OteaIroda Norte ...... ..... Tadevsz Kantor
D'Auhipc e Diderot
dma olSa sake oeapap ...................................................21
Fatima Sandi
En busce do taatro e do brasileiro ..........................................39
Angela Leite Lopes
thin nctaz sire o Doii Juan di Moliere ................................51
Walter Lime Torres
0 tealro i coin do pauado ....................................................65
Antonio Suedes
Entisviita lie Nelly laiiort .......................................................11
a Fáma Saadi e Walter Lima Tories
II mMstIu 'e model
Giorgio Strehlec 1921-1997 ..................................................08
Walter time Tortes
DUAS NOTAS SOME 0
DON JUAN DE MOLIERE
W A LTER LIIM Ti
PEQUENA TRAJETORIA DE DON JUAN ATE 0 BRAsIL
Originairnente, a Don Juan do Moliere respondeu
a urna necessidade prernente do autor-ator e chete do
trupe de consegur fazer urn born ernpreendirnento corn o
qual pudesse superar as dificuldades econornicas que
nunca deixarn de assolar as companhas teatrais. Desta
forma, a peca possui as caracteristicas basicas e rnais
marcantes, Os elementos que rnais seduziam a pUblico ca
epoca do autor: a farsa, a feerico maravUhoso e a
maquinaria. 0 fato de escrever sua peca corn as olhos
voltados para estes elernentos não quer dizer qua Mokere
renunciasse, ou fizesse urna concessão, a carnpanha que
ete mesmo encabeçava por urna drarnaturgia qua se
interrogava justamente sobre a eficencia destes recursos
cénicos dentro de urna escritura festal quo tinha por base
a representaçao critics do comportamento hurnano: a
comedia do caracteres.
Don Juan de MoliOro foi apresentado pela prirneira
vez no Teatro do Palais Royal, em Paris. a 15 de fevereiro
de 1665. Obtendo urn grande sucesso de bilheteria, contaSe, no entanto, que 0 autor teve que retftä-lo de cartaz
quinze dias apOs a estreia, a conselho do prOprio rel Luis
XIV. 0 texto tnha se tornado urna resposta, näo rnenos
511
velada S pane do autor, a seus detratoles qua oito meses
antes conseguirarn, através da censure, interditar 0 sou
Tartufo. Corn este texto, Moliere foi severamente criticado
per estar denegrndo as mernbros da Congregacäo do
Santo Sacramento ou seja, a cabala dos falsos devotes e
hipOcritas que, sob a manto da religião, cornetiam as
maiores arbitrariedades e cujo poder era temido pelo
prOprio rei. Em contrapartida, em agosto do mesmo ano, 0
autor de 0 Burguês ndtculo e sua trupe recebiarn de Luis
XIV a priviIégo do serern designados 'trupe du roE",
tornando-se a cornpanhia oficial, e 0 autor passando a
receber uma pensão de seis mil libras, 0 qua era uma
some bastante significativa na Opoca.
Durante alguns seculos, Don Juan for urn texto
renegade pales atores e esquecido ou pouco procurado
pales encenadores. 0 propria Moliere parece te-to
abandonado depois de criA-lo. Morto 0 autor. em 1673,
Thomas Corneille recria 0 texto, em verses e de forma
bastante edulcorada. E esta versão qua passe a ser a
texto de ref erOncia das rnontagens ate 1841. Entre 1847 e
1900, e a peca de Moliere, e nêo rnas a versão de
Thomas Corneille, qua e representada, rnas, reputada
dificil, 6 rnontada apenas oitenta vezes. Antoine, ideologo
do naturalismo. quando de seu mandate come diretor do
Odéon 1904-1914), tenta encena-lo revestindo-o de
elementos que sugerern urna reconstituicão histOrica.
Durante as duas primeiras decadas de nosso seculo, Don
Juan ¶01 representado sem grande repercussãc na
Cornedie-Francaise. Data, entretanto, da decade de trinta
52
urna montagern de Meyerhold qua identifica Don Juan
corn a nobreza decadente quo deveria bar lugar ao
nascirnento de urn hornem escrupuloso e moralmente so
que sevilia be base a urna sociedade onde irnperasse 0
born senso do povo, encarnado, desta feita, pelo
personagem do servo. Sganarelo.
A dificuldade mEdal da obra de Moliere se deve ao
fato de ela nào Sel unicamente urna comédia barroca,
once sobrepOern-se as efeitos de rnaquinaria, não
possuindo tao pouco as caracteristicas be urna tradicional
cornadia be caracteres. Alérn disto, a fato de Moliere
utilizar-se da prose revela qua ele estava premido peth
urgOncia de escrever sua peça corno urna replica aos
detratores do Tartufo.
Tanto os historiadores do espetaculo corno a
critica especiaizada são unãnimes em atribuir a Louis
Jouvet, em sue encenacão de 1947, a reabilitação da peca
de Moliere. As duzentas representacOes, levadas no
Teatro do Athenée. revigoraram a obra de Moliere,
retirando-a definitivarnente do ostracismo.
A concepcao rnarcadaniente religiosa de Louis
Jouvet tinha por base uma visão de Don Juan como 0 não
eleito, ou seja, aquele qua fora excluido por Deus, 0
homem incapaz de crer, apesar de Se esforçar para tal.
Segundo Louis Jouvet, corn este texto be Where
"passarnos do ateismo que desconhece ao ateisrnO que
recusa".
Louis Jouvet convidou Procopio Ferreira pare
representar, nesta niontagern, o personagern de
53
Sganarelo. Entre 1941 e 1942. 0 encenador fiancés, em
turné pelo Brasil e pela America Latina, ficou inuito bern
impressonado corn a trabaiho de Procopia Ferreira num
outro texto de MolLOfe. 0 convite não vinQou, rras 0 ator
Fernand René qua representou Sganarelo ao lado do
Jouvet, tinha a mesmo tipo Itsico do nosso ProcOpio.
Jouvet passou muito tempo procurando seu Sganarelo, e
so escolheu Fernand René depois da certeza de não porter
contac corn o cOlebre ator brasileiro. Jouvet ficara de care
forma prisioneiro da irnagem de ProcOpio, da sue
interpretacão vivaz, de sua voz, de seu histrionismo e, par
isto, arriscou-se a convidar pare sua montagem urn ator
ate certo ponto desconhecido, que vinha do music-hail e
que não possula experiOncLa no trabalbo sisternOtico corn
textos clássicos.
Na dOcada seguinte, outra montagem marcante lot
a Don Juan encenado e interpretado por Jean War e peta
equipe do Teatro Nacional Popular (TNP). 0 pUblico
brasileiro assistiu a esta versão durante a turnO do TNP em
1957. A referéncia básica desta encenacão era a
vatorizacão do papel de Sganarelo, devida a interpretaçãO
de Daniel Sorano, quo buscava assemelhar-se fiscamente
a Moliere, e a esvaziamento da relacao patrao-empiegadO.
Este inontagem parece acentuar, pela prirneira vez, a
intrinseca complementaridade entre Don Juan-Sganarelo.
Na Opoca, a critico DOcio de Almeida Prado sublinhava a
diferença entre o trabaiho dos dots atores. Sabre a
interpretacaO de Sorano, ele afirmava, qua 'seu
Sqanarelo, apesar de tao consciente, de tao bem pensado,
54
e rnaravilhoso do espontaneidade: entre pensarnento 0
gesto. id6ia e acäo, jamais conseguiremos introduzir uma
cunha, perceber a intencao antecedendo e preparando a
efeito cOmico". Quanto a Jean Vilar, Airneida Prado
declarava quo "ole pertence a outra categoria do ator. Para
ele. representar a sobrotudo urn ato de inteligOncia e do
vontade 2 . Comparando 0 animador do TNP corn Louis
Jouvet, o historiador brasileiro lembrava: "Jouvet, qua foi
0 outro grande Don Juan deste seculo, via o gentil-homem
espanhol comic, urn animal de presa, hierãtico, quase
mOvet, atraindo corn o olhar, corn a sorriso irnperceptivel
de desprezo, as suas v(tirnas. Vilar anda, gesticula, ri, mas,
no fundo, corn o seu tranqUilo atrevirnento, corn a sua
serena petulância, sogere a mesma face distante e
enigmatica"3.
No Brasil, esperamos ate os anos 70 pare termos
urna montagem do texto frances. Eb foi realizada pSo
Teatro Oficina, mais precisamente. por iniciativa do
Fernando Peixoto. qua encenou 0 texto em 1970.
Cornpunham ainda a equipe Flávio li-npOrio (cenografo),
Gianfrancesco Guarnieri (Don Juan), Antonio Pedro
Sganarelo) e Marta Overbeck (Elvira). Atravos do urna
adaptacão bastante livre do toxto frances, a montagern
brasileira reivindicava urn compromisso emergente,
radical, corn a realidade daquela década no Brasil. Segundo
Fernando Peixoto, a espetaculo era concebido do forma a
depender da mUsica, neste caso do rock. Isto é, a
estrutura do espetAcuto e constituida pelas cenas do
MoliOre, contando a vida, paixão e morte de urn rebelde, 0
55
calvário terrivel do urn personagern complexo, niistuia do
James Dean-Hippie-Roiling Stone-Easy Rider e pea
musica livre e espontànea, pelo son explosivo qua yen da
bateria e das guitarras elOtricas dos Brasaes ".
Como se ye, as questOes suscitadas pelo texto de
Moliere possibilitarn inürneras leitures ou, so preferirmos.
inUrneras versOes de uma mesma historia: Os Ultimos dies
da vida do Burlador de Sevilha.
Houve, flog palcos do Rio de Janeiro, em 1997,
dues montagens do texto de Volterra. A primeira fol a
encenacão de André De la Cruz, no Teatro GlOucio Gill. Na
concepcão do diretor, Don Juan é urn bissexual a procure
de todos Os prazeres, correndo em direçao a sua morte.
corno urn suicida consciente e contente. Jé o Don Juan
ciue estreou no Teatro Villa-Lobes, personificado por Edson
Celulari corn sobriedade e lirisrno, encenado por Moacir
Chaves, acentuou a sokdão. 0 egoisrno e a perversao do
urn honern quo, ao desafiar as leis divines, encontra-se
diante de seus proprios limites.
Hole, porém, 0 eterno sedutor nao Se debate mais, comb
no tempo do Luis XIV, contra os falsos devotes e a cabala
da CongregacOo do Santo Sacramento. Don Juan Se bate
contra a indiferenca de urna sociedade inodore e
pasteurizada ciiante cia miséria do comportamefito social e
frente a ineficãcia do sistema politico. Inconformista, Don
Juan mantern-se como sirobolo do hornem revoltado, que
luta contra urna sociedade once irnpera 0 cornportameflto
burguês-globalizaflte. Don Juan é 0 exercicio de uma
resistencia. Hole, 0 herOi de Moliere persiste no seu
56
embato, não so corn a hornern-clone-de-dous", duplicado
na sua insignificãncia corporea, mas também contra a
valorização da rnesrnice.
DON JUAN E 0 CEW DE CADA UM.
A perenidade de urn texto de teatro pods ser
rnedida pale sue génese. Ou seja, eta e o resultado de
uma vontade ernergente e erninente do entrega e do
oterecirnento da parts daquele qua a escreve. Neste caso.
Moliere dá forma drarnática aos sentirnentos e as
questôes inerentes so seu tempo: a danacêo e a satvacão
do alma humana.
Neste note enfatizarernos algumas ideias sobre
urn personagern quo, inicialrnente oculto, reveta-se
fundamental ao longo do peça: 0 Céu.
A imagem do urn triOngulo parece adequar-se
perfeitarnente aos nossos propOsitos, transmitindo a ideia
que desenvolverenios. Desta rnaneira, so a base do
tringulo, qua orienta a visão perspectivada do espectador,
o traçada entre as pontos A (Don Juan) e B (Sganarelo); ao
vertice C, identificado corn 0 Ceu, concorrern as linhas quo
originarn-se nestes dois pontos. Nao Se tratando de urn
personagem alegOrico, interpretado par urn ator, tao pouco
o COu é previsto no tista do personagens qua acompanha
o texto mas Moliere torna-o onipresente 0 onisciente
através do discurso dos outros personagens. Nao
dirninuiriamos em nada 0 brilho do Don Juan so
declarássernos qua a Ceu 0 0 personagern central da
peça. SinOnirno do Deus cristo e da proba moral catOlica,
57
este mesmo Céu proibiu, através do lgreja, quando da
morte do autor do Tartufo, seu sepuitamento em campo
santo.
Em linhas gerais, urn personagern do teatro é
constituido pelas palavras qua 0 drarnaturgo Ihe atribul,
ganhando realidade cOnica atravOs do presenca fisica do
ator. Urn personagem tambOm e aquilo qua Os outros
personagens cornentam a seu respeito. Percebe-se S a
mac, do autor qua convida nosso julgernento as mültiplas
possibilidades de decifracao do mFsterio quo urn
personagem abñga. Isso Sen falar no trabaiho do ator quo,
partindo des palavras do autor, tambem contribui pare
aumentar a complexidade do personagern ao the
emprestar sue imagem.
Este nao O ci caso do Ceu de Don Juan, pois como
a se afirrnou, ele nao at encarnado par urn atm. Ou seja. 0
COu e citado, avocado, provocado, invocado, recrirninado,
reverenciado, injuriado, desafiado e, no final da peca,
chega mesrno a se manUestar punindo definitivamente, e
enviando ao Inferno (?), a personagern qua ernpresta seu
none a page.
0 discurso dos personagens engendrado P01
Moliere, por urn lado, converge diretamente na direcao do
ponto de fuga do uma perspective celestial, ou sale. 0
ponto C do triângulo inicial. Por outro lado, ao Céu O
atribuida a funçOa de motor do trama, justificando a moral,
o decoro, a teinperanca na malha de sentimentos qua
cornpôe a açOo dos personagens. 0 Céu apresenta-se
corno coadjuvante dos demais personagens orientando-os
58
na diieço de seus objetivos, auxiliando-os na
concfetizaQão de suas acães.
0 COu a foi o Ultimo limite, a fronteira maxima e
intransponivel ate qua 0 hornern chegasse a Lua. Trata-se
aqul, evidenternente, do firrnamento, do ar e da
atrnosfera, da abObada celeste, do espaco infinito onde
nossos aihos alcançam as estrelas, e Os astros se
rnovimentam. Entretanto, o Céu de Don Juan é 0 vértice
do triängulo do qual este Ultimo e Sganarelo são a base. 0
Céu traduz-se, Segundo as reigiOes, corno o espaço once
o tempo O eterno, ou meihor, ausente. Junto de Deus
encontram-se Os Anjos e Os Santos, assim corno aqueles
que viverarn na retidão durante suas trajetorias terrenas,
desirutando agora de urn lugar ao lado das almas dos
justos e piedosos. Desta forma, 0 COu torna-se sinonimo
de Paraiso e evidentemente 0 oposto de Inferno.
A iddia qua a espectador se fez deste Cáo, ao
longo da peca, está relacionada corn a discussOo,
elaborada por Where, entre Sganarelo e Don Juan.
Aquele O temente a Deus e aos designios do COu,
aceitando sern questionar e não fazendo a manor oposicêo
aO seu destino e a sue condiçao social; este, debochando
corn desfacatez, desafiando corn seu atrevirnenta e sue
impiedade Os valores religiosos entra em conflito direto
corn o Céu que todos reverenciam. E a partir deste
conflito, entre A e B, qua nosso olhar converge para C, 0
vertice do triangulo, ou ponto de fuga celestial.
Contribuem de forma eloquente para esta dialetica a
atitude e C cornportarnento transgressores de Don Juan
59
que, aproxirnando-se da figure satanica é apresentado
corno a grande perversor e par conseguinte a principal
antagonista do COu.
Em contrapartda, a prirneira 6 ünica manifestacao
do COu punindo Don Juan por ter transgredido norinas C
preceitos qua ele devefia respeitar, revels manors 0
rnaniqueisn'o do urn simples deus ex machina do qua a
tragicidade inerente ao gesto do conhecirnento e Iucidez
01 parte do mesmo Don Juan, qua aqui so avizinha do
mito prometeico.
A ação exterminadora do Céu e, sobretudo para a
pOblico da epoca de MoliOre, sinai da punicão divina, do
castigo celestial irredutivel, qua deve Ser distribuido aoS
impios C aos blasfernadores.
Tondo em vista, entretanto, qua C COu não so
corporifica num 8101, temos qua procurer as vestigios de
sua reaidade cénica no prOprio texto do Molars. Ou ainda,
Se preferirmos, nos indtios qua fornecem a traducão
cenica do texto em espaco teatral.
Textualrnente, a Céu Se manifesta em trés
mornentos alOm das citacOes e alusees pirates advindas
dos discursos das personagens: na cena de Don Juan corn
o Pobre; nas três aparicoes da Estatua do Cornendador,
sobretudo na Ultirna; e na cena do Espectro antes da
Oltirna intervencao da Estatua. Evidentemente, todas estas
rnanifestacoes são irnagens metaforicas da reandade
teatral do Céu.
0 Pobre vive isoado do mundo num basque. Ele
pode ser identificado corn a figure do Cristo e a ärvore quo
60
o abria, p01 sua vez, rernete a imagem do conhedmento
e do saber, do boa seiva, do ärvore original quo dá bons
frutos, relembrada por Sganarelo no seu discurso final. Ela
Se apresenta corno metafora do verdade, pale qual todo
homern qua deseja ser born e seguir as preceitos do
espirito cristáo, deveria pouter seu cornportarnento. 0
Pobre surge em cane mendigando, e sua dqueza é a sue
opcao pela virtude beatifica, pale santificaçao. Ele O
resignacão e martiria. 0 Pobre lembra a Don Juan, e
indiretarnente so espectador, que somos todos peregrinos
sabre a face do Terra e quo urn dia a juizo final chegarA
para todos. Coma born moralista, Moliere, de maneira
manqueista, observa qua quern segue 0 exemplo de
abnegaçao do Pobre tera maiores chances de obter urn
lugar no Ceu, enquanto que aquele que imitar a atitude de
Don Juan podera, apOs a morte, encontrar-se no Inferno. A
atitude vii do herOi, tentando fazer 0 Pobre blasfemar em
troca de dinheiro, ilustra seu caráter provocador e
transgressor.
Jã apaziguada do paixão quo a arrebatou, Elvira, a
esposa conspurcada, vem ate Don Juan como a muiher
intercessora ernie o Céu e os homens - Maria, mae de
Jesus ou Beatriz intercedendo par Dante, são outros dois
exemplos do mesma figure. Elvira tenta salvar não so a
sua alma como a de Don Juan. Na sua quarts e Ultirna
aparicão em cons, Elvira manifesta-se no voz do Espectro,
qua 6 a ultimo sinai de sua interferéncia junto a Don Juan
procurando convertO-lo. 0 Espectro, diante do investida do
61
helOi, transfoirna-se p a irnagem do Morte corn a foce,
prenCincio do desaparecknento de Don Juan.
A Estätua do Comendadoi ë urn ültirno exernplo
da presenca do COu. Este objeto remote ao rnonumentc
criado pelo hornern no tentativa de eternizar a Vida,
prestando uma hornenagern indireta a vitarLa do Morte
score esta rnesrna Vida. Por urn lado, a Estatua tradiiz a
rnanifestacao do transcendental, ou seja, O atraves dela
qua 0 Céu ofendido lab" corn Don Juan e, em segwda, o
pune. A Estatua vem infligir, p01 outro lado, a pena capital
00 mau procedimento de Don Juan, agravado pea noticia
do sua rnentjrosa converso diante de Don Luis, seu paL
Neste punição final a Estatua tambem sugere 0 fantasma
do figure paterna, agora investida do celesta poder de
vinganca.
Para Don Juan, no entanto, a Estätua é simbobo
daquibo qua não muda, isto é, do tempo qua aprisiona, do
constancia qua ele niesmo combate atraves de seu
cornportamentO inquieto, sempre A procure de novas
conquistas amorosas. Personificacao do sobrenatural, a
Estatua é o guia de Don Juan no mornento de transpor a
fronteira entre as dois mundos. Nesse sentido, a Estatua
do Cornendador, Ciltinia vitirna de Don Juan no Terra,
torna-se 0 seu companheiro no caminho qua o love a
eternidade celestial ou As charrias infernais.
Portanto, através do EstAtua do Cornendador, do
Pobre e do Espectro (Elvira), C autor de Don Juan cv 0
convidado de podia situa o espectador diante de algurnas
62
manJfestacOes diferentes do mesmo Ceu do qual Don
Juan escarnece.
Aiquitetonicarnente, entretanto, a traducao cènica
do Ceu, na montagern de Moacir Chaves, A indiciada, por
exernpb, pals presença em cena de urn precipicio. Este A
sugerido a partir de urna rampa, idealizada por Daniela
Thomas, a partir de urna estrutwa construida corn chapas
de metal de relatEva transparOncia. Gracas a ilurninaçao de
AurOlio de Simoni, ternos a impressão de que os atores
estao nas nuvens, flutuando. Esta sensacão acentua-se
pela presença, no fundo do palco, de um telao once estã
pintado urn céu, e sobreposto a ele urn segundo telao,
trnnsparente, corn o desenho de urn outro céu. Casts
superposiçao, graças rnais uma vez aos efeitos da
iluminação cenica, advern uma variaçao do
"ternperamento celestial". Ou seja, O possivel revelar ao
espectador, através deste dispositivo, a imagern de urn
COu ora placido, calmo e apaziguado, ore funesto, colerico
e ameacador.
Hnalmente, atraves do pcecipicio, nosso olhar A
guiado na direçao deste espaco inhinfto, ponto de fuga da
perspectiva celestial e vertice do triOngulo. E como no
teatro a experiencia do olhar A soberana, cada espectador
pode atribuir 0 significado qua mais lhe convArn 80 CAu de
Don Juan, havendo tantos COus quanto major for o
nUrnero de fieis ou de hereges que estejarn na platAja.
[;]
a't'lfS]
Décia de Almeida Prado, Teatro em Progresso. São Paulo:
Martins Fontes, 1964, p. 75.
2
den.
den.
28
Peixoto, Teatro em Pedacos. São Paulo: Hucilec,
ed., 1989, p. 135.
4$
64