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OS ARRANJOS INSTITUCIONAIS DOS
INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA
NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOBRE SEIS
GRANDES PROJETOS DO PROGRAMA
DE ACELERAÇÃO DE CRESCIMENTO
Gabriela Lotta
Arilson Favareto
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TEXTO PARA DISCUSSÃO
Brasília, Novembro de 2016
OS ARRANJOS INSTITUCIONAIS DOS INVESTIMENTOS EM INFRAESTRUTURA
NO BRASIL: UMA ANÁLISE SOBRE SEIS GRANDES PROJETOS DO PROGRAMA
DE ACELERAÇÃO DE CRESCIMENTO
Gabriela Lotta¹
Arilson Favareto2
1. Professora do Bacharelado de Políticas Públicas e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da Universidade
Federal do ABC (UFABC). Email: <gabriela.lotta@ufabc.edu.br>.
2. Professor do Bacharelado em Planejamento Territorial e do Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão do
Território da UFABC e Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap). Email: <arilson.favareto@
ufabc.edu.br>.
Governo Federal
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão
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Texto para
Discussão
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Texto para discussão / Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada.- Brasília : Rio de Janeiro : Ipea , 1990ISSN 1415-4765
1.Brasil. 2.Aspectos Econômicos. 3.Aspectos Sociais.
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CDD 330.908
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JEL: H7
SUMÁRIO
SINOPSE
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO : OS ARRANJOS INSTITUCIONAIS COMO UM DOS
CONDICIONANTES À EXECUÇÃO DOS INVESTIMENTOS EM
INFRAESTRUTURA NO BRASIL .................................................................................7
2 CONDICIONANTES DA EXECUÇÃO DE GRANDES PROJETOS
DE INFRAESTRUTURA ...........................................................................................12
3 ARRANJOS INSTITUCIONAIS PARA COORDENAÇÃO: O QUE DIZ A LITERATURA .....15
4 DESENHO DE PESQUISA ........................................................................................19
5 RESULTADOS.........................................................................................................27
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................44
REFERÊNCIAS ..........................................................................................................47
APÊNDICE ...............................................................................................................51
SINOPSE
Este trabalho analisa o arranjo institucional de gestão de grandes projetos de infraestrutura vinculados ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal
brasileiro. O objetivo consiste em identificar elementos do desenho do programa que
afetam positiva ou negativamente seu desempenho. São analisados arranjos de execução
de seis diferentes obras em curso no país, com especial atenção para a existência – ou
não – de formas de coordenação entre diferentes atores, bem como seu impacto em processos decisórios e, consequentemente, nos resultados da gestão desses grandes projetos
de infraestrutura. As formas de coordenação nos arranjos institucionais são analisadas
em três diferentes dimensões: intersetorialidade (coordenação intragovernamental),
relações federativas (coordenação intergovernamental) e relações com o território (coordenação com forças e interesses sociais locais para além do Estado). O estudo confirma
a importância dos condicionantes institucionais para o desempenho dos investimentos
em infraestrutura, descreve as formas de coordenação existentes no arranjo de gestão e
identifica temas críticos em cada uma das dimensões observadas. Contudo, as análises
comprovam também que boa parte dos problemas existentes antecede a gestão dos investimentos propriamente, o que remete à necessidade de vincular o tema dos arranjos
institucionais de execução de projetos de infraestrutura ao tema das capacidades e das
formas de planejamento do Estado brasileiro.
Palavras-chave: arranjos institucionais; coordenação; intersetorialidade; arranjos federativos; territórios.
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Discussão
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
1 INTRODUÇÃO: OS ARRANJOS INSTITUCIONAIS COMO UM
DOS CONDICIONANTES À EXECUÇÃO DOS INVESTIMENTOS
EM INFRAESTRUTURA NO BRASIL
Ao longo dos anos 2000, o Estado brasileiro passou por uma série de transformações, tanto
no conteúdo de suas políticas como em seu desenho, sua gestão e seu monitoramento.
Em relação ao conteúdo, a década passada foi marcada por priorização de políticas sociais
(combate à pobreza, expansão do acesso a direitos e valorização do salário mínimo) e
de políticas voltadas à retomada do crescimento econômico (especialmente projetos de
infraestrutura, além de maior oferta de crédito, estímulos às exportações e ampliação do
mercado consumidor interno). Muitos autores qualificam esse processo como um novo
conjunto de políticas de caráter desenvolvimentista, com ou sem adjetivações – como
neodesenvolvimentista ou social-desenvolvimentista. Esse movimento, para alguns,
estaria inserido em um contexto internacional mais amplo de perda de legitimidade da agenda
do Consenso de Washington na América Latina, da reestruturação da economia global a partir
da emergência de novos atores (como a China) e da crise financeira nos países centrais (Gomide
e Pires, 2014, p. 15).
Já com relação às mudanças em termos de planejamento e gestão, as transformações
são em parte oriundas de uma percepção de que a reforma do Estado dos anos 1990
trouxe poucos resultados concretos à melhoria de políticas públicas. Ao mesmo tempo,
demanda crescente por otimização de recursos – aliada à necessidade de ampliação do
acesso a serviços e de recuperação da infraestrutura – foi fator que fez com que o governo federal passasse a experimentar um conjunto de novas formas de planejamento e
gestão marcados por novos arranjos institucionais, que buscam aumentar a efetividade
das políticas por meio da articulação horizontal, vertical e com atores da sociedade civil
(Lotta e Favareto, 2015).
Um dos resultados dessas mudanças na gestão pública federal é que, naquela década,
o Brasil alcançou desempenho positivo em diversos indicadores de desenvolvimento,
tendo conseguido simultaneamente obter crescimento econômico e redução da pobreza e
da desigualdade (IBGE, 2011), ainda que a manifestação espacial desses bons indicadores
não seja homogênea, destacadamente no caso da desigualdade de renda (Favareto et al.,
2013). Um dos vetores para a produção desses resultados positivos, como assinalado, foi
uma retomada de investimentos voltados à construção de infraestrutura, tendo como
principais iniciativas o PAC, lançado em 2007, e a adoção de instrumentos de política
industrial – como a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), iniciada em 2008.
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Ambas as políticas “explicitam a tentativa do governo de retomar os instrumentos e a
capacidade de intervenção estatal, por meio do planejamento econômico – ao menos
no âmbito setorial –, em prol do desenvolvimento” (Ipea, 2012, p. 8).
Como constatado em relatório de pesquisa de Ipea (2012),
(...) no caso dos países em desenvolvimento, o Estado tem historicamente conservado o protagonismo nesta área, seja atuando diretamente, por meio da ampliação e modernização do capital físico do
país, seja indiretamente, por meio da regulação e do incentivo às inversões das firmas. Nesse sentido,
é absolutamente imprescindível a estes países a construção de mecanismos estatais eficientes para a
coordenação e a indução dos investimentos em infraestrutura, de modo a assegurar que as ações dos
agentes econômicos possam não apenas produzir os melhores resultados econômicos no tempo, em
termos de produtividade e rentabilidade, mas também ser direcionadas para aqueles objetivos mais
elevados almejados pela sociedade e expressos na Constituição nacional (Ipea, 2012, p. 7).
Assim, os programas foram construídos no país com o objetivo de contribuir
para o desenvolvimento continuado e acelerado do Brasil ao desobstruírem gargalos
que impediam investimentos e promoverem a retomada do planejamento e da execução
de grandes obras de infraestrutura social, urbana, logística e energética. Para tanto, há
na operacionalização do PAC e da PDP explícita tentativa de estabelecer mecanismos
ágeis de coordenação e gestão por meio de novos arranjos institucionais. No primeiro
momento, foram organizados diversos eixos de atuação, que incluem elementos como
aumento do crédito e redução das taxas de juros, melhoria do ambiente de investimento,
aperfeiçoamento do sistema tributário, medidas fiscais de longo prazo e especificamente
aumento do investimento em infraestrutura, naquilo que ficou conhecido como PAC
1. Na reestruturação do programa, em 2011, o PAC 2 reorganizou-se em outros cinco
eixos, que contemplaram uma dimensão social: Cidade Melhor, Comunidade Cidadã,
Minha Casa Minha Vida, Água e Luz para Todos e Transportes e Energia. Para cada
eixo, são definidos projetos prioritários, que recebem investimentos do governo federal,
de estados, de municípios e do setor privado.
Mais do que a construção de novas ações, o programa buscou contemplar projetos
e obras que já estavam em execução ou eram previstos pelos diversos ministérios ou empresas estatais e que deveriam ser tomados como prioridade e objeto de monitoramento
contínuo, por serem centrais para o intuito de promover a aceleração do crescimento
(Leitão, 2011). Foram selecionados mais de 1,6 mil projetos, obras e ações, que passaram a ser monitorados em uma lógica de gestão integrada e contínua, com garantia de
recursos, agilidade gerencial e visibilidade.
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
Embora o PAC e a PDP tragam em si uma grande virtude, por retomarem o papel
ativo do Estado na promoção da competitividade econômica, ao eliminarem gargalos
de infraestrutura, pesquisas mostram que seus resultados muitas vezes ficam aquém do
esperado tanto em termos de entregas como em termos de avanços de gestão e relação
Estado-sociedade (Lotta e Favareto, 2015). Entre os problemas que não estão sendo devidamente tratados na gestão desses grandes projetos de infraestrutura, cabe mencionar:
as desigualdades espaciais produzidas pela competitividade (Banco Mundial, 2009); os
conflitos socioambientais decorrentes de seus impactos (Rolnik, 2012; Leitão, 2013);
os impactos territoriais indesejados da competitividade (Vainer, 2007); e a ausência de
procedimentos de gestão antecipada da contestabilidade (Homer, 2010). A isso também
se soma uma dificuldade, em vários casos, de execução dos projetos, seja de cumprir
o cronograma de execução da obra, seja de orçamento. Por fim, igualmente se coloca
como dificuldade de parte expressiva dos projetos a ausência de dimensão territorial em
sua concepção. Isso faz com que tais investimentos se tornem espacialmente cegos, o
que limita sua eficácia em gerar sinergias e resultados desejados no plano local (Favereto
et al., 2013).
Considerando-se, portanto, as dificuldades apresentadas anteriormente, a relevância
e a centralidade de programas voltados à construção de infraestrutura que contribuam de
fato para o desenvolvimento e, junto disso, os desafios postos para a adoção de arranjos
eficientes para a gestão desses mesmos programas, este estudo se situa nos marcos de
pesquisa mais ampla, cujo objetivo é justamente analisar quais são os condicionantes
institucionais que impactam positiva ou negativamente o desempenho dessas políticas.
No âmbito da pesquisa coletiva, outros estudos se dedicaram a aspectos como as formas
de participação social mobilizadas em torno dessas obras e investimentos, as formas de
licenciamento, o papel dos órgãos de controle, entre outros. Aqui, especificamente,
pretende-se analisar o desenho institucional e dos mecanismos de planejamento e gestão de projetos de infraestrutura vinculados ao PAC com o intuito de identificar que
elementos do desenho do programa afetam positiva ou negativamente seu desempenho.
As próximas páginas trazem os resultados principais do estudo. Após uma apresentação da literatura pertinente sobre o tema, são analisados os arranjos institucionais
adotados para a execução de seis diferentes obras de infraestrutura em curso no Brasil,
todas estas vinculadas ao PAC. A análise buscará observar como as características de
cada arranjo contribuem ou não para a efetivação da coordenação entre diferentes
atores, o que, por sua vez, impacta os processos decisórios e consequentemente os resultados da gestão de infraestrutura. Os arranjos institucionais serão estudados tendo-se
como base a coordenação promovida por cada um destes em três diferentes dimensões:
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intersetorialidade (coordenação intragovernamental), relações federativas (coordenação
intergovernamental) e relações com o território e seus agentes (coordenação com forças
e interesses sociais locais para além do Estado).
A ideia central que emerge deste estudo confirma a importância dos condicionantes
institucionais para o desempenho dos investimentos em infraestrutura. Mais que isso, a
análise que será apresentada nas próximas páginas pretende fornecer evidências de que
os arranjos institucionais desempenham papel decisivo na forma pela qual estes investimentos são administrados e nos resultados desta gestão. Contudo, chama-se atenção
também para o fato de que boa parte dos problemas institucionais antecede os arranjos
de gestão dos investimentos propriamente, o que remete à necessidade de vincular o
tema dos arranjos institucionais de execução de projetos de infraestrutura diretamente ao
tema das capacidades e das formas de planejamento do Estado brasileiro. Essa afirmação
geral se sustenta em quatro afirmações intermediárias.
Em primeiro lugar, no caso específico das grandes obras de infraestrutura reunidas
no PAC, boa parte dos problemas verificados deve-se ao fato de que os projetos foram
herdados pelo programa. Isto é, sua elaboração é anterior, e não houve lógica única –
nem mesmo similar – de desenho e decolagem dos projetos. Isso limitou de partida a
capacidade dos arranjos institucionais de contornar problemas que, de certa maneira,
já estavam dados, de forma expressa ou latente.
Em segundo lugar, embora com fortes e evidentes impactos espaciais, parte expressiva
dos projetos é territorialmente cega: estes são desenhados como se os municípios e as regiões
onde são feitos os investimentos fossem meros repositórios dos investimentos. Com isso,
muitas vezes se multiplicaram conflitos, que geraram atrasos e readequações. Boa parte
desses problemas poderia ter sido objeto de gestão antecipada da contestabilidade caso
houvesse tratamento mais afirmativo das forças sociais e dos interesses dos agentes mais
representativos do tecido social e econômico dos territórios em que se realizam as obras.
Em terceiro lugar, a coordenação vertical (relação com entes federados) aparece
como dimensão marginal nas obras analisadas. Em parte, isso se deve à afirmação anterior de que os programas são, em sua maioria, territorialmente cegos. Mas também,
em parte, isso é em razão da própria dinâmica de atuação do governo federal brasileiro
no período. A baixa densidade das relações verticais estabelecidas na execução das obras
compromete a capacidade de desenhar as políticas de forma adequada aos territórios e
sobrecarrega a atuação do governo federal na sua gestão, o que dificulta, assim, a eficácia
em antever e resolver problemas.
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
Em quarto lugar, a coordenação intragovernamental ou intersetorial ocorre de forma
bastante restrita nas obras analisadas. Esta é central no processo de monitoramento, mas
desconsidera o envolvimento da diversidade de atores relevantes nos processos de formulação e planejamento das obras. Embora a análise dos processos de planejamento tenha
sido objeto de outro estudo nos marcos desta pesquisa, observou-se que, na dinâmica
de gestão do PAC, os tipos de ações de coordenação são predominantemente reativos
e mobilizam atores e recursos para resolver problemas já instalados e que poderiam ter
sido previstos ou minimizados caso essa articulação tivesse se estabelecido desde a etapa
anterior. Soma-se a isso um modelo de coordenação adotado para a gestão do programa
que se apoia fundamentalmente naquilo que a literatura chama de mecanismos de rede:
procedimentos que dependem de adesão voluntária e cooperativa de diferentes atores,
nesse caso mobilizados sempre a posteriori quando se trata de equacionar os conflitos
derivados da ausência de gestão antecipada de problemas e da contestabilidade. Apenas
de forma complementar, a gestão apoia-se também – e de forma dependente do funcionamento das redes mobilizadas por gestores – em mecanismos hierárquicos informais,
derivados da autoridade transmitida aos burocratas envolvidos com o programa, por
tratar-se de clara prioridade governamental. O resultado é a fragilidade dos mecanismos
de enforcement das decisões de coordenação – que restam dependentes de redes, e não
de regras e processos institucionalizados –, agravada pela alta variabilidade no grau de
sucesso e comprometimento entre atores.
Para demonstrar essa ideia central e os argumentos nos quais esta se desdobra,
este trabalho está estruturado em quatro seções, além desta introdução e de breves considerações finais. Na primeira seção, retomam-se aspectos da literatura que discute os
condicionantes dos grandes projetos de infraestrutura, apontando-se quais os principais
elementos que devem ser considerados para a gestão de obras públicas, com enfoque
central nos problemas relativos à coordenação de diferentes atores para realização de
processos decisórios mais efetivos. Na segunda seção, são apresentadas considerações
concernentes aos arranjos institucionais para a coordenação e discutidos os conceitos de
arranjos institucionais e coordenação, as diferentes dimensões e mecanismos de coordenação e como se espera que estes enfrentem os problemas apontados na seção anterior.
A terceira seção traz o desenho da pesquisa realizada, com a apresentação das variáveis
abordadas e dos casos analisados. A quarta seção, mais extensa, revela os principais resultados obtidos. Finalizamos o texto com algumas considerações a título de conclusão,
retomando as perguntas iniciais, as principais evidências obtidas e suas consequências
para o entendimento do PAC, em particular, e para o futuro dos arranjos institucionais
de execução de obras de infraestrutura no Brasil, em geral.
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2 CONDICIONANTES DA EXECUÇÃO DE GRANDES PROJETOS
DE INFRAESTRUTURA
As dificuldades para execução de projetos de infraestrutura não são problema exclusivo
do contexto brasileiro. A literatura internacional já aponta e analisa há alguns anos as
dificuldades inerentes aos chamados megaprojetos para que seja cumprida sua execução – tanto em termos financeiros como temporais – e, ao mesmo tempo, para que
seja garantida também a gestão de riscos, diminuindo-se a contestação, os impactos
indesejados e as externalidades negativas.
Uma das questões apontadas pela literatura internacional sobre megaprojetos diz
respeito aos condicionantes externos que impactam fortemente a gestão governamental e,
portanto, implicam os resultados alcançados. Raimundo e Sabatini (2012), por exemplo,
argumentam que os condicionantes das políticas de infraestrutura envolvem aspectos
macroeconômicos, microeconômicos, sociais e regionais. Esses autores ressaltam que o
investimento em infraestrutura tem algumas características bem específicas que devem
ser levadas em consideração no desenho e na implementação de políticas, tais como as
seguintes características dos serviços: podem ser estratégicos e essenciais, no entanto,
muitas vezes os agentes econômicos não têm interesse ou capacidade de ofertá-los; são
intensivos em escala e capital e implicam elevados custos fixos em projeto e construção;
requerem uso amplo de recursos para financiamento com condições de alta incerteza – o
que leva à necessidade de intervenção do Estado; e precisam de formas de regulação da
iniciativa privada para evitar ganhos de monopólio.
Ainda pensando sobre as especificidades da gestão de infraestrutura, a partir de
levantamento da literatura e de entrevistas com gestores de projetos públicos, Gomide
(2015) sistematiza alguns dos principais problemas que afetam a execução das obras: i)
as deficiências de planejamento e gestão, evidenciadas pela má qualidade dos projetos; a
falta de capacidade técnica das burocracias envolvidas; ii) as dificuldades de coordenação
de atores e atividades e a precariedade na supervisão das obras; iii) a demora na obtenção
das licenças ambientais; iv) os conflitos fundiários decorrentes das desapropriações; v) a
multiplicidade de controles (internos e externos, procedimentais e judiciais) a que está
submetida a administração pública; vi) as amarras da legislação de licitações e contratos
administrativos; vii) a falta de articulação entre entes federativos e de capacidade técnica
de estados e municípios para executar os empreendimentos; viii) o fato de que os grupos
sociais afetados negativamente pelas obras, bem como a sociedade civil como um todo,
são consultados apenas depois de decididas as obras, o que resulta em judicialização e
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
paralisações; ix) e os limites da engenharia consultiva e das empresas de construção de
pequeno e médio porte para atender às demandas exigidas pelas obras.
Ao analisar várias obras de infraestrutura em diferentes países, Flyvbjerg, Bruzelius
e Rothengatter (2003) apontam para a existência constante do que denominam paradoxo
da performance. Segundo os autores, o paradoxo consiste em que, ao mesmo tempo que
no mundo todo são cada vez mais propostos e construídos projetos de grande porte, estes
continuam tendo desempenho pobre em termos de economia, ambiente e apoio político,
de forma que os custos acabam sendo sempre maiores do que os previstos, deixando os
projetos em risco. Para eles, e em consonância com as demais afirmações mencionadas
anteriormente, projetos de grande porte envolvem necessariamente muitos riscos e incertezas, por isso, na medida em que estes existem, as estratégias de tomada de decisão a
respeito de riscos deveriam estar no centro do processo decisório. No entanto, apontam
os autores, as discussões mais amplas e abrangentes acabam sendo negligenciadas em
prol de tomadas de decisão mais restritas e feitas de cima para baixo, sem envolvimento
de quem pode ser afetado pelo projeto.
Flyvbjerg, Bruzelius e Rothengatter (2003) trabalham com a ideia de que um bom
processo decisório não é apenas o que tem melhor informação e decisão mais racional,
mas especialmente aquele que envolve arranjos institucionais que promovam accountability como algo fundamental para promoção de diálogo contínuo entre cidadãos e
políticos. Para os autores, esse processo de construção deliberativa de decisões a respeito
dos riscos dos megaprojetos é condição para que se tomem decisões mais assertivas, com
menor grau de contestabilidade e, portanto, que garantam processos mais eficazes e
efetivos para a própria obra em construção. Os megaprojetos são complexos e híbridos
por sua natureza, de forma que o envolvimento entre os atores estatais e não estatais
deve ser parte fundante do processo decisório, e isso se torna condição para uma melhor
execução das obras.
No caso brasileiro, essa ideia de envolvimento de diversos atores no processo
decisório como condição para boas decisões se torna ainda mais crítica considerando-se
o contexto particular vivido nos últimos anos. A esse respeito, Pires (2015) aponta que
há quatro vetores atuais cercando as políticas voltadas ao desenvolvimento.
O primeiro vetor diz respeito à lógica política que permeia o Estado brasileiro pós-Constituição Federal (CF) de 1988. A divisão de poderes e o presidencialismo de coalizão
trazem particularidades à operação de políticas públicas, como a necessidade de viabilizar
as ações por meio de apoios políticos. “Essa dinâmica traz sérias implicações para a gestão
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e implementação de políticas públicas no país, pois recursos administrativos essenciais
passam a ser filtrados pela lógica da manutenção do apoio político” (Pires, 2015). Este
nem sempre se dá de acordo com as prioridades da gestão ou da burocracia e, muitas
vezes, acaba por dificultar a coordenação intragovernamental e de ações transversais.
O segundo vetor diz respeito à descentralização político-administrativa, que acabou
por envolver municípios e estados nas políticas públicas e, portanto, exige do governo federal
capacidade de articulação entre os entes federativos para que as políticas sejam executadas.
O terceiro vetor relaciona-se com a complexidade de agências envolvidas na produção
das políticas públicas para garantir direitos individuais, coletivos e difusos. Apenas para
citar algumas, temos o papel cada vez maior de todo o sistema de controles bem como
das agências reguladoras e dos demais poderes, o que também exige ampla capacidade de
coordenação e negociação entre diferentes agências para que as políticas públicas aconteçam.
Por fim, o quarto vetor tem a ver com a construção de ambiente institucional
que incorpora a participação social nos processos de formulação e controle das políticas
públicas. Somados à necessidade de transparência, mais uma vez se reforça a importância
de que o Poder Executivo seja capaz de articular e envolver outros atores na produção
das políticas públicas.
Gomide e Pires (2014) também argumentam que, no contexto atual, os gestores
públicos precisam lidar, ao mesmo tempo, com três tipos de sistema institucional: representativo (atuação de partidos e seus representantes), participativo (das instituições de
participação da sociedade civil) e de controles burocráticos (mecanismos de accountability
horizontal, como controles externos e internos, parlamentar e judicial).
Todos esses elementos do contexto atual brasileiro têm levado o Estado à construção
de novas maneiras de formular, implementar e avaliar as políticas públicas para dar conta
dos novos desafios existentes e, especialmente, da articulação com novos atores. O tema
da coordenação torna-se, assim, absolutamente central para compreender as condições
que permitem sucesso ou insucesso dos projetos de infraestrutura. A coordenação não
significa apenas o envolvimento de atores estatais e não estatais, mas sim – como aponta
Pires (2015) – o envolvimento de uma gama complexa de atores que podem interferir na
gestão dos projetos ou serem afetados por estes. São, portanto, atores internos do Estado,
atores externos, atores públicos e privados, beneficiários, fornecedores, atores nacionais e
atores localizados no território, uma diversidade de atores e sistemas que devem ser – de
maneiras distintas, mas combinadas – envolvidos no processo decisório, o que requer
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
incentivos e procedimentos igualmente diversos, de forma a garantir melhor eficácia e
efetividade nas obras de infraestrutura. Essa coordenação só pode ser alcançada por meio
de arranjos institucionais constituídos para esse fim, como os que serão aqui analisados.
A isso é dedicada a próxima seção, na qual são discutidas as questões e os temas sensíveis
na análise dos arranjos institucionais e de sua função na promoção de coordenação.
3 ARRANJOS INSTITUCIONAIS PARA COORDENAÇÃO: O QUE
DIZ A LITERATURA
Como apontado anteriormente, o atual contexto de gestão das obras de infraestrutura
pressupõe ampla capacidade de coordenação para envolvimento de diferentes atores,
instituições e instâncias no processo decisório. Os arranjos institucionais são aqui compreendidos como regras específicas que os agentes estabelecem para suas transações
econômicas ou nas relações políticas e sociais e que definem a forma de coordenação
de processos em campos específicos, “delimitando quem está habilitado a participar de
um determinado processo, o objeto e os objetivos deste e as formas de relação entre
os atores” (Pires e Gomide, 2014). A análise dos arranjos institucionais nos permite
observar variáveis centrais para entender a definição dos atores envolvidos. Além disso,
possibilita compreender como se efetiva a governança, os processos decisórios, os graus
de autonomia e o impacto dessas variáveis sobre os resultados das políticas.
Esses arranjos – amplamente estudados por Gomide e Pires (2014) – incorporam
avanços tanto em relação às capacidades técnicas do Estado (competências dos agentes
do Estado para coordenar e levar adiante suas políticas) como no que concerne a suas
capacidades políticas (habilidade dos agentes de expandir a articulação e a interlocução
com diferentes atores sociais). Essas duas dimensões, afirmam os autores, são centrais
para compreensão de como o Estado avança em processos de desenvolvimento nacional
em bases consistentes, ao mesmo tempo que promovem legitimidade da ação estatal e
contabilização de diversos interesses em torno de plataformas comuns.
O desenho de arranjos institucionais torna-se condição para promoção de maior
coordenação entre diferentes atores, e isso, aponta a literatura, tem sido elemento cada vez
mais evidente na gestão pública, como consequência tanto do ambiente complexo em que
as políticas são atualmente formuladas e implementadas como do aumento de especialização
e diferenciação típicas da construção dos Estados ao longo do século XX: quanto mais
especialização e diferenciação, maior a necessidade de coordenação (Bouckaert, Peters e
Verhoest, 2010). Analisando-se diferentes arranjos institucionais nas políticas públicas no
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Brasília, Novembro de 2016
Brasil, Lotta e Favareto (2015) apontam que há quatro diferentes dimensões que têm sido
incorporadas – de distintas maneiras – nos atuais arranjos institucionais: intersetorialidade,
relações federativas, participação social e territorialidade. Essas dimensões, segundo os
autores, incorporam formas de coordenação com distintos tipos de atores envolvidos na
produção de políticas públicas.
A intersetorialidade, ou articulação horizontal, envolve a coordenação de diferentes
setores governamentais para, conjuntamente, construírem soluções que resolvam de
forma produtiva problemas sociais (Cunil Grau, 2005). É construída pela conjunção
de saberes e experiências para formulação, implementação, monitoramento ou avaliação
de políticas públicas, buscando alcançar resultados sinérgicos em situações complexas.
A lógica intersetorial pressupõe articulação e junção de diferentes ações com um foco
específico, seja um território onde se quer atuar, um determinado público ou um problema complexo a enfrentar (Inojosa, 2013). Intersetorialidade define-se pela medida
em que diferentes competências setoriais, programas ou temas de políticas públicas são
organizados horizontalmente, permitindo-se integração entre estes.
A segunda dimensão é a subsidiariedade, ou articulação vertical. Esta envolve as
formas como as políticas consideram as relações federativas – entre governo federal,
governos estaduais e governos municipais. O ponto central aqui consiste em tomar em
conta como os diversos entes federativos se relacionam e se responsabilizam no processo de formulação e execução das políticas públicas. Para compreender o desenho das
políticas e as relações federativas, Arretche (2012) sugere considerar a diferença entre o
que chama de policy making (quem tem autoridade formal e responsabilidade sobre a
política) e policy decision making (quem possui autonomia para tomar decisões sobre as
políticas). Nesse sentido, sugere que se diferencie a descentralização em três variáveis:
descentralização política, com a possibilidade de que governos locais sejam eleitos diretamente; descentralização fiscal, que é a participação de receitas e gastos dos governos
subnacionais sobre o gasto agregado; e descentralização de competências – isto é, a
diferenciação entre os entes federativos das responsabilidades pela execução das políticas públicas, considerando-se, como foi dito, que a execução é diferente da autonomia
decisória para definir as políticas públicas.
A terceira dimensão envolve o tratamento da questão territorial. Embora a noção de
território tenha longa trajetória em disciplinas como geografia e antropologia, é somente no
último quarto do século passado, em geral, e na virada para este século, no caso brasileiro,
que esta entra para o repertório dos gestores, passando a ser associada diretamente à gestão
e à implementação de políticas públicas (Favereto, 2010). Uma das principais razões para
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
isso é a constatação de que as políticas nacionais dão origem a indicadores muito diferenciados nos vários municípios em que são implementadas, o que sugere a importância de
fatores locais para condicionar o êxito dos investimentos feitos. Além disso, outros autores
têm enfatizado a importância de que se promovam formas de articulação intermunicipal, já
que o tamanho reduzido e as limitadas capacidades institucionais de pequenos municípios
ou equivalentes se tornam um fator de bloqueio à emergência de projetos consistentes e
duradouros. E, finalmente, para o caso de certas políticas, é preciso também mobilizar uma
pluralidade de forças sociais; cada uma destas portadora de interesses ou de habilidades sociais
necessárias à consecução desses projetos. Em síntese, a literatura associa à ideia de território
a necessidade de mobilizar três dimensões da vida social local: intermunicipalidade – isto é,
escala geográfica de planejamento dos investimentos mais ampla que os pequenos municípios e mais restrita que os estados –; perspectiva intersetorial capaz de articular interesses e
capacidades coerentes com a heterogeneidade das estruturas sociais locais; e permeabilidade
aos interesses e à participação dessas forças sociais nos mecanismos de planejamento e gestão.
A quarta dimensão busca compreender como os diversos atores sociais são considerados no processo de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas. A
CF/1988 trouxe a participação como elemento central para a democratização das políticas e
o aumento de sua efetividade. Há aliada a isso uma percepção de que “amplas negociações
e debates entre a pluralidade de atores envolvidos contribuem também para a coerência
interna das políticas (...). A participação pode ser entendida como parte do processo e do
próprio conteúdo de uma renovada noção de desenvolvimento” (Sen, 2000 apud Gomide
e Pires, 2014, p. 18).
Assim, foram propostas e criadas diversas instituições participativas no país nos
últimos anos que buscavam contemplar a população no processo decisório de forma
mais direta. As avaliações sobre a participação, no entanto, apontam que esta não tem
sido incorporada em todas as áreas de políticas públicas e – até mesmo quando incorporadas – nem sempre são efetivas em termos de democratização da participação ou de
promoção do desenvolvimento (Coelho e Favareto, 2007).1
A maneira como essas quatro dimensões funcionam, por sua vez, pressupõe
a existência de distintas formas de coordenação nos arranjos institucionais. Três são
os mecanismos de coordenação apontados por Bouckaert, Peters e Verhoest (2010):
hierarquia, mercado e rede.
1. Muito embora essa quarta dimensão seja essencial para analisar os arranjos, esta não será incorporada neste estudo
por ter sido objeto de pesquisa específica nos marcos do mesmo projeto coletivo de pesquisa. Ver a respeito Abers (2015).
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Brasília, Novembro de 2016
A hierarquia é a lógica de coordenação baseada nos recursos de autoridade e poder.
Esta se dá pela imposição de coordenação por meio de leis e estruturas organizacionais
em que há alta formalização e rotinização e pouco espaço para criatividade e flexibilidade (Pires e Gomide, 2014). Ou, como apontam Bouckaert, Peters e Verhoest (2010),
a hierarquia é a habilidade de fazer coisas serem realizadas sem oposição, a partir do
controle hierárquico e político sobre os atores.
O mecanismo de mercado tem como base a ideia de coordenação por meio de
trocas entre atores com interesses específicos. Caberia ao governo criar mecanismos de
mercado baseados na existência de interessados, na competição e na regulação, que criam
ambientes propícios à coordenação dos atores baseados em seus interesses (Bouckaert,
Peters e Verhoest, 2010).
A ideia de redes surge como uma forma alternativa de coordenação que depende
de colaboração voluntária e solidariedade entre os atores (Bouckaert, Peters e Verhoest,
2010). Ou seja, estes se envolveriam de forma independente, baseados em confiança,
identidade, reciprocidade e compartilhamento de valores ou objetivos (Pires e Gomide, 2014).
Bouckaert, Peters e Verhoest (2010) apontam que cada mecanismo se efetiva
por meio de um conjunto de instrumentos que podem ser usados pelo setor público
para promover a coordenação – por exemplo, instrumentos de gestão da estratégia, de
gestão financeira, de aprendizado interorganizacional, entre outros. A análise desses
instrumentos, apontam os autores, pode ser uma das chaves para compreender como
estão desenhados e estruturados os mecanismos de coordenação.
Neste trabalho, entendemos, portanto, que os arranjos institucionais são desenhados
para promover a coordenação entre diferentes tipos de atores (intersetoriais, federativos
ou do território) e que esse processo de coordenação se apoia na adoção de diferentes
tipos de mecanismos (hierarquia, mercado e redes). Estes, por sua vez, são efetivados pela
construção de instrumentos específicos que dão forma aos diferentes arranjos institucionais aqui estudados. Da análise combinada desse conjunto de dimensões e variáveis,
é possível descortinar quais são os elementos que aparecem associados a melhores graus
de desempenho na execução de grandes obras de infraestrutura.
Para a abordagem analítica, foram selecionados seis diferentes casos de infraestrutura que apresentaram variação em termos de resultados (cumprimento de cronograma e orçamento). A análise dos seis casos utiliza o levantamento de como os arranjos
institucionais estão desenhados em termos de promoção de coordenação entre os diferentes
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
tipos de atores. Para tanto, foram analisados os atores envolvidos, a forma de envolvimento e os mecanismos de promoção da coordenação entre estes. Essa análise se baseia
na metodologia já desenvolvida por Lotta e Favareto (2015), aqui complementada por
uma análise final sobre mecanismos de coordenação (hierarquia, mercado e rede) e seus
respectivos instrumentos.
4 DESENHO DE PESQUISA
Nesta seção, são apresentados os casos e a análise a respeito das diferentes variáveis que
compõem os arranjos institucionais dos casos analisados. Para cada dimensão de análise,
retomam-se os aspectos centrais da bibliografia e como estes podem ser traduzidos em
variáveis a serem observadas. Em seguida, são apresentados, inicialmente e de forma
breve, os seis projetos escolhidos.
Antes, porém, cabe explicitar uma ressalva. A pesquisa coordenada pelo Ipea à qual
este estudo está vinculado partiu da ideia de comparar diversos fatores, considerando-se
experiências de sucesso e insucesso. A definição do grau de sucesso teve por critérios o
cumprimento de metas, o cronograma e o orçamento das obras – ou seja, aquelas obras
que conseguiram cumprir metas no prazo e gastando perto do previsto foram consideradas
obras de sucesso. No entanto – como se discutirá mais adiante –, esse critério de sucesso
é bastante relativo e parcial, visto que o bom desempenho em termos de cumprimento
de cronograma pode não se refletir em maior efetividade, qualidade e inclusão. Apenas
como exemplo, no caso da Usina Hidrelétrica (UHE) de Teles Pires, o critério de sucesso
envolve somente a consideração do prazo e orçamento utilizados para efeitos de entrega
da obra, e não da operação em serviço final, o que significa grande diferença e exige certa
relativização desse critério quando aplicado a grandes obras de infraestrutura.
4.1 Dimensões e variáveis de análise
4.1.1 Intersertorialidade: coordenação intragovernamental
A intersetorialidade – ou seja, o envolvimento de diversos atores setoriais – tem como
base uma problemática existente em boa parte das organizações públicas: o excesso
de especialização. Bouckaert, Peters e Verhoest (2010) apontam que o século XX foi
voltado a uma construção de especialização das organizações resultante da ideia de que
tal especialização geraria ganhos de eficiência, transparência e controle. No entanto, o
que se percebeu ao longo do tempo é que a especialização aumenta os problemas de
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Brasília, Novembro de 2016
coordenação, especialmente na separação entre formulação, implementação e avaliação
de políticas públicas. Esses problemas, afirmam os autores, afetam a qualidade das decisões públicas. A coordenação intersetorial seria uma solução a esse problema, como
um processo através do qual a decisão seria feita conjuntamente entre diferentes organizações. A coordenação intersetorial envolve, portanto, o ajuste mútuo entre atores ou
a adoção de interações mais deliberativas, capazes de produzir resultados positivos aos
participantes ao limitarem consequências negativas e, ao mesmo tempo, produzirem
maior coerência, diminuindo redundâncias, lacunas e contradições tanto entre as políticas quanto nas políticas em si (Bouckaert, Peters e Verhoest, 2010).
A literatura sobre intersetorialidade aponta que esta pode se concretizar em diferentes graus nas políticas, variando em que medida de fato os temas estão articulados
e como se concretizam – ou seja, se existe efetiva integração ou apenas justaposição de
políticas. A intersetorialidade é tanto mais efetiva quanto mais a integração for pensada
desde o planejamento até o monitoramento das políticas públicas. Assim, experiências
que consideram intersetorialidade apenas como o processo de monitoramento conjunto
de experiências diferentes têm poucas chances de avançar em termos de integração efetiva
com vistas à resolução de problemas complexos.
4.1.2 Subsidiariedade: coordenação federativa
A literatura sobre os arranjos institucionais também tem apontado a dimensão das
relações federativas como central para compreender a coordenação entre atores de diferentes entes federativos na promoção de políticas públicas. Essa variável é ainda mais
central no caso de países com lógicas federativas complexas como o Brasil, no qual os
entes têm diferentes responsabilidades sobre uma mesma política.
Ao analisar o caso brasileiro, Arretche (2012) aponta que a CF/1988 descentralizou
a execução de uma série de políticas públicas para estados e municípios. No entanto, a
descentralização não levou a uma efetiva autonomia dos entes subnacionais em relação às
políticas públicas, na medida em que a Constituição também desenhou regras que deram
ampla autoridade legislativa à União, que acaba exercendo “poderosa influência sobre a
agenda e as políticas dos governos subnacionais. Além da legislação aprovada no parlamento,
esse poder também é exercido no campo da legislação específica de cada política pública
bem como dos poderes de gasto e supervisão do governo federal” (Arretche, 2012, p. 19).
A autora conclui ainda que, no caso brasileiro, há mecanismos institucionais que
limitam a autonomia dos governos locais para tomarem decisões sobre suas atividades,
mesmo que estes tenham autonomia política.
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do Programa de Aceleração de Crescimento
No caso das políticas de infraestrutura, isso também pode ser evidenciado.
Observando-se apenas os casos a serem analisados (transportes ferroviário e rodoviário,
mobilidade urbana e energia), pode-se ver como existem complexidades inerentes à divisão de responsabilidades entre os entes federativos. No caso de transportes ferroviário
e rodoviário, a Constituição coloca que é competência privativa da União estabelecer diretrizes da política nacional de transportes e legislar sobre trânsito e transportes (art. 22).
Quanto aos serviços, a União pode explorar – diretamente ou por autorização ou concessão
– os serviços rodoviários interestadual ou internacional (art. 21). No tocante ao transporte urbano, também é competência privativa da União legislar sobre diretrizes (art. 22),
no entanto, cabe aos demais entes o fornecimento de serviços, como aponta o art. 30
sobre os municípios: “Compete aos Municípios: V - organizar e prestar, diretamente ou
sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o
de transporte coletivo, que tem caráter essencial” (Brasil, 1988, art. 30). Já com relação à
energia hidráulica, o art. 22 também indica que é “competência privativa da União legislar
sobre águas, energia, informática, telecomunicações e radiodifusão” (op. cit., art. 22). No
que concerne aos serviços, o art. 21 afirma que a União “pode explorar (diretamente ou
mediante autorização ou concessão) serviços e instalações para uso da água em parceria
com estados” (op. cit., art. 21).
Os três casos apontados demonstram, portanto, a complexidade inerente às discussões sobre relações federativas nas políticas de infraestrutura, já que há determinações
diferentes a respeito da responsabilidade pela legislação, pela execução e pela exploração
do serviço. Estão previstas também as possibilidades de delegação e concessão, o que
significa envolvimento de diferentes atores na execução das políticas públicas. Assim,
a análise a respeito das relações federativas deve contemplar a observação de como os
diversos entes federativos se relacionam e se responsabilizam no processo de formulação
e execução das políticas públicas. E, para compreender como os arranjos institucionais
se diferenciam em termos de relações federativas, podemos considerar a diferenciação
proposta por Arretche (2012), envolvendo responsabilidade e autonomia decisória em
três perspectivas: normatização (quem faz a lei, quem regulamenta), financiamento
(quem financia) e execução das políticas (quem executa).
4.1.3 Territórios
Uma das principais características das políticas públicas no Brasil neste século reside na incorporação da dimensão territorial ao vocabulário dos gestores públicos e em instrumentos de planejamento e execução das políticas. Quatro razões explicam esse movimento.
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Primeiro, a constatação de que políticas nacionais acabam por originar indicadores de desempenho e impacto muito diferenciados nos vários municípios em que são implementadas, o que sugere a importância de fatores locais para condicionar o êxito dos investimentos feitos. Segundo, vários autores têm enfatizado a importância de que se promovam formas de articulação intermunicipal, já que o tamanho reduzido e as limitadas capacidades
institucionais de pequenos municípios ou equivalentes se tornam fatores de bloqueio à
emergência de projetos duradouros. Por razões diferentes, isso também vale para municípios de grande porte ou áreas metropolitanas. Ali, a interdependência dos fluxos ou a dependência de recursos do entorno faz necessária a articulação em escala regional. Terceiro,
para o caso de certas políticas, é preciso ainda mobilizar uma pluralidade de forças sociais,
cada uma destas portadoras de interesses ou de habilidades sociais necessárias à consecução desses projetos. Quarto, a análise prévia e o envolvimento de atores representativos
do tecido social dos territórios poderiam permitir a identificação precoce de resistências,
problemas e bloqueios a investimentos, o que permitiria gestão antecipada dos conflitos
relacionados a esses projetos e garantiria, assim, maior controle e menores problemas de
gestão em sua execução (Favareto, 2012; Abramovay, 2006).
Nesse texto, consideram-se como indicadores a serem observados para analisar
como ocorre a incorporação da dimensão territorial nos arranjos os seguintes elementos:
i) a identificação prévia de nexos entre os investimentos a serem realizados e as características do tecido social e econômico local para além da mitigação ou compensação dos
impactos negativos a serem gerados; ii) a existência de instrumentos de planejamento e
gestão em escala intermunicipal; iii) a efetiva participação do poder público e da sociedade civil local nesses espaços; e iv) a existência de incentivos à participação de forças
sociais representativas da heterogeneidade estrutural dos territórios nos seus processos
de formulação e gestão em todas as suas etapas.
4.2 Os casos
Os casos analisados foram: UHE Teles Pires, Usina Termoelétrica (UTE) Candiota, bus
rapid transit (BRT) do Distrito Federal (DF), Metrô de Salvador, Ferrovia Transnordestina e BR-163. A seguir, cada um dos projetos é descrito sucintamente; em seguida, são
apresentadas as análises realizadas.
4.2.1 UHE Teles Pires
A construção da Usina Hidroelétrica Teles Pires, no estado do Mato Grosso, foi incorporada ao PAC em 2010. Está inserida em um conjunto de cinco usinas do rio Teles Pires,
as quais juntas produzirão 3,7 mil megawatts de energia. Sua capacidade individual
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será de 1.819 MW. Os estudos para a realização do conjunto de usinas remontam a
2005, tendo sido realizadas pesquisas de aproveitamento do rio para utilização de energia, bem como estudos ambientais, de engenharia e de benefícios. Também foram realizadas análises de viabilidade técnica e econômica pela Empresa de Pesquisa Energética
(EPE) e pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A obra é considerada de sucesso por ter sido finalizada antes do prazo acordado.
No entanto, toda a sua gestão, planejamento e execução estão voltados apenas à construção da hidrelétrica. A realização das obras responsáveis pela transmissão de energia
é considerada um empreendimento distinto. Assim, embora a hidrelétrica em si tenha
sido entregue antes do prazo, não há, até agora, geração e transmissão de energia, que
dependem da finalização da construção da rede de transmissão. A obra tem sido alvo de
vários conflitos sociais, dos quais fazem parte grupos indígenas contrários à construção
do complexo de usinas, pois argumentam terem sido pouco envolvidos no processo decisório. Esses conflitos, no entanto, aparecem diluídos nos demais projetos de construção
das usinas, que têm sido tratados de maneira segmentada. Dessa forma, com a segmentação dos diferentes projetos, a UHE Teles Pires não enfrentou grandes problemas para
conseguir o licenciamento ambiental, já que os pontos centrais de conflito ambiental
foram “transferidos” para a construção das demais obras do complexo.
4.2.2 UTE Candiota
A obra é a terceira etapa de um conjunto de termoelétricas no Rio Grande do Sul, iniciado ainda nos anos 1960. Essa terceira etapa foi desenvolvida em parceria com uma
empresa chinesa especializada em geração de energia com uso de carvão mineral. De
acordo com os gestores, a parceria com essa empresa foi essencial para garantir o resultado e o sucesso da empreitada, inclusive em termos de desenvolvimento tecnológico e
redução de impacto ambiental. Além disso, a obra é considerada de sucesso por ter tido
atraso relativamente pequeno (doze meses).
Por ser a ampliação de projeto já existente previamente, a construção da termoelétrica não resultou em grande complexidade, considerando-se o seguinte: existência
prévia de terreno destinado ao empreendimento; conhecimento prévio sobre a tecnologia a ser adotada; e adesão da população local e potencial de geração de renda. Além
disso, foi utilizada uma modalidade de contrato que transferiu os riscos para a empresa
contratada. Ressalta-se também a boa capacidade de gestão da empresa responsável, com
recursos humanos considerados de boa qualificação, expertise e competência para acessar
consultorias especializadas e resolver os problemas com agilidade.
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Brasília, Novembro de 2016
4.2.3 BRT do Distrito Federal
O projeto previa a construção de um BRT (sistema de transporte urbano) no Distrito
Federal conectando as cidades da periferia com o centro em um trajeto de 35 km.
A obra teve doze meses de atraso, e é por isso considerada caso de sucesso, mesmo não
tendo sido entregue de forma completa, por questões técnicas e orçamentárias.
Por ter sido construída sobre vias públicas já existentes, ao utilizar tecnologia já
conhecida, a obra pode ser considerada de baixo potencial de conflito, além de baixa
complexidade em comparação com outras. Implicou baixo número de desapropriações,
e há relatos de poucos conflitos para sua implementação.
A Caixa Econômica Federal (CEF), responsável pelo financiamento da iniciativa,
desenvolveu uma estrutura de gestão voltada a gerenciamento de projetos e constituiu um
grupo de gestão integrada (GGI) composto por financiador, proponente e instituições
parceiras. O GGI é apontado como um importante espaço para garantir a articulação
entre os entes federativos e as demais organizações públicas envolvidas com a obra, tendo
atuado positivamente para promover a coordenação em torno do projeto.
4.2.4 Metrô de Salvador
A obra destinava-se à construção da linha 1 do Metrô de Salvador, com um trecho de
cerca de 12 km com oito estações, sendo duas subterrâneas. As discussões sobre o projeto iniciaram-se em 1995, mas apenas em 1999 a construção começou. O projeto passa
a fazer parte da carteira do PAC em 2007, com a constituição do programa. Devido a
um acúmulo de atrasos, parte da obra foi entregue para a população apenas em 2014.
A obra é considerada como um projeto sem sucesso devido ao enorme atraso
e aumento orçamentário. Estes, por sua vez, foram causados por inúmeros problemas de gestão, mudanças de projeto, escândalos de corrupção, conflitos e falta de
coordenação entre atores. É um caso muito difícil de ser comparado aos demais
devido às suas especificidades em termos de problemas historicamente acumulados e que envolvem quase todas as dimensões do empreendimento. Até mesmo a
comparação com o BRT/DF não é recomendável, uma vez que a magnitude e a
extensão dos problemas verificados no caso de Salvador – boa parte herdados pelo PAC
– dificultam a análise ponderada dos fatores de desenho responsáveis pelo seu insucesso.
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do Programa de Aceleração de Crescimento
4.2.5 Ferrovia Transnordestina
Este projeto se refere à construção de uma ferrovia conectando o sul do Piauí aos
portos de Pecém (CE) e Suape (PE). Sua história remonta ainda ao século XIX. Nas
últimas décadas, diferentes versões de projetos foram elaboradas. O projeto que vem
sendo executado iniciou-se em 2006 e deve passar por algumas dezenas de municípios
do Nordeste, em sua maioria com população de baixa renda e condições precárias de
vida. Essas localidades são alvo de desapropriações para a realização da obra, mas não
se beneficiarão diretamente pela ferrovia, já que seu intuito principal é conectar regiões
produtoras de matérias-primas dos cerrados do Nordeste aos portos no litoral. As áreas
do semiárido – onde se encontra o maior trecho do traçado – serão apenas lugar de
passagem, sem projetos de aproveitamento do empreendimento pelas economias locais,
em geral marcadas por baixo dinamismo.
O projeto não é considerado um caso de sucesso devido aos inúmeros atrasos e às
revisões orçamentárias significativas. O empreendimento acumula um conjunto de problemas relacionados a conflitos ambientais e sociais, bem como problemas concernentes
às desapropriações, à falta de coordenação com atores locais e às dificuldades relativas ao
planejamento técnico da obra. No momento de elaboração do estudo, contabilizava-se
mais de 2,5 mil dias de atraso para sua entrega.
4.2.6 Rodovia BR-163
O projeto visa à pavimentação da BR-163, que conecta as cidades de Cuiabá (MT) a
Santarém (PA) em mais de 1,7 mil quilômetros de estrada, construída originalmente
nos anos 1970. A obra atende a interesses dos produtores de soja do Mato Grosso,
mas tem apoio forte das comunidades locais que poderão utilizar a nova rodovia. Por
estar assentada sobre uma rodovia já existente, não há necessidade de grandes desapropriações. Por sua vez, o projeto foi altamente polêmico pelo potencial de afetar indiretamente as áreas adjacentes do bioma amazônico, que guardam grande sensibilidade
social e ambiental. O início das discussões sobre o projeto remonta a 1990, tendo
passado, desde então, por diversas reformulações.
Em 2007, o projeto entra no PAC; em 2009, iniciam-se suas obras, planejadas em
doze diferentes lotes. As pesquisas sobre o caso demonstram que seus sucessivos atrasos
estão ligados a suspeitas de superfaturamento, irregularidades em processos licitatórios,
qualidade sofrível na execução e problemas de fiscalização e planejamento técnico da
obra, bem como falta de interlocução e coordenação entre os diferentes atores.
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Brasília, Novembro de 2016
O quadro 1, elaborado para esta mesma pesquisa por Paula, Carvalho e Gonçalves
(2015), traz um resumo de algumas características desses projetos.
QUADRO 1
Caracterização dos problemas verificados nos empreendimentos do PAC selecionados
Tempo de atraso
Aumento
do custo
Gestão do
contrato
clara
Percalços
no diálogo
com a
sociedade
Percalços no
tratamento
de temas
ambientais
Sim
Aproximadamente 360 dias
Sim
Sim
Não
Sim
Sim
Sim
Aproximadamente 360 dias
Sim
Sim
Sim
Não
UHE Teles Pires
Sim
Sim
-
Sim
Sim
Não
Não
Ferrovia
Transnordestina
Não
Não
Aproximadamente 2.520
dias
Sim
Não
Sim
Sim
Metrô de
Salvador
Não
Não
Aproximadamente 810 dias
Sim
Não
Sim
Não
Sim
Sim
Não
Sim
Empreendimento
Definição
clara do
escopo
Contrato
definido
UTE Candiota
Sim
BRT/DF
Lote 1 –
Aproximadamente 810 dias
Lote 2 –
Aproximadamente 960 dias
Lote 3 –
Aproximadamente 1.080
dias
Lote 4 –
Aproximadamente 1.170
dias
Lote 5 –
Aproximadamente 1.080
dias
Rodovia BR-163
Sim
Sim
Lote 6 –
Aproximadamente 1.170
dias
Lote 7 –
Aproximadamente 720 dias
Lote 8 –
Aproximadamente 1.050
dias
Lote 9 –
Em construção
Lote 10 –
Em construção
Lote 11 –
Aproximadamente 360
Lote 12 –
Sem aditivo
Fonte: Paula Carvalho e Gonçalves (2015).
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Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
A análise desse conjunto de casos, tomando-se por base os instrumentos e os
elementos a partir dos quais se concretizam os arranjos institucionais voltados ao planejamento e à gestão dos projetos selecionados, leva à identificação de três campos de
problemas principais: o caráter territorialmente cego dos investimentos; a presença marginal de formas de coordenação federativa; e a ocorrência de tentativas de coordenação
setorial meramente reativas, a posteriori, desencadeadas somente quando entraves geravam
atrasos e dificuldades que afetavam cronograma e orçamento dos empreendimentos.
Antes de detalhar esses três campos de problemas, a próxima seção introduz as formas
de coordenação presentes no modelo de gestão do PAC.
5 RESULTADOS
A aplicação do desenho de pesquisa apresentado na seção anterior faz-se nesta seção
por meio de dois movimentos a um só tempo descritivos e analíticos. Inicialmente, introduz-se o desenho do arranjo institucional do PAC e de cada projeto específico, com
o intuito de mostrar como ali predominam formas de coordenação em rede, aspecto
fundamental para compreender como se comportam os mecanismos de gestão. Isso se
faz apresentando inicialmente o modelo de gestão do programa e, na sequência, a adequação desse modelo de gestão ao arranjo de cada projeto específico, uma vez que – por
tratar-se de obras de diferentes tipos, submetidas a distintos marcos regulatórios – há
especificidades que precisam ser contrastadas com os mecanismos comuns aos demais
projetos. Em seguida, são abordadas separadamente cada uma das três dimensões já
destacadas: as coordenações intersetorial, federativa e territorial.
5.1 O modelo de gestão do PAC e as especificidades dos arranjos
em cada projeto
A construção do PAC deu-se não apenas pela seleção e priorização de projetos de
infraestrutura, mas também pela constituição de sistema de coordenação baseado na
articulação entre diferentes setores do governo federal. Essa articulação se constitui em
uma lógica ao mesmo tempo hierárquica e intersetorial, na qual diferentes atores participam de decisões distintas, como é demonstrado pela figura 1.
27
Brasília, Novembro de 2016
FIGURA 1
Modelo de gestão e monitoramento do PAC
Fonte: Material institucional do PAC do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP).
Obs.: MF = Ministério da Fazenda.
MT = Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil.
MI = Ministério da Integração Nacional.
MCidades = Ministério das Cidades
MME = Ministério de Minas e Energia.
CC = Casa Civil.
SOF = Secretaria de Orçamento Federal.
SPF = Secretaria de Planejamento e Investimento.
STN = Secretaria do Tesouro Nacional.
SPE = Secretaria de Política Econômica.
SAM = Subchefia de Articulação e Monitoramento.
SRI = Secretaria de Relações Institucionais
Infraero = Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária.
O Comitê Gestor do Programa de Aceleração do Crescimento (CGPAC) é integrado
pelos titulares da Casa Civil da Presidência da República, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (MP) e do Ministério da Fazenda (MF) e tem como
função acompanhar, supervisionar e coordenar as ações necessárias à implementação e
à execução dos empreendimentos do PAC. O Grupo Executivo do PAC (Gepac) é um
órgão vinculado ao CGPAC, atualmente situado na Secretaria do Programa de Aceleração
do Crescimento (Sepac), no MP, e funciona como uma secretaria executiva do Gepac.
A Sepac possui a função de elaborar os balanços quadrimestrais, consolidar as ações,
estabelecer as metas e acompanhar os resultados de implementação e execução do programa.
Para seu funcionamento concreto em termos de articulação, foram criados diversos
instrumentos de coordenação vinculados ao funcionamento do PAC.
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do Programa de Aceleração de Crescimento
Em primeiro lugar, podemos citar o Sistema de Monitoramento do Programa de
Aceleração do Crescimento (SisPAC), a partir do Decreto no 6.394/2009. O sistema tem
como objetivo integrar as informações gerenciais a respeito da obra, bem como gerenciar
as metas do programa e liberar os recursos. O SisPAC é gerenciado e acompanhado pela
Sepac, embora seja alimentado por cada um dos ministérios responsáveis pelas obras.
Também foram instituídos os balanços quadrimestrais e as reuniões de avaliação do
andamento do PAC, que funcionam como espaços de prestação de contas previstos em
lei. A função original dos balanços é apresentar os resultados alcançados pelo programa
à sociedade e aos interessados. No entanto, ao longo dos anos, como afirmam alguns
gestores, os balanços passaram também a funcionar como pontos de “stress programado”,
para os quais as equipes se preparam previamente no levantamento de informações e
resolução de problemas a fim de prestarem contas no momento programado.
Há também as salas de situação, que são reuniões interministeriais envolvendo
diferentes atores convocados pela equipe da Sepac, nas quais são apresentados problemas
de andamento das obras e encaminhadas soluções. Essas salas são temáticas e compostas
pelos três ministérios do CGPAC, pelo ministério setorial relacionado à política e pela
equipe da secretaria. As salas de situação também são espaços para levantamento das
informações a serem reveladas nos balanços e, como apontado anteriormente, são instrumentos importantes para a resolução de conflitos e articulação intersetorial – embora
muitas vezes a posteriori. As salas de situação funcionam como
elo entre a gestão do PAC e o nível operacional dos ministérios e são responsáveis pela gestão e
tratamento das informações que são repassadas ao Gepac e CGPAC. Elas realizam o acompanhamento de cronogramas físico e financeiro para assegurar os prazos e metas, gerenciar as restrições
e induzir melhorias no que for necessário (Lotta e Favareto, 2015, p. 57).
Além disso, para seu funcionamento, foram criados, nos ministérios setoriais,
comitês gestores e responsáveis que organizam e repassam as informações para as salas
de situação e o SisPAC.
Vale ressaltar também como um avanço importante que contribui para a capacidade de coordenação do PAC a construção e o fortalecimento da carreira de analista
de infraestrutura. Essa carreira – ao modelo de outras estratégicas do governo federal
– apresenta um desenho intersetorial, de forma que os servidores podem transitar entre
diferentes instituições federais, potencializando a capacidade de troca de informações e
construção de redes. Além de fortalecer a capacidade de planejamento e gerenciamento
do setor de infraestrutura no governo federal, a criação da carreira também tem como
29
Brasília, Novembro de 2016
consequência positiva a construção de ampla rede de servidores públicos especialistas
em um tema, mas que ocupam cargos em diferentes áreas.
Ainda em relação ao corpo técnico, é importante ressaltar que a gestão do PAC –
especialmente a Sepac – tem trazido gestores públicos de diferentes órgãos relacionados
à infraestrutura ou à gestão, como técnicos da Petrobras e do Departamento Nacional
de Infraestrutura de Transportes (Dnit), bem como especialistas em políticas públicas
e gestão governamental (EPPGGs). Essa escolha de técnicos de diferentes organizações para auxiliarem na gestão central do programa também apresenta um potencial
de promover fortalecimento das redes e trocas de informações sobre as obras, como
analisaremos a seguir.
Todo esse arranjo se combina com certas especificidades que dizem respeito aos tipos
de projetos geridos no âmbito do PAC. Entre outros aspectos, os projetos diferenciam-se
pela modalidade de execução – direta ou indireta –, pela sua forma de inserção nos marcos
regulatórios do setor ao qual está vinculada (transportes, energia ou outros) e pelas consequências disto – nas dimensões analisadas – para a forma como vão ser constituídos os
mecanismos específicos de financiamento, consulta, envolvimento de atores e partilha de
responsabilidades. Consequências estas que podem ser visualizadas em cada uma das três
dimensões prioritárias de análise dos arranjos e das formas de coordenação aqui destacadas.
Por exemplo, o fato de serem as obras de infraestrutura de transportes metropolitanos
sujeitas ao marco regulatório do planejamento urbano praticamente obriga a existência
de algum diálogo com os instrumentos de planejamento territorial, o que repercute positivamente para a aderência do projeto a esse critério de avaliação dos arranjos. Em outro
exemplo, as obras de execução indireta pressupõem a necessidade de maior diálogo com
atores, uma vez que não estão submetidas aos instrumentos de decisão e controle diretos
do Estado. As formas de financiamento, igualmente, implicam mecanismos de supervisão e
controle específicos. É o caso de todas as obras financiadas pela Caixa Econômica Federal,
que – para sua própria supervisão – instituiu os chamados GGIs, compostos pela CEF,
pelo proponente dos projetos e pelas instituições parceiras. O grupo tem como função
garantir a articulação entre os diferentes entes federativos e as demais organizações públicas
envolvidas com a obra.
Esses aspectos podem ser mais bem visualizados no quadro 2. E a repercussão dessas
especificidades será discutida mais detidamente mais adiante, quando serão apresentados
os resultados da análise aplicada a cada dimensão de coordenação observada nos arranjos.
30
Área
Modalidade
de execução
Intersetorialidade
Integração federativa
Territórios considerados de forma ativa ou passiva (tratamento das especificidades locais, espaços e atores)
BRT/DF
Transporte
urbano
Indireta
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação).
Obra planejada no âmbito do Plano Diretor do Distrito
Federal. Entrada no PAC posterior ao planejamento.
Obra monitorada pelo governo federal, mas com ampla
participação dos atores do Distrito Federal.
Dimensão territorial é contemplada no Plano Diretor do
Distrito Federal, que previu a construção da obra, e no
seu traçado.
Gestão concomitante pelo
GGI, coordenação da CEF que
congrega diferentes instituições
e entes federativos envolvidos
na obra.
Metrô de
Salvador
UTE Candiota
Transporte
urbano
Energia
Indireta
Direta
Coordenação federativa promovida também pelo GGI
(CEF).
Financiamento compartilhado entre governo federal e
contrapartida do Distrito Federal.
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação).
Obra planejada pelo governo municipal e pelo governo
estadual.
Gestão concomitante pelo
GGI, coordenação da CEF que
congrega diferentes instituições
e entes federativos envolvidos
na obra
Entrada no PAC posterior ao planejamento.
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação)
Obra planejada pelos atores locais à luz de experiências prévias já existentes na região.
Dimensão territorial é contemplada no planejamento
da obra por beneficiar o território (demanda nasce de
necessidade local).
Monitoramento realizado no âmbito desse programa.
Obra sofreu alteração de responsabilidade entre entes
federativos.
Financiamento via convênio entre governo estadual,
CEF e governo federal. Houve anteriormente financiamento via Banco do Brasil (BB).
Entrada no PAC posterior ao planejamento da obra.
Monitoramento realizado no âmbito desse programa.
Municípios e governo estadual têm papel importante
na articulação com governo federal para viabilização
da obra.
Financiamento com captação de recursos externos via
Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras) com recursos repassados para a gestora da obra.
Território é visto como beneficiário da obra pela
geração de empregos permanentes e pelo aumento de
arrecadação.
Empreendimento tem alta aderência às características
do tecido social local: produção de carvão e energia.
Forças sociais locais participam do processo de discussão sobre os impactos e as formas de compensação e
mitigação.
(Continua)
31
Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
Projetos
Texto para
Aspectos dos arranjos específicos de execução dos projetos selecionados no âmbito do PAC
Discussão
2 2 5 3
QUADRO 2
Projetos
Área
Modalidade
de execução
Intersetorialidade
Integração federativa
Territórios considerados de forma ativa ou passiva (tratamento das especificidades locais, espaços e atores)
UHE Teles Pires
Energia
Privada
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação).
Obra planejada no âmbito federal, relacionada a planejamento energético mais amplo.
Dimensão territorial não foi contemplada no processo
decisório.
Baixo envolvimento dos atores locais no processo de
planejamento.
Atores locais fazem reivindicações e mobilizações a
posteriori.
Monitoramento realizado no âmbito do PAC.
Gerou constituição de consórcio intermunicipal a posteriori como fruto da própria intervenção.
Financiamento pela Eletrobras.
Rodovia BR-163
Transporte
regional
Direta
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação).
Obra planejada pelo governo federal com diferentes
graus de envolvimento de atores locais ao longo do
tempo.
Governos municipais só foram envolvidos efetivamente
após as decisões, para mitigação de problemas. Monitoramento realizado no âmbito do PAC.
Dimensão territorial incorporada de maneira ambígua.
Alto grau de heterogeneidade de interesses e atores
envolvidos; dificuldade de contemplar as diferentes
demandas de atores.
Alto grau de contestação e de modificações introduzidas no projeto.
Financiamento via governo federal.
Ferrovia
Transnordestina
Transporte
regional
Elaboração dos autores.
Privada
Intersetorialidade promovida no
planejamento conjunto para desenho do traçado que envolve o
MI, o MT, o MF e a Presidência
da República.
Projeto monitorado no âmbito
do PAC (salas de situação).
Obra planejada em âmbito federal com pouco envolvimento de municípios e governos estaduais em seu
planejamento.
Aderência parcial do empreendimento ao território –
conflitos localizados em certos espaços e benefícios
concentrados em outros.
Monitoramento realizado no âmbito do PAC.
Alto grau de heterogeneidade de interesses e atores
envolvidos.
Entes federativos têm responsabilidade pelas desapropriações.
Financiamento público – com participação de bancos e
fundos – e da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN).
Alto grau de contestação e de modificações introduzidas no projeto.
Brasília, Novembro de 2016
32
(Continuação)
Texto para
Discussão
2 2 5 3
Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
Independentemente das especificidades que, como foi dito, serão retomadas
mais adiante na análise das dimensões específicas, importa estudar que mecanismos de
coordenação predominam no arranjo do programa como um todo. Na literatura de
coordenação de políticas, já apresentada, existem conceituações e análises sobre como
a adoção de diferentes instrumentos tem consequências em termos de construção de
mecanismos de coordenação em rede, de hierarquia ou de mercado. Buscamos, portanto,
identificar – a partir dos instrumentos existentes no PAC – em quais mecanismos estes
se encaixavam pela conceituação da literatura.
No quadro 3, mostramos o resultado dessa análise, que permitiu constatar que
os instrumentos adotados pelo PAC possuem, em grande medida, similaridade com os
instrumentos clássicos da coordenação em rede. O quadro traz os instrumentos de rede,
tal como definidos por Bouckaert, Peters e Verhoest (2010), e como estes se apresentam
no caso específico dos instrumentos de gestão do programa.
QUADRO 3
Definição de mecanismos de coordenação em rede e análise dos instrumentos adotados
no PAC
Mecanismos de coordenação
em rede como definido pela
literatura
Instrumentos adotados pelo PAC
Sistema de gestão financeira
orientada a resultados,
mas baseada em trocas de
informações do andamento
das políticas
Em termos de gestão financeira, podemos dizer que os instrumentos adotados pelo PAC se
assemelham à ideia de pagamento vinculado ao atingimento de metas, mas baseado em acordos e
informações estabelecidas entre os diferentes agentes.
Na medida em que o empenho dos recursos do PAC depende de aprovação por parte da Sepac –
que, por sua vez, recebe informações dos diferentes ministérios –, podemos dizer que há repasse
baseado em alcance de resultados, mas estes são acordados e estabelecidos ao longo do processo
de monitoramento.
Aprendizado interorganizacional (rotatividade
de funcionários, trocas de
experiências etc.)
A atuação dos analistas de infraestrutura nos diferentes ministérios – bem como a seleção de
técnicos de órgãos de infraestrutura e de gestores de carreira (EPPGGs) –, com o objetivo de
ocupação de cargos na Sepac e nos ministérios setoriais, reforça a ideia de que há investimento no
aprendizado interorganizacional. Este se constitui não apenas pela troca formal de servidores entre
órgãos, mas também pelas trocas informais de experiências e informações potencializadas pelas
redes sociais dos indivíduos das diferentes carreiras e organizações.
Existência de instrumentos
procedimentais e manuais
para consulta e sua obrigatoriedade
Há diferentes instrumentos normativos no caso do PAC: desde aqueles previstos anteriormente
para esse programa e obrigatórios a toda a administração pública até aqueles vinculados diretamente à gestão do programa. Com relação aos primeiros, podemos citar a normatização em termos
de compras no setor público (licitações) e a para licenciamento dos projetos. Em ambos os casos,
há alta normatização, com existência de instrumentos procedimentais e manuais obrigatórios e
com alta obrigatoriedade e padronização. Esses instrumentos são aderentes à lógica de coordenação hierárquica. No entanto, estes não são nem criados pelo PAC nem exclusivos do programa.
No que concerne ao segundo, o PAC cria procedimentos internos para alimentação de sistemas,
para realização de reuniões etc. Mas pode-se dizer que há um grau considerável de liberdade em
termos de planejamento e gerenciamento das obras no que concerne à gestão do programa. As
características de gerenciamento estão mais relacionadas às características da obra e do setor do
que ao programa em si. Nesse caso, pode-se afirmar que há menor obrigatoriedade e capacidade
de enforcement dos procedimentos do PAC do que dos demais procedimentos existentes, o que
caracteriza estes como concernentes ao mecanismo de rede.
(Continua)
33
Brasília, Novembro de 2016
(Continuação)
Mecanismos de coordenação
em rede como definido pela
literatura
Instrumentos adotados pelo PAC
Estabelecimento de funções
ou entidades de coordenação
Na lógica de funcionamento do PAC, há o estabelecimento de diferentes funções e entidades de
coordenação. É o caso, por exemplo, do Comitê Gestor de Monitoramento e do Grupo Executivo.
Embora sejam formalizadas por decreto, essas funções e entidades não têm hierarquia formal, na
medida em que são compostas por ministros que devem “coordenar” outros ministros. Estas dependem, portanto, de uma autoridade prática, e não hierárquica, que recai na ideia de mecanismo
de rede.
Sistemas para trocas de
informações
O PAC criou diversos sistemas para trocas de informações, o que potencializa sua capacidade de
coordenação em rede. Podemos citar, entre estes, o próprio SisPAC e as salas de situação.
Entidades coletivas para
tomada de decisão
O PAC também se baseia na construção de entidades coletivas para tomada de decisão em seus
diversos níveis hierárquicos. Desde a constituição do Comitê Gestor de Monitoramento e Grupo
Executivo – ambos formados por ministros – até as salas de situação, há um conjunto de espaços
formalizados para tomada de decisão coletiva, o que é característico da ideia de coordenação em
rede.
Elaboração dos autores.
Como se pode notar pelas informações anteriores, o investimento em termos
de coordenação do PAC está voltado ao uso basicamente de instrumentos vinculados
aos mecanismos de coordenação em rede. Estes se dão pela construção de ambiente de
compartilhamento de ideias e objetivos comuns, bem como pelo estabelecimento de
valores coletivos em prol das políticas a serem coordenadas. Além disso, baseiam-se na
troca de informações e em sistemas de enforcement relativamente frouxos, na medida em
que dependem de adesão não contratualizada nem hierárquica, mas construída a partir
de reputação, prestígio e decisões conjuntas.
Para tanto, no caso do PAC, o papel prioritário do programa e das obras e sua
vinculação próxima à presidência desempenham papel fundamental. Para além de funcionarem como espaços de tomada coletiva de decisão, os comitês com participação de
ministros e presidente funcionam como espaços para determinação de diretrizes gerais
que orientam as ações coletivas a serem coordenadas pela Sepac. Há, nesse processo,
priorização e empoderamento das ações determinadas pela Presidência e que dão respaldo
institucional para as atividades de articulação dos atores da secretaria. É nesse sentido que
as salas de situação se tornam espaços legitimados para que os atores da Sepac possam,
em conjunto com atores de outros órgãos, cobrar ou encaminhar ações.
Além da legitimidade construída em nível central, o PAC vale-se também de
processos de construção de ambiente de priorização e legitimação de suas ações, seja
em nível discursivo (determinação do que é prioritário para o governo), seja em nível
prático – como liberação agilizada de recursos, facilitação de procedimentos legais e agilidade em processos. Esses elementos acabam se constituindo em incentivos para adesão
34
Texto para
Discussão
2 2 5 3
Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
ao programa e a seu modus operandi, na medida em que se transformam em vantagens
concretas para os ministérios setoriais. Isso, por sua vez, é vinculado à elaboração de
ambiente de alta cobrança e de construção de incentivos para adesão. Estabelecimento
de prioridades, construção de atores e setores de prestígio e legitimidade, bem como
cobrança e disponibilização de incentivos à adesão acabam sendo os ingredientes para
a construção de acordo tácito em prol da governança por parte da Sepac, que se torna
instância ao mesmo tempo facilitadora e com capacidade de enforcement.
Esses mesmos ingredientes, no entanto, não têm grau de institucionalização e
permanência suficientes para que possam ter continuidade independentemente da
conjuntura. Como acontece em geral com os mecanismos de coordenação em rede,
estes dependem de processo constante de reforço e reconstrução de acordos, narrativas
e compromissos, na medida em que sua sustentação está baseada na adesão “voluntária”
de atores. Isso se pode observar mais claramente em cada uma das três dimensões de
coordenação, analisadas em maior profundidade a seguir.
5.2 Investimentos em infraestrutura territorialmente cegos
Boa parte dos problemas verificados nas formas de coordenação que impactam o desempenho dos projetos e obras de infraestrutura deriva do fato de que essas iniciativas
são, em sua maioria, territorialmente cegas. Isto é, veem os territórios como meros
espaços que irão receber investimentos. As características locais são tomadas em conta,
via de regra, no que diz respeito à necessidade de identificar eventuais impactos negativos dessas obras e que precisam ser objeto de ações compensatórias ou mitigadoras,
de forma que não impliquem restrições à realização da obra; ou, em outros termos, e
para utilizar o jargão do meio empresarial, para “destravar o empreendimento”. Um dos
principais gestores entrevistados para o projeto confirma essa percepção ao afirmar que
os processos de licenciamento deveriam acontecer antes da contratação das obras. Porque muitas vezes problemas identificados nos estudos de impacto demandam soluções
que não cabem no escopo do contrato já existente. Assim, cria-se uma dissonância entre
o diagnóstico dos aspectos negativos compreendidos na obra e o tipo de alternativa que
se pode adotar, o que resulta em potenciais conflitos que frequentemente acarretam
atrasos ou encarecimento dos projetos.
Os trabalhos de Berdegué (2013; 2014) têm enfatizado esse traço de muitas
políticas setoriais (seu caráter espacialmente neutro) sob o ângulo dos efeitos indiretos
ou não antecipados. Essa ideia se pode aplicar à gestão de conflitos. A não identificação
prévia das características sociais dos territórios e a ideia subjacente de que um mesmo
35
Brasília, Novembro de 2016
modelo de projeto ou de investimento deveria funcionar da mesma forma em lugares
com identidades e condicionantes locais tão diversos são características comuns nos casos
analisados, com exceção do BRT/DF – que já constava do plano diretor local, do qual
se pode inferir algum grau de aderência – e da UTE Candiota, cujas características são
coerentes com traços marcantes da economia local. Nos demais casos, simplesmente se
desconsideram os variados graus de coerência que cada obra tem com os interesses locais.
E, como se verá a seguir, é justamente essa maior ou menor aderência e coerência entre o
projeto da obra e o tecido social e econômico dos territórios o que desencadeia processos
de contestação que muitas vezes ocasionam atrasos e aumento de custos.
De forma um tanto esquemática, mas útil à ilustração do argumento referido
anteriormente, pode-se dizer que há três situações distintas nos casos analisados.
Na primeira situação, estão aqueles empreendimentos que tiveram um grau
relativamente baixo de contestabilidade, o que gerou, portanto, um volume de ações
igualmente pequeno – sempre em termos comparativos aos demais casos, obviamente –
de medidas voltadas a seu equacionamento. Estão nessa situação, por exemplo, a UTE
Candiota e o BRT do Distrito Federal. Nesses casos, é evidente a alta aderência das
obras às características e aos interesses do tecido social local, somando-se a uma menor
complexidade das obras quando comparadas a outras analisadas. A UTE Candiota é um
empreendimento com alta aderência à região onde esta se instala, marcada pela produção
do carvão como um dos vetores econômicos mais importantes e pela existência prévia
de outros empreendimentos similares. Em tal contexto, não há surpresa em ver que os
atores locais e as instituições não seriam refratários a um investimento com essas características. Eventuais problemas decorrentes, como os impactos ambientais, são, assim,
mais facilmente absorvidos porque encontram contexto marcado pela permeabilidade a
esse tipo de conflito. O BRT/DF, igualmente, atendeu a uma demanda local. Em certo
sentido, sua existência beneficia moradores e empreendimentos. Os poucos problemas
verificados são mais facilmente tratados porque não se inscrevem em um quadro de
contestação do sentido do empreendimento, mas de aspectos relativamente laterais de
sua execução.
Em outro extremo, estão os empreendimentos marcados por alto grau de contestabilidade, caso típico da Ferrovia Transnordestina. Além de se tratar de empreendimento
que envolve uma gama maior e mais complexa de atores (dezenas de municípios e vários
governos estaduais, além de indivíduos e empresas), os impactos positivos da obra estão
longe de serem homogêneos. O propósito principal do empreendimento é o escoamento da produção para os principais portos do Nordeste. Como consequência, a maior
36
Texto para
Discussão
2 2 5 3
Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
parte dos municípios da vasta região que se situam entre esses dois polos (o produtor
e os portos – estes, sim, diretamente beneficiados) simplesmente arca com prejuízos
decorrentes da obra, como deslocamento de atividades produtivas e locais de moradia,
fragmentação de unidades agropecuárias e alterações na paisagem. Não faziam parte do
planejamento do empreendimento formas de amplificar os benefícios do negócio para
essas localidades, apenas formas de compensação e mitigação de impactos. Não se trata
de querer que a empresa responsável pela obra de engenharia assuma custos de projetos
complementares voltados a ampliar ou gerar formas de aproveitamento de possíveis
externalidades criadas com a obra. Consiste, isso sim, em evidenciar que a identificação
e a definição, pelo Estado, do tipo de investimento em infraestrutura a ser feito e a previsão – ou não – de coordenação com projetos de desenvolvimento territorial afetam a
geração de benefícios indiretos para a economia e a população local e, por extensão, têm
igualmente influência sobre o grau de contestabilidade ao empreendimento. Além disso,
também aqui boa parte das negociações com entes envolvidos se fez após a elaboração
do projeto original, sem pactuação prévia. Como seria de se imaginar, o resultado foi
um processo absolutamente errático de revisões de projeto, bem como renegociações,
com enormes atrasos e redimensionamento dos custos envolvidos.
O caso da rodovia BR-163 poderia ser incluído também nesse bloco, com uma
ressalva: nesta obra, os benefícios para o território são vistos pelos atores locais como
ambíguos, pois, de um lado, há impactos ambientais e sociais muito severos – sobretudo
indiretos –, mas, por outro lado, a rodovia serve também à população local e leva a uma
valorização das terras de parte de seus habitantes, diferente da Ferrovia Transnordestina,
que se volta ao transporte de grandes cargas. Disso decorre o fato de haver mais ambiguidade, dividindo a população local e fazendo com que a obra seja vista como algo
importante e necessário, porém com muitas consequências negativas que precisariam
ser equacionadas. Dessa ambiguidade, resultou um longo caminho até o licenciamento
e, agora, até a execução completa da obra.
Em situação intermediária estão casos como a UHE Teles Pires. Ali, a obra não
tem alta aderência aos interesses da população local porque se trata da geração de energia
para a rede de distribuição. Isto é, atende prioritariamente a uma demanda do sistema de
energia do país. Tanto é que, segundo informações obtidas, a opção tecnológica adotada
prioriza a alimentação do sistema nacional e praticamente impede o acesso local à energia
gerada. Seria errado dizer que não houve contestabilidade nesse caso e que os impactos
ambientais e sociais são menos severos. Mas parece ser correto dizer que a percepção
desses impactos e, sobretudo, a constituição de atores coletivos capazes de verbalizar e
amplificar tais impactos para a esfera pública são mais restritas ou de menor repercussão
37
Brasília, Novembro de 2016
que nos casos mencionados no parágrafo anterior. Parte disso se deve ao maior peso
de grandes propriedades fundiárias, em vez de um mosaico de populações tradicionais,
pequenos municípios e agricultores de pequeno porte, como nos casos anteriores. Outra
parte se deve ao caráter mais localizado da obra. E há ainda de se considerar que esse
empreendimento em especial compõe um conjunto de cinco obras previstas. Com tudo
isso foi possível aos gestores encontrar formas mais rápidas de encaminhamento dos
conflitos, algumas vezes direcionando os conflitos potenciais ou expressos para as obras
futuras, que serão objeto de novos processos de licenciamento.
Esses problemas – aqui elencados e associados ao fato de que os territórios são
tomados como passivos, e não como ativos – não podem ser atribuídos a uma falha no
arranjo constituído para a gestão do PAC, programa ao qual se vinculam essas obras.
Isso porque, nos casos mencionados, este herdou as obras que haviam sido desenhadas
e planejadas em momento anterior. Mas resta evidente que o fato de se ter um planejamento das propostas territorialmente cego impactou negativamente a capacidade de
antecipação da contestabilidade. Diante disso, os projetos e o arranjo de coordenação
equivocadamente acreditam que as instâncias constituídas para atuar no processo de licenciamento das obras seriam suficientes para promover a absorção e o encaminhamento
dos conflitos (comitês de gestão de recursos hídricos, ritos de licenciamento ambiental
e medidas derivadas). Ocorre, todavia, que esses espaços e ritos se constituíram praticamente há três décadas, e, de lá para cá, os dilemas da participação complexificaram-se.2
Finalmente, espera-se também que os entes federativos se vinculem à iniciativa por meio
desses espaços constituídos, aspecto que é tratado na próxima subseção.
5.3 A presença marginal da coordenação federativa
A análise dos casos selecionados permite afirmar que, na maioria das vezes, a coordenação vertical aparece como dimensão marginal.3 Se em parte isso é em razão da afirmação
anterior, de que os investimentos tomam os territórios como elemento passivo, em parte
também deve ser atribuído à própria dinâmica de atuação do governo federal. Diversas
pesquisas têm demonstrado que, ao longo dos últimos anos, ocorre um processo de
2. Ver a respeito o estudo conduzido por Rebecca Abers no âmbito desse projeto de pesquisa e dedicado exclusivamente
ao tema da participação (Abers, 2015). Para uma visão crítica da experiência brasileira de licenciamento ambiental em
contraste com experiências internacionais, ver Piagentini e Favareto (2014).
3. Não há, nos casos analisados, evidências da participação de entes locais na formulação ou gestão das obras. Nada
nesse sentido foi encontrado nos relatórios de casos produzidos pela pesquisa para subsidiar as análises temáticas como
a empreendida neste trabalho, nem nas entrevistas realizadas como complemento a esse subsídio inicial ou em outros
materiais correlatos.
38
Texto para
Discussão
2 2 5 3
Os Arranjos Institucionais dos Investimentos em Infraestrutura no Brasil: uma análise sobre seis grandes projetos
do Programa de Aceleração de Crescimento
(re)centralização de políticas nesse governo (Arretche, 2012; Oliveira e Lotta, 2014).
Esse movimento, que já era evidente no caso das políticas sociais, fica também claro ao
olhar-se para as políticas de infraestrutura. A constatação da baixa capacidade institucional dos municípios – somada ao projeto de desenvolvimento nacional da Presidência da
República – tem feito com que o governo federal assuma papel não apenas indutor, mas
também de executor de políticas públicas até mesmo no plano local, em que a atuação
de outros entes federativos poderia ser maior.
O papel de protagonista do governo federal é ainda mais forte no caso das políticas
de infraestrutura, especialmente nas situações relacionadas a obras de energia. Nesses
casos, nos termos utilizados pelos gestores do PAC, a definição sobre a melhor localidade
das obras é determinada por questões naturais – especialmente geográficas –, de forma
que cabe pouco espaço para negociação prévia com os entes federativos sobre a realização das obras. Essa evidência está presente em praticamente todos os casos analisados,
nos quais, até mesmo quando a política foi originalmente proposta pelo município
– como no caso da UTE Candiota –, o governo federal passa a assumir praticamente
toda a responsabilidade pela regulamentação, pelo financiamento, pela execução e pelo
monitoramento das obras. Cabe aos municípios, quando muito, papéis específicos e
relativamente marginais, como o de conduzir as desapropriações, a exemplo do ocorreu
com a Ferrovia Transnordestina. Mas ambos os entes federativos (municípios e estados)
são pouco envolvidos nos processos decisórios mais relevantes do planejamento e da
implementação das obras.
A relação com os municípios e os estados aparece também – e na maioria das
vezes – quando, em primeiro lugar, há problemas a serem resolvidos a posteriori ou, em
segundo lugar, na ocasião de o governo federal, por iniciativa paralela à gestão da obra,
optar por realizar outras ações na região, buscando suprir um deficit histórico do Estado
com a população local.
Com relação à primeira situação, o caso da Transnordestina, relatado por Sousa
e Pompermeyer (2015), demonstra como pode ocorrer articulação a posteriori para
resolução de problemas não antevistos. Os autores dissertam a respeito do exemplo de
Barragem do Serro Azul, construída pelo governo do estado de Pernambuco, que provocou uma readequação do traçado da rodovia pela troca de informações entre o projeto
da Transnordestina e os estados e municípios afetados. Também pode ser citado o caso
do Metrô de Salvador, cuja falta de integração entre os entes federativos levou à elaboração de um plano de operação do metrô que envolvia os governos estadual e federal,
39
Brasília, Novembro de 2016
enquanto o município de Salvador criou um plano de ônibus que gerou problemas de
operação entre ambos e um processo de integração com elaboração também apenas a
posteriori (Sousa e Pompermeyer, 2015).
Com relação à segunda situação mencionada, quando o governo federal atua com
projetos paralelos, pode-se citar o caso da implementação de equipamentos de saúde
indígena na região de Teles Pires, ou das capacitações a municípios para acessarem recursos federais, como também ocorreu com os municípios daquela região. Mas, até mesmo
nesses casos, o governo federal ainda aparece como ator protagonista, e os governos
municipais, como receptores das ações pouco articuladas previamente.
Em apenas uma situação a relação entre entes federativos aparece de forma mais
contínua e aprofundada: o caso do BRT/DF. Esse caso, no entanto, ao menos em parte,
pode ser explicado pela própria proximidade física da obra em relação ao governo federal.
Ainda assim, serve como contraponto aos demais casos e demonstra que um processo de
coordenação vertical mais bem estabelecido potencializa a execução da obra e diminui
os conflitos. Vale ressaltar que, no caso do BRT/DF, o processo de coordenação também
se diferencia dos demais, visto que ali é a Caixa Econômica Federal quem exerce o papel
fundamental que permite a articulação vertical por meio de seus mecanismos próprios
de coordenação. Para tanto, a CEF constituiu um grupo de coordenação que envolve os
mais diversos atores relacionados à obra, incluindo-se gestores municipais, e os relatos
sobre a experiência creditam à própria articulação do banco parte de seu sucesso. Ou
seja, mais uma vez, essa experiência – por ser diferente das demais – reforça os problemas existentes com relação ao processo de coordenação federativa na gestão das obras.
Essa baixa articulação vertical encontrada em quase todos os casos traz pelo menos três consequências negativas para a gestão das obras: compromete a capacidade de
desenhar ações mais adequadas aos territórios; sobrecarrega a atuação do governo federal
na gestão dos investimentos – o que pode, por sua vez, comprometer a qualidade, o
tempo de entrega e a previsão de custos –; e dificulta a competência do governo federal
de antever e resolver problemas.
5.4 Uma coordenação intersetorial a posteriori e reativa
De forma similar aos problemas de coordenação federativa, a coordenação intragovernamental ou intersetorial nos casos em questão revela-se igualmente restrita e limitada.
Como foi dito anteriormente, essa coordenação pode ser analisada pelo grau de integração
40
Texto para
Discussão
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do Programa de Aceleração de Crescimento
das políticas nos diferentes momentos do ciclo – isto é, na formulação, na implementação, no monitoramento e na avaliação dos projetos de infraestrutura.
No caso das obras analisadas, podem-se perceber dois avanços bastante limitados
com relação à intersetorialidade. O primeiro diz respeito ao processo de licenciamento
e o segundo, ao processo de monitoramento das ações.
Com relação ao licenciamento, nos últimos anos, tem havido uma mudança normativa que aproxima cada vez mais a dimensão de licenciamento ambiental da inclusão
de aspectos culturais e sociais. Isso acaba gerando integração entre diferentes órgãos
no processo – como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (Ibama); o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
(patrimônio imaterial); a Fundação Nacional do Índio – Funai (populações indígenas); e
a Fundação Palmares (comunidades quilombolas), – que, conjuntamente, são envolvidos
no processo de concessão das licenças para as obras.4 Esse é, sem dúvida, um avanço na
dimensão da intersetorialidade, embora se atenha à dimensão do licenciamento.
O segundo avanço está relacionado à realização de monitoramento intragovernamental. A análise dos casos demonstra que, na grande maioria das vezes, há enfoque muito
grande de intersetorialidade no processo de monitoramento, fruto do desenho do PAC.
Salas de situação, grupos de trabalho e outros instrumentos são fortemente utilizados para
tentar garantir a execução razoável dos investimentos. Mas isso não se observa no momento de formulação das políticas, quando acontece seu planejamento. Exceção é o caso
da Ferrovia Transnordestina, em que houve articulação de diferentes ministérios desde o
processo de planejamento da obra (Ministério da Integração Nacional – MI, Ministério
dos Transportes, Portos e Aviação Civil – MT e MF). Nos demais casos, não há relatos de
processos de coordenação prévios à implementação da obra. O não envolvimento desses
atores na formulação faz com que a coordenação intragovernamental ocorra sempre
reativamente aos problemas, praticamente bloqueando a possibilidade de que eles sejam
adequadamente previstos ou considerados na etapa de planejamento, o que poderia permitir sua gestão antecipada.
Até mesmo em casos em que a gestão do PAC buscou integração com outros órgãos, isso aparece a reboque e, muitas vezes, em questões desconectadas da obra em si.
4. Esses processos de coordenação intragovernamental do licenciamento estão regulamentados pela Portaria Interministerial no 419/2011, revisada pela Portaria Interministerial no 60/2015.
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É o caso, por exemplo, da articulação que tem sido feita pela Coordenação de Energia
Elétrica e Petróleo e Gás do PAC para viabilização de ações complementares no entorno
das obras como Teles Pires. Nesse caso, a secretaria responsável pela gestão do programa
no MP realizou articulações com o Ministério da Saúde (MS) e o Ministério das Cidades
(MCidades) para realização de obras complementares no entorno das obras, como a casa
de saúde indígena – apontada anteriormente –, as reformas de aeroportos e o levantamento de deficit habitacional. Essas articulações, no entanto, não estão relacionadas
ao processo de planejamento ou implementação das obras em si, mas dizem respeito a
uma tentativa do governo federal de redução do deficit histórico na região em questão
e dependem de ação “voluntária” dos gestores do PAC.
Dessa forma, a atuação do PAC como articulador e viabilizador de diálogos entre
os diferentes atores acontece sempre a posteriori, quando “a luz amarela acendeu”, termo
usado por alguns dos gestores desse programa. Claramente, os operadores do programa
exercem papel central na coordenação intragovernamental, por exemplo, por meio do
monitoramento conjunto nas salas de situação antes mencionadas, mas essa sua capacidade de coordenação fica limitada e relativa às dimensões do problema tal como este
se apresenta. Se tivesse sido antevisto, com a extensão da coordenação à etapa anterior,
de planejamento, tal problema poderia não se efetivar ou apresentar maiores chances
de resolução simplificada.
Esse não envolvimento de atores diversos no processo de formulação não se dá por
conta da estrutura atual de funcionamento do PAC, mas pelo próprio processo de seleção
de obras, cujos contornos principais, como já se disse anteriormente, se encontravam
previamente definidos. Ou seja, muito embora os gestores do programa articulem “a
construção de mecanismos de comunicação, articulação e coordenação entre os diversos
atores envolvidos para produzir complementaridades e reduzir contradições entre os
diferentes segmentos do Estado” (Pires, 2015), essa articulação estará necessariamente
fadada a ter seu potencial limitado pela forma como as obras entram na esfera de gestão
do PAC.
Outro elemento importante diz respeito aos mecanismos para promoção da
coordenação. No caso de quase todas essas obras envolvidas no PAC, a coordenação se
dá dentro da lógica da operação do programa, isto é, na lógica das salas de situação e
sistemas de monitoramento. A exceção dá-se no caso do BRT/DF e do Metrô de Salvador, nos quais há estrutura de coordenação paralela promovida pela CEF e presente
em todas as obras do MCidades.
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Pires, ao analisar o processo de articulação conduzido pelos gestores do PAC,
(...) sugere que esses agentes atuem como nós de uma rede de informações para monitoramento
e construção de capacidades. Esse termo pretende dar conta de três elementos centrais para a
compreensão da operação cotidiana do PAC: (a) a ideia de rede evoca a importância de interações
pessoais, as quais perpassam fronteiras organizacionais no interior do governo, mas não necessariamente respeitando estruturas e protocolos hierárquicos típicos da burocracia federal; (b) o
complemento “informação” designa o objeto primordial dessas interações entre agentes situados
lateralmente (órgãos do governo) e acima, no eixo vertical, até o Comitê de Ministros (CGPAC)
e a Presidência da República; (c) por fim, as ideias de “monitoramento” e “construção de capacidades” se referem às finalidades e usos das informações transacionadas na rede, nos seus eixos
vertical e horizontal (Pires, 2015, p. 203).
Se, por um lado, essas constatações reforçam a importância dos operadores do
PAC e de suas redes para fazer a coordenação acontecer, por outro, as constatações também demonstram que boa parte do processo de articulação é baseada em uma lógica de
mecanismos de rede5 em parte de maneira combinada com mecanismos de hierarquia
informais. Relembrando-se o que já foi colocado anteriormente, os mecanismos em rede
dependem da colaboração voluntária e da solidariedade entre os atores, de forma que
estes se envolvem baseados em identidade, confiança, reciprocidade e compartilhamento
de objetivos (Bouckaert, Peters e Verhoest, 2010; Pires e Gomide, 2014). Já os mecanismos de hierarquia são relativos à atuação hierárquica em uma cadeia de comando.
Nesse caso, no entanto, essa cadeia de comando se dá de maneira relativamente informal,
dependente de acordos mútuos e de determinação do próprio presidente, visto que o
poder hierárquico esteve nas mãos da Casa Civil (segunda gestão Lula) ou do MP (gestão
Dilma) e, em ambos os casos, não há formalmente hierarquia entre esses ministérios
e os demais da Esplanada. Assim, o processo de enforcement dá-se pela construção de
uma autoridade por parte da Presidência, e não pela existência formal de estruturas de
distribuição de poder organizacionais. Em ambos os casos, seja no uso dos mecanismos
de rede, seja no uso dos mecanismos de hierarquia informais existentes, pode-se afirmar
que a capacidade de promover coordenação depende do comprometimento mútuo entre atores diferentes, estimulado pela atuação dos operadores do PAC, mas não apenas
disso, já que a capacidade de enforcement é limitada. Ou, como afirma um operador do
programa, “a gente faz essa articulação, mas não define o que será feito”.
5. Bouckaert, Peters e Verhoest (2010) apontam como algumas das ferramentas dos mecanismos em rede o uso de sistemas de informação com trocas de informações e os espaços para tomada de decisão coletiva; ferramentas essas existentes
no caso do PAC.
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Nessa direção, frequentemente se ouve de pesquisadores e gestores do programa que
o sucesso nas tentativas de dar agilidade à resolução de problemas é atribuído a características pessoais de burocratas envolvidos nos processos de gestão. Esses burocratas teriam
legitimidade, conhecimento ou um capital de relações que lhes permitiria mobilizar os
recursos necessários à adoção de boas soluções. Isto é, não se devia a procedimentos, mas
a recursos mobilizados em rede. Por sua vez, é inegável que, por tratar-se de programa
absolutamente prioritário para o governo federal, há alguma transferência de autoridade
embutida no exercício da função, e esses burocratas seriam vistos como portadores da
vontade presidencial. Disso advém a afirmação de que se trata da combinação dos dois
elementos (rede e hierarquia), mas com predominância do primeiro.
Em síntese, à medida que os atores que podem viabilizar ou inviabilizar a obra não
foram envolvidos nos processos prévios de decisão, o comprometimento para atuação
conjunta pode ser mais ou menos fácil, a depender do conteúdo das decisões a serem
tomadas e do tanto que os atores precisarão “ceder” para chegar a acordos. Tem-se, assim,
a configuração de processos de coordenação que tendem a ser complexos, na medida
em que os atores são envolvidos a posteriori, muitas vezes em situações reativas, em que
o problema já está instalado e com baixa capacidade de enforcement.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa partiu da hipótese geral de que arranjos institucionais são importantes
para explicar o sucesso ou o fracasso das obras de infraestrutura, considerando-se que
as características dos arranjos contribuiriam para a efetivação da coordenação entre
diferentes atores, o que, por sua vez, impactaria os processos decisórios e, consequentemente, os resultados da gestão desses projetos de investimento. Para testar essa hipótese, analisaram-se os arranjos de seis diferentes projetos tomando-se em conta três
diferentes dimensões: intersetorialidade (coordenação intragovernamental), relações
federativas (coordenação intergovernamental) e relações com o território onde são realizados os investimentos. Desde os resultados encontrados, é possível formular algumas
considerações a título de balanço da hipótese inicial.
O aspecto mais importante a se destacar é a confirmação dessa importância das
formas de coordenação postas em prática por meio dos arranjos institucionais para o
desempenho dos investimentos em infraestrutura. No que diz respeito à questão territorial, deve ter ficado claro que – apesar dos impactos locais – a maior parte dos projetos
pode ser considerada territorialmente cega, pois estes são desenhados tomando-se os
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municípios e as regiões como passivos, meramente recebendo investimentos. Se fossem
consideradas afirmativamente as especificidades dos territórios, parte significativa dos
problemas que posteriormente implicam atrasos poderia ser contornada, praticando aquilo
que a literatura chama de gestão antecipada da contestabilidade. No que diz respeito à
coordenação vertical, procurou-se demonstrar como esta acontece de forma marginal
nas obras analisadas, seja por não se tomar os territórios como parte ativa da formulação dos projetos, seja pela própria dinâmica de atuação do governo federal, marcada
por certo grau de centralização, especialmente no caso dessas obras de infraestrutura. A
consequência aqui é a limitação na capacidade de desenhar os investimentos com maior
aderência aos territórios aos quais se destinam e a sobrecarga para os gestores federais no
acompanhamento desses investimentos. No que concerne à coordenação intragovernamental – ou intersetorial –, finalmente, esta também ocorre de forma restrita. É central
no monitoramento, mas limitada justamente por ater-se a essa etapa do ciclo, quando
deveria dar-se desde o momento de formulação e planejamento das obras. Sem isso, a
coordenação ocorre sempre de forma reativa aos problemas, o que tem consequências
para o escopo de soluções possíveis, com repercussões em termos de tempo e custos das
obras. Além disso, viu-se que – quando se estabelece – essa coordenação se vale do que a
literatura qualifica como mecanismos de rede, baseados em adesão relativamente voluntária e cooperativa de diferentes atores, de forma combinada com mecanismos baseados
em hierarquia informal, o que pode não apenas garantir solidez no caso de adesão firme,
mas também comportar fragilidades no caso de elos mais frágeis. Em ambos os casos,
no entanto, depende de processo de construção e reforço de uma autoridade prática
(Abers e Keck, 2014), muitas vezes destituída do poder formal para comandar, mas que
se legitima pela dinâmica de poder existente atualmente no governo federal – no qual
as obras assumem caráter prioritário – e no empoderamento estabelecido e reforçado
cotidianamente pelo chefe do Poder Executivo.
O segundo aspecto a se destacar é que parte dos problemas de coordenação verificados guarda correspondência com o modelo de gestão, apoiado predominantemente no
que a literatura classifica como mecanismos de rede, distintos dos tradicionais mecanismos
hierárquicos ou de mercado. Isso envolve a formação de ambiente de compartilhamento
de ideias e objetivos comuns, que se baseiam não somente na troca de informações, mas
também em sistemas de enforcement relativamente frouxos, na medida em que dependem
de adesão não contratualizada nem hierárquica, mas construída a partir de reputação,
prestígio e decisões conjuntas. No caso do PAC, o caráter de prioridade dos projetos
vinculados ao programa desempenha papel destacado, pois engendra espaços distintos
e singulares de tomada coletiva de decisão. A legitimação dos gestores envolvidos e
seu empoderamento nas salas de situação, espaço fundamental no desenho adotado,
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funcionam como os principais elementos garantidores da eficácia das ações. Além da legitimidade centralizada, o programa adota incentivos como liberação agilizada de recursos,
facilitação de procedimentos legais e celeridade em processos que também se sustentam
na priorização. Esses ingredientes e outros mencionados no corpo do texto, no entanto,
não têm grau de institucionalização e estabilidade suficientes que garantam continuidade
independentemente de mudanças conjunturais. De forma comum, em situações apoiadas
em mecanismos de coordenação em rede, há fragilidade decorrente da necessidade de
constante reforço e reconstrução de acordos e compromissos, já que sua sustentação se
baseia na adesão “voluntária” de atores e em interações fortemente pessoalizadas.
Por fim, e esse é o terceiro aspecto crucial a se destacar, parte expressiva dos problemas de coordenação enfrentados por meio dos arranjos institucionais está relacionada
a aspectos que se originam antes do momento da gestão propriamente dita. Isto é, há
processos, situações e conflitos que se constituem no momento do planejamento. Como
também apontam Sousa e Pompermeyer ao analisarem esses casos,
a dificuldade de coordenação governamental entre as etapas de avaliação, planejamento e análises
de viabilidade técnica, econômica e ambiental amplia as incertezas e tem impactos significativos
sobre a execução dos projetos. Boa parte dos problemas encontrados na fase de implementação
dos projetos tem apontado falhas no planejamento como causas principais. De fato, diversos atrasos nos licenciamentos ambientais ocorrem por estudos ambientais incompletos, superficiais, ou
mesmo omissão de impactos ambientais relevantes. Conflitos fundiários poderiam ser previstos
na fase de planejamento. O mesmo pode ser dito quanto a impactos sociais negativos dos projetos. Até mesmo limitações nas ofertas de serviços de engenharia e construção deveriam ser levadas
em conta durante a fase de planejamento (Sousa e Pompermeyer, 2015).
No caso específico do PAC, os projetos foram herdados pelo programa. Não se
pode, portanto, atribuir ao arranjo neste estabelecido a responsabilidade por parte dessas
falhas e dos prejuízos que estas acarretam à execução dos investimentos. Disso decorre a
necessidade de vincular o tema dos arranjos institucionais de coordenação ao tema das
capacidades estatais. Uma nova geração de projetos de infraestrutura precisa não apenas
aperfeiçoar os arranjos de coordenação, como indicado no parágrafo anterior, mas também
ampliar esses arranjos já para a fase de formulação dos projetos, para o planejamento,
como destacado aqui. Isso implica rever tanto a estrutura de coordenação pensada para
a gestão das obras quanto a própria legislação que determina seu planejamento.
A afirmação feita anteriormente não deve ser interpretada como constatação de
que os problemas verificados são herdados e não dizem respeito ao PAC. Esta precisa ser
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considerada combinadamente com a conclusão principal apresentada anteriormente e
que diz respeito aos problemas internos de coordenação do programa. O resultado de
ambas é a constatação de que as falhas de coordenação identificadas são agravadas pela
inércia e pelo caráter cumulativo dos problemas que se verificam desde o momento da
concepção estratégica e do planejamento dos projetos. Logo, o aperfeiçoamento dos
arranjos institucionais envolve, inseparavelmente, aspectos internos ao desenho do
PAC e aspectos relativos à sua inserção no desenho dos mecanismos institucionais de
planejamento estratégico do Estado brasileiro.
Finalmente, é preciso reconhecer que tudo o que foi dito antes pode importar
menos em certos casos: aqueles em que a complexidade da situação envolvida nas obras
de infraestrutura torna menos decisivo o papel de arranjos robustos. No caso de obras
muito complexas, que envolvem diferentes atores, altos impactos sociais e ambientais e,
portanto, amplo potencial de contestação, o arranjo de coordenação torna-se algo fundamental para a forma como surgem e são tratados os problemas e as contestações que
resultam em atraso ou aumento de custos das obras. Já em situações menos complexas
– pelas características da obra ou do território, ou ainda pela intersecção entre ambos
–, nas quais há potencialmente menor impacto e contestabilidade, o grau de exigência
que recai sobre os arranjos pode ser menor, de forma que estes se tornam condições
menos relevantes para que a obra se efetive. Essas situações, no entanto, tendem a ser a
minoria quando se trata de grandes obras de infraestrutura, razão pela qual é de extrema
importância levar em conta a necessidade de aperfeiçoar os arranjos de coordenação que
podem sustentar eventual nova geração desses projetos no futuro.
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do Programa de Aceleração de Crescimento
APÊNDICE
QUADRO 1
Análise dos empreendimentos a partir das dimensões selecionadas
Projetos
Intersetorialidade no ciclo de políticas públicas
Integração federativa (financiamento, regra e
implementação)
Territórios considerados de forma
ativa ou passiva (tratamento das
especificidades locais, espaços e atores)
BRT/DF
Não houve planejamento
intersetorial.
Não houve envolvimento do governo federal no
planejamento da obra (obra planejada antes da
entrada no PAC).
Território é visto como beneficiário
direto e não conflitivo da obra (melhoria
da mobilidade com impactos positivos
para o bem-estar e a valorização imobiliária e baixo impacto em alteração
do território).
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
coordenação é necessária – e do
grupo de gestão integrada (GGI).
Coordenação promovida pela Caixa
Econômica Federal (CEF) potencializa
o diálogo entre diversos atores
no processo de monitoramento e
implementação.
Financiamento compartilhado entre governo
federal (grande maioria) e contrapartida do
Distrito Federal.
Governo federal faz diretrizes sobre política
nacional.
Mecanismo de coordenação de mercado entre
Distrito Federal e governo federal.
Ocorre por meio de mecanismo
de coordenação em rede (sala
de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade
do órgão gestor do Programa de
Aceleração do Crescimento – PAC).
Metrô de
Salvador
Não houve planejamento intersetorial.
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
a coordenação é necessária.
Mecanismo de coordenação em rede
(sala de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade do
órgão gestor do PAC).
Não houve envolvimento do governo federal no
planejamento da obra (obra planejada antes da
entrada no PAC).
Obra passou de responsabilidade entre entes
federativos.
Ocorre financiamento via convênio entre governo
estadual, CEF e governo federal. Houve anteriormente financiamento via Banco do Brasil (BB).
Governo federal faz diretrizes sobre política
nacional.
Território é visto como beneficiário
direto e não conflitivo da obra (melhoria
da mobilidade com impactos positivos
para o bem-estar e a valorização
imobiliária).
Há baixo impacto em termos de conflitos
socioambientais.
Licenciamento ambiental é nos moldes
tradicionais.
Ocorre por meio de mecanismo de coordenação de mercado entre o Distrito Federal e o
governo federal.
Usina
Termoelétrica (UTE)
Candiota
Não houve planejamento intersetorial.
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
a coordenação é necessária.
Mecanismo de coordenação em rede
(sala de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade do
órgão gestor do PAC).
Não houve envolvimento do governo federal no
planejamento da obra (obra planejada antes da
entrada no PAC).
Municípios e governo estadual têm papel
importante na articulação com governo federal
para viabilização da obra.
Financiamento com captação de recursos externos
via Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobras)
com recursos repassados para a gestora da obra.
Território é visto como beneficiário
da obra pela geração de empregos
permanentes e pelo aumento de
arrecadação.
Empreendimento tem alta aderência
às características do tecido social
local: produção de carvão e energia.
Governo federal faz diretrizes e regulamenta
exploração.
Forças sociais locais participam do
processo de discussão sobre os impactos e as formas de compensação
e mitigação.
Mecanismo de coordenação de rede com entes
federativos.
Há licenciamento ambiental nos moldes
tradicionais.
(Continua)
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Brasília, Novembro de 2016
Projetos
Intersetorialidade no ciclo de políticas públicas
Integração federativa (financiamento, regra e
implementação)
Territórios considerados de forma
ativa ou passiva (tratamento das
especificidades locais, espaços e atores)
UHE Teles
Pires
Não houve planejamento intersetorial.
Ocorre planejamento federal.
Formas de encadeamento entre os
investimentos e as características
do território são menos enfatizadas
que os mecanismos de compensação
e mitigação.
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
a coordenação é necessária.
Mecanismo de coordenação em rede
(sala de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade do
órgão gestor do PAC).
Não houve planejamento intersetorial.
Rodovia
BR-163
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
a coordenação é necessária.
Mecanismo de coordenação em rede
(sala de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade do
órgão gestor do PAC).
Gerou constituição de consórcio intermunicipal
a posteriori.
Há financiamento da Eletrobras.
Governo federal faz diretrizes e regulamenta
exploração.
Ocorre por meio de mecanismo de coordenação
de rede com entes federativos.
Há financiamento via governo federal.
Governo federal tem competência para fazer
diretrizes e explorar diretamente ou por concessão.
Governo federal relaciona-se com municípios
após o início da obra para realizar novas ações
de outras áreas na região.
Atores locais mobilizados negociam
mecanismos de compensação e mitigação.
Há licenciamento ambiental nos moldes
tradicionais.
Há várias etapas e fases no processo
de licenciamento.
Ocorrem ambiguidades na aderência
do empreendimento ao território
(conflitos e benefícios).
Há alto grau de heterogeneidade de
interesses e atores envolvidos.
Existe tentativa – após atrasos – de
fazer do licenciamento da obra um
caso exemplar de negociação de
condicionalidades socioambientais.
Há alto grau de contestação e de
modificações introduzidas no projeto.
Ferrovia
Transnordestina
Planejamento conjunto para desenho do traçado que envolve o
Ministério da Integração (MI), o
Ministério dos Transportes, Portos
e Aviação Civil (MT), o Ministério
da Fazenda (MF) e a Presidência
da República.
Não envolveu demais ministérios
que poderiam abarcar dimensão
dos impactos social, ambiental e
econômico.
Há monitoramento intersetorial por
meio das salas de situação – quando
a coordenação é necessária.
Mecanismo de coordenação em rede
(sala de situação) e de coordenação
hierárquica informal (autoridade do
órgão gestor do PAC).
Elaboração dos autores.
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Houve pouco envolvimento de municípios e
governos estaduais no planejamento da obra.
Há várias etapas e fases no processo
de licenciamento.
Entes federativos ficam responsáveis pelas
desapropriações (parte da execução).
Ocorre aderência parcial do empreendimento ao território – conflitos localizados em certos espaços e benefícios
concentrados em outros.
Há financiamento público – com participação de
bancos e fundos – e da Companhia Siderúrgica
Nacional (CSN).
Governo federal tem competência para fazer
diretrizes e explorar diretamente ou por concessão.
Ocorre por meio de mecanismo de coordenação
de mercado com entes federativos.
Há alto grau de heterogeneidade de
interesses e atores envolvidos.
Há alto grau de contestação e de
modificações introduzidas no projeto.
Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
EDITORIAL
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Capa
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