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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 O uso da animação na série Quem Sou Eu? do Fantástico1 Lívia Mie Anbai SOARES2 Lucas André Vasconcelos VICHINHESKI3 Sandra NODARI4 Universidade Positivo – Curitiba (PR) RESUMO O presente trabalho busca analisar um caso específico do telejornalismo brasileiro, pontuando os aspectos positivos e negativos da série “Quem sou eu?”, apresentada em quatro episódios no Fantástico, programa do veículo Globo, que vai ao ar aos domingos pelo período noturno. A série aborda a vida de pessoas transgênero, ou seja, indivíduos que não se identificam com o seu corpo biológico, usando como recurso a animação, fazendo paralelo com o conto “Alice no país das maravilhas”, do autor Lewis Carroll. Para tal estudo, foi preciso compreender a origem do termo transgênero, da animação e, como ela pode interferir ou agregar na recepção da mensagem, por parte dos telespectadores. Também, analisar a Alice como personagem e como essa relação poderá interferir no conceito de transgênero transmitido pela série. PALAVRAS-CHAVE:Telejornalismo; Fantástico; Transgênero; Animação TEXTO DO TRABALHO Introdução A ANCINE - Agência Nacional de Cinema apresentou em 2016“Um Estudo Sobre o Valor Adicionado Pelo Setor Audiovisual” que demonstra que o setor agregou R$ 24,5 bilhões à economia brasileira no ano de 2014, contra R$ 8,7 bilhões em 2007 (ANCINE, 2015). Isso representa um crescimento de 181% em sete anos. Este crescimento do audiovisual no Brasil pode refletir em todos os setores que atuam com imagens em movimento. Inclusive com a televisão, que embora ainda esteja presente na maioria dos lares dos brasileiros, vive um momento de crise, constatado por profissionais da área. Ainda que a participação do setor audiovisual na economia brasileira tenha passado de 0,38% em 2007 para 0,54% em 2013, a participação da tevê Trabalho apresentado na DT 1 – Jornalismo do XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul, realizado de 31 de maio a 2 de junho de 2018. 1 2 Estudante do 2º ano do curso de Jornalismo, mieanbai@hotmail.com. Estudante do 2º ano do curso de Jornalismo, lucasvichinheski@hotmail.com. 4 Professora do curso de Jornalismo da Universidade Positivo e orientadora deste artigo, e-mail: Sandra.nodari@up.edu.br. 3 1 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 aberta encolheu de 63,7% para 41,5%. Por outro lado, a atividade de programação da TV por assinatura cresceu de 6% para 13,5%. (O VALE, 2016) O crescimento da produção audiovisual se deu em grande medida depois da aprovação da lei 12.485/11 (ANCINE, 2016) que exige cotas de Produção Audiovisual Independente realizada por produtoras nacionais nos canais de TV por assinatura. Segundo dados da Ancine, pela primeira vez na história, a TV a cabo passou a TV aberta. A disputa por audiência faz com que os canais abertos tenham que se redescobrir para manter-se ativos no mercado. Esta redescoberta está resultando em mais espaços de pesquisa e experimentação de novos formatos no jornalismo audiovisual. O programa Fantástico da Rede Globo é talvez o espaço de maior pesquisa entre o que se pratica na TV fechada aplicado à TV aberta. Técnicas de audiovisual muito utilizadas na ficção, são trazidas para atração semanal que vai ao ar aos domingos, como forma de manter a atenção do público. Este é o caso da série de quatro episódios chamada: Quem Sou Eu? Além da linguagem comum ao telejornalismo, o recurso de animação foi bastante explorado na produção. A obra literária “Alice no País das Maravilhas”, de Lewis Carroll, é o fio condutor da narrativa que trabalha com um tema bastante relevante para a sociedade contemporânea: “O Fantástico mostra, em quatro episódios, os momentos da vida de indivíduos transgêneros.” (G1, 2016) O tema abordado na série, bastante atual, por si, já foi uma iniciativa contemporânea e corajosa da emissora de televisão, fugindo um pouco de sua característica tradicional. Tratar de forma natural, por meio de vários personagens, inclusive crianças, da questão transgênero, joga luz a um tema tabu na sociedade brasileira, se não mundial. Aproveitar esta série para produzir uma pesquisa dá continuidade ao trabalho iniciado pelo programa Fantástico, não permitindo ao tema, ser esquecido. Conhecer os trabalhos já realizados por especialistas em estudos de transgenia, permitirá uma análise mais profunda de como a série discutiu este tema complexo por meio da personagem Alice, cuja história, por si só, remete ao mundo do sonho. A partir desta breve apresentação das características e intenções do Fantástico e da descrição rápida da série, a questão que merece ser discutida é se o fato de programa semanal utilizar-se de recursos de ficção, como a animação na edição, pode transformar um assunto sério e relevante em algo fantasioso que não faria parte da realidade? A edição de recursos como animação interfere na comunicação da notícia? Proceder a 2 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 análise dos quatro episódios e observar como a animação foi utilizada para contar a notícia é o objetivo deste trabalho. Metodologia O primeiro passo para iniciar este projetoé proceder à revisão da literatura conforme Prodanov e Freitas (2013, pág. 80) “O levantamento bibliográfico é um apanhado geral sobre os principais documentos e trabalhos realizados a respeito do tema escolhido, abordados anteriormente por outros pesquisadores para a obtenção de dados para a pesquisa.” Servem como elementos para pesquisa: artigos científicos (que estão sempre mais atualizados), livros, revistas, dissertações, teses, publicações em periódicos e internet e servem para aprimorar o estudo. As análises das reportagens serão abordadas como estudo de caso: Beuren, (2004, p. 84) citado por Prodanov e Freitas (2013, pág. 201) comenta que “a pesquisa do tipo estudo de caso caracteriza-se principalmente pelo estudo concentrado de um único caso. Este estudo é preferido pelos pesquisadores que desejam aprofundar seus conhecimentos a respeito de determinado caso específico.” O Termo Transgênero de onde surgiu? Em um cenário histórico, é possível perceber o transgênero sendo citado desde o início da mitologia narrativa, através do termo andrógeno. “A androginia (andros, homem; gynos, mulher) é a condição que vai além da representação da união entre o masculino e o feminino; o andrógino é um ser que contém em si todas as oposições, que basta a si mesmo, completo e fecundo” (CHEVALIER, GHEERBRANT, 2002). Embora não seja o termo mais adequado, foi o que mais se aproximou para descrever esse grupo no passado. Na mitologia é possível encontrar vários personagens transgêneros, como na África onde encontramos três mitos diferentes de uma serpente que: Cria o mundo ao fecundar a si mesma. Em Benim, na África Ocidental, encontramos a mítica Mau-Lisa, serpente venerada como deusa e relacionada ao arco-íris; na África Setentrional, no sul da Argélia, a gigantesca serpente Mínia; e na África Austral a grande píton Chinaweji (BRAVO, 2008, p. 90). 3 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 Na Índia, eles romperam o universo mítico-religioso com o ambiente real através dos hijras, uma casta formada por transgêneros que apresentam uma cultura com rituais e mitologia própria e representam um papel importante dentro do mítico indiano (CAMARGO; MENDONÇA, p. 158, 2016). A palavra como conhecemos hoje foi inventada por John Oliven (1965), e popularizada por vários transgêneros que abriram caminho para o conceito. Segundo Oliven, o termo transexual é enganoso, sendo transgênero o mais adequado. Às vezes, diz-se que Virginia Prince (1976), foi quem popularizou o termo, mas a história mostra que muitas pessoas advogaram o uso deste termo muito antes de Prince. (OLIVEN, 1965). Então, o transgênero é a terminologia utilizada para descrever pessoas que transitam entre os gêneros. São pessoas cuja identidade de gênero transcende as definições convencionais de sexualidade (ABGLT, 2015, p.17). O uso de Animação no Audiovisual Não é comum encontrar animação em telejornalismo, essa é uma prática que vem conquistando os editores aos poucos, uma vez que é necessário cuidado com o tipo de animação e notícia, podendo mesclar e confundir a realidade com um mundo imaginário e fantasioso. O perigo é de causar conflito aos telespectadores, é preciso saber exatamente o que se quer passar para o público não entender de forma errada. As possibilidades de diálogo do receptor com a obra, no que se refere à interpretação da mensagem em suas diversas extensões passam a ser um diferencial da mesma, que oferece uma liquidez maior do que as tradicionalmente produzidas, onde a imagem fílmica ocupa um status de supremacia e as poucas interpretações podem ser obtidas por meio de discursos subjetivos da mensagem, muitas vezes sem a participação do receptor no que tange a decisão de receber esta representação audiovisual. (GONÇALVES; RENÓ, p.4). A animação começou com o francês Emile Cohl, que realizou o primeiro filme animado “Fantasmagorie”, com cerca de dois minutos (SILVA, 1999, p. 8). Assim, a animação sempre esteve mais presente no cinema, podemos observar no cinema desde “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin. 4 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 Hoje, com a internet, há uma diversidade maior de explorações de formatos de mídia, o que faz com que o telespectador não se contente apenas com o audiovisual padrão, exigindo o uso de novas ferramentas como a animação. Percebe-se, numa breve discussão, que tal participação é uma necessidade nos ambientes comunicacionais atuais, pois os receptores não aceitam mais as informações com a passividade tradicional. (Gonçalves e Renó, p.4). O Programa Fantástico e as Séries de Reportagens O telejornalismo da Rede Globo tem gerado vários espaços de exibição de reportagens especiais, investigativas e séries de reportagens. “No final dos anos 1990, os repórteres Valmir Salaro e Robinson Cerântula, da TV Globo, fizeram uma matéria que foi, sem sombra de dúvida, um divisor de águas no jornalismo-denúncia.” (CARVALHO et al, 2010, pág. 78). Tratava-se de uma reportagem com câmera escondida de um flagrante de crime cometido por fiscais da prefeitura de São Paulo. Os autores chamam a atenção para algo que deve ser fundamental no momento de se pensar uma pauta: “... dois conceitos que normalmente se confundem: interesse público e interesse do público”. No momento histórico social em que o Brasil vive produzir uma série que discute gêneros e diversidade, é servir ao interesse público. O programa Fantástico foi criado em 1973 pela Rede Globo de Televisão para ser uma revista semanal que mesclava jornalismo e entretenimento. A intenção era ter uma produção sofisticada visualmente e que mesclasse realidade e ficção. “Boni queria uma revista visualmente sofisticada que trabalhasse com a realidade e a ficção, representadas pelo jornalismo, pela dramaturgia e pela linha de shows” (MEMÓRIA GLOBO, 2016) A inovação estava presente no nome e na intenção do novo programa: Um programa diferente de tudo o que existia na televisão brasileira na época. Em 1973, estreava na Globo uma revista eletrônica de variedades, com duas horas de duração, que reunia jornalismo e entretenimento para levar até o telespectador os assuntos relevantes no Brasil e no mundo. O programa tinha um nome à altura de suas pretensões: Fantástico, o Show da Vida.(MEMÓRIA GLOBO, 2016) O jornalismo dentro do novo programa deveria ter um tratamento diferente do que já era realizado nos telejornais da emissora. O Fantástico inovou, desde os 5 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 primeiros anos, na forma de se fazer jornalismo na televisão brasileira, ao passar em revista os principais assuntos da semana. As notícias recebiam tratamento sofisticado, tanto o conteúdo quanto a imagem. José Itamar de Freitas, diretor-geral do programa a partir de 1977, classificava as reportagens apresentadas todos os domingos como “um meio-termo entre o Globo Repórter e os telejornais diários”.(MEMÓRIA GLOBO, 2016). As reportagens especiais foram sempre o tratamento dado à notícia no Fantástico. Para Edvaldo Pereira Limaa função destas grandes reportagens é ampliar os fatos, possibilitar a compreensão de maior alcance e permitir a dimensão contextual em vez do relato raso. Possibilita um mergulho de fôlego nos fatos e em seu contexto, oferecendo, a seu autor ou a seus autores, uma dose ponderável de liberdade para escapar aos grilhões normalmente impostos pela fórmula convencional do tratamento da notícia, com o lead e as pirâmides. (LIMA, 2004, pág. 18) A presença do humor e de recursos de ficção sempre conversaram com o jornalismo na emissora. Alexandre Garcia, em 1988, tinha um quadro no Fantástico que discutia política de maneira mais leve, utilizando ironia em manipulação de imagens. Fonte: Memória Globo A busca por novas formas de contar e discutir a notícia é uma constante no jornalismo audiovisual. Iluska Coutinho (2012, pág. 112) estuda a presença da teledramaturgia no jornalismo televisivo citando Balogh (2002) para quem “o real e o ficcional ganham aspectos ambíguos”, o que geraria interferências claras nos modelos de expressão ficcional, e também, no telejornalismo, completo. Para Newton Cannito: 6 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 O digital fez algo que ninguém esperava: tornou a televisão muito mais narrativa. O roteiro para séries de televisão jamais foi tão narrativo e tão interligado. A presença de bons roteiristas tornou-se fundamental. O poder deslocou-se para as mãos dos contadores de histórias. (2010, pág. 18) Para além do roteiro, tanto o processo de captação das imagens e sons, quanto da edição nas grandes reportagens é um exercício contínuo de encontrar o melhor caminho para contar uma história dentro da complexidade audiovisual. Por trás da força visual de uma história existe a estrutura sonora essencial para a boa comunicação. Os sons captados e a trilha sonora expandem os limites da criatividade do editor, proporcionando contrastes, sugerindo a intensidade e até contando o tempo de forma marcada.(ARMBRUST, 2016, p.190) A Série Quem Sou Eu? O primeiro episódio da sériemostra como é adolescência de transgêneros; o segundo acompanha um personagem que realiza tratamento hormonal para que seu corpo ganhe traços masculinos; a terceira reportagem mostra a realidade de ser uma pessoa transgênero no Brasil; e a última, apresenta a formação de famílias e os relacionamentos vividos por transgêneros que realizaram cirurgias de mudança de sexo. A série utiliza o recurso de animação para incluir a personagem de Alice em cada reportagem. Uma Alice criada especialmente para este fim que em nada lembra a personagem notabilizada pelo desenho animado da Disney. Uma Alice um tanto andrógina, de cabelo curto, de calça, blusa e tênis, num tom pastel. Fonte: G1 Segundo o site G1, que explica o que é a série: “Para ajudar a esclarecer o assunto, a série traça um paralelo com a história de ‘Mas a Alice de Quem Sou Eu?’e 7 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 parte em uma jornada de autoconhecimento e representa todas as pessoas que sentem que nasceram no corpo errado e estão em busca de sua identidade” (G1, 2016). Fonte: G1 O primeiro episódio da série aborda a infância da criança transgênero e explica a relação biológica dessa condição. Há uma contextualização no início pelos apresentadores do Fantástico. Logo em seguida, a repórter Renata Ceribelli, explica como irá funcionar a matéria e a ligação traçada com o conto de fadas “Alice no país das maravilhas” para facilitar a compreensão do expectador através do olhar da personagem Alice, usada como metáfora para a representação da vida de um transgênero. O primeiro entrevistado mostrado na série tem o nome social de Melissa de Fazzio, 11 anos. O episódio tem doze minutos e trinta e quatro segundos, conta com nove entrevistados. Entre eles estão os pais de Melissa, a coordenadora administrativa do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo Vanessa Galesi e o psiquiatra Alexandre Saadeh. O nome da série é “Quem sou eu?” devido à busca constante da pessoa transgênero de encontrar sua verdadeira identidade e não a biológica. Alice na série representa o transgênero, em busca de sua identidade, pois no clássico infantil, a garota está desorientada em um país desconhecido buscando o caminho de volta para casa (CARROLL, 2003). Vale ressaltar que Alice também representa todo o processo de transformação corporal ocorrido na adolescência, o que se relaciona com o processo de mudança ao qual o transgênero passa durante sua vida. Já no primeiro episódio, Renata Ceribelli deixa explícita essa relação e complementa, “tudo começa com uma corrida contra o tempo. Alice quer alcançar o 8 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 coelho branco e o relógio, os transgêneros também têm pressa. Pressa em responder uma única pergunta: quem sou eu?” (trecho do Fantástico). No final do episódio, Renata faz um paralelo sobre o crescimento de Melissa e Alice, no qual as duas vão sofrer por estarem em um corpo inadequado. Durante a história original do conto, Alice passa por diversas mudanças em seu corpo, e Melissa, terá de estar ciente que mudanças irão acontecer com ela. O segundo episódio é sobre o transgênero na adolescência, o início do tratamento hormonal e a automedicação. Bernardo,15 anos, bissexual, é um dos personagens. Outro personagem é Andrea da Costa e Silva, monitora de telemarketing, que começou o tratamento hormonal aos 22 anos. Também participam o psiquiatra Alexandre Saadeh, Karen Seidel, endocrinologista do IEDE (Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia), o urulogistaEloisio Alexsandro e Clarice Cezar Cabral, psicóloga. O episódio tem 14 minutos e 43 segundos. O paralelo nesse episódio começa quando a apresentadora fala que no jardim das maravilhas as flores que lá vivem são falantes e querem saber qual tipo de flor é Alice, porém, ela explica que a menina não é uma flor igual a elas e as flores a julgam como mato e por isso deve ser expulsa. As flores seriam as pessoas que praticam bullying com Bernardo por ser transgênero. Depois a conexão vem através do encontro da Alice com o Chapeleiro Maluco e então, pode fazer perguntas a ele, isso acontece com Andrea quando ela tem a oportunidade de tirar suas dúvidas com profissionais da saúde. O terceiro episódio da série “quem sou eu?” tem 14 minutos e 45 segundos e conta com 13 entrevistas, sendo as principais de Thaís Rocha e Luiza Valentim. Thaís Rocha, 21 anos, nascida em Santa Maria da Vitória (BA), porém mora em Curitiba após ter sido expulsa de casa, aos 16 anos. Trabalha como profissional do sexo e sonha em ser publicitária. Luiza Valentim, estudante de engenharia, mora em Serra do Cipó (MG). Buscou orientação aos 23 anos pelo Sistema Único de Saúde. O episódio apresenta dados sobre a expectativa de vida de pessoas transgênero. Cita as 177 mortes registradas em 2016. Outro dado, são as 34 operações de transgenitalização realizadas pelo SUS. Para a cirurgia, é necessário ser maior de 21 anos e ter, pelo menos, 2 anos de acompanhamento médico e psicológico. Nesse episódio, Thaís é expulsa de casa, assim como Alice é expulsa do jardim das flores, apenas por ser diferente. Renata, narra que o caminho de Thaís é tão difícil quanto o de Alice quando encontra a Rainha de Copas que ordena que lhe cortem a 9 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 cabeça por contrariá-la. A expectativa de vida de uma pessoa trans no Brasil não passa dos 35 anos. Intercalando os dados sobre violência e morte de trans que Renata Ceribelli traz, a animação demonstra a rainha falando “cortem as cabeças”, relacionando com a violência que Alice sofre. O quarto e último episódio tem 12min e 57 minutos e relata sobre relacionamentos amorosos de pessoas transgênero e relações familiares, contando com seis entrevistas. Alessandra Azevedo (Lekka), 29 anos – cabeleireira - conta que assumiu a identidade feminina aos 18 anos, mas somente aos 26 passou pela cirurgia de transgenitalização e sente medo de se relacionar com outras pessoas, por isso, ainda é virgem. Leonard Maulaz é homem trans - estudante de psicologia - e se apaixonou por Carla de Oliveira, uma mulher heterossexual – professora de educação física e dança – na academia. O casal sonha em casar e ter filhos. Anderson Cunha é homem trans – gari – e Helena Freitas é mulher trans – operadora de telemarketing. O primeiro casal transgênero a se casar e ter filho, Gregório. No último episódio, Alessandra é comparada com Alice devido aos problemas que ambas já enfrentaram e agora só querem responder uma pergunta: quem sou eu? Assim como no conto que Alice acorda e percebe que tudo foi um sonho, Alessandra desperta para a realidade, percebendo que ainda enfrentaria preconceito mesmo após terminar sua transformação e a série termina com uma animação da “árvore da diversidade”, que Renata descreve com sendo repleta de amor. Nota-se que as cores usadas na animação são cores neutras, mas quando se trata de violência, emprega-se a cor vermelha, fazendo referências a morte, como diz a personagem Rainha de Copas: “Cortem as cabeças” enquanto a reportagem mostra notícias e dados sobre a violência contra pessoas transexuais. CONSIDERAÇÕES FINAIS Após assistir e analisar os quatro episódios da série, é possível pensar que a animação pode proporcionar duas vertentes dentro desse produto jornalístico: uma delas seria: aproximar e inteirar pessoas que tem preconceito com o assunto e fazê-las ter um contato maior, a outra, ao contrário, seria de afastar aquelas pessoas que têm maior conhecimento. 10 Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sul – Cascavel - PR – 31/05 a 02/06/2018 Quando a série apresenta um conto de fadas de conhecimento comum e a compara e adapta ao transgênero ela tem a capacidade de fazer pessoas que tem resistência e preconceito com assunto, olhar e pensar de maneira diferente sobre o tema, pois aproxima o telespectador do dilema vivido pelos personagens da matéria. Mas ao mesmo tempo, pode criar um imaginário que a realidade do transgênero é algo distante, não pertencente a nossa realidade, e sim, estánum mundo fantasioso. A intertextualização que acontece entre o vídeo tradicional trabalhado dentro do telejornalismo com a animação contribui para uma maior diversidade dentro do audiovisual, todavia, é um caminho perigoso com sua interpretação que pode ser ambígua. Alice como personagem que vive em outro mundo, que sonha acordada, que vive experiências fora do comum, pode ser trazida para a interpretação dos personagens apresentados, seriam eles também, pessoas que estão fora da realidade? Experimentar é sempre arriscado porque não se pode ter controle sobre o resultado do que é novo. Porém, experimentar é necessário e fundamental não só na televisão, mas como argumenta Cannito: “Vivemos num período de profunda transformação social e política, e a tecnologia digital é a maior revolução que já ocorreu na história das mídias” (2010, pág. 15). É necessário e fundamental continuar experimentando e discutindo as experiências para que o jornalismo perceba onde erra e acerta e como buscar sempre pelos acertos. REFERÊNCIAS ABGLT – Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Manual de Comunicação LGBT. 2015 ARMBRUST. Rafael. In Barcellos, Caco. Profissão Repórter 10 anos: Grandes Aventuras e Grandes Coberturas. São Paulo: Planeta, 2016. BRASIL. ANCINE. Setor audiovisual tem crescimento mais acelerado do que o conjunto da economia brasileira. 2015. Disponível em: http://www.ancine.gov.br/salaimprensa/noticias/setor-audiovisual-tem-crescimento-mais-acelerado-do-que-o-conjunto-da BRASIL. ANCINE. Tire suas dúvidas sobre a Lei da TV Paga. 2016. Disponível em: <http://www.ancine.gov.br/faq-lei-da-tv-paga BRAVO, Susana Gavilanes. Presencia y ausencia de la figura femeninaenlosorígenes de las culturas: de lasdiosaseuropeas a lasdiosas americanas. 2008, 00f. Tese (doutoradoem...) -UniversitatJaume I. 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