Artigo recebido em:
08.12.2015
Aprovado em:
22.07.2016
Rodrigo Oliveira de
Oliveira,
Graduado em Desenho Industrial - Programação Visual pela
Universidade Federal
de Santa Maria, Mestre em Ciências da
Comunicação pela
Universidade do Vale
do Rio dos Sinos, coordenador do curso
de Design - Ênfase
em Design Visual
na Unochapecó e do
curso Superior de
Tecnologia em Jogos
Digitais da mesma
instituição, no qual
atua como professor.
roo@unochapeco.
edu.br
Aline Bernardi Acadrolli,
Jornalista formada
pela Universidade
Comunitária da
Região de Chapecó e Especialista
em Jornalismo e
Convergência pela
mesma instituição.
alinexxe@hotmail.
com
Newsgames: um estudo na
internet sobre notícias e
jogos
Rodrigo Oliveira de Oliveira
Aline Bernardi Acadrolli
Resumo
Este artigo apresenta uma reflexão acerca de como se dá a relação dos usuários com
newsagames na internet. Foram abordados fundamentos de Jornalismo Online, Cultura Gamer, newsgames, cibercultura, a partir de um estudo observação na internet
de dois newsgames (Filosofighters e CSI – Ciência Contra o Crime) da página multimídia da Revista online Super Interessante, do Grupo Abril. Foram analisados um
total de 204 comentários publicados na página dos newsgames, no mês de novembro
de 2015. O objetivo foi buscar perceber as interações dos jogadores com o ambiente
no qual estão inseridos. Percebeu-se que os indivíduos que orbitam neste espaço se
autorreconhecem, se relacionam e fortalecem a identidade de comunidade virtual.
Nota-se que as mecânicas do jogo são os fatores que mais chamam a atenção dos
jogadores; porém, muitos vão além do “jogar” e analisam o conteúdo, aprendem e
materializam suas experiências e ideologias nesse contexto.
Palavra-chave:
newsgames, convergência midiática, recepção, cibercultura.
Abstract
This article presents a reflection on how is the relationship of the users with newsagames the Internet. Online Journalism foundations were approached, Gamer Culture,
Newsgames, cyberculture from a study observation on the internet two Newsgames
(Filosofighters and CSI - Science Against Crime) the multimedia page of the online
magazine Super Interesting the Abril Group. It analyzed a total of 204 comments
posted on the page of Newsgames, in November 2015. The objective was to try to
understand the interactions of the players with the environment that they live. It was
noticed that individuals, orbiting in this space, if autorreconhecem, relate and strengthen virtual community identity. It was observed that the mechanics of the game
are the factors that most attract the attention of players, but many go beyond the
“play” and analyze the content, learn and materialize their experiences and ideology
in this context.
Keywords:
Newsgames, media convergence, reception, cyberculture.
Estudos em Jornalismo e Mídia
Vol. 13 Nº 1
Janeiro a Julho de 2016,
ISSNe 1984-6924
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
115
E
stamos na Era da Informação, da cibercultura, em que
a principal característica é
a tecnologia como meio de
disseminar o conhecimento
através de plataformas que unem diversão e informação. Atualmente, a internet
oferece o suporte necessário para a multimidialidade. Diante do contexto online,
o Jornalismo procura alternativas para a
conquista de novos públicos emergentes,
que estão cada vez mais habituados com
os ambientes digitais e exigem conteúdos
dinâmicos e atualizados. Nessa interface,
encontram-se os newsgames. Os newsgames são a fusão da informação – advinda
do formato jornalístico – com o universo lúdico dos jogos eletrônicos, com o
intuito de informar e prender a atenção
do usuário/jogador, envolvendo-o nos
conteúdos de forma imersiva e divertida.
As interações oriundas dos comentários
presentes na página da Revista online Superinteressante, da editora Abril, serão o
objeto de análise desse artigo através de
um estudo na internet de dois newsgames: Filosofighters e CSI – Ciência Contra
o Crime.
O presente trabalho constitui-se
em momentos que permeiam desde a
busca conceitual, a escolha do objeto, as
estratégias metodológicas, até a análise
dos dados e os resultados da pesquisa.
Muitas pesquisas sobre newsgames foram realizadas na última década e provocam reflexões importantes no campo
jornalístico. Desse modo, pretende-se
discutir as possibilidades de interação de
quem habita o mundo dos newsgames.
Decidiu-se realizar essa pesquisa,
inicialmente, pela paixão da autora pelas
duas áreas: jogos e jornalismo. Com esse
estudo, pretende-se ocasionalmente, até
quebrar paradigmas do que realmente é
entendido pelo público como newsgame.
No meio acadêmico, esse artigo pode
ajudar a preencher uma lacuna encontrada atualmente acerca da falta de estudos sobre o público de newsgame no
Brasil. Entender as peculiaridades desse
nicho virtual resultará em produções
116
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
científicas que podem contribuir no conhecimento sobre a temática. Na busca
por conhecimento nesta área, percebeu-se que os newsgames são um espaço de
agrupamento e recepção que resulta na
criação de uma rede social. A partir daí,
tem-se a questão problema deste artigo:
• Como se dá a interação entre
as pessoas que frequentam os ambientes
onde são publicados os newsgames com
os jogos da Superinteressante?
Outros questionamentos permeiam a problemática, sendo, buscar
entender o que os indivíduos expressam
neste meio; perceber como os newsgames
são apresentados para o público, e como
“os jogos com base em notícias” podem
ser uma ferramenta para colaborar com
o entendimento dos leitores sobre o
mundo que os cerca.
O objetivo desse estudo consiste
em analisar a relação dos usuários com
o conteúdo hipermidiático de dois newsgames da página da Super Interessante
na internet1 : Filosofighters e CSI – Ciência Contra o Crime. A pesquisa não
tem o intuito de ir atrás dos indivíduos
e entrevistá-los; mas, de analisá-los em
seus próprios ambientes de interação
através de seus comentários. Entende-se
os newsgames como uma prática interacional da comunicação inserida no processo de convergência de mídias.
CONTEXTUALIZAÇÃO E CONCEITOS: NEWSGAMES NO BRASIL E
SUA RELAÇÃO COM OS GAMES
A história dos jogos digitais remete ao período pós-guerra. A partir das
décadas de 1970 e 1980, os jogos eletrônicos se tornaram populares assim como
jogos de arcade, consoles de videogame
e jogos de computador foram introduzidos ao público em geral. Desde então, os
jogos eletrônico são uma forma popular
de entretenimento e uma parte da cultura moderna (OLIVEIRA, 2014, p. 34).
Com a internet, jogos virtuais e
o advento da cibercultura, nasceu um
novo público, um nicho que busca mais
que os meios tradicionais de informação e entretenimento. Os formatos tradicionais de TV e jornal são obsoletos;
a internet, os tablets e os smartphones
fazem parte da vida dos nascidos na
cultura convergente (JENKINS, 2009).
Dessa maneira, o Jornalismo Online precisava apresentar-se para essas pessoas
e tonar-se um agente social e cultural
nesse processo. A velocidade com que a
informação é disseminada e a sua atualização vão além do tempo dos formatos jornalísticos tradicionais. Por isso,
o fascínio pelos virtuais foi a união do
entretenimento com a informação, na
linguagem e narrativa dos games que o
Jornalismo encontrou novos caminhos
para este meio comunicacional. O novo
conceito de Jornalismo online, chamado
de newsgame (SEABRA, 2007) – ou intitulado por muitos autores como “jogos
jornalísticos” – trabalha a informação
em formatos lúdicos de comunicação,
direcionando aos jogadores de videogame a informação que interessa a eles e
proporcionando elevado grau de engajamento de forma participativa e colaborativa (ANDRADE, 2008).
A relação entre jogos e jornalismo é evidenciada no ambiente online,
tendo como característica a narrativa
multimídia e a imersão (BOGOST et al.,
2010). O newsgame se apoderou da forma divertida do game de educar com a
informação diversional. “A potencialidade do newsgame é unir um jogo à narrativa” (MARCIANO, 2012, p. 14, grifo do
autor). A trama do jogo está na capacidade lúdica do usuário/jogador imersivo
em utilizar suas habilidades de memorizar as informações, recebidas durante o
jogo, para lidar com as interfaces gráficas
de cada jogada. Segundo Santos (2012), a
linguagem dos games é inclusiva e oferece outros canais cognitivos de recepção
do conteúdo. O jogador aprende qualquer tipo de conhecimento através de
janelas, sons, imagens e animação. No
mundo da convergência das mídias, o
consumidor de informações é seduzido
por diversos suportes midiáticos.
Os suportes de games emulam
informações de diversas formas. Johnson
(2005) diz que o sistema de recompensa
é o que atrai o jogador e o faz querer jogar. A recompensa pode ser: postar na
rede social que venceu, mostrar para os
amigos virtuais que ele jogou, autoafirmar-se dentro do ambiente dos comentários ou, até mesmo, ser aceito no meio
onde habita – necessidades que também
estão presentes na vida real.
Os newsgames trazem uma proposta em que a notícia é formatada de
um modo diferente, em suporte lúdico.
De acordo com Bogost, Ferrari e Schweizer (2010), “é a capacidade dos jogos de
simular interativamente sobre como as
coisas funcionam, tornando-os aptos
para apresentar aos usuários/jogadores
conteúdos”. Dessa maneira, os newsgames dispõem de inúmeras funções. Entre elas, segundo os autores: recriar um
evento histórico; colocar o conteúdo das
notícias em um quebra-cabeça, ensinar
jornalismo ou construir uma comunidade, tudo de forma interativa com a
informação que pode persuadir, informar e excitar. Doria (2011) refere-se a
newsgames como jogos feitos com base
em notícias ou acontecimentos em curso. Segundo Araújo (2010), os newgames
possuem um formato “geralmente curto,
com mecânica simples”. Essa interface –
utilizada principalmente pelo jornalismo
– permite ao leitor se aprofundar no contexto em que os fatos ocorrem.
O campo imersivo dos jogos e o
caráter lúdico podem ser as principais
características da cultura dos games. Esses traços encantaram o Jornalismo para
atrair o novo público que, por sua vez,
adicionou as narrativas multimídias interativas para que quem estivesse no
meio newsgame pudesse simular a vivência da notícia ou ser personagem participante do conteúdo retratado.
Huizinga (2010) diz que a força
da experiência de imersão no jogo pode
ser tão intensa que absorve inteiramente
o indivíduo, fazendo-o entrar em uma
realidade mágica, pois “todo jogo se pro-
1 Homepage da Página eletrônica da Revista Super Interessante em análise: http://super.
abril.com.br/newsgames
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
117
cessa e existe no interior de um campo previamente delimitado, de maneira
material ou imaginária, deliberada ou
espontânea” (HUIZINGA, 2010, p. 13).
Murray (2003) complementa definindo imersão como parte do meio digital
que intensifica o desejo humano de viver
uma fantasia em um mundo ficcional.
Braga (2008) comenta que a história tem
poder de envolver quando os dispositivos tecnológicos são bem executados.
Conforme Gee (2009, p. 174),
os games estimulam o exercício do processo criativo do jogador, possibilitando
o aprendizado e o desenvolvimento de
múltiplas habilidades de forma simultânea.
Para Bogost, Ferrari e Schweizer
(2010), a experiência dos newsgames é
mais profunda que uma simples descrição de um evento: ela pode transmitir a complexidade da informação que,
até então, não pode ser conseguida nos
meios jornalísticos tradicionais. Ainda,
corroborando com a abordagem lúdica,
Murray (2003, p. 141) segue o raciocínio,
considerando que os jogos “podem ser
vistos como interpretações de experiências”. Esse cenário mostra que os newsgames oferecem mais detalhes da notícia,
além do caráter informativo, e se tornam
eficazes através de modelos interativos
jogáveis.
A potencialidade expressiva do
newsgame é unir um jogo a uma
narrativa, dando a sensação de
criação ao jogador, no intuito de
atrair os usuários de games para
o universo do jornalismo online.
Com isso, o laço entre o jogo e comunicação social acaba por se estreitar. A notícia é encarada como
o fio condutor da trama do jogo
exigindo uma postura mais ativa
do jogador-leitor (MARCIANO,
2012, p. 14, grifo do autor).
Gonzalo Frasca (2013) acredita
que os videogames possam ser uma ferramenta para entender melhor o mundo,
118
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
mesmo que geralmente foquem mais na
fantasia do que na realidade. Lévy (2000)
e Bogost et al. (2010) concordam em
usar a capacidade interativa dos jogos e
a simulação para facilitar a compreensão dos usuários de assuntos complexos,
como casos de polícia, guerras, ecossistemas, corrida eleitoral e crises econômicas. Como os newsgames apresentam
um propósito que ultrapassa o puro entretenimento, pode-se afirmar que estão
dentro da proposta de “jogos sérios”,
conforme Sicart (2008).
Segundo Bogost (2010), o newsgame deve agregar informação, levar o
jogador para dentro da narrativa de forma que ele sinta-se no ambiente e possa ver o fato de um ângulo que o texto,
a imagem, o vídeo ou o infográfico não
permitem. Pode-se citar também que
uma função social do newsgame é levar
as pessoas a mudar de comportamento
em questões sociais, de saúde, de meio
ambiente, de participaç/ão política, entre outros. Atualmente a falta de interesse do público jovem preocupa, pois eles
constituem uma parcela importante da
sociedade que precisa adquirir conhecimento e informação para se tornarem cidadãos mais responsáveis, politizados e
engajados. Bogost (2010) diz que a mídia
pode ser usada como ferramenta social,
política, educativa, informativa ou, apenas, para divertir e entreter.
É importante ressaltar que não
faz sentido criar um newsgame de qualquer fato. Para que ele atenda a necessidade jornalística, é preciso ter origem em
um fato noticioso, pois o conteúdo é extremamente relevante para o Jornalismo.
Bogost (2010) explica que além da relevância da reportagem, a velocidade do
Jornalismo online influencia na criação
dos jogos newsgames, por isso, o tempo
de produção precisa ser menor. Enquanto os jogos eletrônicos podem demorar
anos para serem lançados, os newsgames
podem demorar de dias a meses. A duração da jogada de um newsgame também
pode levar entre dez e 20 minutos; enquanto os eletrônicos podem demora
dias para que o jogador consiga finalizá-lo.
No livro “Newsgames: Journalism at Play”, Bogost, Ferrari e Schweizer
(2010) dividem os newsgames nas seguintes categorias: atualidade – dividida
entre os de editoriais, tabloide e reportagem e baseado em eventos recentes.
Geralmente são marcados por uma forte
opinião e/ou critica por parte do autor.
Esse tipo de newsgame possui forte identificação com os editoriais jornalísticos e
cartoons políticos e de críticas sociais; infográficos – utilizam elementos de infografia. Surgem de uma evolução dos infográficos jornalísticos, adaptados para
os meios digitais. Os infográficos digitais
permitem novas formas de interação e se
comportam mais como games, nos quais
os jogadores podem simular diferentes
cenários e situações, com base em informações de acontecimentos reais.
Outra categoria são os newsgames
documentários, que simulam uma situação e apresentam histórias mais amplas.
São jogos que abordam fatos históricos
e atuais de forma semelhante aos documentários e reportagens investigativas.
Normalmente são jogos maiores, que
oferecem experiências dos acontecimentos que são notícia, impossíveis de serem
assimiladas no noticiário convencional
ou que recriam espaços, acontecimentos
e sistemas do passado que só poderiam
se compreendidos, de outra forma, por
meio de filmes de arquivo ou da imaginação). Os quebra-cabeça ou passatempos são baseados no formato de jogos de
quebra-cabeça. São jogos que surgem da
adaptação de palavras cruzadas e questionários sobre notícias para o mundo
digital, dando origem a novos quebra-cabeças e jogos casuais. Os de letramento
ou educativos são jogos que contribuem
para o aprendizado do jornalismo. Jogos
que oferecem informações diretas ou indiretas sobre como ser um bom jornalista ou sobre a importância do jornalismo
para os cidadãos e a sociedade.
Por fim, os de comunidade fazem efeito na vida real e social do joga-
dor. São jogos que estimulam e criam comunidades e grupos locais, muitas vezes,
situando o jogo parte no mundo virtual
e parte no mundo real.
Desde 2003, alguns dos maiores
jornais online do mundo começaram a
utilizar os chamados newsgames2 – jogos
baseados em notícias que apresentam
conteúdo complementar. Eles são disponibilizados online e sem custos para o
acesso. No Brasil, a revista eletrônica Superinteressante, teve as primeiras experiências com a produção de newsgames
em 2007, que foram realizadas através do
Núcleo Jovem da Editora Abril. Ao todo,
a revista produziu 13 jogos jornalísticos.
Os newsgames da Super Interessante foram selecionados por fazerem
parte de uma mídia popular no Brasil.
Os dois newsgames escolhidos para análise podem ser acessados através da homepage da Super Interessante, clicando
no botão NEWSGAME 3, que aparece no
topo da página. Ao entrar nessa sessão,
estão em destaque os principais newsgames e abaixo os demais, incluindo os
advergames. Interessante perceber que
a própria Super intitula os newsgames
secundários como “Conheça nossos
demais jogos”, caracterizando o objeto
mais voltado para a área de game. Todos
os newsgames estão disponíveis para jogar no próprio browser. Filosofighters e
CSI – Ciência Contra o Crime se utilizam
principalmente do mouse para jogar.
Para que as interações aconteçam neste
ambiente, estão acessíveis botões de redes sociais (Twitter, Facebook e Google +)
localizados acima dos jogos, o que possibilita que os jogadores curtam, comentem e compartilhem as informações e
experiências sobre os newsgames. Abaixo
da tela do newsgame há um campo para
que o usuário faça seus comentários com
a opção de também publicá-lo no Facebook. Nos objetos em estudo, percebe-se
que é evidente o propósito básico de informar, o que desperta a valorização de
ações que se traduzem em educação, engajamento e cidadania.
Partiu-se do pressuposto de que
2 De acordo com Seabra
(2008), Jornais como El País,
New York Times, USA Today
e portais de notícias da CNN e
MSNBC são alguns exemplos
que se utilizaram dos Newsgames para informar o público.
3 Link de acesso para os newsgames na homepage da Super
Abril http://super.abril.com.br/
newsgames
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
119
os indivíduos envolvidos nas interações
observadas são usuários que possuem
certa experiência com a internet, mas
precisa-se confirmar se são habituados aos jogos online. Percebe-se que os
newsgames da Super possuem linguagem
coloquial, bem-humorada e que expande
o conceito de leitura para algo além do
texto. Conheça os dois jogos em análise:
Filosofighters
FIGURA 1 : FILOSOFIGHTERS
- SIMONE/SARTRE Vs MAQUIAVEL
Fonte: Superinteressante Newsgames
Trata-se de um jogo no qual são convocados nove filósofos para uma batalha física: Platão, Santo Agostinho, Maquiavel,
Descartes, Rousseau, Marx, Nietzsche e
Simone/Sartre. Neste jogo, as armas são
as ideias de cada filósofo, o que possibilita ao jogador conhecer melhor a vida,
a obra e as teorias de cada um. Os golpes são os principais pensamentos que
marcaram a história da filosofia e que até
hoje influenciam a sociedade. Nesta tela
inicial há as instruções de como jogar e
escolher se deseja um torneio ou uma
luta, bem como o nível de dificuldade
através das categorias: Aprendiz, Mestre
ou PHD. Na dinâmica do jogo 5, as regras
são claras. O jogador escolhe um dos
nove filósofos e comandará este filósofo
por meio de golpes – os quais têm a ver
com a sua obra – combatendo o outro. Há
uma barra de energia, de vida, na qual os
golpes tiram vidas um do outro. O primeiro que perder toda a energia perde
a luta. São dois rounds, com melhor de
três. Os comandos são realizados pelo
teclado, sendo, normalmente as letras C
e V assim como os comandos de setas. O
jogo tem uma narrativa envolvente com
recursos de áudio, animações gráficas
e um texto simples, coloquial e de fácil
entendimento. Em relação a outros jogos
é relativamente fácil de navegar. Este é o
newsgame mais comentado na página da
Super, com 1059 comentários 6.
CSI – Ciência Contra o Crime:
FIGURA 2: CSI: CIÊNCIA CONTRA O CRIME - PRIMEIRAS INSTRUÇÕES DO
JOGO
120
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
Fonte: Superinteressante Newsgames7
Neste newsgame, o usuário/jogador pode se transformar em um agente
CSI e ajudar a Super a desvendar um
crime fictício da morte de um juiz de 52
anos, encontrado morto no escritório de
sua casa pela namorada de 22. O jogo
basicamente é comandado pelo mouse
e poucas vezes utiliza-se o teclado para
digitar números e senhas. São cinco fases
e cada uma é caracterizada por uma imagem de fundo que sugere cliques dentro
da cena para encontrar as pistas e seguir
para a próxima etapa. O jogador precisa
clicar nos objetos da imagem para descobrir pistas. A cada etapa, uma janela
se abre para orientar acerca das regras.
O jogador pode pular as fases se quiser,
mas logo aparece um aviso que ainda não
terminou a etapa e pede se deseja prosseguir com uma nova fase. Na quarta fase,
nota-se que as regras não são muito explícitas, como, por exemplo, não é sugerido que é preciso arrastar com o mouse
para juntar o bilhete rasgado ou é preciso
encontrar um código que abre uma maleta, na qual está a apólice de seguros da
vítima.
Na quinta e última fase, é necessário digitar uma senha para acessar.
Caso o jogador não tenha prestado atenção a todas as dicas, não conseguirá finalizar o game. Apesar de toda a narrativa
expor o fato, a contextualização das evi-
dências para que o jogador desvende o
caso e as técnicas de jogabilidade não são
fáceis de perceber, o que dificulta o jogo.
Este newsgame possui 444 comentários
8.
ESTRATÉGIAS METODOLÓGICAS
Os newsgames Filosofighters e CSI
– Ciência Contra o Crime foram escolhidos como objetos de estudo por estarem
em destaque na página de Newsgame
da Revista eletrônica Superinteressante,
bem como por serem os dois jogos mais
comentados da lista dos principais. Foi
selecionada uma amostra de 102 comentários mais recentes de cada jogo no período de 1º a 30 de novembro de 2015,
lembrando que os comentários são publicados na página do newsgame através
do perfil do usuário no Facebook.
As estratégias metodológicas
para entender a problemática iniciou
com um exercício de pesquisa, em que
o primeiro passo foi quantificar para depois qualificar. Nesta análise, pretende-se
mapear os aspectos de como se comportam os usuários que jogam os newsgames
tendo como foco principal entender a interação que existe neste meio. Para isso,
foi desenvolvido um trabalho a partir da
observação dos comentários na página
relacionando-os à problematica propos-
4 Disponível em <http://super.
abril.com.br/multimidia/filosofighters-631063.shtml>. Acesso
em 23 nov. 2015.
5 Filosofighters lembra muito
jogos como Street Fighters e
Mortal Kombat
6 Último acesso realizado em
22 nov 2015: http://super.abril.
com.br/multimidia/filosofighters-631063.shtml
7 Disponível em <http://super.abril.com.br/multimidia/
info_405177.shtml>. Acesso em
23 nov. 2015.
8 Último acesso em 26 nov
2015: http://super.abril.com.
br/multimidia/info_405177.
shtml
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
121
ta, sendo possível detectar o espaço
como local legítimo das interações entre
os comentários.
Primeiramente foi elaborada
uma tabela como ferramenta para tabular os 204 comentários. Na sequência,
surgiram as categorias para enquadrar
cada comentário. As categorias não
foram imperativas; elas surgiram a partir
de vários ciclos de análises dos próprios
comentários. Nesse período, muitas categorias se dividiram e algumas se aglutinaram, estabelecendo-se finalmente
em: aquisição de conhecimento; performance no jogo; dificuldade em jogar ou
com o conteúdo; crítica positiva ao jogo;
crítica negativa ao jogo; análise do conteúdo; menção a amigos; pedido de ajuda; ajuda a outros jogadores; comentários estrangeiros; e comentários genéricos.
As mesmas categorias foram utilizadas
em ambos os jogos. A tabulação dos dados serviu de parâmetro para auxiliar
a traçar o perfil de quem orbita nesses
meios. Outros dados na tabela também
colaboram para a análise: nome do jogador, o sexo, a ocupação, o link do perfil no Facebook, subcomentários e likes
(curtidas).
A estratégia de análise dos comentários foi inspirada na metodologia
do professor orientador Rodrigo Oliveira9 (2014) que é de tabular os dados, categorizar por meio de observação do ambiente e sobre o que o objeto diz, tendo
como base a sua tabela utilizada na dissertação de mestrado. Esse formato diferenciado caracteriza-se pela observação
na internet, sem ser obrigatória entrevista pessoal com cada perfil analisado.
Decidiu-se por esta forma de
observação e análise por caracterizar-se
como uma forma imparcial, que não
afeta a interação e nem o comentário do
jogador na página, mantendo a neutralidade como observadora.
FIGURA 3: TABULAÇÃO UTILIZADA PARA ANALISAR OS DOIS JOGOS
FILOSOFIGHTERS
Link para o perfil
Publicador
Dia
N
Comentário
Nome
4
1
passei na prova de filosofia por causa do jogo!!! muito bom.
Gabriell Matteo
1
4
2
venci todas com Marx e venci o último sem perder vida
Tiago Soares
1
8
3
no perdi um round com Nietzsche
Anderson Porfrio da Silva
1
8
4
Venci com Rosseau
Anderson Porfrio da Silva
1
8
5
8
6
8
7
8
8
8
9
8
10
8
11
8
12
H
M
Vaiiii Santo Agostinho, mete o cajado neles kkkk
kkkkkkkkkkkkkkkkkkk MMA FILOSFICO
Interessante, alguns golpes so ideias ultrapassadas (como
a teoria das ideias de platao, com quem zerei), tornando o
golpe intil tambm no jogo (no consegui acertar um), ao
contrrio da caverna que foi uma sacada muito boa, o Marx
acaba com voc usando a multido dele se voc tentar se
defender, afinal nunca se deve bater de frente com a
multidao, quanto melhor a idea do filsofo, mais eficiente o
golpe tambm.
Acaba sendo divertido e engraado ver personalidades to
interessantes em uma luta
11
15
11
16
11
17
Cara ficou Muito legal. hueuauehahueuha o Nietzsche
Ficou Muito louco Jogando um deus morto uhehuehuehu
11
18
Jos Samuel De Miranda Melo Neto OLHA ESSE JOGO!!!!
HAHAHAHAHA
11
19
12
24
12
25
Grupo Uninter
https://www.facebook.com/joa
o.domingos.108
Zerei com Nietzsche hahahaha
1
https://www.facebook.com/gla
uber.franco.54
1
1
???
1
professora
secretaria da
educação de SP
https://www.facebook.com/cla
udiacpaula
1
escola CTPMMG
https://www.facebook.com/m
attheus.pereira.97
1
Olha isso Débora Corrêa Marinho!! Minha melhor batalha
foi Simone de Beauvoir x Santo Agostinho...bati com
vontade, kkkkkk!
Unisinos
https://www.facebook.com/gr
emiovini
1
Vendedor at
Dicico Home
Center da
Construo
https://www.facebook.com/a
marofabricio
Mateus Kublinski
1
IFPR
Bruno Bigode
1
E.E.E.P.Gov.Virgi
lio Tvora
https://www.facebook.com/br
uno.smits.77
1
Saviola Corra
1
Monitor at Pikok
Diverses
https://www.facebook.com/sa
viola.correa
1
???
1
Mark o Magneto kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
1
Simone Boeira
Henrique Gracietti
Anxo Santana (Anderson
CLayton Santana)
trabalhou
Construtora
Engemold PréFabricadas
Trabalha na
empresa Klabin.
Estufou
neurocincia na
Instituio de
ensino Duke
University Lages.SC
Senac - Técnico
em Rádio e TV
1
Arthur Silva
Marcos Pacanaro
Estgio
profissional at TV
Cultura
1
1
1
Angela Sousa Souza
Kkkkk
1
Michael Braga
1
1
1
1
1
1
https://www.facebook.com/an
dersonclaytonsantana
https://www.facebook.com/m.
pacanaro
1
1
https://www.facebook.com/he
nrique.gracietti
https://www.facebook.com/Art
Thrash666
1
1
1
https://www.facebook.com/IF
PR-Campus-Curitiba520031844724182/?rf=14277
2319121687
https://www.facebook.com/si
mone.boeira.77
1
1
1
Gabriela Schalcher Cestari
SENSACIONAL!
nuu s escolher quem sabe vencer kkk maquiavel
indestrutivel
São Luis
11
Comentários
genéricos
1
1
1
MARX! MARX! MARX! MARX! MARX! MARX! MARX!
MARX!
1
Vincius Mller
1
10
Comentários
estrangeiros
1
Fabrcio Amaro da Silva
irado meu
9
1
Glauber Franco
1
8
Pedido de Ajudar outros
ajuda
jogadores
1
TheWalter Castro
Mattheus Pereira
7
Menção a
amigos
1
1
1
6
Análise do
conteúdo
1
Alessandro A. F. Cabral
Cludia Cristina Oliveira
5
Aquisição de
conhecimento
1
https://www.facebook.com/joa
o.domingos.108
https://www.facebook.com/ale
ssandro.a.f.cabral
4
1
1
ETEP
Faculdades
3
1
Joo Domingos
Gabryel Pioner
Nietzsche!!!
23
e https://www.facebook.com/du
da.andrade.180
2
0
1
20
12
TOT
Joo Domingos
Zerei todos com Marx rsrs
21
IScafaculdades
Limeira
Zerei todos com Plato!Gostei da caverna kkkkk
13
22
Subcomentários
Criativo. Parabns !
14
12
https://www.facebook.com/ga
briell.matteo.7
DEMAIS! RSRSRS
8
12
Colegio Maria
Aparecida
Nisgoski - Castro,
PR
Karl Marx para cima deles, viva a Revoluo
11
11
URLs
Categorias dos comentários
1
Dificuldade em
Crítica positiva Crítica negativa Performance no
jogar e ou com
ao jogo
ao jogo
jogo
o conteúdo
https://www.facebook.com/pr
ofile.php?id=1000103494605
93
https://www.facebook.com/pe
ople/AndersonPorf%C3%ADrio-daSilva/100008190667098
https://www.facebook.com/pe
ople/AndersonPorf%C3%ADrio-daSilva/100008190667098
1
Duda Andrade
Ocupação
Likes
1
1
1
1
1
https://www.facebook.com/an
gela.sousasouza
1
1
1
Fonte: os autores10
122
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
ANÁLISE DOS DADOS
Sobre o viés classificatório de
Bogost et al. (2010), evidenciou-se que
o tempo de jogabilidade dos newsgames
foi rápido e manteve-se na média. Os
jogos em análise foram categorizados
da seguinte forma: Filosofighters como
newgame educativo e comunitário.
Partindo da análise dos comentários
dos jogadores e do pressuposto que a
palavra “educativo” significa processos
de aprendizagem de aspectos teóricos
e práticos dos mais variados assuntos,
resolveu-se ampliar o entendimento
da caracterização de Bogost (2010)
nesta categoria e enquadrar o jogo. Os
newsgames educativos não tornarão o
jogador um especialista no assunto do
jogo em questão, mas podem ensinar
a mentalidade do pensador através de
regras e golpes, como verificado no
Comentário 1: “passei na prova de filosofia por causa do jogo!!! muito bom”,
no qual um jogador – jovem estudante
– diz que passou na prova de filosofia graças ao jogo. No Comentário 8,
o jogador também demonstra que
aprendeu sobre o filósofo, relacionando o pensamento com seu golpe de
luta e ainda faz uma análise do game:
“Interessante, alguns golpes são ideias
ultrapassadas (como a teoria das ideias de platao, com quem zerei), ..., ao
contrário da caverna que foi uma sacada muito boa, o Marx acaba com você
usando a multidão dele se você tentar
se defender, afinal nunca se deve bater
de frente com a multidão, quanto melhor a ideia do filósofo, mais eficiente é o
golpe também”. No Comentário 49, a
jogadora é professora e diz que o jogo
revisita de forma resumida os principais pensamentos de cada filósofo e
ainda cita que usará o jogo em sala de
aula, mencionando seus alunos para
jogar o game: “Interessante porque revisita de forma resumida, os principais
pensamentos de cada filósofo… Continuem adorei”. O mesmo acontece com
o Comentário 66: “adorei vou adotar
este método na minha escola prof....bela
criatividade”, no qual um professor do
Ensino Médio de uma escola estadual
afirma que adotará o método na escola.
O Comentário 81 “Excelente
instrumento de aprendizagem”, por sua
vez, é de um funcionário da Secretaria
da Educação de São Paulo. Dois comentários foram originados de fora do
Brasil, o Comentário 92 “jajaja muy
bueno, lo usaré en las clases de este año”
e o Comentário 95: “severo. Creo que
lo usaré para clase”. São de professores
que usarão o game com os alunos. O
Comentário 101 é de um perfil do Instituo Federal do Paraná, Campus Pitanga, que mostra que o jogo é sobre
conceitos de filosofia. “Salve gurizada
“amiga da sabedoria”, este jogo é muito
bom pra entender algumas das principais ideias e conceitos filosóficos...Eu
recomendo!”. Todos estes comentários
reforçam a classificação deste newsgame como educativo.
Filosofighters também é comunitário por mostrar que o jogo tem
efeito na vida real dos jogadores, pois
ajuda nas tomadas de decisões diárias,
como o rapaz do Comentário 8, supracitado, que ganhou boa nota na disciplina de filosofia em função do game
ou pelos professores que utilizarão o
jogo como instrumento de aprendizagem para as aulas de filosofia. Braga
(2008) ressalta que os jogos perpassam o campo do entretenimento e
ajudam na tomada de decisões do dia
a dia, permitindo que “os sujeitos experimentem, de maneira segura e com
a temporalidade peculiar, o cotidiano
que os cercam” (BRAGA, 2008, p. 5).
O game retém a atenção do jogador à
medida que o envolve na narrativa de
forma divertida, seja através da linguagem, das animações ou das interfaces
gráficas, ao mesmo tempo em que ensina ou informa algo.
O game CSI – Ciência Contra o
Crime foi categorizado como newsgame documentário e comunitário.
9 Nomenclatura e forma de
pesquisa realizada pelo Me.
Rodrigo Oliveira de Oliveira
em sua dissertação de Mestrado pela UNISINOS “Garotas
que jogam videogames” em
2014.
10 Link para acesso a tabela:
https://docs.google.com/spreadsheets/d/1ONZL7-v3CClrxCX0UUvkR6CxMz1JbuitBsTt84gX6_M/edit?usp=sharing
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
123
CSI é um jogo criado a partir de fatos fictícios, mas foi inerido na categoria documentário de Bogost (2010) pela análise
do seu conteúdo, que recebe um tratamento mais detalhado do que uma notícia. apresentando a vantagem de contar
com uma apuração mais detalhada das
informações. Através de cenários, gráficos e narrativas, as quais, em consonância com a mecânica do jogo, mostra as
evidências presentes em cada cena do
crime, as possíveis hipóteses e a solução
do caso. O game traz toda o levantamento
dos fatos e a narrativa do Jornalismo Investigativo. O CSI apresenta uma investigação de um assassinato nos moldes do
seriado americano CSI. É uma história
mais ampla e similar a documentários, filmes e reportagens investigativas,
motivo pelo qual foi enquadrado como
newsgame de documentário. Também
encaixa-se na categoria comunitário por
fazer parte da vida real das pessoas. Este
caso pode ser congênere a outros casos
de polícia, por isso se torna comunitário,
pois os jogadores querem ajudar a solucionar o caso, querem entender o motivo
da morte do juiz e fazem isso através da
descoberta das evidências e do raciocínio das informações.
No final do game, o jogador
preenche um relatório com a sua teoria
sobre o crime e depois recebe um feedback com uma comparação da teoria
dele com o verdadeiro desfecho do caso.
Após a análise desses dados, concorda-se
com Falcão (2011) que “os processos cognitivos são responsáveis pela formação
das práticas comunicativas e de sociabilidade humanas”. Eles se formam tanto
da linguagem simbólico representacional quanto de infinitos sinais e estímulos
sensório-perceptivos que possibilitam a
formulação de códigos quanto de outros
processos de percepção e afetuosidades
que vão além do campo da linguagem”
(FALCÃO, 2011, p. 7).
Nota-se que games transcendem
a sensação de fazer novas coisas, as quais,
na vida real, não seria permitido fazer,
como, por exemplo, um garoto ser um
124
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
“investigador criminal” ou um cidadão
comum estar dentro de um centro de
investigações da Polícia para opinar sobre o caso. A imersão dos jogadores é tão
intensa, como destaca Hiuzinga (2010),
que é evidenciada pelo Comentário 97,
no qual a jogadora “veste-se de detetive”,
utiliza toda a sua vivência e dá a sua conclusão do caso: “Parece uma cena montada... não há sangue no tapete, nas roupas
e no ambiente mas, vômito. Poderia ter
ingerido algum veneno?Ou ter sido induzido a isso? Em suma, tudo indica que
foi crime (por envenenamento). O tiro, só
mascara o real motivo da morte...”.
O atrativo dos jogos pode ser
motivado por diversas situações. Há alguns que gostam de fugir do mundo
real; outros querem fugir das normas da
sociedade e ainda outros até buscam superação de preconceitos maior sociabilidade.
Os jogos também tematizam conversas. Há uma circulação de mensagens fora do momento de estar
jogando, da mesma forma que
amigos debatem sobre filmes que
viram e livros que leram etc. Isso
também acontece com o jogos
eletrônicos. A cultura dos videogames não precisa ser vista somente
como a ação de jogar, mas também
como uma forma de vida, uma
experiência (OLIVEIRA, 2014, p.
20).
A seguir, serão analisados os comentários nas categorias que se organizam por 1) Crítica positiva ao jogo,2)
Crítica negativa ao jogo, 3) Performance no jogo, 4) Dificuldade em jogar ou com o conteúdo, 5) Aquisição de
conhecimento, 6) Análise de conteúdo,7) Menção a amigos, 8) Pedido de
ajuda, 9) Ajudar outros jogadores 10)
Comentários estrangeiros e 11) comentários geéricos. As categorias que
surgiram durante a pesquisa e a classificação dos comentários mostram muito
sobre os indivíduos que habitam o meio
dos newsgames. No Filosofighters, percebeu-se que a maioria dos jogadores eram
homens (76%) enquanto 24% eram do mulheres são as jogadoras que mais copúblico feminino. Por sua vez, no news- mentaram na página, com 59,80% contra
game CSI – Ciência Contra o Crime – 40,20% do público masculino.
que é um newsgame mais narrativo – as
FIGURA 4: GRÁFICO COMPARATIVO DOS COMENTÁRIOS NAS CATEGORIAS
Fonte: A Autora (2016).
1) Crítica positiva ao jogo: esta foi a categoria de destaque em ambos os games,
com 52,94% dos comentários no Filosofighter e 49,02% no CSI. Isso evidencia o
fato de que a maioria dos indivíduos gostaram da ideia e da mecânica dos jogos,
expondo sua visão positiva sobre eles e
não do conhecimento adquirido pelos
games.
2) A Crítica negativa ao jogo foi maior
no CSI com 3,92%; enquanto no Filosofighters ficou com 2,94%. A categoria
3) Performance no jogo teve grande
número de comentários, com 26,47% no
Filosofighters e 20,59% no CSI. Em ambos os jogos, os jogadores falam de suas
batalhas, vitórias e derrotas. Alguns se
vangloriam, mostrando superioridade
aos demais, e outros expressam suas dificuldades conforme tabela abaixo:
FIGURA 5: COMENTÁRIOS DOS DOIS NEWSGAMES SOBRE “PERFORMANCE NO JOGO”
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
125
4) A categoria Dificuldade em jogar
ou com o conteúdo teve diferença nos
games. Foram 1,96% dos comentários
no Filosofighters contra 34,31% no CSI.
Evidencia-se que pelo teor narrativo do
newsgame CSI, a mecânica do jogo não
contribuiu para que fosse fácil para o
jogador. A comprovação está nos comentários dos jogadores que tiveram
dificuldades para entender o seu andamento ou o conteúdo presente no game.
Muitos não sabiam como passar para a
fase seguinte, não conseguiam saber qual
a senha da mala ou da fase 4 ou, até mesmo, da última fase.
FIGURA 6: COMENTÁRIOS DA CATEGORIA “DIFICULDADE EM JOGAR” DO CSI
Fonte: A Autora (2016).
cionam conhecimento além de performance.
6) Análise de conteúdo: no CSI,
a porcentagem é de 3,92%; já no Filosofighters, esta categoria obteve 26,47% dos
comentários. Apesar deste jogo ter destaque pela mecânica, houve relação com
o conteúdo mesmo sendo um game de
luta. Os indivíduos falam de suas batalhas e vitórias na mesma proporção que
comentam e expressam suas ideologias,
além do conhecimento adquirido com o
game. Para os jogadores do Filosofighters,
mais que a batalha, há mensagens nas
entrelinhas do game. Os Comentários 6
e 37 mostram que os jogadores são adeptos das ideologias de Marx, entre elas, a
do proletariado, reforçando a ideia do
“Operários do mundo: uni-vos!”, pois,
no jogo, Marx convoca um exército de
operários com foices e martelos. Já no
Comentário 17, o jogador é a favor de
Nietzche porque fala do golpe “Deus está
morto”, remetendo à ideia do pensador
de que Deus não faz sentido e, por isso,
está morto e que sem religião, os homens
podem reconhecer o valor deste mundo
e se tornarem deuses. Já o Comentário
19, a jogadora expressa sua vertente feminista e existencialista. No Comentário
25, o jogador é a favor de Maquiavel e o
considera o filósofo indestrutível. O comentário de um jovem estudante de engenharia mostra que no jogo ele “bateu
no Descartes com gosto” e o Comentário 59 é adepto do Niilismo, conforme a
imagem abaixo:
Os jogadores tiveram mais 5)
Aquisição de conhecimento no FilosoFIGURA 7: COMENTÁRIOS CATEfighters com 6,86% do que no CSI, com
GORIA “ANÁLISE DE CONTEÚDO”
2,94%. Nota-se que por ser um newsgaDO FILOSOFIGHTERS
me educativo, o Filosofighters proporciona mais conhecimento sobre a temática “filósofos e seus pensamentos” para
os jogadores se comparado à temática e
o formato do CSI. No Comentário 1 do
Filosofighters, o jogador diz que passou
na prova de Filosofia por causa do jogo.
Aqui, percebe-se que os games propor126
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
Fonte: A Autora (2016).
Notou-se que a maioria dos comentários de ambos os jogos, classificados na categoria Análise de conteúdo,
são de pessoas com elevado grau de escolaridade, entre elas, professores, especialistas da área de comunicação, jornalistas, designers, game designer ou, até
mesmo, pessoas que consomem a cultura pop e entendem de jogo.
A categoria 7) Menção a amigos
no game CSI – Ciência Contra o Crime
possui 0,98% dos comentários, enquanto, no Filosofighters, está com 14,71%,
o que reforça o pensamento de Taylor
(2008) sobre a maioria das pessoas entrarem na cultura dos jogos através de
suas redes sociais. “Por exemplo, muitas
pessoas que jogam newsgames são apresentadas a eles por um membro da família (...), amigo ou colega de trabalho”.
(TAYLOR, 2008, p. 53). No game, os
jogadores atraíam os amigos do seu círculo social para duelar devido à possibilidade de comentários que a plataforma
oferece. Com essa comparação, pode-se
dizer que muitos dos newsgames são difundidos através da indicação a amigos
de jogadores que estão nesses ambientes.
Interessante ressaltar que essas menções
a amigos perpassam as fronteiras territoriais e de presença, divulgando a informação em uma velocidade rápida pela
facilidade da internet, conforme Recuero
(2006).
No Filosofighters, o 8) Pedido de
ajuda teve 0,98% dos comentários; no
CSI, por sua vez, foi 22,55%. Aqui, nota-se que a mecânica do jogo não foi compreendida pelo jogador, por isso tantos
indivíduos comentavam sobre como
continuar o jogo, como descobrir as pistas ou o que deveriam fazer em cada fase.
Percebe-se que por seu cunho narrativo,
a mecânica do game deveria estar em
harmonia com o conteúdo para facilitar
a compreensão e a jogabilidade, detalhe
que foi suprido pelos próprios indivíduos através dos comentários. A categoria
“Pedido de Ajuda” está relacionada à
categoria 9) Ajudar outros jogadores.
No Filosofighters foi de 0% e 5,88%, no
game CSI. A dificuldade no jogo pode
ter colaborado para a configuração de
agrupamentos e inclusão dos indivíduos
no meio dos newsgames em questão. Verifica-se que há interação entre os usuários que orbitam neste espaço pois, em
momentos diferentes, o mesmo usuário
comentava sobre a dinâmica do jogo
para ajudar quem jogava – seja com instruções de como passar a fase ou com as
senhas para a próxima etapa. Isso mostra que os jogos geram várias interações
e confirma o ambiente como legítimo de
interações sociais, reforçando a ideia de
Huizinga (2010) de identificação dos indivíduos enquanto comunidade, mesmo
fora do “estar jogando”. “As comunidades
de jogadores geralmente tendem a tornarem-se permanentes, mesmo depois
de acabado o jogo” (HUIZINGA, 2010,
p. 15).
A categoria 10) Comentários estrangeiros teve 0,98% no CSI e 19,61%
no jogo Filosofighters. Pode-se relacionar essa porcentagem à categoria Menção a amigos, citada anteriormente para
este game. Possivelmente, seja por isso
que há muitos comentários estrangeiros.
Além de falar da performance do jogo,
os jogadores mencionam outros amigos,
de todo o lugar do mundo, para o combate. Nestes comentários estrangeiros, os
indivíduos citam que utilizarão o jogo
em sala de aula e ainda mostram que adquiriram conhecimento.
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
127
Na categoria 11) Comentários
genéricos, a porcentagem ficou de 2,94%
no Filosofighters e 4,9% no CSI. Esses comentários não se relacionavam ao jogo,
mas os indivíduos aproveitavam para
dizer que era a primeira vez que estavam
ali ou, até mesmo, para deixar declaração
de amor para outros indivíduos que
supostamente poderiam jogar os newsgames.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As conclusões da pesquisas possibilitaram entender quem são os indivíduos que habitam os ambientes do
newsgame: pessoas de diversas idades,
escolaridade, com experiências e ideologias distintas, mas que se unem pelo
game e se reconhecem como indivíduo
neste ambiente. Sendo amigos legítimos
fora do meio virtual ou se relacionando
pela primeira neste espaço, nota-se que
os indivíduos se familiarizam entre si, o
que reforça a identidade social de cada
um, mesmo na internet. Percebe-se que a
conversação é um fenômeno emergente
nas páginas dos dois objetos em estudo.
O indivíduo busca o autorreconhecimento e a representatividade dentro do
contexto dos newsgames. As pessoas que
frequentam esse meio possuem conexões e interagem entre si através dos comentários, falando sobre a performance
ou a dificuldade no jogo, mostrando sua
intelectualidade sobre o assunto do game
ou, até mesmo, apenas afirmando sua
presença enquanto indivíduo social.
Pessoas que nunca se conheceram pessoalmente trocam ideias, com-
partilham experiências e ajudam-se entre
si, evidenciando o senso de comunidade.
Outras demonstram seu poder heroico e
desbravador em vencer o game. A página dos newsgames da Superinteressante
pode conferir possibilidades de reconhecimento, representação e inclusão,
Essa foi uma experiência de muita pesquisa, que colaborou com mais
conhecimento sobre o jornalismo e
games. A realização deste artigo superou
as expectativas e apontou possibilidades
de ampliar o estudo para um projeto de
mestrado ou doutorado sobre a temática.
Conhecendo um pouco de quem são os
consumidores de newsgames – deste formato de notícia que envolve a ludo-informação – sugerem-se proposições para
novos estudos científicos mais aprofundados sobre quem consome newsgame.
Acredita-se que o newsgame vem
suprir uma necessidade própria da comunicação de inovar seus processos.
Mostra uma conjunção de formatos aparentemente opostos – os jogos, antes vistos como ferramentas para o puro entretenimento – e a informação jornalística
que preserva, ainda hoje, a função de informar sobre causas sérias, que tenham
repercussão na vida dos indivíduos.
Propõe-se pesquisas sobre o novo
jornalista, que precisa emergir neste contexto que une as várias áreas de comunicação: design, publicidade e jornalismo.
Outros assuntos que também podem ser
alvo de estudo são as dificuldades em se
produzir newsgame no Brasil, já que foi
evidenciada a importância de se conhecer quem está do outro lado, recebendo os newsgames.
REFERÊNCIAS
ANDRADE de, Luis Adolfo (2008) Games em Pauta: A relação entre jogos eletrônicos, weblogs e jornalismo online Trabalho apresentado ao III Congresso de Estudantes de Pós-graduação em Comunicação. Rio de Janeiro, 2008. Disponível em
h t t p : / / w w w. a c a d e m i a . e d u / 7 3 1 0 8 3 2 / G a m e s _ e m _ P a u t a _ A _
rela%C3%A7%C3%A3o_entre_jogos_eletr%C3%B4nicos_blogs_e_jornalismo_online. Acesso em 01 nov. 2015.
128
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
ARAÚJO, Daniela. Jogar para informar: uma análise dos Newsgames como linguagem na divulgação científica. Viçosa, 2010. Monografia (Graduação – Comunicação
Social – Jornalismo). Universidade Federal de Viçosa. Disponível em http://www.
com.ufv.br/pdfs/tccs/2010/DanielaAraujo.pdf. Acesso em 30 out. 2015.
BOGOST, I., FERRARI, S., SCHWIZER, B. Newsgames: Journalism at play. MIT
press, Cambridge, 2010.
BRAGA, Marcos ; Brincando de Deus: Os jogos virtuais e uma percepção de mundo
a partir da jogabilidade. In: I ECOMIG - Encontro dos Programas de Pós-graduação
em Comunicação de Minas Gerais, 2008, Belo Horizonte. Comunicação e Tecnologias, 2008.
DÓRIA, Thiago. O que são Newsgames?. Disponível em: http://www.tiagodoria.
com.br/coluna/2008/03/10/o-que-sao-newsgames/ Acesso em: 23 nov.
2015.
FALCÃO, Carlysangela. O infotenimento e as novas competências cognitivas: a
adequação
do jornalismo às habilidades dos usuários do ciberespaço. 2011. Disponível em:
<http://sbpjor.kamotini.kinghost.net/sbpjor/admjor/arquivos/9encontro/CL_35.
pdf>, acessado
em: 25 de outubro de 2015.
FRASCA, G. Newsgames: El crecimiento de los videojuegos periodísticos. In: SCOLARI, Carlos A. (ed.) Homo Videoludens 2.0: de Pacman a la gamification. BArcelona Colleccio Transmedia XXI, Universitat de Barcelona, 2013.
GEE, James Paul. Bons videogames e boa aprendizagem. In: UFSC. Perspectiva.
Florianópolis. v27, n 1. jan/jun 2009. p. 167-178.
HUINZINGA, Johan. Homo Ludens. ed. São Paulo: Perspectiva, 2010.
JENKINS, Henry. Cultura da convergência, Tradução Susana Alexandria, Aleph
Editora, São Paulo, 2009
LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2ª ed. São Paulo: Editora 34, 2000.
MARCIANO, N. Carlos. NEWSGAMES: JORNALISMO ALÉM DO GAME OVER:
Reflexão sobre a utilização de jogos como plataforma de notícias no jornalismo online. 2012. Monografia (graduação Comunicação social – Jornalismo) Associação
Educacional Luterana Bom Jesus/Ielusc. Disponível em http://www.jornalismodigital.org/wp-content/uploads/2012/08/monografia_newsgames.pdf. Acesso em 01
nov. 2015.
MURRAY, Janet. H. Hamlet no holodeck: o futuro da narrativa no ciberespaço. São
Paulo: Itaú Cultural; Unesp, 2003.
OLIVEIRA, Rodrigo Oliveira de. Garotas que jogam videogame: Expressões de
Identidade e Interações sobre Cultura Gamer no Facebook. Dissertação de Mestrado
( Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS). São Leopoldo, 2014.
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115
129
RECUERO, Raquel. Dinâmicas de Redes Sociais no Orkut e Capital Social. Disponível em http://www.raquelrecuero.com/alaic2006.pdf. Acesso em 10 nov 2015.
SANTOS, Luciene. Newsgames: jogos são aliados na hora de estudar. Jul.2012. Disponível em http://webinsider.com.br/2012/07/12/newsgames-jogos-sao-aliados-nahora-de-estudar/. Acesso em 30 out. 2015.
SEABRA, Geraldo A. Newsgames - Games como emuladores de notícia. Uma
proposta de modelo de Jornalismo Online . Juiz de Fora: Unipac, 2007 Disponível
em
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/8/80/Artigo_Games_
Not%C3%ADcia.PDF. Acesso em 29 out 2015
SICART, Miguel. Newsgames: Theory and Design,in Entertainment Computing –
ICEC 2008, Lecture Notes in Computer Science, November 2009.
TAYLOR, T. L. Becoming a Player: Networks, Structure, and Imagined Futures. In:
KAFAI, Yasmin B; DENNER, Jill; HEETER, Carrie; SUN; Jennifer Y. Beyond Barbie
and Mortal Kombat: New Perspectives on Gender and Gaming. Massachusetts:
The MIT Press, 2008.
130
DOI: 10.5007/1984-6924.2016v13n1p115