CARTA
Publicaçãodo
Núcleode
Pesquisaem
Relações
Internacionaisda
Universidadede
SãoPaulo
INTERNACIONAL
ISSN1413-0904
S
Julhode2006-Vol.1,No2
Memória,retornoseconquistas
e “a maré do passado reflui da
roca do presente” e “o futuro nublado carregou o horizonte”, assim
como Odisseu fomos obrigados a trocar
todos os sonhos por um só: recolocar
em circulação a Carta Internacional.
As sereias contam a gloriosa memória
de nossa publicação e desacreditam no
seu ressurgimento. Mas a única forma
de arrancar a frágil existência da dura
natureza é trabalhar o presente, para
sobre ele erguer o futuro. Afinal de
contas, nenhum imigrante, nenhum
desterrado, ninguém que luta pela sobrevivência, pode ser nostálgico, pois
“a promessa do retorno é o engano por
onde o passado captura o saudoso”.
Obedecemos a Odisseu, o herói errante, fizemos o caminho da obediência
e do trabalho, sobre o qual a satisfação
“reluz apenas como miragem, como be-
leza esvaziada de força”. Movidos pela
sonho de reeditar a Carta Internacional,
remamos olhando somente para frente
e deixamos para trás e para o lado o
que ficou para trás e para o lado. Valeu
a pena?
Sim. A volta, quando bem planejada
e a tempo certo, resulta em conquistas.
E, felizmente, a Carta Internacional
não foi a única volta nem a única conquista do NUPRI nos últimos meses.
Voltaram ao NUPRI os cursos livres de
difusão cultural, que se iniciaram com
o curso “Cooperação Internacional ao
Desenvolvimento”, um sucesso coordenado pelo Prof. Bruno Ayllón Pino.
Voltou a ser publicada a coleção Sessenta
Anos de Política Externa Brasileira, que
estava esgotada há muitos anos apesar
da demanda do público, que permaneceu reconhecendo sua qualidade.
Voltam os grandes projetos de pesquisa, iniciando-se com o Observatório de
Política Externa dos Estados Unidos
para América Latina (OPEXA), coordenado pelo Prof. Rafael Villa.
O retorno da Carta Internacional
foi recebido com inúmeras manifestações de congratulações e de apoio, de
leitores e autores que nos acompanhavam desde a fase anterior, e de novos
colaboradores que acreditam em nosso esforço de construir um publicação
que trata da política internacional com
um enfoque singular. Agradecemos aos
nossos fiéis colaboradores, que teceram
suas contribuições na esperanca de
nossa volta. Aos antigos e novos leitores
somos também muito gratos.
A todos esperamos que tenham uma
boa leitura,
Os Editores
SUMÁRIODESTAEDIÇÃO
3|Não-proliferaçãoeconflitonuclear
LuizA.P.SoutoMaior
6|AméricadoSul:rumoàdesintegraçãopolítica
eàfragmentaçãoeconômica?
PauloRobertodeAlmeida
11|Venezuela-Brasil:unarelacióngeoestratégica
privilegiada
AlejandroMendibleZurita
24|Subordinación,másqueamistadenlas
relacionesColombia-EstadosUnidos
MariadelPilarOstosCetina
30|AconjunturaatualnoOrienteMédio:uma
visãoisraelense
SamuelFeldberg
35|HumanSecurity:aparadigmcontradictingthe
nationalinterest?
RobertSchütteeTalitaYamashiroFordelone
41|RobertMcNamaracomoumteóricodorealismo
modernonasrelaçõesinternacionais
RodolphoTalaisysBernabel
48|DeHavanaaDoha:osistemamultilateralde
comércioemperspectivahistórica
IvanTiagoMachadoOliveira
59|Aeconomiapolíticainternacionalentreo
regionalismoeomultilateralismo
ElóiMartinsSenhoras
69|Cooperaçãointernacionalparaofimdapobreza
BrunoAyllón
Volume1–Número2–Julhode2006
ISSN1413-0904
Carta Internacional é uma revista eletrônica quadrimestral dedicada ao debate sobre as questões mais relevantes das
relações internacionais na perspectiva brasileira. As opiniões expressas nos artigos assinados são de responsabilidade
exclusiva de seus autores e não expressam as opiniões da Universidade de São Paulo ou do seu Núcleo de Pesquisa em
Relações Internacionais.
Carta Internacional é publicada pelo Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo. A
revista está disponível para download gratuito, em formato PDF (Portable Document Format), no endereço
www.usp.br/relint.
© 2006 Núcleo de Pesquisa em Relações Internacionais da Universidade de São Paulo. Todos os direitos reservados.
Editores:
Fábio Cereda Cordeiro
Flávio Antonio Gomes de Azevedo
Conselho Científico:
Amado Luiz Cervo, André Singer, Andrew Hurrell, Antônio Augusto Cançado Trindade, Antônio Carlos Lessa,
Carlos Eduardo Lins da Silva, Celso Lafer, Elizabeth Balbachevsky, Félix Peña, Fernando Augusto Albuquerque
Mourão, Gary Hubauer, Gilson Schwartz, Gustavo Vega, Henrique Altemani de Oliveira, José Augusto Guilhon
Albuquerque, Luis Olavo Baptista, Margarita Martin, Maria Cristina Cacciamali, Maria Regina Soares de Lima,
Paulo Esteves, Paulo Fagundes Vizentini, Peter Demant, Rafael Duarte Villa, Sonia de Camargo e Tullo Vigevani.
Correspondência:
Rua do Anfiteatro, 181 – Colméia – Favo 7
Cidade Universitária
05508-060
São Paulo – SP
Tel: (55)(11) 3091-3061
Fax: (55)(11) 3032-4154
Email: nupri@usp.br
NúcleodePesquisaemRelaçõesInternacionaisdaUniversidadedeSãoPaulo
Conselho Deliberativo:
José Augusto Guilhon Albuquerque, Maria Cristina Cacciamali, Henrique Altemani de Oliveira, Luis Olavo
Baptista, Elizabeth Balbachevsky, Rafael Duarte Villa, Peter Demant e Amâncio Jorge Nunes de Oliveira.
Coordenador Científico:
Rafael Duarte Villa
Visite o site do NUPRI para maiores informações: www.usp.br/relint.
2
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Não-proliferaçãoe
conflitonuclear
LuizA.P.SoutoMaior
O
desenvolvimento da bomba atômica representou não
apenas um avanço espetacular na tecnologia militar, mas também
uma drástica mudança na condução
da política entre os Estados. O imenso poder de destruição da nova arma
– dramaticamente demonstrado sobre Hiroshima e Nagasaki – tornou
evidente que um conflito bélico entre
dois países dotados de tal armamento
levaria a danos recíprocos de tal magnitude que, ao final, seria difícil falar
de vencedores e vencidos. Era a situação que, em certa época, costumava
ser objeto de um adequado trocadilho
a partir da sigla inglesa M.A.D. (mutual assured destruction), denotando a
loucura envolvida. O enfrentamento
militar direto entre grandes potências
tornara-se um ato de insanidade política, se não mental.
Assim, as seis décadas transcorridas do fim da II Guerra Mundial até
hoje foram provavelmente, desde o
surgimento dos Estados nacionais, o
mais longo período de paz – no sentido limitado de ausência de choques
militares – entre grandes potências. A
Guerra Fria é representativa de tal estado de coisas. Duas superpotências e
Luiz A. P. Souto Maior é diplomata
aposentado. Foi Embaixador junto às
Comunidades Européias, e Ministro
Conselheiro na Delegação permanente
em Genebra.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
os blocos liderados por cada uma delas disputavam a hegemonia mundial,
tanto em termos político-estratégicos
como ideológicos. Em outras circunstâncias, é provável que tal rivalidade
tivesse conduzido a um conflito armado entre as duas coligações. No
mundo pós-bomba atômica, porém,
tanto Washington como Moscou conduziram suas respectivas políticas externas de modo a evitar ou contornar
situações suscetíveis de levar os dois
grandes centros de poder a um enfrentamento bélico direto, certamente
ruinoso para ambos. Assim, cada um
dos lados tendia a admitir a liberdade
praticamente total de atuação, inclusive de intervenção aberta, da outra
dentro de sua respectiva área de influência. Houve mesmo casos de recuo de
uma das partes quando algum excesso
de ousadia criou um risco iminente de
conflito direto. Evitava-se dessa forma
o pior, como no caso da retirada dos
mísseis soviéticos de Cuba. Mais freqüentemente ocorriam, porém, situações que se poderiam descrever como
de terceirização da guerra, nas quais
um grupo partidário de uma das duas
superpotências enfrentava elementos
locais ligados à superpotência rival ou
mesmo tropas regulares desta última.
Em qualquer das duas hipóteses, evitava-se, o embate direto entre as forças
dos dois grandes contendores e a conseqüente probabilidade de um choque
nuclear.
A Carta das Nações Unidas, embora visando a objetivos muito mais
amplos, tratou de formalizar tal estado
de coisas. O uso da força nas relações
entre os Estados passou a ser admitido apenas em casos de auto-defesa ou
quando autorizado pelo Conselho de
Segurança, onde cada um dos Cinco
Grandes tem poder de veto – e, já em
1945, eram ou logo passariam a ser
potências nucleares.
Do ponto de vista daquelas cinco
potências, o problema suscitado por
tal situação é que ela só poderia evitar
conflagrações nucleares e, ao mesmo
tempo, assegurar a hegemonia dos
Grandes, na medida em que outros
países não se dotassem igualmente
de armas atômicas e dos respectivos
meios de lançamento. Em outras palavras, era indispensável evitar a “proliferação” de tais armas. Surge assim
a iniciativa de um Tratado de NãoProliferação (TNP), que, na medida
em que encontrasse aceitação generalizada, reforçaria a efetiva hegemonia dos Cinco Grandes, colocando-os
inclusive a salvo das eventuais veleidades de algum possível aspirante a
grande potência.
Para fins de apresentação pública, a
proposta partia de um raciocínio simples e sugeria uma barganha aparentemente razoável. O raciocínio – talvez
mais simplista do que realmente simples – era que um conflito nuclear traria
séria devastação à humanidade intei-
3
ra, donde a necessidade de fazer todo
o possível para evitar que ele ocorresse
– e “a proliferação das armas nucleares
agravaria consideravelmente o perigo
de guerra nuclear”, cumprindo, pois,
evitá-la1. A barganha era que aqueles
países que renunciassem ao uso militar da energia nuclear poderiam contar, para sua utilização pacífica, com a
ajuda dos países nucleares, sem serem
onerados pelos custos de pesquisa e
desenvolvimento2. Evidentemente, tal
não de algum pequeno rogue state, ou
“estado fora da lei”, para usar a retórica
popularizada por Washington. A idéia
do desarmamento nuclear é, aliás,
contemplada no artigo VI do próprio
Tratado de Não-Proliferação, assinado
em 1968, mas quase quarenta anos depois, parece claro que se está cada vez
mais longe de tal objetivo. No caso do
Brasil, o decreto legislativo que aprovou nossa adesão ao TNP estabeleceu
que ela “estava vinculada ao entendi-
Parasercoerentecomseufundamentológico,oTNP
deverialevaràdestruiçãoouaocontroleinternacional
efetivoedemocráticodetodasasarmasnucleares,
enãoàmeralimitaçãoaalgunspaísesdodireitode
possuí-las.
apresentação continha vários elementos falaciosos, de maior ou menor importância, conforme a situação internacional atual e as aspirações de cada
signatário potencial do TNP.
Para ser coerente com seu fundamento lógico, o TNP deveria levar à
destruição ou ao controle internacional efetivo e democrático de todas
as armas nucleares – inclusive as dos
Cinco Grandes – e não à mera limitação a alguns países do direito de possuí-las. Em outras palavras, se todo
conflito nuclear é um flagelo a ser evitado, não basta reduzir a probabilidade
da sua ocorrência – é preciso impedir
que ocorra. Evitar a disseminação de
bombas atômicas poderia ser, pois, no
máximo, um objetivo intermediário,
que contribuiria para alcançar a meta
final de impedir o uso de tais armas.
Dar a alguns países o direito de possuir
armas nucleares e negá-lo a outros é,
pois, além de claramente discriminatório, como já tem sido repetido à saciedade, evidentemente insatisfatório
em termos do objetivo declarado de
defender a segurança da humanidade.
Isto se torna particularmente óbvio
quando recordamos que os únicos casos de utilização de artefatos nucleares
para fins bélicos foram obra da maior
potência política e militar do planeta e
4
mento de que, nos termos do artigo
VI, serão tomadas medidas efetivas
visando à cessação, em data próxima,
da corrida armamentista nuclear, com
a completa eliminação de todas as armas atômicas”. Como tal entendimento claramente não se concretizará, é
possível argumentar, pelo menos em
tese, que nossa adesão àquele tratado
está aberta a uma ampla cláusula de
escape.
Na realidade, o que se tem visto tem
sido uma forma tortuosa de proliferação semi-clandestina, limitada menos
pela aceitação generalizada das apregoadas vantagens de evitar a disseminação de armas nucleares do que pelas
circunstâncias internas e externas de
cada país: tendem a não dotar-se de
armamento nuclear aqueles Estados
que não têm as condições econômicas, técnicas ou políticas de produzi-lo
e aqueles que não vêem em tal iniciativa um objetivo estratégico próprio
ou, pelo menos, não a percebem como
algo tão importante que justifique enfrentar as inevitáveis pressões externas
em sentido contrário.
Para a paz e a segurança da comunidade internacional, tem sido uma
felicidade que a maior parte dos países
se enquadre – ou considere enquadrar-se – numa dessas categorias. É
claro, porém, que, embora lentamente,
tal situação tem-se modificado.
Há tempos, Índia, Israel e Paquistão
são considerados países dotados de armamento nuclear. Como não aderiram
ao TNP, nada os impede legalmente de
desenvolverem tal equipamento, mas
Israel cerca seu programa atômico do
maior sigilo e nem sequer reconhece
oficialmente que ele exista. Por outro
lado, qualquer que seja sua situação
jurídica, nada isenta um país que adquira ou se proponha a adquirir armas
atômicas da pressão política exercida
pelas potências nucleares “oficiais”,
especialmente pelos EUA. O grau de
oposição à posse de armas nucleares
tem variado, porém, em cada caso,
de acordo com o momento e com as
condições do país que delas disponha
ou se proponha adquiri-las, em especial suas relações com Washington.
Os acontecimentos dos últimos meses
ou anos apenas confirmam tal estado
de coisas. Israel, tradicional aliado de
Washington, praticamente nunca foi
pressionado para acabar com seu programa nuclear. Índia e Paquistão sofreram considerável pressão em 1998,
quando realizaram testes nucleares
considerados na época como potencialmente desestabilizadores da geopolítica da área e uma ameaça à paz.
Na percepção daqueles países, entretanto, a ameaça à estabilidade internacional teria outra origem. Num artigo
da época, homas Friedman, colunista do New York Times, cita a respeito
um ex-Primeiro Ministro da Índia: “If
you (the US) have decided that this
side of Suez is an area of influence of
China, what should an Indian policy
maker do?”3. Para ele, o equilíbrio geopolítico da área tinha sido favorecido, durante a Guerra Fria, pelo apoio
de Moscou a Nova Delhi e de Beijing
a Islamabad. Com o desmoronamento
do império soviético e a aproximação
entre os EUA e a China, tal situação
se teria modificado de maneira desfavorável à Índia, o que teria contribuído para a decisão indiana de retomar
testes nucleares, o que não fazia desde
a década de 1970. Hoje, o Paquistão,
aliado essencial de Washington na
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
guerra no Afeganistão, é deixado em
paz com seu programa atômico, desde
que coíba a exportação para terceiros
países de material e tecnologia capazes de contribuir para o êxito de iniciativas consideradas indesejáveis de
outros países. Enquanto isso, os EUA
pressionam o Conselho de Segurança
da ONU a adotar sanções contra o Irã
e procuram obter apoio regional para
uma crescente pressão política sobre a
Coréia do Norte, com vistas a pôr fim
aos seus respectivos programas nucleares.
Em certo sentido, tudo isso parece deixar mais clara a finalidade real
do TNP. Ao criá-lo, não se tratou de
estabelecer uma norma geral de conduta destinada a contribuir para a paz
e a segurança da comunidade internacional em seu conjunto. Tratou-se antes de criar um instrumento político,
destinado a limitar às cinco potências
atômicas originais o poder associado
à posse de armas nucleares. Verificada
a inviabilidade de impedir a proliferação dos conhecimentos necessários
à produção de armas atômicas e, em
um número crescente de casos, a impraticabilidade política e/ou militar de
impedir a sua aquisição, mudou-se na
pudesse satisfazer os objetivos estratégicos de todos os Estados, excetuados
os Cinco Grandes. A realidade incumbiu-se de desmentir tal premissa, com
os resultados a que já nos referimos.
Assim, quando um Estado que
não é membro – ou decide retirar-se
– do TNP resolve dotar-se de armas
atômicas ou toma iniciativas que são
percebidas como visando a tal objetivo, como no caso atual do Irã, a
comunidade internacional não pode
aplicar procedimentos institucionais,
devendo recorrer a métodos mais ou
menos arbitrários de pressão. A atitude mental subjacente a tal estado de
coisas foi bem ilustrada pela observação da Secretária de Estado americana, Condoleeza Rice, de que “é preciso que fique claro para os países que
tudo o que conseguirão adquirindo
uma arma atômica será o isolamento”.
O que ela parece ter considerado irrelevante esclarecer foi o que eles obteriam de positivo por não adquirirem
tal armamento. Aparentemente, para
a diplomacia americana, o importante seria a pressão, não a persuasão. O
problema é que freqüentemente não
existe consenso mesmo entre os Cinco
Grandes – muito menos na comuni-
QuandooTNPfoicriado,nãosetratoudeestabelecer
umanormageraldecondutadestinadaacontribuirpara
apazeasegurançadacomunidadeinternacionalem
seuconjunto.Tratou-sedecriaruminstrumentopolítico
paralimitaràscincopotênciasatômicasoriginaiso
poderassociadoàpossedearmasnucleares.
prática o objetivo inicial. Tratou-se de
restringir a posse de tal armamento a
um número tão pequeno quanto possível de países, cujo acesso a ele fosse
considerado particularmente difícil de
evitar. É neste caráter de instrumento
de poder – e não de norma de paz e
eqüidade – que reside, porém, a grande debilidade do TNP.
A barganha implícita a que antes nos referimos – facilitar o uso da
energia atômica para fins pacíficos
àqueles países que desistissem de usála militarmente – pressupunha que ela
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
dade internacional em seu conjunto
– sobre a forma e a conveniência de
exercê-la. Na verdade, inexiste sequer,
em cada um dos Grandes individualmente, uma orientação uniforme aplicável a todos os casos de “proliferação”
nuclear. Para ficarmos num exemplo
recente, basta recordar a atitude de
Washington, que pede sanções contra
o Irã – que no momento apenas produz urânio enriquecido – ao mesmo
tempo em que firma um acordo de
cooperação nuclear com a Índia.
Em suma, a idéia da não-prolife-
ração de armas nucleares, da maneira
abusiva e discriminatória como se formalizou no TNP, claramente fracassou.
Aos poucos, um número crescente de
países vem adquirindo capacidade nuclear para fins bélicos. E não há razão
para esperar que tal tendência se modifique. Antes pelo contrário. Na medida
em que se multiplique a quantidade de
Estados militarmente nuclearizados,
mais fácil se tornará a outros seguirlhes o exemplo – e maior também o
risco de que artefatos atômicos caiam
em mãos de malfeitores, especialmente de terroristas internacionais.
Para se ter uma idéia do horror potencial de tal situação, basta recordar o
desastre de Chernobyl, decorrente do
mero superaquecimento de um único
reator de potência. Perderam-se milhares de vidas humanas, parte significativa da Europa sentiu-se ameaçada
pela radioatividade e foram gastos, até
agora, dez bilhões de dólares – sem que
se chegasse a conter inteiramente os
resíduos radioativos. Decorridas duas
décadas desde aquele episódio, uma
vasta área em torno do reator continua inabitável e a incidência de câncer
na Ucrânia e na Bielorússia ainda é
anormalmente alta. Imagine-se o que
ocorreria com a troca deliberada de
algumas “poucas” bombas atômicas,
cada uma com a capacidade de infligir
um dano muito maior do que o ocorrido em Chernobyl. Como se estima
que só as potências nucleares “oficiais”
disponham hoje de um total de quase
20.000 ogivas atômicas, várias vezes o
necessário para incinerar o planeta, e
como as tentativas de revisão do TNP
não permitem acreditar na sua desativação sob adequado controle internacional, as perspectivas para o futuro
parecem assustadoras – na medida em
que, nas circunstâncias, ainda seja válido falar de um futuro...
Notas
V. primeiros parágrafos do preâmbulo
ao TNP.
1
2
Artigo V do TNP.
3
New York Times, 20/6/1998, pág. A 11.
5
AméricadoSul:rumoà
desintegraçãopolíticaeà
fragmentaçãoeconômica?
PauloRobertodeAlmeida
A
integraçãoéumahipótese,masafragmentaçãoéumfato
A América Latina – e, dentro dela, a América
do Sul – tem vivido, desde a remota época bolivariana, sob a mística da integração política
e, desde meados dos anos 1950, pelo menos, sob o signo
da integração econômica. Paradoxalmente, quando mais
e mais líderes da região proclamam sua vocação a perseguirem tais ideais, ela parece estar vivendo uma realidade
antinômica ao que poderia expressar o conceito de integração. Ela, na verdade, aproxima-se do que poderia ser
chamado de fragmentação.
O conceito de integração – eminentemente positivo e
propositivo de uma nova realidade de cooperação irrestrita e de construção de economias sólidas e sociedades mais
inclusivas – talvez seja inadequado para traduzir a presente conjuntura da América do Sul, na qual, a despeito da
retórica integracionista, as tendências fortes indicam, na
verdade, forças centrífugas em marcha em diversos países.
As realidades são divergentes porque as lideranças políticas e seus respectivos projetos nacionais são muito diversos, o que revela a existência de projetos políticos – ou até a
ausência deles – bastante diferentes e, possivelmente, contraditórios entre si.
O conceito de fragmentação, por sua vez, traduz não
Paulo Roberto de Almeida é doutor em Ciências Sociais,
diplomata e professor no Mestrado em Direito do Uniceub,
Brasília. Seu site é www.pralmeida.org.
6
apenas uma realidade econômica, mas, também e principalmente, uma tendência política e social com fortes conotações internas, isto é, domésticas e regionais. A despeito
de certo crescimento nos fluxos de comércio e de investimentos dentro da própria região – talvez bem mais uma
recuperação de níveis passados –, a despeito mesmo do
aparecimento de um projeto de união política dos países
do continente – a Casa –, parece claro que cada país vem
procurando resolver problemas econômicos e sociais imediatos com soluções ad hoc, definidas internamente e com
respostas tipicamente nacionais, nem sempre coincidentes
com a lógica do esforço integracionista no plano político
ou econômico. Esse conceito me parece, portanto, totalmente adequado à presente realidade sul-americana.
Estariam, então, os países da América do Sul a caminho
da sua desintegração política e da fragmentação econômica? Em parte sim, por razões objetivas, derivadas de insucessos econômicos acumulados e de frustrações sociais
continuadas. Mas em parte não, em virtude das aspirações
míticas a uma aparente e ilusória unidade de propósitos e
uma pretensa comunidade de intenções. A despeito, assim,
de projetos integracionistas grandiosos – e a Casa não representa senão uma nova aposta no mesmo ideal mítico –,
a verdade é que os países caminham para esquemas políticos e econômicos que procuram responder a necessidades
do momento e a conveniências políticas nacionais, mesmo se são inevitáveis pressões no sentido contrário, isto
é, aquelas de natureza centrípeta, que são exercidas pelas
forças da globalização e da interdependência econômica.
Em todo caso, o panorama é suficientemente confuso
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
para justificar uma análise que deixe de lado os esquemas generalizadores e unificadores, que redundariam, por
exemplo, em identificar pretensas tendências globais para
o continente, e privilegie, em lugar disso, análises mais
focadas nas realidades nacionais, com situações únicas a
cada caso. Mesmo neste caso, alguns analistas da própria
região – Castañeda, por exemplo – pretendem visualizar
dois modelos de desenvolvimento político, ambos focados
nas novas forças políticas de esquerda que estão se firman-
lideranças tradicionais dos sistemas políticos nacionais de
continuar na via das reformas econômicas, políticas e sociais iniciadas a partir da crise da dívida do início dos anos
1980, que também serviu para reconduzir a região ao caminho da redemocratização política, reformas que pudessem
viabilizar um novo processo de crescimento sustentado.
Com a notável exceção do Chile e, parcialmente, do
México – sem mencionar a Costa Rica e o Brasil –, a maior
parte dos países não conseguiu consolidar sólidas estruturas políticas democráticas comprometidas com o processo de reformas,
Oquecaracteriza,antesdetudo,asúltimasduas
incorrendo quase todos eles em graves
décadasemeianocenáriopolíticoregionaléaerosãoe problemas de legitimação das estrututalvezmesmooesclerosamentoirremediáveldasforças ras políticas tradicionais, que acabaram sendo parcialmente substituídas
políticastradicionais.
ou, mesmo, totalmente suplantadas
por novos desafiantes saídos de fora
do no continente: de um lado, uma esquerda moderna, re- do sistema político tradicional.
formista, capitalista e democrática – que seria a do Chile,
Um panorama geral da região, em especial nos paíUruguai, Brasil e, em parte, a Argentina – e, de outro, a ve- ses andinos – à exceção do Chile, como referido –, indica
lha esquerda que insiste nos chavões antiimperialistas, nas que os partidos políticos tradicionais entraram em crise.
mesmas receitas nacionalizantes e estatizantes, que possui Dominados que estavam por velhas oligarquias que não
nítidos traços autoritários e cesaristas, esta claramente souberam responder aos anseios das massas urbanas e
identificada com Chávez e seus pupilos regionais, até aqui rurais, seus mecanismos tradicionais de dominação pasbasicamente limitados a Evo Morales (uma vez que mesmo saram a ser contestados. Em alguns países, a instabilidaOllanta Humala, do Peru, Daniel Ortega, da Nicarágua, e de política atingiu níveis traumáticos, com manifestações
Manuel López Obrador, do México, aparentam recusar a maciças, ameaças de golpe, queda de presidentes e ruptura
companhia). Não creio que a bipartição de Castañeda seja dos canais normais de transição política e de sucessão de
correta em seus próprios termos: trata-se de um recurso chefes de Estado.
jornalístico ou ensaístico, que prefere absolutizar determiO Chile e a Argentina puderam conservar seus partidos
nadas situações, num sentido propriamente maniqueísta, tradicionais, mas com a emergência de novas lideranças
mas o fato é que existem tantas “esquerdas”, no continente, políticas, da mesma forma que o Brasil, que realizou uma
quanto são diversas as “direitas”, e isso em função de dinâ- bem sucedida transição para a normalidade democrática,
micas políticas exclusivamente nacionais.
sem que fossem, no entanto, colocadas as bases de um novo
Vejamos, rapidamente, algumas das tendências políti- modelo de crescimento econômico com divisão eqüitativa
cas no plano regional.
de seus frutos. No Brasil, o quadro político é suficientemente confuso neste momento (junho 2006) para fazer progEvoluçãodocenáriopolíticonaAméricadoSul,dos
nósticos sobre as forças políticas que emergirão a partir
anos1980a2006
do próximo escrutínio eleitoral (outubro de 2006). O que é
O que caracteriza, antes de tudo, as últimas duas déca- certo é que o governo do PT conseguiu desmantelar o que
das e meia no cenário político regional é a erosão e talvez restava de credibilidade política das instituições públicas,
mesmo o esclerosamento irremediável das forças políticas fragmentando lideranças partidárias e envolvendo toda a
tradicionais nos diversos países da região. Antigos partidos classe política numa teia de corrupção que vai deixar marconservadores, de extração liberal ou claramente conser- cas profundas nos próximos anos. O Brasil caminha, aliás,
vadora, vêm sendo submetidos a fortes pressões competi- qualquer que seja o resultado da eleição presidencial de
tivas, quando não são alijados do poder, por novas forças outubro, para sérios problemas de governabilidade estatal
políticas ou por movimentos sociais que nem sempre as- e de governança política a partir de 2007. Nenhum presisumem as características de partidos políticos, no sentido dente disporá de maioria clara no Congresso e os mecanisusual da palavra. O fato é que os partidos tradicionais estão mos de funcionamento do Congresso deixaram de operar
em declínio.
em condições normais.
O progresso relativo a ser registrado parece ter sido o
Além disso, a despeito do crescente consenso social e
afastamento dos militares, enquanto corporação, dos negó- político em torno das bases essenciais da estabilização macios da política, ainda que militares tenham continuado a croeconômica, a sociedade brasileira ainda não realizou
participar, enquanto indivíduos, do jogo político. O atraso esforço equivalente para completar o ciclo de reformas e
registrado, tangível e real, foi a incapacidade política das retomar o caminho do crescimento sustentado. Nenhuma
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
7
força política importante propõe a volta aos padrões insustentáveis de irresponsabilidade fiscal e monetária que
marcaram o Brasil até o início dos anos 1990, mas tampouco há consenso sobre como continuar e completar a série
de reformas políticas e econômicas. Meus prognósticos, na
vertente econômica, são propriamente pessimistas, com
tendências ao baixo crescimento pelos anos à frente.
Nos demais países, o quadro é propriamente desolador,
e mesmo a Argentina conheceu os efeitos da desestruturação das lideranças políticas tradicionais, sem chegar, no
entanto, à exacerbação de paixões e de movimentos destrutivos que caracterizaram vários países andinos nos últimos anos. Por incrível que pareça, o partido justicialista,
ou seja, o movimento peronista tradicional, ainda continua
influente naquele país: trata-se, sem dúvida, de caso único
na história da humanidade, um líder político que conseguiu seqüestrar todo um país, inclusive a sua inteligência,
durante mais de meio século. Claro, o peronismo, durante
os últimos sessenta anos, teve várias encarnações: foi primeiro fascista, depois socialista moderado (mas assistindo
a lutas terríveis entre suas facções de esquerda e de direita),
veio a ser neoliberal com Menem, e hoje se descobre simplesmente nacionalista e populista, como sempre foi, aliás.
Os países andinos, por sua vez, em especial aqueles
marcadamente indígenas – Bolívia, Peru e Equador – aproximam-se de certo modo do padrão de “estados falidos”,
ainda que possam ter conhecido fases de crescimento e re-
ta com uma bem sucedida experiência de mistura racial,
a crise política foi praticamente criada pela “maldição do
petróleo”, já que esta fonte abundante de recursos fáceis
criou uma sociedade rentista, na qual os ricos e os líderes
políticos simplesmente se encarregaram de “organizar” a
dilapidação dos recursos nacionais, em lugar de criar uma
sociedade “normal”, baseada em outras fontes de receitas
do que unicamente a renda petrolífera. A decadência moral das velhas lideranças políticas chegou a tal ponto que o
país “regrediu” para a solução ilusória da liderança cesarista-distributivista-populista. Ganhou um fascismo leniente,
como brinde.
Finalmente, o Chile parece conformar a única experiência sul-americana de crescimento em bases sólidas, com
desenvolvimento moderado de novas oportunidades sociais. Mas isso só foi possível depois de duas décadas de
traumas políticos e sociais como resultado da funesta experiência do “socialismo legal” de Allende e da brutal ditadura que se lhe seguiu. Não se pense que os militares introduziram de imediato os Chicago boys e produziram crescimento e estabilidade nos preços desde os primeiros anos
da ditadura. Passaram por diversas disfunções e uma grave
crise bancária antes de consolidar um modelo econômico
conforme ao instrumental básico da mainstream economics
– com algumas adaptações – e uma adequação satisfatória
ao que prega o famoso “consenso de Washington” (algo que
a Argentina nunca fez, ao contrário do que vulgarmente se
alega). As lideranças políticas chilenas
pós-ditadura foram sábias o bastante
OfatoéqueoMercosulmergulhounacriseem1999
para preservar o essencial do modeenuncamaissaiudela.Masnãofoiporfaltade
lo econômico construído ao longo da
instituiçoesqueoMercosuldeixoudeseconsolidar,
transição. O Chile é, provavelmente,
um dos poucos países no mundo que
esimporumainfelizcombinaçãodecircunstâncias
realiza superávit nominal há muitos
conjunturaisedefatoresestruturais.
anos. Direita e esquerda aprenderam a
conviver em bons termos – apesar de
estruturação econômica. As crises políticas que abalaram rancores passados – e a eventual alternância para a direita
esses países, inclusive a Venezuela, constituem exemplos de em algum momento do futuro não implicaria, provavelincapacidade das elites em realizar a transição das antigas mente, em mudança fundamental do modelo.
sociedades oligárquicas para democracias inclusivas de
Feito esse giro pela política da região, vejamos agora a
massa, o que nem sempre é fácil, reconheça-se. Todos eles, “integração”, na prática.
com particularidades para o caso da Colômbia, enfrentaram surtos prolongados de violência, instabilidade política, Esforçosintegracionistasedecoordenaçãopolítica
anomia social e fragmentação do tecido social, com várias
Depois de décadas de esforços integracionistas uniforameaças latentes de ruptura institucional ainda hoje.
memente multilateralistas, mas “hacia adentro”, a América
O caso da Colômbia é um tanto diverso, na medida Latina adentrou em iniciativas mais limitadas, de cunho
em que esse país representa um dos exemplos “bem suce- sub-regional. O México, depois da crise de 1982, procurou
didos” de dominação oligárquica com incorporação gra- seu caminho liberalizador próprio e encerrou décadas de
dual de setores médios, o que pode ter evitado os exem- lutas contra sua própria geografia para tentar, por uma vez,
plos sensíveis de deterioração social e política observada render-se ao charme pouco discreto do grande irmão do
nos demais países, nos quais a componente indígena era Norte. Pode-se dizer que foi relativamente bem sucedido
mais viva. Ainda assim, sua elite tampouco conseguiu evi- na empreitada, pois conseguiu consolidar um acesso ao
tar a transformação da luta política em guerra civil, hoje mercado norte-americano através do Nata e teria consetransformada em banditismo puro, com a narco-guerrilha guido um canal seguro para “exportar” regularmente seu
e a indústria dos seqüestros. Na Venezuela, país que con- excedente demográfico se não fosse pelo 11 de setembro.
8
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Em todo caso, uniu seu destino, para o bem e para o mal,
ao dos EUA, mas continua perseguindo outros esquemas
livre-cambistas, dentro e fora da região.
Na América do Sul, os resultados da sub-regionalização foram contraditórios, parar dizer o mínimo. O Chile
escolheu a via da “multilateralização” do livre-comércio e
permanece consistentemente nesse itinerário, mesmo de
forma unilateral. Quanto aos demais, houve sucessos e
fracassos. O Pacto Andino, que primeiro tinha perseguido
um modelo “europeu” de integração, e definido a panóplia
completa de “políticas comuns” e instrumentos institucionais para a integração – inclusive um Tribunal –, não
conseguiu sequer completar a sua união aduaneira, fican-
Mercosul – procuraram o que lhe parecia a melhor promessa de ampliação de mercados: o dos EUA, que perseguiram sua estratégia minilateralista de forma sistemática,
isolando o Mercosul em direção da Antártida, como tinha
prometido o ex-USTR Robert Zoellick.
Quando o Brasil, tardiamente em relação à primeira
reunião promovida por FHC em 2000, decidiu completar a
Alcsa – a zona de livre-comércio sul-americana, proposta
em 1993 pelo chanceler Amorim – mediante o esquema
político da Comunidade Sul-Americana de Nações (e seu
estranho acrônimo), as condições já não eram propícias
para assegurar uma mesma visão estratégica do processo.
Vários países se desgarraram do ideal integracionista, seja
por interesse em resultados mais tangíveis de curto prazo – na direção do
AAméricaLatina,demodogeral,éumaregiãoa
império – seja por problemas políticaminhoda“mafialização”,mesmosemastradicionais cos internos. Registre-se, também, que
famíliasbaseadasnaomertà.
a iniciativa brasileira veio no bojo de
uma auto-proclamada (e por isso indo bem atrás do Mercosul, que logrou relativo sucesso nos conveniente) “liderança regional”, reforçando sentimentos
seus primeiros quatro (transição) ou nove anos (depois de de desconfiança dos vizinhos, inclusive porque não vinha
formar a união aduaneira) de vida. O comércio se expan- secundada pelos meios materiais ou políticos para o seu
diu, assim como as trocas com o resto do mundo, mas a exercício. A Casa pode dificultar, em lugar de ajudar, a prointroversão econômica das suas economias habitual e as moção da integração física do continente.
muitas exceções feitas à zona de livre-comércio e à próO fato é que o Mercosul mergulhou na crise desde 1999
pria união aduaneira abriram espaços para as resistências e nunca mais saiu dela, mesmo se o comércio voltou a
setoriais ao acabamento do que seria um mercado comum crescer nos últimos anos entre os dois maiores membros,
embrionário.
à luz da recuperação argentina da crise de 2001. Mas salNão foi por falta de instituições que o Mercosul dei- vaguardas abusivas e déficit de internalização de normas
xou de se consolidar, como alegado por juristas e outros contribuem para restringir as potencialidades de um bloco
neófitos do processo, mas sim por uma infeliz combina- que constitui metade da economia do continente. Mesmo a
ção de circunstâncias conjunturais e de fatores estruturais, recente decisão pela adesão “plena” da Venezuela não deve
que acabaram se constituindo em poderosos obstáculos à produzir resultados significativos antes de muitos anos, em
implementação completa do Tratado de Assunção. Os pro- virtude dos prazos de transição que obedecem em grande
cessos domésticos de estabilização econômica foram diver- medida a acordos aladianos pouco ambiciosos (sem mengentes entre si – caso dos regimes cambiais da Argentina e cionar o risco de politização ainda maior do Mercosul).
do Brasil – e agravados pelas crises financeiras dos anos
Se já não bastassem os inúmeros problemas comerciais,
1990, ao passo que as assimetrias existentes entre os países a nova administração brasileira decidiu, ao dar início a seus
não puderam ser vencidas por esforços próprios de recon- esforços de “revitalização” do Mercosul, que os aspectos coversão ou de adaptação às novas condições de concorrên- merciais seriam secundários em relação a outros objetivos,
cia.
políticos ou de ordem social, e que estes deveriam passar a
De fato, depois de implementada a TEC, nunca mais sustentar o processo. Por fim, mas não menos importante,
houve esforços adicionais de liberalização comercial ou a concepção originalíssima do líder venezuelano sobre o
de abertura econômica, mas ao contrário, um rol comple- que deve ser a integração torna todo o exercício – seja da
to de medidas protelatórias ou protecionistas, seguidas de Casa, seja do reforço do Mercosul – o equivalente a uma
constantes promessas de “mais Mercosul” para vencer as aventura política de alto risco.
deficiências constatadas do processo. Das poucas iniciatiObserve-se que a Alba pode até ser movida a petrovas de liberalização comercial surgidas, nenhuma partiu dólares durante algum tempo mais – e certamente Mister
do Mercosul ou de algum dos países membros, mas sim de Chávez está sendo beneficiado pela tendência irrefreável
parceiros externos, como os EUA – no caso da Alca – ou a ao aumento nos preços do óleo cru –, mas ela não parece
UE – no caso do acordo birregional.
constituir uma alternativa válida de integração econômica
O México e o Chile foram os mais consistentes libe- para o continente, uma vez que pretende ignorar as regras
ralizadores “hacia adentro” e “hacia afuera”, ao passo que mais elementares da economia. Ou seja, pode-se comprar
o Mercosul parecia se fechar numa visão introvertida do alguns países durante algum tempo, mas não parece ser fáprocesso. Os demais países – e mesmo alguns dentro do cil comprar todos os países durante todo o tempo.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
9
Umcontinenteacaminhoda“mafialização”?
O chanceler Celso Amorim costuma repetir que o destino da América do Sul tem de ser o da integração e que ela
deve fazê-lo pela via positiva da cooperação política e do
comércio, ou será forçosamente integrada pela via perversa
do crime organizado e do narcotráfico. Pode-se retrucar, a
esta promessa de um futuro sombrio, que ela já se realizou,
pois a integração de grupos criminosos – tráfico de drogas,
de armas, diversas formas de lavagem de dinheiro, ademais
da contaminação dos corpos político e polícial – já é um
dado cada dia mais comum na paisagem regional. Não
deveria haver nenhuma dúvida quanto a isso: a América
Latina, de modo geral, é uma região a caminho da “mafialização”, mesmo sem as tradicionais famílias baseadas na
omertà.
Aspecto ainda mais patético da involução que se observa nos costumes e no “mores” político local é o apelo recorrente a soluções do passado para enfrentar os problemas
do presente: o velho apelo ao nacionalismo epidérmico, a
denúncia infantil da exploração imperialista e o recurso a
esquemas estatizantes que já demonstraram ser ineficien-
10
tes em mais de uma ocasião. Mais preocupante é o estilo
autoritário que líderes políticos estão imprimindo a suas
campanhas eleitorais ou às administrações em curso, com
notável destaque, mais uma vez, para o coronel bolivariano. Para o desconforto da esquerda, o antiimperialismo
também se apresenta em sua modalidade fascista.
Se considerarmos que a América Latina já é, de todas as
regiões do mundo, a de menor crescimento relativo – perdendo, agora, inclusive para a África – e que os países da
América do Sul continuam a perseguir estratégias nacionais de crescimento ou de inserção internacional, chegaremos inevitavelmente à conclusão de que as perspectivas
para a integração política ou econômica na região são no
mínimo limitadas, em que pese a retórica integracionista
ascendente.
Pode até ser que meu pessimismo não seja justificado
em bases reais, mas como diz um velho ditado, os pessimistas nunca correm o risco de serem desagradavelmente surpreendidos pela realidade que um dia desaba à sua
frente.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Venezuela-Brasil:unarelación
geoestratégicaprivilegiada
AlejandroMendibleZurita
“Nuestra alianza estratégica esta solidamente apoyada
en tres pilares: diálogo político, ampliación del comercio de bienes y servicios e integración de la infraestructura.”
L
Luiz Inácio Lula da Silva
Discurso en Caracas, 14/02/2005
as relaciones diplomáticas entre Venezuela y
Brasil entran en una nueva era histórica, con la
llegada de Lula a la presidencia del Brasil a partir
del 2003, y se caracterizan entonces por alcanzar un nivel de “relaciones estratégicas”, hacia
el 2005. Brasil, un país de 8.512.000 km2 y 182 millones de
habitantes en la actualidad, y Venezuela, de 912.050 km2 y
27 millones de habitantes, desde su creación evolucionaron
como dos estados nacionales diferentes y por mucho tiempo mantuvieron relaciones formales pero distantes, hasta
mediados de los años 1970, cuando las relaciones entre el
gran país del sur y Venezuela inician un ritmo cada vez
más acelerado. La optimización de las relaciones acontece
cuando en el mundo actual y, particularmente, en nuestro
continente, Sur América, se incrementa la interacción de
una multiplicidad de redes que diluyen la diferencia entre
lo interno y lo externo, y cuando el funcionamiento de esas
redes crea una multiplicidad de actores gubernamentales y
no gubernamentales tendientes a asumir una nueva idenAlejandro Mendible Zurita é Doutor em História e Professor Titular da Universidad Central de Venezuela (UCV).
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
tidad histórica a escala continental.1 Esta nueva identidad
histórica empieza a mostrar la formación de una nueva organización supranacional: el MERCOSUR, cuya evolución
busca superar los restringidos ámbitos del desarrollo de los
estados nacionales tradicionales y ampliarlos a una escala
continental. A partir de la última década del siglo pasado,
las relaciones entre Venezuela y Brasil experimentan un
gran salto proclive a la consecución de una convergencia
en la reorganización de las posibilidades geo-económicas
de los dos países, vistas dentro de una integración a escala
sudaméricana.
En la historia de las relaciones entre ambos países, desde
sus inicios formales en 1843, cuando Miguel María Lisboa,
el Consejero Lisboa, llega a Caracas representando los intereses de D. Pedro II, Emperador del Brasil y en Venezuela se
encontraba en la Presidencia el General Carlos Soublette,2
hasta el presente, entre los dos países han predominado
los gestos amistosos.3 En 163 años de relaciones, por las
embajadas de ambos países han pasado prominentes figuras, como los historiadores brasileños Adolfo Varnhagen y
Manuel de Olivera Lima, o los intelectuales venezolanos
Mariano Picón Salas y Salcedo Bastardo.
Es menester señalar algunos momentos determinantes
y diferentes en la evolución histórica de cada país. En principio, los procesos de independencia de ambos países fueron diferentes: en Brasil fue una transición prácticamente arreglada dentro de la familia real y en Venezuela un
capítulo violento y cruento. De esta manera, mientras en
nuestro país trasciende la independencia como una gran
11
gesta épica y de ella surge nuestra gran figura nacional el
Libertador Simón Bolívar para convertirse en el cemento y
núcleo central de la nacionalidad. Durante la gesta de independencia en Venezuela, se establece un vínculo histórico
importante entre Brasil y Venezuela, creado por la participación del patriota brasileño, Abreu e Lima en la constitución de la Gran Colombia. En Brasil, “un país sin héroes”,
según expreso el historiador inglés Arnold Toynbe,4 lo que
surge es un Estado dotado de gran capacidad de asimilación y apto para mantener la unidad nacional de un país
enorme, con diferentes regiones geográficas bien definidas.
Ignacio Abreu e Lima llega a Venezuela en 1818, procedente de los Estados Unidos, para participar en la lucha
de independencia venezolana, después de su actuación en
la fallida Revolución pernambucana en Brasil. En su país,
Abreu e Lima fue capitán de artillería y posteriormente se
adhirió a la Revolución republicana de 1817. En nuestro
país, participa de manera activa en el ejército del Libertador
Simón Bolívar, logrando años después el reconocimiento
por su arrojo y valentía, con el grado de general otorgado
por el propio Bolívar. Permanece al lado del Libertador, por
ternacionales diferentes: Venezuela hacia el Caribe y Brasil
hacia la Cuenca del Plata. No obstante merece destacarse
el establecimiento de un satisfactorio Tratado de Límites y
Navegación Fluvial entre ambos áises en 1859, estableciendo fronteras definidas tomando para el efecto el divorcio de
las cuencas de las aguas de los ríos Orinoco y Amazonas.7
Este tratado se encuentra todavía vigente y se ha convertido en el acuerdo de límites de mayor duración, así como
el único que le ha rendido beneficios territoriales a nuestro
país. Consecuentemente, Venezuela ganó 4 mil kilómetros
cuadrados en sus delimitaciones con Brasil, en 1973.
A partir de marzo, en 1994, se produce un gran salto
cuando se firma el ‘Acuerdo de la Guzmania’ entre los presidentes Rafael Caldera de Venezuela e Itamar Franco del
Brasil, con motivo de la visita de este último a Venezuela.
En esa oportunidad en el “Comunicado de Prensa”, ambos
dignatarios reconocen: “la renovada determinación de los
dos Gobiernos de promover un intenso acercamiento entre
ambos países con la identificación de nuevas oportunidades de intercambio, cooperación e integración”.8 En el mismo año, el Ministro de Relaciones Exteriores, de Venezuela,
Miguel Angel Burelli Rivas en su menaje ante el Congreso
señala: “Brasil fue hasta 1964
uno de los mayores y más seguElgradoexcepcionaldelasrelacionesentreVenezuelay
ros compradores de nuestro peBrasil,alcanzadodurantelosgobiernosdeLuladaSilvay
tróleo. Se ha previsto que vuelva
deHugoChávez,esfortalecidomediantelaelevacióndelas a serlo y que el intercambio empresarial, económico y tecnolómismasaunnivelde“alianzaestratégica”.
gico que hemos iniciado, pueda
llegarse a tender un oleoducto
insinuación de quien escribe sobre la dictadura de 1828, y a vincular a las empresas PDVSA y PETROBRAS para
y lo acompaña hasta su muerte en 1830; después, parte ir al mercado mundial con la suma de sus experiencias y
de Venezuela para regresar a su país. Con ésta actitud, el capacidades”.9
Con referencia al Tratado firmado entre los presidentes
prócer brasileño trataba de evitar las confrontaciones con
otros importantes personajes del proceso de independen- Caldera y Franco en 1994, se observa que se halla mediacia, enemigos de Bolívar. En su viaje de regreso al Brasil do por la convergencia y la afirmación del conocimiento
pasa por Estados Unidos y sigue a París, Francia, donde mutuo entre los dos países, que se muestran decididos a
conoce al Emperador Pedro I, del cual se hace partidario, enfrentar los grandes desafíos surgidos del nuevo orden
pasando a contribuir por su reposición en el trono. Sin internacional, impulsados por el fenómeno de la globalizaembargo, Pedro I muere poco tiempo después y en 1844 ción.10 Como resultado de un intenso trabajo diplomático,
Abreu e Lima se traslada a ejercer el periodismo en su re- al inicio del nuevo milenio las relaciones adquieren mucha
gión natal, Pernambuco.5 Más tarde, en 1848, participa en mayor complejidad y la convergencia creciente entre las
la Revolución Praiera y al ser derrotado el movimiento es sociedades brasileña y venezolana prosiguen en tránsito
desterrado a la isla Fernando de Noroña. En 1855, publica hacia la creación de una verdadera reorganización geohisun celebre texto sobre el socialismo, muy comentado en la tórica del continente suramericano.
El grado excepcional de las relaciones, alcanzado ducritica histórica por ser el primer texto escrito en Brasil sobre el tema. Posteriormente, en 1868, le responde una carta rante los gobiernos de Lula da Silva y de Hugo Chávez,
al General José Antonio Páez, en la cual formula una larga un estadio relevante y singular, es fortalecido mediante la
explicación sobre su actuación en la Gran Colombia.6 Este elevación de las mismas a un nivel de “alianza estratégica”.
documento de gran valor, el cual prácticamente se convier- Actualmente, las relaciones son un instrumento invalorate en su autobiografía, puede considerarse como su carta ble de articulación en la reorganización de una nueva plataforma nacional conjunta para dar respuesta apropiada a
testamento por cuanto muere poco tiempo después.
Durante mucho tiempo, la influencia del distancia- la nueva coyuntura presentada en el continente sudamerimiento geográfico entre ambas sociedades incidió para cano y a convertirse en una respuesta regional ante el emque cada uno de los dos países se insertara en circuitos in- puje de la globalización en curso, líderizado por los Estados
12
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Unidos. Así, la historia presente de la relaciones se torna
determinante para el futuro de la unidad del Continente
Suramericano. Para Venezuela es un soporte importante
en su proceso de concretar el viraje de su política exterior
hacia el Sur, y para Brasil resultan de gran valor porque le
permiten contar con un aliado estratégico de primer orden
al norte de su territorio. Para ambos, resulta de gran ayuda mutua la coordinación entre sus gobiernos de políticas
tendientes a la construcción de un futuro prospero y digno
para sus ciudadanos.
Derelacionesdiplomáticasdistantesarelaciones
internacionalesplenas
En el presente después de superar el distanciamiento del pasado se establecen las posibilidades para que
Brasil considerado como uno de los países más industrializados del mundo pueda vincularse con Venezuela, con una
de capacidad energética de importancia mundial. Brasil,
según cifras suministradas por el Instituto Brasileño de
Geografía y Estadística, en el 2005, sumó un PTB de US$
795,776 millones, lo que le permitió al país recuperar su
posición como la mayor economía de Latinoamérica y undécima del mundo.11
Las relaciones venezolano brasileñas se apoyan
en bases firmes. Tanto la Constitución brasileña de 1988 y
como la venezolana de 1999 propician la integración latinoamericana. En la del Brasil, en su Título I en lo relativo
a “Los Principios Fundamentales”, destaca en su Parágrafo
Único: “La República Federativa del Brasil buscará la integración económica, política, social y cultural de los
pueblos de América Latina mirando hacia la formación
de una comunidad latinoamericana de naciones”.12 En la
venezolana, en su Título IV, en lo concerniente a las relaciones internacionales en el artículo 153, se expresa: “La
República promoverá y favorecerá la integración latinoamericana y caribeña, en aras de avanzar hacia la creación
de una comunidad de naciones, defendiendo los intereses
económicos, sociales, culturales, políticos y ambientales de
la región”.13 Posiblemente, puedan presentarse enmiendas
o cambios constitucionales en el futuro, pero no resulta
previsible pensar que las bases establecidas para la integración sean alteradas. Por el contrario, cada vez afloran más
afinidades y elementos de convergencia de los dos países
hacia un destino común.
La importancia de las relaciones de Brasil con
nuestro país durante el gobierno del presidente Lula, fue
reconocida por el Ministro de Relaciones Exteriores de
Venezuela, Ali Rodríguez Araque, en su informe ante la
Asamblea Nacional del 2004, cuando señala: “las relaciones con el Brasil han adquirido un especial ímpetu y dinamismo, reafirmándose los sólidos lazos de amistad que
las han caracterizado. Con el Presidente Luiz Inácio Lula
da Silva, hemos puesto en marcha una intensa relación
que va más allá de los tradicionales vínculos de amistad,
favorecidos por las coincidencias y afinidades en los prinCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
cipales asuntos de la agenda regional e internacional y en
la vocación integracionista y sudamericana que comparten
ambos mandatarios”.14 Desde otro punto de vista, se puede
señalar que el mejoramiento de las relaciones diplomáticas
de los dos países hasta alcanzar en la actualidad niveles sin
precedentes se inscribe dentro de las coincidencias ideológicas de los ambos gobiernos, de tendencia de izquierda.
CambiosycontinuidadenlasrelacionesLula/Chavez
Con la elección del presidente Constitucional de la
República de Venezuela, Hugo Rafael Chávez Frías el 6 de
diciembre de 1998, se hizo evidente un amplio sentimiento a favor de cambios de orientación en la conducción de
los asuntos del Estado, cuando el 56,24% de los votantes
lo eligieron para ocupar el cargo. El triunfo electoral de
Chávez y sus actos posteriores como gobernante no han
sido los de un presidente más en la larga sucesión presidencial venezolana, iniciada a partir de 1958, fecha en que
fue derrocada la dictadura de Marcos Pérez Jiménez, sino
que viene a ser la alteración del curso democrático establecido. En la extensa bibliografía desarrollada, (con más
de 300 títulos publicados hasta el presente), se observa un
debate entre los autores que sostienen el agotamiento histórico del pacto de gobernabilidad democrática conocido
como “Pacto de Punto Fijo”, establecido después del 23 de
enero de 1958,15 e interpretaciones diferentes con relación
al fenómeno que representa Chávez en el escenario político venezolano contemporáneo: las mismas giran entre el
neo-populismo y la “revolución bolivariana”.
En el primer caso, con relación al populismo, se destacan los aspectos referentes al patrón personalista y paternalista, la coalición política policlasista y heterogénea concentrada en sectores subalternos de la sociedad venezolana,
expresados en el poder de movilización política de arriba
hacia abajo que pasa por alto las formas institucionales o
los subordina a vínculos más directos entre el líder y las
masas. También, se refieren a la ideología amorfa y a los
proyectos económicos que utilizan métodos distributivos
‘clientelistas’, difundidos a fin de crear una base material
para el apoyo popular, manteniendo fuertes márgenes de
corrupción.16 Se destaca asimismo, la forma de un régimen
“populista mediático” que se caracteriza, por un gobierno
donde el Jefe (Chávez) y el Pueblo se establece una relación
directa a través de los medios de masas con la consiguiente subestimación de los otros poderes públicos del Estado
venezolano.
En el segundo caso, los autores destacan como temas
de investigación: la incorporación de los marginados, el
inicio del desarrollo endógeno tendiente a la construcción
de un nuevo tipo de sociedad socialista, el rescate de la autoestima del venezolano, y de su plena soberanía sobre sus
riquezas naturales, en especial el petróleo.
Para el presente trabajo nos importa destacar los cambios de la política exterior presentados bajo la administración Chávez. Durante el siglo XX la producción petrolera
13
venezolana se orientó hacia los Estados Unidos. La subordinación de su principal producto le crea serios problemas
de dependencia y de identidad nacional, agudizados en el
presente por la transformación de Estados Unidos en potencia unipolar en un mundo globalizado. La constatación de esta realidad mueve a la Cancillería venezolana -a
partir del 2000- a buscar vías alternas de relaciones que
le permitan desembarazarse de su alta inclinación hacia el
hemisferio norte. En este sentido, busca la creación de una
multipolaridad y, para ello fortalece los vínculos en su entorno geográfico natural, América del Sur. En este punto
es consecuente con el ideario bolivariano de la integración
costo social del país y la voluntad del Estado que representa la profundización de la unidad sudamericana. Estos
dos puntos guardan afinidad con los cambios imperantes
en Venezuela. En el informe del año 2003 a la Asamblea
Nacional, la Cancillería venezolana reconocía: “las relaciones con Brasil están dirigidas a fortalecer la cooperación
entre ambos países en el ámbito bilateral e internacional,
con el fin de ver integrada a la región total y realmente”.18 En ese mismo año, correspondiente al primer año
del Presidente Lula en el gobierno, se produjo un incremento del intercambio comercial de carácter importante,
que se puede medir en las exportaciones de Brasil hacia
Venezuela por un volumen valorado en 605.717.717 millones
Conlacoordinacióndelasactividadesyladiplomacia
de dólares contra una importapresidencial,seamplíanloscontactosdelosfuncionarios
ción de 217.154.451 millones de
dólares, con un saldo favorable
gubernamentalesdeambospaíses,enespecialenelárea
a Brasil de 330.563.263 millones
delcampoenergético.
de dólares.19 En el 2004 el comercio, comparado con el año antelatinoamericana, para formar una ‘patria grande’. La facti- rior, creció el 48% saltando de 37,9 billones de dólares para
bilidad de estas aspiraciones nacionales pasa por el reco- 56 millones de dólares.20 En el mes de febrero del 2005,
nocimiento de Brasil como un país básico y fundamental cuando el Presidente Lula visita oficialmente a Venezuela,
en la unificación suramericana.
se estimaba que el intercambio comercial podía crecer en
En Brasil, a partir de la década de 1990 se venía mani- un 85.5% al pasar de 1,6 millones de dólares en 2004 a 3
festando un rescate de la identidad nacional latinoameri- millones de dólares al cierre de ese año fiscal.21 Igualmente,
cana y particularmente, suramericana. Esta situación, tiene según declaraciones de algunos analistas, en los años siun periodo de gestación durante los años finales de la dic- guientes el intercambio podría saltar a los 5 billones. Sin
tadura militar y el inicio de los gobiernos democráticos en embargo, en la actualidad la asimetría existente de las rela1985. En esos años, Itamaraty pasa de una política exterior ciones comerciales es motivo de consideración por los dos
del primer mundo, a otra pragmática y de acercamiento al países, que buscan formulas para conseguir un intercamtercer mundo. La toma de conciencia se orienta a superar bio más equilibrado.
el conocimiento de nuestro continente como mera referencia cartográfica en el mapamundi, y contribuir de ma- Escaladahaciaunaarticulaciónpermanente
nera decisiva para convertirlo en un espacio unificado del
Durante el primer año de gobierno del presidente Lula
desarrollo del siglo XXI. Así, el enorme país vecino tiende entre el mes de enero de 2003 y el mes de diciembre de
a convertirse en el gran centro articulador del proceso in- 2004 se produjeron varios encuentros presidenciales: Hugo
tegracionista y el marco de referencia en la constitución de Chávez viajó al Brasil en ocho oportunidades mientras Lula
un nuevo polo de referencia en el hemisferio sur del mun- visitó Venezuela en dos oportunidades. La diplomacia predo. En principio, de manera evidente, el nuevo giro empezó sidencial compartida contribuyó grandemente al proceso
a manifestarse a partir de los acuerdos de la “Guzmanía” de expansión y solidificación de las relaciones binacionamediante los cuales los presidentes de Venezuela y Brasil les. Así, los sucesivos encuentros fueron escalonando un
manifiestan su voluntad política de impulsar las relacio- mayor grado de articulación binacional y fortalecieron las
nes binacionales.17 A partir de entonces se experimenta el posibilidades de integración suramericana, tal como sucegran salto en las relaciones, incrementándose de manera dió en la reunión de la Cúpula del “Grupo de Río”, en Brasil;
sostenida el intercambio comercial binacional. La situaci- en la III reunión de Presidentes de América del Sur en el
ón mejora en diciembre de 2002 cuando en las elecciones Cuzco, Perú; y en la reuniones del Consejo del Mercado
presidenciales brasileñas gana por amplio margen, Lula Da Común de Belo Horizonte y después en la Cúpula de
Silva. Este triunfo electoral brasileño no presenta los nive- Presidentes del MERCOSUR en Ouro Preto, Minas Gerais,
les traumáticos de Venezuela; sin embargo, demuestra el donde se acordó el ingreso de Venezuela como miembro
movimiento del centro político establecido en Brasil hacia asociado. El Acuerdo continental se fortaleció en octubre
la izquierda para fortalecer el proceso de orientación so- de 2004 con el Acuerdo de Complementación Económica
cial.
No 59 (ACE-59) entre la Comunidad Andina de Naciones
Cuando asume la presidencia el Presidente Lula en ene- (CAN) y MERCOSUR creando un espacio sudamericano
ro de 2003, manifiesta su determinación de encarar el alto integrado.
14
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Con la coordinación de las actividades y la diplomacia
presidencial, se amplían los contactos de los funcionarios
gubernamentales de ambos países. En especial, en el área
del campo energético. Así, el presidente de PDVSA, visita
el Brasil informando a la prensa de los estudios tendientes a la construcción de refinerías en el Estado de Río y
Pernambuco.22 En el caso de ésta última los medios venezolanos anunciaron su construcción para el mes de septiembre de 2005, considerándolo como uno de los planes
de mayor envergadura que evalúan Pdvsa y Petrobras.23
Según las fuentes informativas se estima que la refinería
requerirá una inversión de 2.500 millones de dólares y será
construida en la región metropolitana de Recife con la intención de procesar entre 200 mil y 250 mil barriles por
día de crudo pesado.24 Estos proyectos se concretaron mediante la firma de un plan energético firmado en Brasilia
el jueves 30 de septiembre de 2005 durante la visita del
Presidente venezolano.
Según informó Petróleos de Venezuela (PDVSA)
en aviso de prensa, la selección del estado brasileño de
Pernambuco se debió a que es el segundo mayor consumidor de combustible del mercado noreste del Brasil, después de Bahía y presenta actualmente un crecimiento en la
demanda de derivados como diesel y especialmente GLP.
Pernambuco contaba además con el área industrial de
Suave, que ésta en funcionamiento desde hace más de 25
años y presentaba además el espacio suficiente para la edificación de la refinería y las características adecuadas para
las actividades de industrialización del petróleo, según las
autoridades de Brasil. Asimismo, las condiciones oceanográficas facilitan la construcción de un puerto adecuado
para la refinería.25
A finales del 2005 las informaciones disponibles indicaban un cambio de orientación de la administración de
durante el primer gobierno de Carlos Andrés Pérez, el 1
de enero de 1976, como “Petróleos de Venezuela S.A”, integrado por tres filiales: Lagoven, Maraven y Corpoven, e
inicia sus actividades con una producción de 2,3 millones
de barriles diarios.28 Ambas compañías, sufrieron transformaciones en el año 2004, impulsando proyectos sociales,
culturales y de educación ambiental en sus respectivos países.
A otro nivel, después de 1994, los sectores empresariales privados actúan con prontitud y le imprimen gran dinamismo al intercambio comercial binacional. Así, incursionaron en los sectores de construcción, petróleo, energía
y alimentos. También, se incrementó la importación de
productos brasileños en el sector agrícola de carne de res,
ganado, productos terminados como margarinas, mortadela y aceites comestibles, al igual que vestido y calzado,
automóviles, maquinas agrícolas y otros bienes. Más recientemente se establecen proyectos de fabricar en astilleros de Brasil, barcos de gran calado para incrementar la
flota petrolera venezolana.
Otro aspecto digno de destacar, es la participación activa del Brasil en el Grupo de Amigos, formado para cooperar con la búsqueda de una salida democrática al grave
impasse y conflicto político venezolano,29 el cual se alcanzó, en medio controversias, mediante el referéndum presidencial del 15 de agosto de 2004. Brasil propuso y coordinó
el grupo integrado por los Estados Unidos, Chile y España,
desempeñando un papel importante en la implementación del referendo revocatorio que convalidó la legitimación
del presidente Hugo Chávez. En más de una oportunidad
el presidente Lula se refirió a la decidida participación de
su gobierno y de Itamaraty en el resultado satisfactorio del
referendo. En retribución, en el 2005, ante la crisis política
surgida en Brasil a partir del mes de junio, por denuncias
de corrupción en el partido de
gobierno, PT, y su implicación
Aotronivel,despuésde1994,lossectoresempresariales
con la clase política brasileña, el
privadosactúanconprontitudyleimprimengran
presidente venezolano declaró
dinamismoalintercambiocomercialbinacional.
públicamente su apoyo al presidente Lula.
PDVSA, realizándose una drástica revisión de su gerencia
En el plano social, merecen una mención especial los
y del negocio del petróleo con la finalidad de cambiar sus vínculos que se han venido estrechando entre sectores y
socios tradicionales y conseguir nuevos mercados en Sur clases sociales importantes de ambos países. Los sindicaAmérica. En este viraje, el gran triunfador es la empresa tos y miembros de la clase obrera intercambian sus expebrasileña Petrobras, a la que le fue asignado el tan peleado riencias y establecen puntos coincidentes ante aspectos
proyecto de gas Mariscal Sucre, para el que se requieren concretos como por ejemplo, la integración binacional.
inversiones de 2.2 millardos de dólares.26 Así como la cons- Igualmente, el Gobierno de Venezuela y el Movimiento de
trucción de un gasducto para conectarse y suministrar el los sin Tierra de Brasil, firmaron el 26 de septiembre un
gas venezolano dentro del Brasil y después arrancarían los acuerdo de cooperación para llevar adelante un trabajo
proyectos de la plataforma deltana (en estudio).
social en el Núcleo de Desarrollo Endógeno Agroturistico
La compañía brasileña Petróleo Brasileño S.A., “Madre Vieja” en Sabaneta de Barinas, Venezuela. Según
Petrobras, fue creada el 3 de octubre de 1953, por el en- los medios de comunicación venezolanos, el proyecto se
tonces presidente Getúlio Vargas, mediante la Ley 2004,27 extiende desde Barinas hasta los estados andinos y se llamientras la venezolana (PDVSA), se creó mediante el de- mará “José Ignacio Abreu de Lima”, en memoria al revolucreto presidencial No. 1125 y entra en funcionamiento cionario socialista brasileño.30
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
15
de América del Sur”; la contribución a la creación de una
En el marco de la visita a Venezuela del presidente bra- nueva geografía política, económica y comercial mundial.
sileño, Luiz Ignacio Lula da Silva durante los días 13 y 14 Reconocen Los presidentes reconocen que estos y otros
de febrero de 2005, se acordó junto con el presidente Hugo puntos se encuentran “inspirados por los más puros ideChávez Frías, elevar las relaciones bilaterales a un nivel de ales de nuestros grandes símbolos como Simón Bolívar
“Alianza Estratégica”, en los ámbitos político, social, econó- y José Ignacio Abreu e Lima”. Este último conocido en
mico, cultural, científico, tecnológico y militar.31 El evento Pernambuco, su tierra natal, como “el general de las masas”,
mediante el cual, se firmaron más de 15 acuerdos en el área se ha convertido, como ya se menciono, en un indeleble
energética, fue considerado por un importante medio de símbolo de unión entre Brasil y Venezuela.
La evocación a los grandes símbolos reconoce de macomunicación venezolano como: “la más valiosa alianza
nera
implícita la fuerte vocación de ambos países por manestratégica alcanzada por país alguno en toda la región”. 32
En el comunicado conjunto firmado por ambos dig- tener vivo el recuerdo de los próceres de la Independencia,
natarios, destacan: “extensas fronteras comunes, enormes de manera concreta la aspiración de los prohombres de
recursos energéticos, potenciales humanos que a lo largo la Independencia por mantener la unidad de América
de la historia se han expresado en el ámbito científico del Latina.
Para implementar la “Alianza Estratégica”, los dos países
pensamiento económico, social y político; una rica creaciimplementaron
un amplio programa de iniciativas estudiaón cultural, vastas extensiones territoriales, cruzadas por
impresionantes masas de agua, condiciones para brindar das previamente por la Comisión Binacional de Alto Nivel
a la humanidad recursos naturales y alimentos; extensos (Coban). Este organismo, creado después de 1989 como
un mecanismo para solventar la
grave crisis debida a la invasión
Enelplanosocial,merecenunamenciónespeciallos
de los ‘garimpeiros’ (buscadores
vínculosquesehanvenidoestrechandoentresectoresy
brasileños de oro ilegales) al territorio venezolano, e integrado
clasessocialesimportantesdeambospaíses.
por diferentes ministerios y entes gubernamentales de los dos
mares que se abren para las comunicaciones; climas estapaíses,
logró
superar
dicha
crisis. Sin embargo, si bien el
bles, toda la suma de posibilidades para la prosperidad de
nuestros pueblos”.33 Las anteriores ventajas humanas y na- COBAN no se reunía desde febrero de 2000, fue reactivaturales le permiten a los dos países aspirar a la creación de do en el año 2005 con el fin de crear la plataforma para la
una “patria grande”, según expresan ambos en el documen- “Alianza Estratégica”. A tal efecto, se integraron diferentes
to oficial. Sin embargo, las posibilidades históricas poten- grupos de trabajo, en las áreas: primero, de energía, petróciales, se encuentran limitadas en la actualidad y en tal sen- leo y gas; segundo, minería; tercero, tributos y aduanas;
tido expresan, “Por doloroso contraste ese impresionante cuarto, financiación; quinto, industria y comercio; sexto,
potencial físico y humano, hoy telón de fondo de la más agricultura familiar y reforma agraria; séptimo, turismo;
estremecedora y creciente pobreza de nuestros pueblos. octavo, cooperación técnica; noveno, acuicultura y pesca;
He allí el desafío para nuestras naciones y para sus lidera- décimo, ciencia y tecnología; undécimo, comunicación e
zgos. He aquí la posibilidad para encararlo exitosamente: información. A las anteriores áreas se le añaden otros teintegrar nuestras fortalezas para superar y vencer nuestras mas de interés como el fondo humanitario internacional,
la carta social de las Américas, integración energética, el
carencias en la ruta hacia la unión y prosperar”.34
36
La aspiración de construir una “patria grande” lleva a Banco de Desarrollo del Sur, y Telesur. Los textos se orlos presidentes venezolano y brasileño a coincidir en el ganizaron en una serie de documentos oficializados bajo
dialogo político, en la ampliación del comercio de bienes la forma jurídica de “memorandum de entendimiento”,
y servicios y en la integración de la infraestructura que “acuerdo de confiabilidad” o “carta de intención”, y fueune a los dos países.35 En lo concreto, se establecen diez ron firmados por diferentes entes gubernamentales de los
(10) “componentes” fundamentales para mejorar y ampliar dos países. Entre las área cubiertas por los acuerdos figulas relaciones entre los dos países. Entre ellos, merecen ran: energía y petróleo: “combustible etanol”, industria del
ser destacados los acuerdos referentes a “la reducción y biodiesel, construcción de plataformas y navíos. Además,
eliminación de la pobreza que azota a millones [de vene- el Proyecto Mariscal Sucre, y el Proyecto conjunto en la
zolanos y brasileños] y que se erige como el mayor obs- Faja del Orinoco; producción y distribución de lubritáculo para el fortalecimiento y prosperidad de nuestras cantes, en áreas de refinación, de comercio y transporte
naciones”. También, los referentes a “explotar todas las po- marítimo; área de fertilizante, de poliolefinas; técnica y
sibilidades de complementación económica entre los dos capacitación de personal entre petróleos. Por otra parte
países”; la constitución de la “Comunidad Suramericana se consideraron las oportunidades de negocios en matede Naciones”; lo referente a “la Amazonía” como una re- ria de hidrocarburos; la identificación de oportunidades
gión de “extraordinaria riqueza, compartida por los países en el bloque cinco, del Proyecto Plataforma Deltana. En
Alianzaestrategicaparaconstruirla“PatriaGrande”
16
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Minería, destacan los acuerdos relativos a la compañía
de carbón Carbosuramérica S.A., el complejo industrial
minero–metalúrgico entre la Corporación Venezolana de
Guyana (CVG) y la Compañía do Vale do Río Doce, y el
entendimiento para el desarrollo de información científica
y técnica en el área de geología. En Tributos, se suscriben
acuerdos para evitar la doble tributación y la evasión fiscal. También, la categoría de la Aduana de Santa Elena de
Uairén, a principal, hecho concretado en el mes de agosto
del 2005.37 Otros acuerdos en las áreas antes mencionadas
se suman para establecer una extensa red donde se entrecruzan intereses públicos y privados de los dos países.
En el acto protocolar de la firma del memorable
acuerdo en el Palacio de Miraflores, en Caracas, el presidente Lula en su discurso señaló: “posiblemente, [Hugo]
Chávez, ni Ud. ni yo vayamos a ver la plenitud del proyecto. No siempre el pionero consigue disfrutar de la primera
producción de la tierra descubierta. Lo que importa es que
los que vengan después puedan dar continuidad [a la obra]
y lo hagan mejor de lo que nosotros lo estamos haciendo”
y seguidamente aseveró, “estamos construyendo un nuevo mundo”.38 Por su parte, el presidente Chávez en su discurso ante la representación de empresarios venezolanos
y brasileños reunidos para la ocasión en Caracas, pidió a
los venezolanos manifestar su patriotismo para impulsar
el proceso de unificación con Brasil y desechar la postura
servil ante los Estados Unidos. En esa oportunidad alabó
al empresariado brasileño “que jamás se ha entregado a intereses imperialistas, apuñalando a su propia patria”.39
económicas son apoyadas por la presencia de la estructura
diplomática de ambos países, en especial las embajadas y
los consulados. Por ejemplo, Venezuela además de su embajada en Brasilia cuenta con cinco consulados localizados
en las ciudades de Belén, Boa Vista, Manaos, Río de Janeiro
y Sao Paulo, que apoyan las iniciativas económicas de
nuestro país. Por su parte Brasil además de su embajada en
Caracas, cuenta con sus consulados en Puerto Ordaz, San
Elena de Uairén y un Viceconsulado en Puerto Ayacucho.
Entre las empresas brasileñas establecidas en nuestro
país, destacan entre otras la Odebrecht, C. A., la Brahma y
la línea aérea Varig. Odebrecht es una de las ocho empresas
más grandes del Brasil, fundada en Salvador (BH) en 1944,
la cual aparece especializada en ingeniería y con el tiempo
logra desarrollar tecnología propia para grandes edificaciones en el trópico. En la actualidad además de las actividades de ingeniería, incursiona en las áreas de inmobiliaria
y turismo, además participa de proyectos especiales en los
sectores de generación de energía, minería, infraestructura y consecución de servicios públicos. Está considerada
como la mayor empresa de Ingeniería y Construcción de
América Latina y la mayor exportadora brasileña de servicios.40
La empresa Odebrecht llegó a Venezuela en 1992 para
construir un centro comercial en la ciudad de Maracaibo, el
“Centro Lago Mall”, en la actualidad, en el 2006, construye
las líneas tres y cuatro del Metro de Caracas; el segundo
puente sobre el río Orinoco; lleva a cabo también la construcción de una hidroeléctrica; un sistema de irrigación El
Diluvio – El Palmar; así como una carretera en el nororienLasempresaseinversionesbrasileñasenVenezuela
te venezolano, además de otros proyectos en estudio, como
Respecto a las inversiones existentes entre ambos paí- la construcción de un tercer puente sobre el río Orinoco.41
ses es importante destacar cómo las actividades industria- Estas obras vienen avaladas por el Estado Brasileño y han
les, comerciales, o de otros ramos, se vienen organizando sido bien recibidas por el Estado venezolano; en tal sentiy ampliando con gran rapidez durante los últimos años. do, para la ampliación de ésta y otras actividades futuras,
el gobierno brasileño bajo el gobierno del
Presidente Lula ha ofrecido a Venezeula
Laaspiracióndeconstruiruna“patriagrande”lleva
una línea de crédito por el orden de los
mil millones de dólares, suministrados
alospresidentesvenezolanoybrasileñoacoincidir
por intermedio del Banco Nacional de
eneldialogopolítico,enlaampliacióndelcomercio Desarrollo Económico y Social de Brasil
debienesyserviciosyenlaintegracióndela
(Bndes), cuyo receptor en Venezuela es
Bandes con 200 (doscientos) millones
infraestructuraqueunealosdospaíses.
de dólares, en tanto que los 800 millones
restantes los administra la Corporación
En principio se encuentran las grandes empresas estatales, Andina de Fomento (CAF). Evidentemente, el aumento de
seguidas por la ampliación y multiplicación de un número la inversión brasileña en la economía venezolana es una
apreciable de empresas privadas organizadas mediante una realidad en incremento y se traducirá en un estimulo para
red en expansión de Cámaras de Comercio Binacionales, ampliar la apertura comercial binacional.
establecidas en diferentes ciudades y Estados de ambos
Por su parte, la Compañía Cervecera Brama, de Brasil,
países. En Brasil destacan las establecidas en las ciudades creada en Río de Janeiro en 1888, puede ser considerada
de Sao Paulo, Roraima, Pará, Rondonía, Paraná, Río de como una de las empresas pioneras del proceso de indusJaneiro, y Manaos en Amazonas. Por su parte en Venezuela trialización en Brasil y Latinoamérica y en la actualidad
se han constituido las de Caracas, Puerto Ordaz, Valencia, está catalogada entre las diez mejores cervezas del mundo.
Margarita y Puerto Ordaz. Evidentemente, las iniciativas Esta empresa llega a Venezuela a finales de la década de
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
17
1980, cuando compra la “Compañía Nacional”, establecida
en la ciudad de Barquisimeto, Estado Lara, desde esta ciudad, cuyas aguas se caracterizan por tener una insuperable pureza que garantiza la producción de una excelente
cerveza, se proyecta cubrir, además del mercado nacional,
el del Caribe y el norte del Brasil. En Venezuela, mantiene centros de distribución en la Gran Caracas, Valencia,
Barquisimeto, Barcelona, Cumana y Porlamar, desde los
cuales se proyecta para alcanzar una alta posición entre las
empresas cerveceras del país, con una producción estimada en la actualidad en 2,1 millones de hectolitros anuales.42
Con relación a la Compañía brasileña de aviación, Varig,
creada por Otto Ernst Mayer el 7 de mayo de 1927, en la
ciudad de Porto Alegre, como S.A. Río Grandense, convertida con el tiempo en la primera línea comercial de Brasil,
tiene una larga permanencia en Venezuela, cubriendo el
aeropuerto de Maiquetía como punto de conexión de sus
vuelos comerciales entre Brasil y los Estados Unidos o hacia Europa.43 En el presente, ésta compañía, prácticamente
domina los vuelos comerciales entre Venezuela y Brasil.
También, en el área de transporte terrestre merece destacarse la presencia de la Línea de autobuses EUCATUR,
en la explotación de petróleo en la faja del Orinoco. De
hecho, el presidente venezolano, Hugo Chávez, en su breve visita del 12 de agosto de 2005 a Brasilia, le ofreció al
Brasil la explotación del campo Cerro Negro, que cuenta
con reservas estimadas en 50 mil millones de barriles de
crudo.45 También, merece destacarse como atractivo para
la inversión brasileña, el gran potencial de energía eléctrica localizada en la represa del Guri, e igualmente el potencial que representa a futuro el río Caura, y el hecho de
que Venezuela ofrece una salida muy importante al océano
Atlántico y al mar Caribe a través de sus puertos.
En la Agenda del Ministerio de Relaciones Exteriores
de Venezuela del 2003, cuando se iniciaba el gobierno de
Lula, se visualizaba la vinculación con Brasil como la complementación de dos unidades de importancia vital para
la proyección económica de nuestro continente. Por ser el
Brasil una potencia industrial, y Venezuela una potencia
energética.
En cuanto al acuerdo petrolero establecido entre los
dos países, se han producido diferentes señalamientos por
parte de influyentes miembros gubernamentales de ambos gobiernos, que coinciden en manifestar la aspiración
de crear una organización trasnacional a nivel de Sur América,
LacondicióndeVenezuelacomounodelosgrandes
una compañía trasnacional:
productoresdepetróleodelmundoleofreceoportunidades “Petroamerica”. La idea, sugerida por el presidente Chávez, en
favorablesparaunentendimientoalargoplazoconBrasil.
función de establecer un “anillo
energético” entre los países suconocida como Caribe, (Empresa Unión Cascabel de ramericanos vinculando las reservas de gas de Venezuela
Transporte y Turismo LTD), que cubre la ruta entre las ciu- con las de Bolivia, para surtir en conjunto las demandas
dades de Caracas, Puerto Ordaz, Boa Vista y Manaus. Esta de Brasil y Argentina, se encuentra en proceso de estudio
ruta terrestre permanente también le abre grandes posibi- sobre su factibilidad. Evidentemente, el proyecto presupone la convergencia y/o fusión de algunas grandes empresas
lidades al turismo y al comercio binacional.
Por otra parte, según informa el periódico “Jornal do nacionales ya existentes como son PDVSA Y PETROBRAS,
Comercio”, de Río de Janeiro, el “Sindicato Nacional de la lo cual supone la superación de muchos factores burocráIndustria de la Construcción Nacional” de Brasil (Sinoval) ticos nacionales, además, de una voluntad política gubertiene asegurada la construcción, en sus astilleros, de por lo namental de ambos países. En todo caso, las tendencias
menos 28 de los 42 embarcaciones nuevas que planea en- están presentes en las administraciones de las dos grandes
cargar la empresa venezolana PDV Marina en el 2006, con compañías petroleras, tanto de colaboración como de convergencia. Esta situación, en el 2006 y adquiere un nuevo
una inversión total de 3 mil millones de dólares.44
contexto potencial con el triunfo electoral de Evo Morales
Lacontrapartevenezolana
en Bolivia que pudiera ampliar una colaboración energétiLa condición de Venezuela como uno de los grandes ca a escala sudamericana.
La colaboración mutua entre PDVSA Y PETROBRAS,
productores de petróleo del mundo le ofrece oportunidades favorables para un entendimiento a largo plazo con a partir del 1 de enero de 2003, muestra una larga lista de
Brasil. Esta situación contribuiría a consolidar la posición acciones en común. Entre otros hechos, merece destacarse
mundial del Brasil y fortalecería su actitud de país estabi- el episodio creado por la huelga petrolera de la compañía
lizador en Sur América. También, se observa el interés del venezolana PDVSA,46 como parte del paro nacional que
Brasil, durante el gobierno de Lula, de inscribir a Venezuela ocasionó perdidas por el orden de 20 mil millones de dóladentro de las relaciones internacionales procurando armo- res. En esta oportunidad, la decisión política de Fernando
nizar los intereses de ambos países, uniendo a ello el deseo Henrique Cardoso, todavía en ejercicio de su cargo en dide una mayor inserción del Brasil como protagonista de ciembre del 2002, apoyada por el presidente electo, Lula da
las negociaciones. También, al Brasil le interesan las gran- Silva, resuelve, en pleno período de transición, el envío a
des reservas de gas venezolano, así como su participación Venezuela de 525.000 barriles de gasolina en el tanquero
18
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
griego, “Amazonan Explorer”, contratado por la compañía
Petrobras. El envío presenta las características de una decisión del Estado brasileño, mediante la cual se ayuda al
gobierno venezolano en un momento muy delicado del
acontecer nacional determinado por la huelga de PDVSA.
Según, los analistas políticos, la ayuda brasileña fue de gran
importancia para que el gobierno venezolano pudiera superar la grave crisis de inestabilidad política nacional. Años
después, en julio de 2005, la prensa venezolana informaba
que la compañía brasileña iniciaba la exportación de alcohol de caña de azúcar combustible, para ser mezclado con
la gasolina de la flota automovilística venezolana.47
Por otra parte, son varias las referencias de los empresarios privados venezolanos con relación al incremento de
las oportunidades de negocio e integración entre los sectores privados de ambos países. Así, por ejemplo, El ingeniero Nelson Quijada Ugarte presidente de la Cámara de
Comercio e Industria Venezolano Brasileña (CAVENBRA)
en declaraciones a la prensa venezolana comentó las grandes posibilidades que se abren a los empresarios privados
a partir de los múltiples acuerdos firmados entre por los
gobiernos.48 Observación especial merece el otorgamiento
de aproximadamente un millón de dólares de PDVSA para
la presentación en el carnaval de Río de Janeiro, del 2006,
de la figura del Libertador, Simón Bolívar, por la Escuela
de Samba Vila Isabel. La Escuela obtuvo el primer lugar
en el evento y las repercusiones en Venezuela resultaron
polémicas.49
LaAmazoníaylaOrinoquia:dosregionesen
articulación
Entre las cuencas de estos dos ríos, el Amazonas y el
Orinoco, se extiende el amplio espacio que configura el
hinterland suramericano. En ese enorme espacio, compartido por los dos países, se presenta una distribución de sus
poblaciones siguiendo cursos diferentes y manteniendo todavía un distanciamiento histórico, el cual ha comenzado
a verse aminorado en tiempos recientes. Estos territorios
compartidos se extienden como una continuidad geográfica en el plano suramericano, ampliando las posibilidades
de desarrollarse en conjunto para producir más y de manera uniforme, ocupando en total 2.230.000 km2 , comprendiendo los estados de Brasil: Roraima y Amazonas, y de
Venezuela, Bolívar y Amazonas, entre los cuales se abren
enormes posibilidades de integración. Creemos oportuno
señalar en este punto que, estos enormes espacios pueden
eventualmente ser susceptibles de ser reorganizados en lo
atinente a lo político territorial, en la medida en que los
territorios más apartados, localizados en cada país, sean
incorporados por la ampliación de la colonización interna
y las demandas del crecimiento nacional. Con éste propósito, se han formulado propuestas antes los congresos de
Venezuela y de Brasil, con la intención de dividir y crear
nuevos estados fronterizos.50 Los cambios también pueden
surgir ante la formulación de mapas más precisos como
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
producto de la utilización de la nueva tecnología satelital.51
En cuanto a los intentos de cooperación ya se han
producido varios importantes avances durante los últimos años, tales como reuniones e intercambio de entrevistas entre los gobernadores de estos estados fronterizos.
Consecuentemente, aumenta la actitud integracionista en
los diferentes niveles de ambos gobiernos por desarrollar
planes conjuntos en las áreas fronterizas. Esta tendencia
se fortalece en la actualidad cuando una de las prioridades
de la política exterior del gobierno del Presidente Lula se
orienta a mejorar la infraestructura de vinculación con sus
países vecinos.
Tanto en Venezuela como Brasil se han producido cambios demográficos significativos, entre ellos los relacionados con la distribución de sus poblaciones en el tramo de
sus respectivas divisiones políticas y territoriales fronterizas. En la actualidad se establecen enormes posibilidades
para el futuro poblacional al sur del Orinoco, en el caso de
Venezuela, y para Brasil, en la macro región Norte. La parte norte de Brasil esta dejando de ser percibida como una
rémora deprimida y de atraso económico para el país, para
convertirse en un espacio atractivo para la ocupación poblacional. Semejante situación ha de modificar de manera
inevitable las tendencias tradicionales de los movimientos
migratorios internos en ambos países.
En general, la falta de población no se conjuga todavía
con las amplias posibilidades de los territorios binacionales. En la Guayana venezolana, donde se hallan ingentes
recursos, que por su diversidad y cuantía podrían permitir
el desarrollo de una actividad económica y constituirse en
las próximas décadas en la verdadera alternativa no petrolera del país, todavía están por implementarse verdaderos
planes de desarrollo. Por otra parte, Guayana es una región
contigua al Amazonas, donde se encuentran las reservas
forestales e hidrográficas más importantes de Venezuela.
Estos recursos tienen una gran importancia para el futuro;
basta con señalar que el agua potable, según los pronósticos, tendrá una demanda primordial en el transcurso del
presente siglo.
En la actualidad, los gobiernos de los presidentes
Chávez y Lula emprenden planes conjuntos considerando el desarrollo integrado de sus respectivos territorios.
La macro región Norte de Brasil le ofrece a la economía
venezolana oportunidades para avanzar y participar en la
recuperación de una zona deprimida en el pasado y con
pocas vinculaciones concretas con la parte industrializada
de ese país.52 Esta parte del Brasil comprende el “Amazonas
Legal”, constituido por los estados de Acre, Amazonas
Roraima, Rondonia, Pará y Amapá, que abarca un espacio
de 3 millones de km2, y una población en el año 2003 que
alcanzaba un promedio de 20 millones de habitantes.
Venezuela y Brasil comparten 2.200 kilómetros de fronteras, de los cuales 895 se hallan entre los estados Bolívar de
Venezuela y Roraima de Brasil, y 1304 km entre los estados
19
Amazonas de ambos países. El segmento correspondiente
al estado Bolívar es el más activo, y se muestra en la actualidad como una frontera viva, particularmente en la línea
divisoria cerca de Santa Elena de Uairén, en la población
fronteriza conocida como “Villa Pacaraima”, en la parte
brasileña contigua al hito fronterizo número 8 (Venezuela/
Brasil-8). La parte correspondiente a los estados Amazonas,
de ambos países, donde se encuentra la mayor selva tropical del planeta, es una frontera, desde el punto de vista del
comercio, muchos menos activa, y fue donde se presentó el
incidente de los garimpeiros ilegales en 1989, localizados
en las cabeceras del Orinoco. La incursión despertó gran
revuelo en la opinión pública nacional, motivando que el
Estado venezolano asumiera una mayor presencia en estas
regiones y para la superación del incidente contó con la
colaboración fronteriza de las autoridades brasileñas.
Entre los estados Bolívar y Roraima se han establecido
nexos importantes en los últimos años. En particular los
dos centros urbanos extremos, localizados entre los ríos
Orinoco y Amazonas, son la ciudad de Manaos, construida
por los portugueses en 1669, capital histórica de la región
Amazónica, y Ciudad Guayana en Venezuela. Esta última,
conocida también como Puerto Ordaz, es un punto de referencia localizado al sur de Venezuela, que actúa a modo
da a acercar a poblaciones que se mantenían prácticamente
incomunicadas, y que a partir de 1994, cuando se establece
un acuerdo internacional de circulación de camiones de
carga entre Brasil y Venezuela, aceleró su proceso de acercamiento comercial.
Evidentemente, la carretera es un factor de articulación permanente entre el Norte del Brasil y el caribe venezolano, convirtiéndose en muchos aspectos en un marco
sólido de referencia dentro del proceso de integración. En
la actualidad su curso de orientación es seguido de manera paralela por el tendido eléctrico que conduce la energía
desde la represa del Guri, en Venezuela, hasta la ciudad de
Boa Vista a 520 km de distancia, y eventualmente, en el
futuro, por la construcción del gasducto hacia el resto de
sudamérica.54 Esta nueva situación, convierte también a la
represa del Guri en un centro importante para el desarrollo
de la región Amazónica y se integra al área de influencia
geopolítica brasileña..
En la actualidad, según informan los ministerios de
infraestructura de los dos países se está considerando la
ampliación de la carretera y su conversión en una troncal
para nuevas vías de comunicaciones con otros puntos importantes localizados en ese inmenso espacio. Existen estudios de factibilidad para complementar la carretera, como
son la construcción de un ferrocarril entre las ciudades-puertos, de Puerto Ordaz
LamacroregiónNortedeBrasilleofreceala
y Manaos, vinculando los ríos Orinoco y
Amazonas. Este medio de transporte sería
economíavenezolanaoportunidadesparaavanzary
propulsado con energía eléctrica venezoparticiparenlarecuperacióndeunazonadeprimida lana y, según las proyecciones realizadas,
yconpocasvinculacionesconcretasconlaparte
podría vincular los estados brasileños de
Roraima y Amazonas para seguir después
industrializadadeesepaís.
por el territorio Esequibo, en la República
Federativa de Guayana, y después ende polo energético mineralógico, e industrial en la parte trar en el Municipio del Caroní, donde se vincularía con
baja del río Caroní. Por su parte, la ciudad de Manaos, si- la vía ferroviaria de la CVG (Corporación Venezolana
tuada a 2 mil 350 kilómetros por vía terrestre de Caracas, de Guayana)/Ferrominera del Pao. Según los estudios, la
y con una población de 1.527.314 habitantes para el año vía férrea se conectaría a través del segundo puente del
de 2003, actúa como un importante polo industrial debido Orinoco, el cual está siendo construido por la Compañía
a la creación de su Zona Franca (ZFM) en 1967, cuando Odebrecht, con los planes ferrocarrileros nacionales, en
empezó también a estimularse la construcción de fábricas especial con la línea que se extenderá hasta el puerto de
para la elaboración de electrodomésticos. En la actualidad, Cariaco en el Golfo de Paria y de allí con los puertos de
la ZFM cuenta con más de 200 industrias y factura la sig- Cumaná y Guanta. No cabe duda, que las obras anteriores
nificativa cifra de 2 billones de dólares anuales.53
tendrán gran importancia en la integración física de la exEn el presente, las dos ciudades se vinculan entre sí por tensa región compartida entre los dos países.
la carretera denominada en Brasil como BR174, que le abre
Entre la parte sur de Venezuela y la región norte del
paso, como se dijo anteriormente, al comercio, al turismo, Brasil, en lo que comprende el inmenso espacio entre los
la cultura y, en general, a las personas y bienes. La vía, que ríos Orinoco y Amazonas, se incrementará en los próximos
establece una comunicación entre Manaos y Caracas, se años la integración de obras de infraestructura tendiente a
terminó de construir en el año 1997. Los 3.600 kilómetros mejorar el transporte binacional. Están planificados tamde carretera debidamente pavimentada, representan un bién la construcción de nuevos aeropuertos para aumentar
avance en el complejo de intercambio comercial por tierra, el número de los existentes en Puerto Ordaz, Santa Elena
puesto que acelera el crecimiento de ciudades intermedias de Uairén, Boa Vista y Manaos, se podrían mejorar y consy fronterizas tales como Boa Vista (capital de Roraima), truir las conexiones fluviales dando cumplimiento a lo inSanta Elena de Uairén, y otras. Asimismo, la carretera ayu- dicado en el Tratado de 1859 y en general la articulación de
20
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
los diferentes espacios irradiaría todo tipo de actividades
económicas.
El rápido acercamiento operado entre Brasil y Venezuela,
durante los gobiernos considerados de izquierda, de Lula y
Chávez, establece en el presente una satisfactoria convergencia de sus políticas exteriores expresada mediante una
“alianza estratégica”, consistente en una cantidad de acuerdos y tratados que se vienen ampliando y sedimentan las
aspiraciones compartidas por los dos países de alcanzar la
unidad continental de Sur América. En el buen sentido de
la realizaciones “estamos construyéndonos en la lucha para
florecer mañana como una nueva civilización, mestiza y
tropical, orgullosa de sí misma” como señalara el sociólogo
brasileño Darcy Ribeiro en el último párrafo de su libro
“O povo brasileiro”.55 Con referencia a este proceso compartido, el presidente Lula en su visita a Caracas del 14 de
febrero de 2005 reconocía: “estamos descubriendo un nuevo mundo”. En términos más concretos, podemos afirmar:
las relaciones entre Venezuela y Brasil transitan por una
nueva edad histórica. Producto de un conocimiento mutuo, el cual crea bases de convergencia y proyecta enormes
posibilidades de crecimiento conjunto en el siglo XXI.
Notas
Lafer, Celso. La identidad internacional de Brasil (Fondo de
cultura Económica, 2002)
1
Lisboa recibió del Emperador el titulo de Barón de Japura por
su actuación diplomática. Sobre el diplomático escribimos un
libro titulado: El consejero Lisboa primer embajador del Imperio
del Brasil en Venezuela y su libro de viaje (Caracas, Fundarte,
2004)
2
Desde el 2006 al frente de la Embajada del Brasil se encuentra
el embajador de carrera, Joao Carlos de Sousa Gomes, mientras
en la Embajada de Venezuela en Brasil esta encargado el
General del Ejército, Jorge Garvira Montoya.
3
Según el autor peruano Alfredo Barnechea, la expresión
se produjo cuando el historiador terminó un viaje por
Sudamérica. (El Edén Imperfecto, Lima, Fondo de Cultura
Económica, 2005)
4
El trabajo mejor elaborado sobre la vida del prócer brasileño
es el del profesor brasileño Vamireh Chacon, Abreu E Lima
General de Bolívar (Caracas, Universidad Simón Bolívar, 1985)
5
Páez se encontraba desterrado en Nueva York y preocupado
por la falta de recursos económicos decide asociarse con
un inventor norteamericano, Horacio S. Lewis, quien había
construido una máquina para quitarle el cuero al ganado
después de ser beneficiado. Con el propósito de vender dicha
máquina en la Argentina se embarcó rumbo a Buenos Aires y
en el transcurso del viaje pasó algunos días en Río de Janeiro
desde donde le escribe a Abreu e Lima
6
Relacoes Diplomaticas Brasil – Venezuela: Documentos
Oficias/Brasília. Fundaçao Alexandre de Gusmao, Ministerio de
Relacoes Exteriores do Brasil, 1998
7
El comunicado es del 4 de mayo de 1994 y aparece en:
Ministerio de Relaciones Exteriores, Libro Amarillo 1994. p.659
8
MRE, Libro Amarillo, Caracas, 1994. p. LIV. Además el
Ministro señala: “la complementación económica entre los dos
países ha permitido el abastecimiento por parte de Venezuela,
del Norte de ese país, que el centro y sur brasileño no pueden,
por ahora, suplirlo. Ello representa un desafío para el aparato
productivo venezolano con miras a un crecimiento y para
estrechar las relaciones económicas con la creación de un polo
de crecimiento en esa área.” Y destaca, “otro tema que conviene
resaltar es el mantenimiento y observación del macro – sistema
de la Amazonía del cual hacemos parte. Brasil ha organizado
9
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
un costoso y sofisticado sistema de vigilancia sobre un vasto
escenario natural y ofrece a Venezuela los beneficios de la
supervisión a través de satélites”. (p.LX)
El Acuerdo de la Guzmánia fue firmado en el mes de marzo
entre el presidente venezolano Rafael Caldera y el brasileño
Itamar Franco. Tiene este nombre, por cuanto el encuentro se
produjo en la casa presidencial venezolana de Macuto, lugar de
descanso cerca de Caracas, en la costa del mar caribe
10
11
Expreso. Lima, viernes 3 de marzo de 2006. p.14
Brasil Constituçao 1988. Constituçao República Federativa do
Brasil 1988. Brasilia, Senado Federal Centro Grafico, 1988. p.4
12
Constitución de la República Bolivariana de Venezuela 1999.
Caracas, Producción La Piedra, 1999.
13
Ministerio de Relaciones Exteriores, Libro Amarillo, Caracas,
2004. p. LXII
14
Entre la bibliografía destacamos: Willian Ojeda, Fabrica de
Odios (2005); Luis Bonilla Medina, Historia de la revolución
bolivariana (Pequeña crónica 1948-2004) (2004); Luis José
Uzcátegui, Chávez mago de las emociones (1999); Luis Bilbao,
Chávez y la Revolución Bolivariana (2002) y Chávez después
del golpe y el sabotaje petrolero (2004); Marta Harnecker,
Hugo Chávez Frías un Hombre, un Pueblo (2002); Guillermo
Martín Lozano, Chávez un abismo golpista (2004); Tulio
Hernández, Carolina Branger y otros, Chávez de papel (2003; J.
M. Vargas, A un paso del Abismo (2003); Radames Larrazábal,
Mis batallas en tiempo de Chávez (s/f); Hugo Chávez Frías,
Un brazalete tricolor (2004); Angel Rivero, Auge u caída de la
Revolución Tapa Amarilla (2002); Alberto Garrido, Revolución
Bolivariana (2005), Notas sobre la Revolución Bolivariana
(2003), Testimonio de la Revolución Bolivariana (2002), y De la
guerrilla al militarismo (2000); Colette Capriles, La Revolución
como espectáculo (2004); Fausto Masó, Los amantes del Tango
(2004); Armando Duran, Venezuela en Llamas (2004); Sandra
La Fuente y Alfredo Meza, El Acertijo de Abril (2004); Pedro
Llorens, Contra Chávez (2004); Antonio Sánchez García,
Dictadura o Democracia. Venezuela en la encrucijada (2003);
Jorge Olavaria, Historia Viva (2004); Antonio García Apontes,
Adios a las izquierdas (2004); Rafael Arrais Luca, Venezuela en
terapia intensiva (2004); Eva Golinger, El codigo Chávez (2005);
Rosa Mirían Elizaldo y Luis Báez, Chávez nuestro (s/f); Alexis
Rosas, La noche de los generales (2005); Mylene Cegarro, El 11
de Abril Palabra por palabra (2004); Aníbal Romero, Jacobo
15
21
Yépez Díaz y otros, La sociedad civil y el estado militar (2002),
entre otros.
Vide: Nelly Arenas, La Coyuntura Política (1999-2004).
Populismo, imaginario y democracia en Venezuela (Caracas,
CENDES/UCV, 2005)
16
El Acuerdo se firma poco después del “impeachment” al
presidente Collor de Mello, cuando el vicepresidente Itamar
Franco toma el cargo y realiza un viaje a Venezuela.
17
18
Libro Amarillo, 2003. p-202.
Dicha cifra es favorable a Brasil, no obstante el incremento
de la exportación venezolana, debido a la venta de productos
derivados del petróleo. Sin embargo cuando se estudia el
intercambio comercial de la década 1993- 2001 se observa
cómo la tendencia es favorable a Venezuela.
19
20
Comercio Exterior, maio/junio 2005 (Informe Banco do
Brasil). “Mercado:Venezuela” pp 8 -15.
Discurso del Presidente Lula durante la ceremonia de la firma
del Acuerdo Estratégico entre Brasil y Venezuela. Caracas,
14/02/2005. Ver: El Nacional, Caracas, martes 15 de febrero de
2005, A/16.
21
Periódico O Globo, Río de Janeiro, 07/10/2004, p. 24 y
Tribuna da Imprensa, Río de Janeiro, 07/10/2004. p. 9.
22
Por otra parte, según noticias de prensa PDEVSA pretende
invertir en Brasil e diversas áreas. Entre ellas, resulta
controversial la disposición de la compañía venezolana de
invertir en el carnaval de Río de Janeiro de 2006, mediante el
patrocinio a la escuela “Vila Isabel” con su espectáculo “estoy
loco por ti América.
23
“Lula anuncia refinería binacional” en. El Universal, Caracas,
jueves 21 de julio de 2005. p-2-2
24
“Venezuela avanza hacia el sur”, publicidad en. El Universal,
Caracas, lunes 19 de diciembre de 2005. p 1-12
25
26
El Nacional, domingo 23 de octubre de 2005. A/20
27
Datos disponibles en www.petrobras.com.br.
28
Información disponible en www.pdvsa.com.ve.
El 11 de abril de 2002, luego de un paro nacional puesto
en marcha por los sectores de la oposición, se produce un
enfrentamiento al final de una multitudinaria marcha pacífica
hacia el Palacio de Miraflores. Ante la orden de atacar la
multitud, por parte del Presidente, se produce el acto de
desobediencia por parte del alto mando militar y Chávez
es depuesto. Sin embargo, luego de un gobierno de dos días
presidido por Pedro Carmona Estanga, el mismo sector
castrense repone en sus funciones al presidente dos días
después, el día 13 de abril. Esta cúpula militar salió de sus
cargos, pero hasta la fecha no se les ha podido probar el cargo
de rebelión ante tribunales ordinarios.
29
30
El Universal, Caracas, martes 27 de septiembre de 2005. p. 2-2
Durante su programa dominical, Aló Presidente, el presidente
Chávez, anunció que junto a Lula sellaría “una alianza
estratégica” que incluía temas como energía, petróleo, gas,
agroindustria, ciencia y tecnología y “hasta el tema militar” (El
Universal, lunes 14/02/06. p.1-10)
31
22
32
El Nacional, Caracas, martes 15 de febrero de 2005.A/16
Comunicado Conjunto; Alianza Estratégica Brasil – Venezuela.
Firmado en Caracas el 14 de febrero de 2005
33
34
Ibidem.
Discurso del Presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante la
ceremonia de la firma de actos de cooperación entre Brasil y
Venezuela. Caracas, Venezuela, 14/ 02/2005.
35
Declaración de los gobiernos de Venezuela y Brasil para la
ejecución de la alianza Estratégica. Disponible en: http://www.
mre.gov.ve/Noticias/A2005/Lula-Visita/DeclaracionConjunta.
htm. El canal de televisión Telesur inició su programación
oficial en Caracas, el domingo 24 de junio de 2005.
36
Los diferentes documentos pertenecientes a cada uno de los
acuerdos se encuentran disponibles en las páginas Web de los
ministerios de relaciones exteriores de Venezuela y Brasil
37
38
Discurso presidencial del 14 de febrero de 2005.
39
El Universal, 15/02/05. 1-10
40
Información suministrada en: www.odebrecht.com.br
Esta compañía construye importantes obras en otros países
sudamericanos, por ejemplo tiene un tramo muy importante de
la carretera Interoceánica que vinculará Perú con Brasil.
41
Los datos de encuentran disponibles en www.brahma.com.
Entre los datos históricos se señala que la palabra Brahma es
hindú y significa en “lo absoluto” y la compañía además de
Venezuela tiene fabricas en Argentina y Uruguay.
42
43
Datos disponibles en www.varig.com.br.
44
El Universal, Caracas, viernes 4/11/2005, p. 2-2.
45
El Universal, Caracas, sábado 13 de agosto de 2005, p 2-2.
Como producto del paro nacional (2002) ya mencionado y
la participación de PDVSA, se agudizó la escasez de gasolina
en Venezuela durante varios meses. Poco después del paro
nacional, más de 18.000 empleados y altos ejecutivos de la
empresa estatal y sus filiales fueron despedidos. Los efectos
de estos despidos aún golpean el correcto funcionamiento y
producción de PDVSA.
46
47
El Nuevo País, Caracas, miércoles 27 de julio de 2005, p. 7
El Universal, 14/02/05, p. 1-10. Otros miembros de la
“Cámara de Comercio e Industria Venezolano – Brasileña” son
Fernando B. Portela y Decio Lopes do Couto
48
49
Ver la prensa venezolana del mes de febrero del 2006
Un ejemplo de esto lo constituye la propuesta del diputado
brasileño Euler Ribeiro del partido PFL, quien en el 2 de
febrero de 1997, durante el Gobierno del Presidente Fernando
Henrique Cardoso, formuló una propuesta en el Senado con
la intención de dividir el Estado Amazonas y crear tres nuevos
territorios que serían: Territorio Federal de Alto Río Negro,
Territorio Federal de Alto Solimoes y Territorio Amazonas. El
primero el de Río Negro ocuparía las fronteras con Venezuela y
Colombia y su capital sería Sao Gabriel de Cachoeira y podría
construirse muy próximo a la frontera de nuestro país. Según
la prensa de la época la proposición contaba con el respaldo del
ejército.
50
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Los nuevos mapas con todos los ríos de América del
Sur presentados como un ecosistema interrelacionado,
elaborados por World Wildlife Fund (WWW). Organización
no gubernamental que lleva a cabo el proyecto llamando
HydroSHEDS. Estos mapas se encuentran disponibles en www.
worldwildife.org/hydroshed y htpp://hydrosheds.cr.usgs.gov
51
Sobre las posibilidades de comercio se han elaborado varios
estudios, en particular las tesis de maestría e investigación
realizadas en el IESA (Instituto de Estudios Superiores de
Administración), Caracas.
52
Datos suministrados por el Gobierno do Estado Amazonas,
Orientacoes Estratégicas do Governo 2003 (disponible en: www.
amazonas.com.gov.br)
53
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Eventualmente, la ruta de la carretera también puede ser
tomada para la construcción del gasducto que saldrá desde la
faja del Orinoco hacia la Argentina.
54
Este libro fue reescrito por el autor en varias oportunidades
a lo largo de su vida y lo terminó de manera definitiva poco
antes de morir en 1995. (O povo brasileiro: A formação e o
sentido do Brasil), São Paulo, Companhia das Letras, 1995). Es
importante destacar vivió y trabajó en la Universidad Central
de Venezuela en 1970 y desarrolló la teoría referente a las
similitudes existentes entre el pueblo venezolano y el brasileño,
considerándolos con gran afinidad por ser “pueblos nuevos”: un
nuevo modelo de estructura social.
55
23
Subordinación,másqueamistad
enlasrelaciones
Colombia-EstadosUnidos
MaríadelPilarOstosCetina
T
ras el colapso de la Unión Soviética, la mayoría de los gobiernos en el mundo y particularmente en América Latina se han decidido,
y en otros casos, se han visto obligados por
diversas razones, pero muy específicamente
frente a sus debilidades económicas y sociales, a optar por
el patrón político estadounidense de la democracia, cuyos
mecanismos y tácticas que se han dado a conocer desde la
década de los ochenta a través de lo que fue el Consenso
de Washington, las Cumbres Presidenciales y los numeroso documentos que se emiten desde el Coloso del Norte
como mandatos hegemónicos para la región.
De este modo, los gobiernos que se acogen al modelo
democrático abandonan, según sea el caso, sus viejas prácticas políticas para convocar a elecciones populares en la
que los civiles pueden aspirar a los cargos de poder, recibir financiamiento con dinero público y/o privado para
sus campañas políticas, utilizar los medios de información
para expresar su plataforma política, así como formular
proclamas en las que se manifiesta el respeto por las garantías individuales y la defensa colectiva de los derechos
María del Pilar Ostos Cetina é Professora da Facultad de
Ciencias Políticas y Sociales da Universidade Autónoma de
México (UNAM) e doutoranda em Relações Internacionais
pela mesma universidade. No primeiro semestre de 2006, o
NUPRI e o Departamento de Ciência Política da USP tiveram o prazer de recebê-la como pesquisadora visitante.
24
humanos; los cuales son entre otros aspectos los que supuestamente identifican el ejercicio democrático guiado
por los estadounidenses en estos últimos tiempos.
En este mismo contexto habría que subrayar la importancia que han cobrado en ciertos países los regímenes
conservadores, empezando por Estados Unidos que desde
que se inicio la Era de Reagan en los ochentas, a diferencia
del mandato del demócrata, Bill Clinton, se ha caracterizado por la aplicación del más puro conservadurismo encabezado por la derecha del Partido Republicano, tomando
como pretexto los valores de la libertad y la democracia
para justificar sus intereses e intensiones políticas.
Otros países que actualmente se guían por la misma
corriente ideológica son, por ejemplo, los gobiernos de
Gran Bretaña, México, Colombia, entre otros que comparten los mismos principios y valores propuestos por Estados
Unidos sobre democracia y libertad como mecanismos
para legitimarse y estar del lado del poderío hegemónico
estadounidense.
En este sentido, el caso de los gobiernos en Colombia
de finales del Siglo XX hasta la actualidad, indistintamente
de que sean dirigidos por partidos políticos guiados por
las facciones Liberal o Conservador, coinciden en la necesidad de ajustarse ideológicamente a los principios de la
democracia avalados por Estados Unidos. Esto mismo se
refleja en los discursos que emite cada gobierno, en los que
persiste la idea de alcanzar la democracia y la seguridad
como banderas de una sola estrategia común para el orden
y la paz interna del país, pero que sólo es una justificación
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
más para afirmar sus intereses particulares y no los de la
nación colombiana.
Así, el actual Presidente en Colombia, Álvaro Uribe
(2002-2010) desde su lema de gobierno: “seguridad democrática”, reitera su compromiso y coincidencia con la
estrategia de gobierno de Estados Unidos cuando señala:
“la seguridad democrática no es más que una política integral a largo plazo, ...cuyo objetivo principal es garantizar
la protección de los derechos de todos los ciudadanos… es
la defensa de los valores democráticos… que se han visto amenazados en los últimos años por fenómenos como
el terrorismo de las Fuerzas Armadas Revolucionarias de
Colombia (FARC) y del Ejercito de Liberación Nacional
(ELN)“1, que a la luz de las autoridades del gobierno colombiano y de Estados Unidos no representan ninguna
opción política ni de Estado, lo que las convierte indistintamente en agrupaciones armadas y delictivas a pesar de
que en sus inicios se hayan podido plantear algún objetivo
de tipo ideológico-político o social que justificará su oposición al Estado central en Colombia.
Desde este punto de vista, la estrategia de seguridad
democrática en Colombia, promovida por estos gobiernos
conservadores en Colombia, tiene un alto contenido militar, mediante el cual se pretende la recuperación de la soberanía, el control y el monopolio de la fuerza del Estado
por medio del re-posicionamiento de la Fuerza Pública
para garantizar el orden, la estabilidad política y social del
país en lugares que han quedado a merced de las organizaciones armadas y del narcotráfico. Y con ello, se pretende por parte del gobierno actual una mayor “interacción”
entre las instituciones del Estado y la ciudadanía para que
instituciones estatales, compañías transnacionales particularmente estadounidenses, las cuales ofrecen diferentes
servicios desde la venta armamento, insumos y pertrechos
hasta adiestramiento en contrainsurgencia, combate a las
guerrillas y al narcotráfico.
Es así como el Plan Colombia, considerado un “plan
para la prosperidad y el fortalecimiento del Estado”, financiado básicamente por recursos estadounidenses a favor
del combate a la guerrilla y el narcotráfico, han permitido
al gobierno colombiano intensificar desde finales de los
años noventa, su carrera armamentista, los entrenamientos y las actividades encaminadas a la captura de guerrilleros, terroristas, narcotraficantes, grupos paramilitares, así
como también han manifestado abiertamente su deseo de
continuar con los programas para la erradicación de más
del 50% de las áreas dedicadas a los cultivos de coca y amapola (calculadas en 122.000 hec. en 2002).
Frente a esta subordinación de la clase política colombiana hacia las estrategias internacionales de Estados
Unidos, resulta cada vez más complejo y difícil que en el
corto o mediano plazo prospere una negociación política
o un acercamiento de diálogo efectivo entre el gobierno
colombiano y los grupos guerrilleros, justamente por que
las no se visualiza una política autónoma, soberana y con
una auténtica voluntad política para solucionar el conflicto
armado colombiano que ya tiene más de cuatro décadas de
existencia.
Más sin en cambio, la continuidad de las doctrinas
militaristas de la actual dirigencia estadounidense – la
Doctrina Bush y la Estrategia Nacional de Seguridad –, por
citar algunas, que se fundamenta en medidas pragmáticas y no
LaestrategiadeseguridaddemocráticaenColombiatiene
de consenso, ni mucho menos
unaltocontenidomilitar,medianteelcualsepretendela
de apego al derecho internaciorecuperacióndelasoberaníaenlugaresquehanquedadoa nal tal como se evidenció luego
de sus incursiones armadas en
merceddelasorganizacionesarmadasydelnarcotráfico.
Afganistán e Irak; que plantean
una mayor escalada del conflicto
mediante estímulos y recompensas2, se logre una coope- armado colombiano, cuyas repercusiones parecen colarse
ración mucho más eficaz que permita la captura de todos hacia los países vecinos, cada vez más involucrados en los
aquellos que infringen la ley, el orden y la seguridad de problemas de seguridad interna de Colombia.
todo el conglomerado social en el país.
Bajo estos criterios, la dirigencia política colombiana Delosacuerdospolíticosalterrenoeconómico
insiste en acompañar el proceso de democratización al lado
En materia económica, lo cierto es que, la “tercera etadel componente militar; que conlleva a facultar cada vez pa de la economía global o de la globalización”, como se
más al Ejecutivo y por ende, a la Fuerza Pública, para to- denomina a la expansión y penetración de las empresas
mar medidas preventivas y de control sobre la población y transnacionales, especialmente norteamericanas, en la
los grupos opositores a la dirigencia estatal.
economía interna de los países, adquiere a partir de finaOtra justificación al binomio democracia y milita- les de los setentas y principios de los ochentas una nueva
rismo en Colombia, que son contradictorios y se niegan peculiaridad; ya no solamente penetran y se asientan en
mutuamente, se puede analizar a partir de los cuantiosos nuestros países, hablando de América Latina, aprovechanrecursos que se destinan en los últimos tiempos al rubro do las ventajas que los gobiernos dieron para impulsar el
de seguridad, formando un circulo vicioso en el que parti- proceso de industrialización, por substitución de imporcipan además de las Fuerzas Armadas de Colombia y otras taciones, como sucedió en las dos primeras etapas, sino
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
25
que reemplazan a las compañías
Cuadro1
nacionales, las desnacionalizan,
para captar de modo más ágil los
recursos económicos, la atención
y preferencia de los consumidores
locales, así como las ganancias adi- Emmillonesdedólares
cionales generadas por la mano de EstadosUnidos
830
obra barata, etc3.
Reddeemergenciasocial,créditoblando
900
En tal sentido, Colombia no es
BID,BMyCAF
la excepción en la región y pronto
300
se vio inmersa en una serie de pro- BID,BMyCAF,créditosordinarios
131
cedimientos necesarios para abrir NacionesUnidas
su economía al mundo exterior a España
100
través de la privatización de varias
Japón-CréditoBlando
70
de sus empresas nacionales, flexibi20
lizar los trámites de ingreso y salida Noruega
de capitales extranjeros, la reduc- UniónEuropea(emformadeacuerdosbilaterales,porfuera
280
ción de aranceles y protecciones delPlanColombia)
para la importación de insumos y Fuente: El Plan Colombia y la internacionalización del conflicto. Bogotá: IEPRI - Universidad Nacional de
demás bienes, entre otros aspectos Colombia,2001,p.113.
que, en apariencia, hacían mucho
más competitiva y atractiva la ecojero y a las empresas trasnacionales para que éstos puedan
nomía colombiana en esos momentos de acuerdo con las
establecerse en el territorio colombiano y de este modo,
fórmulas lanzadas por el Consenso de Washington (1986)
soslayar la solución de los problemas nacionales: pobreza,
y los organismos internacionales como: el AGAAC/GATT,
desempleo, falta de servicios públicos y obras de infraesel Fondo Monetario Internacional y el Banco Mundial.
tructura, entre otros, que no se han podido superar.
Así fue cómo el neoliberalismo, sustento ideológico de
Por esa razón, la financiación de proyectos como el
la globalización, o sea, de la suplantación, reemplazo o asiPlan Colombia forma parte de esa nueva modalidad de
milación de las empresas nacionales por las norteamericaotorgamiento de préstamos, en los que participan países
nas, que se perfiló en 1980, continuó su carrera vertiginosa
desarrollados con algún interés geoestratégico, así como
en Colombia, y esta tomó mayor impulso a principios de
organismos y bancos internacionales; que al tiempo que
los noventas con la privatización de numerosas empresas
conceden el crédito al país receptor lo condicionan meestatales, la reducción de aranceles y una serie de reformas
diante fórmulas de ajuste, concesiones en la explotación
de ajuste fiscal, tributarias y hasta constitucionales para
de recursos vitales y otros que aplican mecanismos para
favorecer no sólo el ingreso de inversiones foráneas, sino
preservar y ensanchar los intereses extraterritoriales como
la compra a precios de remate de las empresas nacionales,
son: el Congreso de Estados Unidos, el FMI, el BID, entre
extranjerizándose así la economía nacional.
otros. El Cuadro 1 señala los compromisos del gobierno
En Colombia, la adopción de estas políticas de corte necolombiano en fechas recientes.
oliberal en lugar de mejorar y atender la crítica situación
Asimismo, la dirigencia actual en Colombia se ha visto
de pobreza y marginación, resolver el problema del desemen la necesidad de aplicar medidas adicionales de ajuste
pleo, reactivar el sector agrario, impulsar la modernización
para los contribuyentes como las que adelanta el Ministerio
de los sectores productivos del país, sanear las finanzas y el
de Hacienda, que planea recaudar en una primera etapa
presupuesto de la nación, contrariamente a las promesas y
cerca de 780 mdd, mediante la aprobación de un impuesal discurso esperanzador de los primeros gobiernos tecnóto del 1.2 % a los patrimonios de más de 58,000 dólares.
cratas en Colombia, en la década de los noventas, poco a
Además de otras aportaciones que se han denominado:
poco se enfrentaron a una prolongada recesión económica4,
bonos de guerra por 600 mdd. y recortes en nómina en
que se manifestó en el déficit público y en la caída de la
ministerios y entidades públicas, lo que implicó el cierre
producción económica que condujo al país a depender del
de algunos consulados y representaciones diplomáticas en
endeudamiento externo.
el exterior, calculado en 264 mdd, entre otras medidas que
Este último aspecto, el de la deuda externa, no se puede
agobian a la sociedad colombiana en general que debe asuanalizar de forma separada a la apremiante necesidad que
mir estos compromisos; ésto con el fin cumplir los propótienen los gobiernos en Colombia de acudir al crédito exsitos del gobierno de fortalecer y modernizar las Fuerzas
terno para detener el déficit interno y a su vez, destinar una
Armadas y activar la campaña de sustitución de cultivos
parte de estos recursos al rubro de seguridad como una
ilícitos, materia para la fabricación de la droga, como objeforma de otorgar mejores garantías al inversionista extrantivos prioritarios para la ejecución del Plan Colombia, que
CompromisoderecursosparaColombia
(2000-2001)
26
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
impulsa y financia principalmente Estados Unidos con
aportaciones, armamento y entrenamiento como se detalla
en Cuadro 2.
Lo anterior explica por qué el encargado de las relaciones entre Colombia y Estados Unidos, durante el primer
mandato del Presidente Uribe Vélez, el Embajador Luis
Alberto Moreno, quien se mantuvo en su cargo desde la
anterior Administración con el Presidente Pastrana, sostuvo que la prioridad de Colombia debía ser la firma de
un acuerdo bilateral en materia económica con Estados
Unidos, mismo que para febrero de 2006 se concretó tras la
firma de un Tratado de Libre Comercio. Y que entre otras
razones, coincide con el constante apoyo de Colombia hacia Estados Unidos, tal como se dio con su voto para que
éste último invadiera Iraq, marcando así su compromiso
y apoyo irrestricto a la expansión hegemónica de ese país
y más aún reconoció la prioridad de agilizar la firma de
acuerdos bilaterales6, dejando en un segundo plano la conformación del ALCA; que según afirmaba Moreno, estarían detenidos por la posición del Mercosur, principalmente
de Brasil; lo que hacia poco probable que el ALCA estuviera consolidado para el 2005 como se tenía previsto7.
Las anteriores actitudes explican también la postura
del gobierno colombiano frente a la relación que mantiene
con sus vecinos, tal como sucedió en la Cumbre de países
Andinos (2003) celebrada en territorio colombiano, en la
cual se notaron marcadas diferencias entre sus dos principales países: Colombia y Venezuela, en la que el primero favorece el esquema del ALCA propuesto por Estados
Unidos y la celebración de posibles acuerdos bilaterales
con este último país; mientras que el segundo propone
consolidar un esquema multilateral de integración entre
países de la región sin la inclusión de Estados Unidos, al
estilo del Mercosur.
Otro aspecto crucial que marcó la subordinación económica de Colombia frente a Estados Unidos, tiene que
ver con el uso de los recursos energéticos. Así, la Alianza
Cuadro2
o la Ley del Congreso norteamericano que posibilitó la
ayuda militar a Colombia, se explicita entre sus objetivos:
“insistir para que el gobierno colombiano complete las reformas urgentes destinadas a abrir completamente su economía a la inversión y el comercio exterior, particularmente a la industria del petróleo...” 8 Atendiendo esta petición,
el Presidente Uribe se ha encargado de minimizar el papel
de la Empresa Colombiana de Petróleos (Ecopetrol), que
además de administrar más del 50% de las ganancias obtenidas por la exploración de gas y crudo en el país, se encargaba de supervisar los pagos de regalías a la nación por
parte de compañías extranjeras. Esta situación obviamente
generó una serie de reclamaciones por parte del sindicato
petrolero de la Unión Sindical Obrera (USO), de mayor
tradición e importancia en el país; sin embargo, la iniciativa gubernamental y de las compañías transnacionales se
colocó por encima de las demandas de los trabajadores.
Al respecto, los trabajadores advierten que con la aplicación de dichas medidas del gobierno y las transnacionales, la situación del petróleo tiende a equipararse con
lo ocurrido con otros recursos geoestratégicos como: el
carbón y el níquel, en los que intervinieron compañías extranjeras, entre ellas: Billington, la Drummond, la Glenco
y Anglo-american dejando “exiguas regalías al país y modestos salarios de los trabajadores. Por lo que en el caso de
las reservas de crudo y gas, la política del actual mandatario colombiano afianza la toma de la industria petrolera
nacional a manos de las transnacionales Chevron Texaco,
Exxon-Mobil, Amoco-BP, Occidental y Shell”9.
De este modo, el petróleo, por encima de la erradicación de los cultivos de hoja de coca y amapola, se ha convertido en el principal objetivo geoestratégico y económico
de Estados Unidos. En ese contexto, América Latina, tanto
por su cercanía geográfica como por sus reservas energéticas, es una de las regiones del mundo que estará bajo el
ojo vigilante de Washington. Actualmente, Venezuela es el
tercer proveedor de Estados Unidos, México, el cuarto y
Colombia, el séptimo.
En ese mismo sentido, el Secretario
de Energía de Estados Unidos, Abraham
Spencer, señaló que: “el Presidente Bush reconoce no sólo la necesidad de un incremento en el suministro de energía, sino también
el papel crucial que tendrá el hemisferio en
Total
la política energética del gobierno”.10 Lo que
explica que, Washington y especialmente
765,00
sus empresas transnacionales, se proponen
88,56
incrementar las exploraciones en las zonas
112,49
dedicadas a la producción de hidrocarburos
314,56
en Colombia, sin embargo, las ambiciones
de éstos se ven algunas veces, obstaculizadas
993,56
por las acciones emprendidas por las gue225,80
rrillas locales, que suelen emplear tácticas
663,29
como: el daño de instalaciones o plantas de
explotación del crudo y de infraestructura
AsistenciadeEstadosUnidosalPlan
Colombia5
Enmillonesdedólares
Período
1988-1996
AyudaMilitar
Otraayuda
N/D
N/D
1997
88,56
0
1998
112,44
0,50
1999
308,81
5,75
2001
785,56
208,00
2002(estimada)
220,15
5,65
2003
508,49
154,80
Fuente:www.ciponline.org
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
27
(oleoductos, principalmente) necesarios para el transporte del crudo hacia los puertos de embarque. Eso aclara la
aprobación de un préstamos de 100 millones de dólares,
otorgado por el Congreso estadounidense para proteger el
principal oleoducto del país, Caño-limón-Coveñas, ubicado en el departamento de Arauca, en inmediaciones con la
frontera de Venezuela, el cual se encarga de transportar el
crudo desde ésta área considera una de las zonas más ricas
hasta los puertos de embarque en el Caribe Atlántico.
Así, la generosidad estadounidense responde más a las
presiones de las compañías como: Occidental Pretroleum
(OXY), EXXON-Mobil, la British Petroleum, Unocal,
Texaco, y Phillips Petroleum, que han invertido más de
25 millones de dólares desde 1996 haciendo cabildeo en el
Congreso para que ayuden a proteger zonas en Colombia
con importantes reservas de hidrocarburos que ellos explotan.
En consecuencia, la lógica de Washington consiste en
proveer de recursos al Estado colombiano, quien los acepta de muy buena manera, a fin de intensificar la actividad
contraguerrillera para aumentar en el futuro la producción petrolera en su beneficio y al mismo tiempo, garantizar
su intervención en los asuntos internos de los países en su
área de influencia.
tráfico de drogas son una amenaza para las democracias
latinoamericanas”. Por lo que, Uribe sugiere “modernizar”
el Tratado Interamericano de Asistencia Reciproca (TIAR)
creado en 1947, más conocido como Tratado de Río, del que
México se retiró el 6 de septiembre del 2002 alegando que
era un instrumento obsoleto y que de continuar, debería
enfocarse a la atención de desastres naturales, inundaciones
y epidemias. Frente a lo cual, el gobierno colombiano sugiere
un enfoque distinto en el cual, la cooperación militar en la
región ponga énfasis en el combate de grupos guerrilleros,
terroristas y de mafias dedicadas al narcotráfico.
Esto significa una reconceptualización de la seguridad
en el hemisferio, que el gobierno colombiano intenta impulsar al lado de Estados Unidos y otros países latinoamericanos que se sumen a esta iniciativa, la cual emerge de las
propias condiciones que se dan con la “internacionalización” del conflicto armado colombiano.
Al respecto, algunos países en el Continente se han unido a esta iniciativa, entre ellos: Ecuador, que ha reforzado
las medidas de seguridad en la frontera y ha cedido la base
de Manta al personal militar estadounidense para monitorear la zona.
Por su parte, Chile permanece expectante, sin condenar categóricamente a Washington y apoyando, de hecho,
el Plan Colombia. Argentina, formalmente respalda la paz,
AsimilacióndeColombiadeladoctrinahegemónicade
pero no hace mucho por Colombia ni censura a Estados
defensayseguridadestadounidense
Unidos.
Al contrario, Venezuela ha fortificado los límites fronLos cambios en el Sistema Internacional con el fin de la
era bipolaridad, particularmente en las cuestiones de se- terizos que comparte con Colombia, desplegando mayor
guridad, van a tomar un nuevo matiz al trascender de la presencia militar y controles migratorios para impedir el
simple persecución del “enemigo comunista” desaparecido paso constante de guerrilleros, paramilitares y personas
y concretar una estrategia mucho más amplia en la que se que buscan refugiarse de la violencia ocasionada en el terincluye a partir de la década de los noventas al narcotráfico ritorio colombiano.
Brasil ha hecho lo mismo al incrementar notablemeny al terrorismo como factores de inestabilidad y de amenate en los últimos años dispositivos militares fronterizos a
za para la seguridad nacional y mundial.
través del avanzado Sistema de
LalógicadeWashingtonconsisteenproveerderecursosel Vigilancia para la Amazonía
11
Estadocolombianoparaaumentarenelfuturolaproducción SIVAM (en sus siglas en inglés), que consiste en un moderpetroleraensubenefícioy,almismotiempo,garantizarsu no radar bajo una estricta estraintervenciónenlosasuntosinternosdelospaísesensuárea tegia de control y vigilancia de
la zona por parte de las Fuerzas
deinfluencia.
Armadas de Brasil para evitar el
paso de guerrilleros y de narcoAhora bien, el gobierno colombiano se incorpora a esa traficantes al interior de su territorio.
Ahora bien, mientras la dirigencia colombiana impulnueva estrategia de seguridad impulsada por el “policía
sa
esta
campaña de defensa de la seguridad en la región y
mundial”, Estados Unidos, al reconocer que el problema
interno de seguridad no sólo era ocasionado por la guer- además, recibe la “asistencia” militar y el financiamiento de
rilla comunista, sino que además se ha convertido en un las autoridades estadounidenses para el fortalecimiento de
serio problema vinculado con las redes del narcotráfico, la las Fuerzas Armadas, se presenta un doble juego político.
Por un lado, algunos sectores en Estados Unidos señalan
delincuencia común, el paramilitarismo y el terrorismo.
Esa misma situación ha impulsado a la dirigencia que, el Ejército colombiano mantiene vínculos con organicolombiana con Uribe Vélez, a abogar por un cambio en zaciones paramilitares, algunas de las cuales son financialos mecanismos de operación de la doctrina de seguridad das por capital privado y de empresas transnacionales para
hemisférica, “con el argumento de que la guerrilla y el operar en el país y que además cometen delitos que atentan
28
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
contra los derechos humanos de la población; y por otro,
el Ejecutivo colombiano está obligado a firmar un acuerdo
mediante el cual se exonere al personal militar estadounidense, que entrena a las Fuerzas Armadas colombianas, de
cualquier delito de lesa humanidad o de crimen de guerra practicado en territorio colombiano. Evitando así, que
sus militares puedan ser enjuiciados ante la Corte Penal
Internacional. Al mismo acuerdo se tuvieron que adherir
países como: Israel y Rumania.
Esta misma situación de subordinación en la toma de
decisiones de la dirigencia colombiana frente a los intereses norteamericanos se observa también, en el bloqueo que
Estados Unidos hizo para impedir la compra del Gobierno
de Uribe de 24 aviones Super Tucano fabricados en Brasil,
calculados en 234 millones de dólares.
Los hechos antes señalados comprueban una vez más la
debilidad estatal y el escaso margen de autonomía y soberanía que demuestran las instituciones políticas en Colombia
para negociar y sobre todo, para resolver sus problemas
internos. Este ha sido pues, uno de los puntos cruciales en
los que la guerrilla fundamenta su razón de erigirse como
un Estado beligerante, defensor de las causas sociales, de
la recuperación de la soberanía y de la autonomía que han
ido cediendo los gobiernos de la oligarquía a países extranjeros como Estados Unidos.
Notas
Ver más en: http://www.mindefensa.gov.co/politica/politi
ca20030629lanzamiento_documento_politica_seguridad_
democratica.html
1
El Presidente Uribe anunció crear los “Lunes de las
recompensas” para estimular a la población a cooperar con su
plan de seguridad, que busca poner freno al conflicto armado.
Agregó que la identidad de quienes entreguen información
relativa al orden público será mantenida en reserva para
garantizar su seguridad. Ver más detalles en: Diario Milenio.
“Uribe pondrá en marcha ‘lunes de recompensas’”. 27 de agosto
de 2002. http://www.milenio.com/nota.asp?id=41441
2
Varias de estas medidas de corte neoliberal impulsado por
Estados Unidos entre los países Latinoamericanos se dieron a
conocer a través del Consenso de Washington en 1986.
3
Los actuales indicadores económicos exhiben una elevada
tasa de desempleo del 20%, haciendo que 59,8% de la población
colombiana se encuentre por debajo de la línea de pobreza y
presente una deuda externa calculada en 40.000 millones de
dólares (mmd), que representa el 48% del PIB.
4
Parte de la ayuda se ha invertido en: 30 helicópteros Huey
UH-1H, 42 Super Huey, 18 Black Hawk, entrenar y dotar
una brigada contra el narcotráfico de 3000 hombres, ubicada
en Santa Ana (Putumayo) y la de Tres Esquinas (Caquetá).
Además de poner en marcha una brigada fluvial de la Armada
con 32 unidades de 5 lanchas artilladas cada una. Ver más
en: http://eltiempo.terra.com.co/judi/2002.../ARTICULOPRINTER_FRIENDLY-PRINTER_FRIENDLY-171345.HTM
5
Al respecto, en los primeros meses del 2004 se iniciaron
formalmente las negociaciones para establecer un Tratado
de Libre Comercio (TLC) entre Estados Unidos, Colombia,
Ecuador y Perú. Ver más detalles: Correa, Jorge. “Colombia
rechazó borrador del TLC que ya traían listo negociadores de
Estados Unidos”. Periódico El Tiempo. Bogotá, Colombia. 23 de
mayo de 2004. (versión en internet).
6
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
“Prioridad de Colombia es firmar acuerdo de Libre Comercio
con Estados Unidos”. Periódico El Tiempo, 4 de septiembre
de 2003. http://eltiempo.terra.com.co/econ/2003-09-05/
ARTICULO-PRINTER_FRIENDLY-_PRINTER_FRIENDLY1242270.htm.
7
Ver más en el documento en Internet de Gustavo Triana,
“Uribe Vélez impuso una reforma petrolera de corte
colonialista”. Secretario de Asuntos Energéticos de la Central
Unitaria de Trabajadores de Colombia, CUT. http://www.
deslinde.org.co/Dsl34/Gustavo_Triana.htm. Y en, Wainer,
Valeria y Stefanoni, Pablo. “Colombia: ¿Nuevo escenario de la
guerra global?”. En Rebelión, 18 de mayo del 2002. Versión en
Internet.
8
Las mismas son hoy dueñas de cerca de 500 millones de
barriles de reservas de crudo y de 1.768 giga pies cúbicos, GPC,
de gas natural. Pero, hacia el futuro, terminarán apoderándose
del potencial hidrocarburífero del país, que hoy el gobierno
estima en más de 40 mil millones de barriles. Asimismo, las
trasnacionales controlan también el 80% de la distribución
mayorista de combustibles y aproximadamente el 20% de
la distribución minorista, en la cual han desplazado a los
inversionistas nacionales dado que, la política que liberó los
precios de los combustibles en Colombia, les otorgó a estas
compañías extranjeras unos márgenes exorbitantes de utilidad
por la distribución y comercialización de hidrocarburos.
9
Palabras del Secretario de Energía de Estados Unidos.
Abraham Spencer durante la quinta Conferencia Ministerial
de Iniciativa Energética, realizada en México el 8 de marzo de
2001. ver más en http://www.lainsignia.org/2002/abril/ibe_072.
htm
10
Sobre el tema se recomienda: Bitencourt, Luis. “Security
issues and challenges to regional security cooperation: a
brasilian perspective”. En, Strategic Studies Institute, U.S.
Army War College. “Perspectives from Argentina, Brazil, and
Colombia. Julio de 2003. versión en Internet. www.carlisle.
army.mil/ssi/index.html.
11
29
Aconjunturaatualno
OrienteMédio:umavisão
israelense
SamuelFeldberg
N
os dias em que este artigo é escrito volta
a escalada de violência aos conflitos no
Oriente Médio. No Iraque, a eliminação
do líder da Al-qaeda no país, Abu Musab
al-Zarqawi não impediu que bombas continuassem a explodir no seio da população civil, matando
xiitas e sunitas que nada têm a ver com a disputa pelo poder no país. Na Faixa de Gaza, recém-abandonada pelos israelenses, continuam a proliferar ataques de foguetes ainda
rudimentares (mas cada vez mais poderosos e precisos) a
partir das áreas fronteiriças a Israel, atingindo as cidades
de Sderot e Ashquelon, e transferindo para o sul a vulnerabilidade características dos ataques de Katyushas por parte
do Hizballah na Galiléia. A reação israelense, como historicamente, levou à morte de vários civis e à eliminação de
vários elementos ligados à liderança dos grupos militantes
palestinos, aí incluído o Hamas, rompendo formalmente
um frágil trégua que já durava mais de um ano.
O Irã continua a recusar-se a interromper seu programa
de enriquecimento nuclear, o que aliado à retórica sobre a
destruição de Israel e a negação do Holocausto combinase com o interesse israelense em manter-se como a única
potência nuclear na região.
Samuel Feldberg é Doutor em Ciência Política pela
Universidade de São Paulo, pesquisador do NUPRI e membro do GACINT.
30
E a disputa entre o Hamas, atualmente o legítimo governante dos palestinos, e o presidente da Autoridade Palestina,
Mahmoud Abbas, permite aos israelenses continuar alegando que não existe um parceiro para negociar a paz.
Assim, do ponto de vista de um impasse, israelenses e
norte-americanos identificam-se na condição de supostamente abrirem a porta para negociações com os palestinos
e o Irã sem que obtenham resposta positivas a seus acenos.
Desde o ano de 2000, quando fracassaram as negociações entre Ehud Barak e Yasser Arafat, as relações entre as
partes tem sido pautadas pela violência, em variados níveis. Depois de uma onda de terror e da reversão completa
da autonomia palestina, os israelenses finalmente optaram
por uma política de unilateralismo, iniciada com a construção do muro (ou cerca) que passou a criar uma separação física entre as duas partes, e culminando, em 2005, com
a retirada de suas tropas e de sua população civil da Faixa
de Gaza, ocupada e colonizada desde 1967.
Os acordos de Oslo de 1993 haviam prometido uma
nova era nas relações entre israelenses e palestinos, definindo um retorno à partilha de 1947, ainda que deixando
temas difíceis como Jerusalém e o retorno de refugiados
para uma discussão posterior. (Os críticos do plano argumentaram então ser esta uma maneira de evitar a abordagem de problemas insolúveis).
A incapacidade (ou a recusa) de Arafat de evitar a proliferação de grupos armados, levou a uma alternância de
períodos de calmaria e violência que desembocaram no
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
governo de Ariel Sharon, eleito para quebrar a espinha
dorsal do terror palestino e que, surpreendentemente, rendeu-se ao conceito da separação unilateral, abandonando
sua trajetória iniciada com a colonização dos territórios
ocupados durante a guerra de 1967. O governo de Sharon
foi excepcionalmente bem sucedido em várias frentes: a
segunda Intifada1 foi derrotada através da maciça intervenção militar israelense, aliada a um efetivo trabalho da
inteligência, as relações com os Estados Unidos aprofundaram-se, especialmente após a identificação entre os dois
governos resultante do impacto do 11 de setembro e as relações de paz entre Israel, o Egito e a Jordânia não foram
abaladas, ainda que não se tenham estreitado. E, ainda que
o “mapa da Estrada” tenha trazido as potências européias
de volta ao cenário após uma longa ausência, não se cogita
nenhuma intervenção direta nos moldes dos Bálcãs.
apresenta um novo desafio aos estrategistas e formuladores
da política externa israelense.
O aumento da ameaça balística e dos riscos representados pelas ADM de certa maneira compensam a diminuição da probabilidade de manutenção da ameaça à sobrevivência do estado israelense, representada pelo potencial
convencional dos vizinhos de Israel de 1948 até 1973.
No passado o estado israelense baseou-se na capacidade de sua força aérea para garantir a imunidade de seus
centros urbanos e a mobilidade de suas forças blindadas.
A inclusão dos novos aviões F15-I, com tanques de combustível adicionais, permitiram estender o longo braço da
capacidade israelense de retaliação, no que se transforma
cada vez mais em uma força capaz de retaliar e não de
defender. Os mísseis balísticos obtidos por países como o
Irã e estacionados na Síria e no Líbano somente poderão
ser interceptados por amplos, complexos e extremamente
EfeitosdasituaçãonoIraquesobreadoutrinamilitar
onerosos sistemas de defesa anti-mísseis, que ainda estão
israelense
em sua fase preliminar de desenvolvimento.
No momento em que o Iraque foi derrotado pelos
Israel dispõe de algumas opções estratégicas. Durante
Estados Unidos e seu exército dispersado, os israelenses muitos anos a doutrina de segurança israelense baseouviram eliminada a maior ameaça convencional a partir do se numa combinação de preempção contra ameaças conleste. Israel beneficia-se especialmente das caóticas condi- vencionais (como alegado em 1967), ataques preventivos,
ções no Iraque, com disputas internas que impedem que se dissuasão convencional e a manutenção de uma vantagem
repitam as ações praticadas por Saddam Hussein, como o qualitativa para compensar a ampla vantagem quantitativa
lançamento de mísseis (convencionais) em 1991. Mas esta de seus vizinhos hostis. Além disso, desde 1960, ameaças à
situação pode não perpetuar-se. Assim como a derrotada sobrevivência do Estado tem sido confrontadas com uma
Alemanha nazista foi re-armada para incorporar-se ao es- capacidade nuclear ambígua e não declarada, aceita pelos
forço norte-americano de contenção da União Soviética, Estados Unidos e talvez até encarada como uma “dispentambém a estabilização do Iraque tende a levar ao re-er- sa” de intervenção direta norte-americana no caso de uma
guimento de seu exército para estabilizar o país, um exérci- ameaça à sobrevivência de Israel.
to que pode no futuro voltar-se novamente contra Israel.
A combinação da dissuasão nuclear e convencional,
Se, quase trinta anos após a assinatura do tratado de que atendeu somente às ameaças convencionais enfrentapaz com o Egito, os estrategistas militares israelenses ainda das pelo estado israelense nas últimas quatro décadas, tem
consideram a possibilidade de uma guerra convencional agora de dar conta também da potencial ameaça nuclear
na sua fronteira sul e dispendem a maior parte do orça- iraniana; o maior dilema enfrentado por Israel relacionase com a capacidade de retaliar.
Dado que Israel é a única potênAsnovasfronteiras,unilateralmentedefinidas,continuarãoa cia atômica da região e, portanto,
sercontestadascomoasde1948ede1967,tantoporum qualquer ataque que sofra com
ADM não será nuclear, uma regovernodoFatahqauntoporumgovernodoHamas.
taliação não convencional forçaria os israelenses a inaugurarem
mento em plataformas convencionais, certamente no caso uma nova era com a utilização de uma bomba nuclear,
do Iraque o risco não será menosprezado no médio e longo a primeira desde 1945, para manter a sua credibilidade.
prazo.
Talvez esta tenha sido a mensagem entendida pelos vários
As ameaças percebidas pelos israelenses têm se trans- países árabes e mesmo pelos palestinos quando decidiram
formado ao longo da última década. Combinaram-se, no engajar-se nas negociações que levaram aos acordos de
período, o final da Guerra Fria, o estabelecimento dos Oslo.
Estados Unidos como a única super-potência, as intervenA proliferação de ADM e de mísseis balísticos talvez
ções militares que não solucionaram a questão iraquiana, obrigue os israelenses a tornar mais explícita sua capacidao programa nuclear iraniano (somado ao desenvolvimento de dissuasiva, respondendo frontalmente aos clamores pela
de mísseis balísticos e a proliferação das armas de destrui- destruição do país. E, em paralelo com o desenvolvimento
ção em massa – ADM) e o sempre estancado processo de do sistema de proteção anti-mísseis, herdeiro da Iniciativa
paz entre Israel e os palestinos. Esta combinação de fatores de Defesa Estratégica do governo Reagan (quando se assiCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
31
nou o protocolo de cooperação estratégica entre Israel e os
EUA), os israelenses têm avançado no desenvolvimento de
mísseis balísticos, demonstrando sua capacidade através
de bem sucedidos lançamentos de satélites, e estão bem à
frente de seus adversários.
Em paralelo com o processo de determinação de uma
política de dissuasão, Israel vem intensificando sua cooperação estratégica com a Turquia, rival da Síria e do Irã
na região, apesar da recusa turca em permitir o assalto das
trina. É um governo em muitas características semelhante
ao de 1981: um primeiro ministro sem uma importante
carreira militar em seu histórico, um governo que, ainda
que não seja do Likud, pode ser visto como seu herdeiro, e
a situação interna é de relativa tranqüilidade.
Mas Israel e Irã, como é sabido, nem sempre foram adversários ferrenhos, e têm várias características comuns. Até
a queda do Xá em 1979 ambos eram países de população
não árabe, localizados nas extremidades do Oriente Médio,
importantes aliados dos Estados
Unidos praticando a Doutrina
Dopontodevistaisraelense,asdisputasentreasfacções
Nixon3 e cercados por um “mar”
palestinassãomaisqueconvenientesparaacriaçãodas
de árabes hostis. E mesmo após
condiçõesquejustifiquemumaaçãounilateral.
a ascensão de Khomeini ao poder, durante a guerra Irã-Iraque,
tropas aliadas contra o Iraque a partir de seu território, e houve espaço para uma retomada daquela aliança e a coladas relações desenvolvidas ao longo dos anos entre Israel e boração entre Irã e Israel quando se fez necessário impedir
a minoria curda no Iraque. Durante os últimos anos houve uma vitória iraquiana. Ironicamente foi a necessidade iramanobras conjuntas, incorporação de tecnologia militar niana de encobrir sua colaboração com Israel que elevou
israelense pela Turquia e cooperação dos serviços de in- o tom das críticas ao aliado israelense, intensificando o
teligência, uma aliança que se opõe frontalmente ao eixo apoio moral do Irã à causa palestina.
Irã-Síria.
Desde então, a transformação do conflito em um embate ideológico e um instrumento de propaganda do goAquestãonucleardoIrã
verno iraniano fez desaparecer qualquer possibilidade
o
Este ano os israelenses festejam o 25 aniversário do de reconhecimento de possíveis interesses estratégicos
ataque da força aérea israelense que destruiu o Osirak, o comuns. Não só os iranianos utilizaram-se deste instrureator nuclear francês, construído no Iraque e que, apesar mento; desde o governo trabalhista do início da década de
das alegações norte-americanas sobre um programa nucle- 1990, a hostilidade iraniana e seu apoio ao Hizballah, tem
ar iraquiano, nunca foi reconstruído.
sido apontados pelos israelenses como importante empeApesar das diversas análises e cenários considerando cilho ao avanço das negociações de paz com os palestinos.
um ataque ao Irã, este não é o Iraque e a conjuntura inter- Assim, a combinação de um real temor ainda baseado na
nacional certamente não é a mesma do início da década memória do Holocausto, o fortalecimento de um adverde 1980. O que provavelmente não mudou foi o princípio sário estratégico regional e a possibilidade de adjudicar
da que veio a ser conhecida como “Doutrina Begin”2, que a um elemento externo parte da culpa pelo fracasso das
continua válido até hoje. Os críticos do ataque ao Osirak negociações com os palestinos passou a nortear a formu(entre eles vários israelenses), entretanto, alegam que a lação da política externa israelense e a influenciar a forma
destruição do reator, em lugar de impedir o avanço do pro- como o Irã era visto pelos Estados Unidos. Se a liderança
grama nuclear iraquiano somente o atrasou; e que após al- iraniana for vista como irracional (segundo as declarações
guns anos o Iraque reconstruiu sua infra-estrutura nucle- do presidente Ahmadinejad, se tomadas pelo seu valor de
ar, obtendo tecnologias que já não necessitavam do reator face) então a aplicação da dissuasão clássica não seria efepara a produção de armas nucleares. Assim, o ataque isra- tiva, exigindo também posturas inflexíveis da comunidaelense teria acelerado o esforço iraquiano, que teria sido de internacional. O interesse de Israel está em dissociar o
bem sucedido se o Iraque não tivesse invadido o Kuwait conflito entre Israel e o Irã de uma disputa hegemônica na
e atraído a atenção dos Estados Unidos para seu poten- região e transformá-lo em um confronto entre a única decial desestabilizador na região. Dez anos depois Saddam mocracia do Oriente Médio e um governo teocrático hostil
Hussein repetiria o processo; a expulsão dos inspetores da ao Ocidente e seus valores.
ONU e a aquisição de tecnologia para o enriquecimento
de urânio teriam finalmente levado ao surgimento de uma OplanodeconvergênciadeOhlmerteas
nova potência no Golfo, agora protegida por um escudo conseqüênciasdaretiradaunilateraldeGaza
nuclear. E ainda que não tenham sido encontradas as tão
O recém formado governo israelense enfrenta diverpropaladas ADM, não há dúvidas sobre as intenções do sos problemas. Apesar da aceitação de sua plataforma de
regime iraquiano de produzi-las, além do histórico de sua continuidade do plano de retirada de Gaza, propondo o
propensão em utilizá-las.
abandono de amplas áreas da Cisjordânia e a incorporação
O governo israelense atual, enfrentando o mesmo dile- dos grandes assentamentos lá localizados, ninguém duvida
ma, certamente pergunta-se se pode voltar a aplicar a dou- da dificuldade em implementar tal política. Por um lado
32
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
os 60.000 colonos que serão forçados a abandonar seus lares tendem a opôr-se de maneira muito mais violenta, o
que gerará vítimas e acusações recíprocas de provocação
de uma guerra civil. Por outro, a atual composição da coalizão israelense não poderá ser mantida, já que os partidos
religiosos que dela fazem parte não aceitam a retirada de
locais considerados sagrados para o judaísmo, uma herança bíblica recuperada para não mais ser abandonada.
Do ponto de vista das relações com os vizinhos, a
Jordânia teme que na sua fronteira surja uma “terra de
ninguém” dominada por radicais islâmicos que, eventualmente frustrados por não poderem avançar em direção ao
oeste, voltem-se para o leste como aconteceu em 1970. E a
cerá com Jerusalém, em cuja parte oriental vivem dezenas
de milhares de palestinos?
Mais grave talvez seja o fato de a implementação do plano não trazer uma solução. As novas fronteiras, unilateralmente definidas, continuarão a ser contestadas como as de
1948 e de 1967 tanto por um governo da Fatah quanto por
um governo do Hamas, por mais que estes aceitem a existência de um estado israelense. Os palestinos, assim como
os israelenses, continuarão a usar o tema como válvula de
escape para suas disputas políticas internas, e muralha alguma, por mais alta que seja, dará conta de um vizinho
hostil equipado com mísseis e foguetes. Qualquer solução
que não inclua uma negociação e um acordo manterá uma
situação de conflito, que fatalmente levará a um retorno das
AdisputadoFatahcomoHamassedáemtodososníveis
tropas israelenses ao território
dasociedadepalestina,especialmentenoqueserefereà
palestino, seja provisória ou permanentemente.
capacidadedeempregarapadrinhadosnoserviçopúblico
Enquanto isso, acumulamquenãosóémaior,maséemmuitoscasosoúnico
se mortos e feridos de ambos os
empregadordisponível.
lados mesmo sem um confronto aberto entre as partes. Em 12
última coisa que os israelenses necessitam é ter de intervir de junho, cinco israelenses morreram vitimados, não pelo
na Jordânia para novamente salvar seu aliado de um gol- terror, mas pelo descarrilamento de um trem e vários pape de estado palestino. Não faltam exemplos dos recentes lestinos morreram em confrontos entre as forças armadas
problemas enfrentados pelo Egito, que se viu responsável do Fatah e do Hamas. Do ponto de vista israelense, para a
pelo controle do acesso à Faixa de Gaza, num retrocesso de criação das condições que justifiquem uma ação unilateral,
40 anos e gerando conflitos que tendem a minar as relações as disputas entre as facções palestinas são mais que conveentre o Egito e Israel.4 Os atentados no Sinai, perpetrados nientes: os grupos armados palestinos estão praticamente
contra importantes centros turísticos egípcios, ainda que em guerra uns com os outros, seqüestrando e assassinando
coloquem Israel e Egito do mesmo lado na luta contra o rivais, atacando edifícios do governo e sofrendo os efeitos
terror, podem também ser vistos como pressão sobre o de um total enxugamento dos recursos necessários para
governo egípcio para facilitar a ação de grupos terroristas manter em funcionamento o embrião do estado palestino.
contra Israel.
Somente o tempo dirá se a política foi acertada, ou se
Uma retirada unilateral terá ainda de contar com o levou os palestinos a uma situação em que já nada havia
apoio dos norte-americanos, não só para o financiamen- para perder.
to do enorme custo implicado mas também para conter a
Toda e qualquer ação israelense dependerá do desfecho
pressão que Israel sofrerá do mundo árabe e mesmo dos da disputa de poder entre as várias facções palestinas. Ao
signatários do “Mapa da Estrada”. O recém-empossado longo dos últimos meses a Autoridade Palestina tem sido
primeiro ministro israelense já visitou os Estados Unidos boicotada num esforço para obrigar o Hamas a aceitar as
e a Inglaterra, não por acaso os principais atores na ocu- condições básicas de reconhecimento do direito de Israel
pação do Iraque, mas não pôde obter o apoio incondicio- à existência e a renúncia ao terror como instrumento de
nal que buscava. Ambos os governos preferem aguardar pressão. Um difícil equilíbrio tem sido buscado, para mana evolução do confronto entre o Hamas e a liderança da ter a pressão, ao mesmo tempo em que se evita a eclosão
Fatah antes de endossar uma ação israelenses que talvez de uma séria crise humanitária. A mensagem para a popuseja irreversível.
lação palestina que elegeu o Hamas será, ao mesmo tempo
Vários pontos ainda não estão claros no plano proposto um incentivo para aqueles que repudiam o extremismo e o
por Ohlmert: a retirada se dará, como em Gaza, também terror e um aviso para aqueles que acreditam que uma orpor parte dos militares? Quem garantirá então a seguran- ganização terrorista no governo pode alcançar seus objetiça dos territórios? Como se manterá a contigüidade das vos. A liderança da Fatah, tanto ou mais que israelenses e
áreas palestinas, condição necessária para a criação de um norte-americanos, está interessada no fracasso da nova adestado palestino viável? Quem controlará as fronteiras oci- ministração. Sua disputa com o Hamas está muito mais em
dentais da Cisjordânia? E o acesso aos picos adjacentes ao evidência no setor de segurança, em que repetidos choques
Vale do Jordão, área considerada estratégica desde antes da de milícias armadas tendem a gerar mais vítimas, mas a
criação do estado de Israel. E, como sempre, o que aconte- rivalidade se dá em todos os níveis da sociedade, especialCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
33
mente no que se refere à capacidade de empregar apadrinhados em um serviço público que, não só é o maior, mas
em alguns casos o único empregador disponível (ainda
que ultimamente não tenha sido capaz de remunerar seus
empregados). A retomada de atentados terroristas pode vir
a ser elemento de pressão utilizado pelas duas partes. As
Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa (grupo armado ligado
à Fatah) poderiam intensificar suas atividades para causar
problemas ao Hamas, responsável pelo ministério da segurança no novo governo. A demanda por uma equiparação
forçaria o rompimento da trégua com Israel e possíveis retaliações maciças que derrubariam o governo eleito, que
já começa a perder legitimidade frente à grave crise que
enfrenta a sociedade palestina. A Fatah poderia recuperar
o controle mais rapidamente minando a posição do Hamas
que tentando reformar suas instituições.
O Hamas tem se defendido culpando israelenses, norte-americanos, a comunidade internacional e a Fatah e
colocando nas ruas uma guarda armada que contesta frontalmente o monopólio da única força de segurança formal
em atuação nos territórios. Enquanto a Fatah tenta colocar
os funcionários públicos contra o novo governo, o Hamas
utiliza sua influência nas mesquitas e escolas para minar as
instituições tradicionalmente controladas pela Fatah.
O maior risco de um impasse está no fortalecimento de
grupos formalmente empossados e vestidos de um manto
de legitimidade que continuem a enfrentar-se, algo remi-
nescente das SA e SS dos primeiros anos do regime nazista.
Enquanto isso, no nível da disputa com os israelenses,
importantes líderes continuam a ser eliminados, como
nestes dias o líder do Comitê de Resistência Popular, responsável pelo assassinato em 2005 de Mussa Arafat, chefe
da inteligência palestina, e recém-nomeado para uma importante posição no ministério do interior.
Se ficar demonstrado que os membros das forças de
segurança seguirão aqueles que pagarem seus salários, estará demonstrado também o acerto da política israelense
de cortar, na medida do possível, o acesso a recursos por
parte do Hamas.
Os líderes do Hamas continuam insistindo em manter
sua postura de não reconhecimento de Israel e não colaboração com a Fatah, o que levou Mahmoud Abbas a convocar um plebiscito, ação tão unilateral quanto os planos israelenses de retirada da Cisjordânia. Uma derrota do Hamas,
e sua conseqüente saída do governo provavelmente levaria
a uma tentativa de deslegitimar a Autoridade Palestina e
a uma onda de atentados contra os israelenses. Não pode
ser descartada a emergência de uma sociedade completamente fragmentada, dominada por milícias armadas, nos
moldes do que ocorreu na Somália. O que certamente se
tornaria terreno fértil para o Al-Qaeda e seus aliados.
Talvez este seja o maior incentivo para que Israel e os
Estados Unidos encontrem uma solução alternativa, e sem
perda de tempo.
Notas
1
O levante contra a ocupação israelense. É necessário
diferenciar o primeiro movimento, efetivamente popular, do
segundo no qual envolveram-se grupos armados patrocinados
pela Autoridade Palestina, tornando-o uma revolta armada
A Doutrina Begin prega a necessidade fundamental de evitar
que os inimigos de Israel obtenham armas nucleares.
2
A Doutrina Nixon tinha por finalidade evitar outro
envolvimento como o do Vietnã, transferindo aos aliados
3
34
norte-americanos a responsabilidade pela manutenção de um
perímetro regional, apoiados por recursos norte-americanos
Não somente diplomatas egípcios foram seqüestrados por
milícias armadas na Faixa de Gaza. As forças de segurança
israelenses mataram dois egípcios encontrados no Neguev e
o crescente contrabando de armas para a faixa de Gaza vem
gerando acusações por parte dos israelenses de que os egípcios
estariam envolvidos.
4
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
HumanSecurity:aparadigm
contradictingthenationalinterest?
RobertSchütte
TalitaYamashiroFordelone
H
uman Security has sparked remarkable
turmoil throughout the epistemic community of international relations during
the last years1. Being on the one hand popularized by international organizations
like the United Nations2, on the other hand proclaimed as a
practical foreign policy posture by states like Japan, Norway
and Canada, this apparently innovative concept of security
imposes itself to the scientific discussion. Human security refers to the human being and its individual security as
a pattern of international relations, widening thereby the
scientific perspective to threats beyond military security
taking into account interrelated problems of under-development and human rights3. his orientation represents in
fact a crucial contestation to the current hegemonic paradigms of realism and neo-realism with their concentration
on interstate security competition. However, there is not
only dispute about questions of analysis and explication,
but also divergence concerning the normative character
of this new paradigm. Human Security claims to deliver
an analytical framework for research and explanation of
Robert Schütte is a student at the Insititut d’Études Politiques
de Paris and at the University of Cologne, completing his Master
in Political Sciences, History and Philosophy. He is particularly
focusing on International Relations theory, European Union,
and the German welfare state.
Talita Yamashiro Fordelone graduated in International
Relations at the University of São Paulo (USP). In the Autumn
of 2005, she attended the Institute d’Études Politiques de Paris,
during an exchange semester in the International Affairs
major, Development Studies concentration.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
security problems, but moreover, as a normative concept,
it also demands to be a practical signpost fully applicable
to foreign policy. Such a political predisposition renders
the emerging paradigm of Human Security especially sensitive to reproaches put forward by competing schools of
thought in international relations theory: Is the concept
nothing but idealistic hot air4, inapt to confront the rough
reality of an anarchic international system which forces all
states to care but for their own national interest? Doubting
the applicability of the Human Security paradigm to real
politics means neglecting an essential component and motif of Human Security as a whole, committing thereby a
deadly blow to its legitimacy. Putting it simply: Who needs
a signpost signing nothing but abstract theory?
he first part of this paper will show that it is misleading to assert an incongruence between Human Security
and the promotion of the national interest of the state. It
will be shown that the assumption of a somehow determined national interest, above all defended by (neo-) realist theory, defects on grounds of a profound misunderstanding of the formation of interest. In the second part,
the paper will present an alternative ideational concept of
interest-formation, describing it as a composite reflection
of narrow intersubjective needs as well as profound normative predispositions, being however neither rational nor
irrational in character. Once established this argument, the
conjured up tension between the national interest and an
application of Human Security in the realm of foreign policy is solved, and the political character of an adoption or
Special thanks to Jan Schmitz, Pawel Radchenko, Tatjana
Radchenko, and Nina Hall for their helpful contributions.
35
not supposed to maximise the national interest. In order
to come to grips with this reproach we have to answer the
Interestasanobjectivelydeductiblepatterninliberal
question: What is the national interest and how is it consandrealisttheory
tituted? To understand the notion of the term national inRealist critics of Human Security object that States are terest, it is essential to understand its philosophical origin
principally interested in their own security and do not in and conception.
Following the classical thoughts of utilitarianism forgeneral care about the “fear” or “need” of other people as
long as primary national interests are not at stake. he con- mulated by Bentham and Mill, every human being is drisideration of human rights plays at best a marginal role ven by the desire to achieve as much happiness as possible
in the great gamble of power-politics in the context of an and to avoid pain. he objective of ethical politics, based
international struggle for security, power and position. on this endeavour to achieve “happiness”, should thus be
Hence, insofar as human security is not promoting the na- to promote the quantitative maximization of good consetional interest of the state, it can be discarded as an irra- quences for a population. Liberal economics grasped this
tional and even risky adventure originating from a some- thought applying it in a particular fashion to their thinking
times idealistic human mind5. he mounting criticism of by equating “happiness” with the materially measura“realist” conservatives inside the Republican Party towards ble maximization of the consumption of goods; because
everybody is striving for hapHumanSecurityreferstothehumanbeinganditsindividual piness, that is nothing else but
the maximization of utility,
securityasapatternofinternationalrelations,widening
everybody tries to achieve the
therebythescientificperspectivetothreatsbeyondmilitary
maximization of consumption. his is an essential point
securityandtakingintoaccountproblemsofunderbecause it enables the liberal
developmentandhumanrights.
theory to define utility regardless of the actors socialisation,
culture and normative predisthe neo-conservative politics of the Bush administration, position. he theoretical clue of this perspective is the possetting the promotion of liberal democracy worldwide as sibility to objectify the utility of agents by establishing that
a strategic goal6, portrays a such refusal of a normative- everybody is an egoistic and rational maximizer of its own
ly loaded foreign policy aiming at the spreading of libe- consumption, a so called homo oeconomicus. People can
ral democracy all over the world: “As we wage war today maximize their utility, or putting it in the political term
to keep the world safe from terror, we must also work to “interest”, in optimal or suboptimal ways, but they do not
make the world a better place for all its citizens.7” Against define their utility in a fashion of striving or not striving
such an understanding of American internationalism, the for happiness/consumption. Being for example born into a
two prominent realist scientists Stephen Walt and John J. wealthy family, it would be rational to demand lower taxes,
Mearsheimer haven taken a clear stance, especially against to engage against systems of redistribution and adhering to
the intervention in Iraq: “Although the United States would a liberal party, this way maximising efficiently the indivialmost certainly win such a war, armed conflict with Iraq dual opportunity to consume goods now and in the futuwould divert resources and attention from the more im- re. he other way around, being born into a poor working
portant task of eliminating the terrorist threat. (…). In class environment should spark the motivation to fight for
short, an invasion of Iraq is the wrong war in the wrong higher taxes, a more equal distribution of wealth and to
place at the wrong time.”8 Underlying a such view of inter- engage in a labour party. It is noteworthy to state that this
national relations, most clearly explained in Waltz heory scheme works only as long as the poor are not becoming
of International Politics, is the theoretical presupposition rich, because from that moment on the nouveau riche will
that states do have a rationally deductible and objective- change their preferences according to their new social poly identifiable national interest. hus, the realist discourse sition by joining a liberal party. Given such a reconfigurain international security concerns primarily the question tion of circumstances, it would simply not be rational for
of how to promote the national interest or, to put in an an egoistic maximizer of utility to fight for higher taxes.
economical term: how to maximise the utility of the state. he key point here is that liberal thought determines utility
For the case of Iraq, it is apparent that many realists are and interest principally as an intersubjective and rationally
at odds with their “missionary” neo-conservative counter- deductible pattern, which can be more or less efficiently
parts, reproaching them the pursuit of ideological politics maximized. Changes of outcome are rather explained by
detrimental to the promotion of the national interest. Of external factors than by intrinsic phenomena. he formercourse, such a blame refers to all forms of “ideology”, inclu- ly poor and now nouveau riche do not change their prefeding naturally the paradigm of Human Security, which are rences because of a change caused by an insight that liberal
non-adoption is reconstituted.
36
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
values are morally superior to socialist values. he change
of political preferences was rather caused by the change in
social position, rendering now the defence of liberal values
congruent with their own interest in the maximization of
consumption. his change of preference is therefore constituted exogenously by a change in the environment, and
not by an endogenous change in values held by the agent.
Hence, interest is a function of exogenous circumstances.
here is no variation in liberal theory between different
people, different cultures or different histories, because
all human beings can be regarded as black boxes driven
by the same motivation in striving for the maximization
of consumption. he consequence is an exclusion of endogenous ideational predispositions hold by the agent as
an explanation for interest. Interest has been externalized
with reference to the maximization of consumption, it is
therefore constituted exogenously by the environment.
Wendt is right to state that “neo-classical economists (…)
try to avoid making substantial assumptions about actors
psychology by explaining varying outcomes through reference to changing prices in the environment rather than
changing preferences.”9 With the assumption of the homo
oeconomicus as a unitary and egoistic utility-maximizer,
liberal thought conceptualises agents as black boxes.
he above explained consideration of egoistic self-regarding black-box agents found its way directly into the
neo-realist paradigm. his is a barely astonishing fact regarding the strong impetus liberal economics had on the
conception of Waltz heory of International Politics. In
fact, Waltz is very clear about the analogy between market
and international system: “(…) the parallel with market
ship, but whether it is placed on the upper or lower end of
the power hierarchy. By ruling out endemic attributes and
in ascribing to external factors the status of an independent
variable to explain interest, neo-realism reflects a liberal
ontology of rational interest. In consequence, neo-realists
argue that a foreign policy not promoting the security and
power of the state suffers from a deficient maximization
of the national interest. Making whole-hearted efforts to
provide for human security might seem morally decent.
However, decency may mostly be an unaffordable luxury
under a merciless international anarchy and the fight for
power and position. Distracting valuable resources from
the realization of primary, that is egoistic, needs to altruistic ends means in this perspective always an imposition of
opportunity costs, thus a suboptimal way to maximize the
rational “national interest”. Given this argument, a practical application of human security as a doctrine of foreign
policy would always be in tension, or even contradiction,
to the realization of the national interest.
Securityiswhatstatesmakeofit
Human Security, nothing but a devout wish of starryeyed idealists out of touch with reality? In fact, there is no
theoretical evidence to believe so. On the contrary, there
is rather good reason to doubt the theoretical foundation
of neo-realist assumptions about the formation of “national interest” and therefore the criticism posed to Human
Security by it. Neglecting the endogenous dimension of
agency, neo-realism rules out ideational factors like norms, socialisation and identity in order to conceptualise
exogenous factors as independent variables having causal
influence on interest. In stating self-regardedness as well
TheorientationproposedbyHumanSecurityrepresentsa
as power- or security-seeking
as constant motivational attricrucialcontestationtothecurrenthegemonicparadigmsof
butions of states, the explanarealismandneo-realism.
tory role falls to the changing
factor of the external environtheory is exact. Both states and firms are like units. hough ment in which the state tries to maximize its interest in a
all of their variations in form, firms share certain qualities: rational-choice manner. Hence, given a particularly specihey are self-regarding units that (…) decide for themsel- fied external environment and the assumption of the above
ves how to cope with their environment and just how to mentioned constant motivational attributes of agency, it is
work for their ends. Variation in structure is introduced, possible to state an objective and rational national interest
not through differences in the character and function of which can be more or less efficiently maximized by the stathe units, but only through distinctions made among them te. It is this conclusion which can be doubted.
according to their capabilities.”10 Neo-realism as a strucInterests are only limitedly objective in character and
tural theory claims to abstract from unit-level attributes, essentially subjectively constituted by ideational factors.
this way excluding variations in normative or psycholo- Even if neo-realism is right to label “security” a basic mogical predispositions. he only behavioural assumption tivation for states, the question remains unanswered how
established is that states are egoistic and above all concer- security is defined. State behaviour can hardly be explained
ned about their own security. Different “national interests” by an underspecified strive for security by self-regarding
derive therefore not from endemic varying attributes of actors. Integrating norms, identities and socialisation as
agents but from exogenous variations of structure. For the endogenous factors to a model of interest-formation can
explanation of national interest in neo-realism it does not help a great deal to understand state-behaviour as well as
matter whether a given state X is a democracy or dictator- the dynamic “political” character of interest. I argue that
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
37
the formation of “national interest” is a function of fundamental exogenous factors as well as endogenous ideational
variables. he exogenous factors set effective borderlines
for the pursuit of interest, binding thereby every actor in
the system. he endogenous ideational components define
the national interest through norms, identity and socialisation. It may be though consensual that all states are bound
by the necessity to save survival and security. However, the
national interest itself is defined by identity and norms of
the agent itself and can not be regarded as the function of
environmental patterns. Ideas give in this sense for example content to security by defining a concept of security:
Security of the narrow nation state? he members of an
Alliance? A particular group of, for example democratic,
states? Or even all human beings like in the concept of
human security? Interest can not be stated objectively because it is subjective by its nature; furthermore, it can be
rationally strived for but not being itself rational.
Ideas and socialisation define the fashion, in which environment and behaviour of other agents is interpreted,
categorized and evaluated. hese cognitive processes can
lead to extremely different interpretations of reality and
its meaning to the agent, depending on its normal predispositions and, noteworthy, independent of changes in
environment. History and socialisation play a crucial role
in forming interest: At the start of the 20th Century, the
German military build-up was regarded by its European
neighbours as a dangerous challenge to their national securities. In contrast, Germany has proved to be a reliable,
calculable and above all friendly partner in Europe during
the second part of the 20th century: the practise of institutionalised cooperation of normatively “coherent” states in
the Euro-Atlantic community, above all in NATO and the
European Community, functioned over the last 60 years
tifies its own security as inseparably attached to that of its
European neighbours. Wendt and other scientists have
extensively worked on the question of norm-constitution,
socialisation and culture11, the present paper will therefore
concentrate in the subsequent section on the influence of
ideational factors on state behaviour.
It was argued that interest can not necessarily be an
objective product of exogenous factors but has to be understood as the function of endogenous and exogenous
attributes of agents. An illustration of the subjective character of the national interest and its dependency on ideational concepts is the Spanish governmental change in
2004: Ater the terrorist attack in Madrid on march 11, the
conservative government under Aznar lost the national
elections and had to handover power to the socialist party
under Zapatero. While the former was a steadfast champion of the invasion of Iraq in 2003 and was supposedly
not to change this course, the later announced and carried
out immediately the retreat of all Spanish troops ater his
victory. Furthermore, he aligned his country ostentatiously with the intervention-critics Chirac and Schröder and
ceased the blocking of the European Constitution, thereby
taking detrimental positions in foreign policy with regard
to his predecessor. How is this explainable? What changed
was neither the relative position of Spain in the international system nor in the European Union: It has to be stated
that although the terrorist attack caused enormous suffer
and meant a shock to the Spanish as well as European publics, it did not change the Spanish power position in the
international arena. here was neither a causal influence
on aggregate national military capabilities nor a lasting
economical impact. What changed was the conception
of the national interest based on differing normative predispositions and different self-images, roles and identities
of Spain in Europe and the international system, induced by the
Interestsareonlylimitedlyobjectiveincharacterand
change of government from Aznar
essentiallysubjectivelyconstitutedbyideationalfactors.
to Zapatero. Obviously, the two
party leaders stood for significanThenationalinterestisneitherobjectivelydefinablenor
tly different position regarding the
rationallydeductible.
international role of Spain, thus
resulting in different definitions of
as successful means to build up confidence and friendship the national interest. he turn in the “national interest” of
between the states of the Western hemisphere. Hence, Spain can hardly be called ir/rational or objectively more
comparable politics in the year 2006 are not anymore re- or less advantageous regarding utility, because both attrigarded as a threat to the national security of France, Britain butes can not be attached to the category of “interest”. Neoor Luxembourg, but rather welcomed as a step forward to realists have serious trouble to explain the turn in Spain’s
empower European or NATO capabilities. Neglecting the foreign policy, because there are only two possibilities to
importance of socialisation and changing identities of sta- explain its results following their presuppositions: Either
tes would thus be a profound misunderstanding of the dy- there was a deep shit in relative power-positions in the
namics of international relations. Applying these factors to international system, or one of the two governments acted
the definition of security, the German Empire for example irrational in disrespecting the maximization of the national
defined its national interest, identity and role in the inter- interest. he first possibility can be ruled out easily because
national system 100 years ago in dissociation to France of the short time-span between the shit in foreign policy
and Britain, whereas the Federal Republic nowadays iden- orientations as well as of the assumption that a conserva-
38
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
therefore an instrument to achieve certain aims determined by the individual interest, being itself the function
of mainly ideational attributes endogenous to the agent.
Another hard illustration for this phenomenon would be
an individual with an interest in killing himself and others
in a suicide-bombing. Although incomprehensible, this
constitutes for whatever reasons an interest, which can be
rationally strived for. A such killer has thus for given reasons an interest in committing suicide while killing as many
people as possible. He will though not chose to detonate on
an abandoned field but search to accomplish his mission in
a crowd of people; a rationally chosen behaviour.
he above mentioned explications and examples show
that the liberal and neorealist ontological asThereisnoevidencetobelievetheclaimthatHumanSecurity
sumption of an objectiisnothingbutadevoutwishofstarry-eyedidealistsoutoftouch ve and rational interest
withreality.Onthecontrary,thereisrathergoodreasontodoubt given exogenously to
agents ideational predisthetheoreticalfoundationofrealismandneo-realism.
positions is in fact a profound misunderstanding
and
a
failure
of
category
of
the
term
interest. his signifies
realist argument that one of the two governments acted irrational and deficiently with regard to the national interest. in consequence that the promotion of the national interest
here is simply no objectively determinable national inte- has not to be viewed as a contradiction to the application
rest that could show politicians the best path to maximise of a Human Security agenda. A such conception of foreign
policy is as much justified as other conceptions, and it rests
the nations utility in a precise case like the discussed one.
What can be stated is that the formation of interest is a therefore a merely political question to define the natiofunction of subjective ideational predispositions, and that nal interest in a correspondent fashion. he instauration of
this formation is of endogenously dynamic character. he Human Security as a policy guideline by the governments
national interest is what states make of it12, being neither of Canada, Japan and Sweden marks a powerful point in
objectively definable nor rationally deductible. Like all favour of this emerging paradigm. A refusal of adoption
normative decisions, the definition of interest is a political can, therefore, no longer be founded in an alleged tension
choice being only to a small part materially constrained. between Human Security and the national interest, but has
Hence, a change in government can lead to profound shits to be clarified as a political decision supported by an expliin conceptions of interests, even if there are particular ban- cit definition of the states interest. A such re-politicization
dwidths intraversable at least for western-style democra- can in the long term support the cause of Human Security
cies with a core of domestically shared consensual identi- by disclosing the normative and political foundations of
ties. he notion of rationality, although not applicable to national foreign policies, withdrawing them from the reinterests itself, can however be understood in an instru- alm of untouchable technocratic experts specialised in the
mental fashion: Ideational endogenous variables constitute art of determining the best way to maximise optimally the
within a framework of exogenous factors the interest of an national interest.
agent, which can then be rationally strived for. Contrary
to everyday language, rationality is disconnected from the ParadigmaticshiftandHumanSecurityininternational
constitution of interest but a means to attain the objectives relationstheory
Since the end of the cold war, the hegemonic paradigm
set by the interest. Taking up once again the example of a
nouveau riche worker: In contrast to the liberal/realist mo- of (neo-)realism has faced mounting criticism by schools
del of interest constitution, it is probable that he will still like constructivism, neo-intuitionalism as well as Human
stick to his socialised values of solidarity and social justice Security. Are the questions, tools and answers of the “reaalthough his circumstances of life have changed. His inte- list” tradition still capable to explain international relations?
rest can thus be interpreted as the function of ideational It is noteworthy that contemporary economists are increfactors including normative predispositions, identity and asingly willing to introduce sociological and psychological
socialisation to a certain environment with certain proble- suppositions to their theories in order to square “anomams. Given a such interest, the nouveau riche will however lies”: for his work on psychological factors in economics,
use its rationality to strive for his aims, that is to achieve Daniel Kahnemann even received the Nobel Price in 2002.
his goals in the most efficient way possible. Rationality is Will international political theory also undergo a similar
tive government would have continued the already chosen way. he second possibility is more tricky to resolve:
he Aznar and Zapatero governments implemented totally
contradictory foreign policies in questions of highest importance for Spain. he assumption that one of the two governments ceased caring about the national interest would
thus imply that it actually acted detrimentally to the national interest. How is it possible to choose the “bad guy”?
Obviously both governments had comprehensible reasons
for their policies with respect to their different conceptions
of interest, and it is impossible to state that one of the two
acted doubtlessly crazy or irrational. A closing answer to
this question can not be found, thus undermining the neo-
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
39
paradigmatic shit during the coming years, abandoning
well established and comfortable patterns of thinking in
order to revise overcome theoretical axioms? Following
homas Kuhns work on the structure of scientific revolutions13, an emerging paradigms must not only explain
reality, but have to perform better than its scientific competitors. he present work was aimed to support this endeavour in favour of Human Security: the first part of the
paper showed that there is a certain ontological deficiency
in realism committing a categorical failure discerning the
notion of interest. he second part of the present work explained that the application of Human Security as a posture of foreign policy is not contradictory to the pursuit of
the national interest, but depends on different normative
predispositions as well as the political definition of what
the national interest is about. With regard to the European
Union for example, one can argue that Human Security,
irrespective of the nation state, has already become a tacit stance amongst European states. he refutation of the
alleged contradiction between a Human Security agenda
and the promotion of the national interest is therefore of
importance. Defending the ideational and political character of the formation of interest against liberal and realistic
advocates of exogenously given material constraints is an
essential basis for the scientific and practical legitimacy of
Human Security as an emerging paradigm in international
relations theory.
7
Notes
Carr, E. H. (1939). he Twenty Years Crisis. Palgrave.
Paris, Roland (2001). Human Security: Paradigm Shit or Hot
Air?, International Security, Vol. 26, No. 2 , pp. 87-102.; Foong
Khong, Yuen (2001). Human Security: A Shotgun Approach to
Alleviating Human Misery? Global Governance 7, 231-236.;
Buzan, Barry, Ole Wæver, and Jaap de Wilde (1998). Security: A
New Framework for Analysis, Boulder: Lynne Rienner; Moller,
Bjorn (2000). he Concept of Security: he Pros and Cons
of Expansion and Contraction, Copenhagen Peace Research
Institute.
1
High-level Panel on hreats, Challenges and Change (2004).
A more secure world: our shared responsibility and Kofi Annan’s
response; United Nations Development Programme (1994).
Human Development Report 1994 – New Dimensions of Human
Security. NewYork: Oxford University Press
2
For a more detailled discussion of Human Security as a
pardigm in International Relations heory, see: Amouyel,
Alexandra (2006). What is Human Security? Human Security
Journal, 1/06, Institut d’Etudes Politiques de Paris
3
4
Paris, Roland (2001)
For classical arguments against idealistic policies compare for
example: Carr, E. H. (1939). he Twenty Years Crisis; Palgrave;
Morgenthau, Hans (1948). Politics Among Nations. he Struggle
for Power and Peace, New York
5
he National Security Strategy of the Unitied States of
America, 2002
6
40
President Bush, Washington, D.C. (Inter-American
Development Bank), March 14, 2002
http://www.ksg.harvard.edu/news/opeds/2002/iraq_che_
111502.htm
8
Wendt, Alexander (1999). Social heory of International
Politics, Cambridge, p. 99
9
10
Waltz, Kenneth N. (1978). heory of International Politics, 98
11
Wendt, Alexander (1999)
his is an allusion to a path-breaking paper of A. Wendt,
making a point for neo-constructivism in international
relations theory: Wendt, Alexander (1992). Anarchy is what
states make of it: the social construction of power politics;
International Organizations, 46/2.
12
Kuhn, homas S. (1962). he Structure of Scientific
Revolutions, University of Chicago Press
13
References
Amouyel, Alexandra (2006). “What is Human Security?”.
Institut d’Etudes Politiques de Paris, Human Security Journal,
1/06.
Buzan, Barry, Ole Wæver, and Jaap de Wilde (1998). Security:
A New Framework for Analysis, Boulder: Lynne Rienner;
Moller, Bjorn (2000). he Concept of Security: he Pros and
Cons of Expansion and Contraction, Copenhagen Peace
Research Institute.
Foong Khong, Yuen (2001). “Human Security: A Shotgun
Approach to Alleviating Human Misery?” Global Governance
7
High-level Panel on hreats, Challenges and Change (2004). A
more secure world: our shared responsibility and Kofi Annan’s
response; United Nations Development Programme (1994).
Human Development Report 1994 – New Dimensions of
Human Security, NewYork: Oxford University Press
Kuhn, homas S. (1962). he Structure of Scientific Revolutions.
University of Chicago Press
Morgenthau, Hans (1948). Politics Among Nations. he Struggle
for Power and Peace. New York.
Paris, Roland (2001). “Human Security: Paradigm Shit or Hot
Air?”, International Security, Vol. 26 (2)
President Bush, Washington, D.C. (Inter-American
Development Bank), March 14, 2002
he National Security Strategy of the Unitied States of America,
2002
Waltz, Kenneth N. (1978). heory of International Politics.
Wendt, Alexander (1992). “Anarchy is what states make of
it: the social construction of power politics”. International
Organization, 46/2.
Wendt, Alexander (1999). Social heory of International Politics.
Cambridge.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
RobertMcNamaracomoumteórico
dorealismomoderno
nasrelaçõesinternacionais
RodolphoTalaisysBernabel
E
ste artigo propõe um exercício de reconstrução racional e análise teórica do documentário
cinematográfico denominado Fog of War1 exibido no Brasil com o título “Sob a Névoa da
Guerra”. Para tanto faço uso da Metodologia
da Teoria da Ciência de José R. N. Chiappin2
O filme, dirigido por Errol Morris no ano de 2003, é uma
compilação da entrevista com Robert Strange McNamara,
gravações do entrevistado como secretário de defesa dos
Estados Unidos da América e imagens da política norte
americana e das principais guerras do século 20 - Primeira
Guerra Mundial, Segunda Guerra mundial, Guerra Fria e
Guerra do Vietnam.
A reconstrução racional procurará mostrar quais são as
principais concepções de McNamara acerca das relações
internacionais, e a análise teórica tentará estabelecer seu
pensamento como pertencente ao programa do realismo
moderno inaugurado por Hans Morgenthau. Assumo aqui
a análise de Morgenthau feita pelo professor José R. N.
Chiappin3 que mostra o surgimento de um novo realismo
nas relações internacionais, o realismo moderno, diferente
do realismo clássico. Obviamente, as interpretações erradas que eu possa ter feito desse trabalho, bem como um
possível mau uso na analise do pensamento de McNamara
são de minha inteira responsabilidade.
Rodolpho Talaisys Bernabel é bacharel em Ciências Sociais
pela Universidade de São Paulo. Foi bolsista do PIBIC por
dois anos, sob orientação do Professor Cícero Araújo, do
departamento de Ciência Política da USP.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
A justificação de meu estudo está no fato – que tentarei
mostrar – de a teoria de McNamara ser complementar à
teoria das relações internacionais de Morgenthau, resolvendo alguns problemas deixados por esta. Minha proposta principal neste artigo é mostrar que há uma transferência teórica e empírica de problemas se tomarmos as teorias
de Morgenthau e McNamara em seqüência. Dessa forma,
teríamos observado uma progressividade no programa de
pesquisa do realismo moderno.
McNamara apresenta suas teses em forma de lições que
resumem sua abordagem, e as expande na entrevista. Essas
lições, no entanto, vêm escritas de forma diferente durante o filme, não correspondendo exatamente ao sentido das
frases escritas por McNamara. Assim, o material utilizado
apresenta duas versões para cada lição, exigindo que se
tome uma decisão metodológica prévia, de qual versão se
fará uso, para evitar as ambigüidades entre elas. Por isso,
utilizei principalmente a lições elaboradas pelo próprio
McNamara, em vez das lições expostas diretamente no filme. Fiz isso para trabalhar com dados primários, já que os
títulos, o número e a seqüência das lições são diferentes,
havendo, inevitavelmente, alguma interpretação prévia do
diretor. Dessa forma, mesmo que cuidando para minimiO autor agradece aos professores José R. N. Chiappin pelos valiosos ensinamentos e pela grande atenção dispensada e José Álvaro Moisés pela indicação do filme. Agradeço
também aos meus colegas Umberto Guarnier Mignozzeti,
Cándido Aquino e Daniel de Oliveira Cunha pelas discussões teóricas e metodológicas, bem como pelo incentivo e indicações bibliográficas.
41
zar as diferenças, haveria o risco de cair em alguma ambigüidade dos títulos. A seqüência elaborada por McNamara
encontra-se em uma faixa extra no disco de imagem digital
– DVD – distribuído comercialmente. Todavia, para fins
de análise, fiz uma transcrição do conteúdo visual – texto
(há também uma fala de McNamara em que ele diz serem
aquelas as suas lições); esta transcrição é exposta ao longo
do artigo.
OrealismomodernodeMorgenthau
Hans Morgenthau, em “Politics among Nations. he
Struggle for Peace”, propõe uma melhora metodológica e
uma mudança axiológica no programa realista clássico no
estudo das relações internacionais, trazendo um elemento
da concepção idealista, mas sendo também uma alternativa a esta. Para os realistas, a paz só pode ser conseguida
temporariamente; e a maneira de fazer isto é equilibrando
o poder das nações. Já os idealistas almejam a paz eterna,
sendo a afirmação de valores universais o caminho para
tanto.
Segundo Morgenthau, é possível alcançar uma paz duradoura, ao contrário do que afirmam os realistas. A paz
duradoura é possível com a construção de um Estado único mundial. Essa seria a mudança nos objetivos, trazida
das concepções idealistas. Contudo, a busca da paz não se
deve basear somente na discussão de idéias e valores, em
detrimento do uso da guerra para a solução de conflitos,
como almejam os idealistas nas relações internacionais.
Chegamos então ao momento da melhora metodológica
feita por Morgenthau no programa realista nas relações
internacionais.
Morgenthau afirma que se deve objetivar a paz duradoura como um fim um pouco distante, que não pode ser
alcançado imediatamente, mas que deve ser perseguido de
forma convergente. Nessa busca, é imprescindível o uso
controlado da guerra, visando o equilíbrio de poder entre
as nações. Para controlar o uso da guerra, é preciso dar um
salto epistemológico que permita uma melhor compreensão de tal fenômeno, permitindo que seja trabalhado mais
racionalmente. Esse salto vem com o estabelecimento de
dois critérios para se escolher e avaliar a conduta nas relações internacionais.
O primeiro aspecto é um preceito moral, usado para
controlar nossos impulsos de agressão: a prudência. O
segundo aspecto é uma exigência política que precisa ser
levada em conta na avaliação das ações: o sucesso, a ser
usado como modo avaliação pragmática. Assim, a guerra
passa a ser compreendida com o apoio de duas novas categorias, uma que serve para escolher ações e outra que serve
para avaliá-las.
Com isso, o equilíbrio de poder pode ser trabalhado
mais racionalmente, pois, se antes tínhamos uma intuição
de como evitar temporariamente a guerra, agora temos
maneiras de operar essa intuição. Pode-se agora pensar
o equilíbrio em um nível metodológico anterior – como
42
uma regulação com menor refinamento –, já que as ações
podem ser escolhidas e avaliadas – um refinamento maior
– tendo em vista o equilíbrio.
AsliçõesdeMcNamara
Passo agora a extrair, das lições de Robert McNamara,
proposições em forma de teses. Algumas dessas teses nos
permitirão encaixar McNamara no programa do realismo
moderno iniciado por Morgenthau. Minha intenção é mostrar que McNamara aprofunda o refinamento epistemológico dos dois novos elementos de Morgenthau, dando-lhes
uma unidade de medida. Com essa unidade a prudência e
o sucesso podem ser trabalhados tendo em vista um princípio regulador mais preciso do que a noção de equilíbrio
apenas. Agora, o equilíbrio poderá ser concebido mais racionalmente, dado que seus elementos constituintes foram
quantificados. Essa é a tese principal deste artigo: procuro
mostrar que a teoria de McNamara resolve um problema
deixado pela teoria anterior, qual seja, estabelece uma unidade de medida para avaliar o impacto dos procedimentos
nas relações internacionais. Temos, portanto, um avanço
epistemológico, já que isso possibilitaria o desenvolvimento de análises quantitativas.
Farei uma exposição do pensamento de McNamara por
meio de teses que visam a aplicação de sua teoria, dessa
forma o ganho epistemológico que identificamos nesse
preâmbulo, ,será exposto como uma tese metodológica.
Isso é possível se entendermos a metodologia com uma
concepção ampla, a aplicação de conhecimentos para resolver problemas, mas que, no momento da pesquisa, pode
ser refinada e ramificada.
Veremos agora como McNamara estabelece uma metodologia (equilíbrio de poder) em função de uma axiologia (paz duradoura). Seu equilíbrio deve ser convergente à
paz duradoura. Para operar os elementos constituintes do
equilíbrio devemos ter em mente a seguinte associação:
a) preceito moral: prudência (entendida como expectativa ou previsão de custos);
b) preceito pragmático: sucesso (entendido como uma
situação em que os benefícios verificados tenham
sido maiores do que os custos).
Lesson #1: he human race will not eliminate war in this
century, but we can reduce the brutality of war - the level
of killing - by adhering to the principles of a “Just War”, in
particular to the principle of “proportionality”.
Tese Ontológica 1) A raça humana é objeto do conhecimento.
Tese Teórica 1) A paz não pode ser alcançada aqui e
agora.
Tese Teórica 1.2) A paz pode ser alcançada.
Tese Teórica 2) Os malefícios da guerra podem ser reCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
duzidos.
cionalidade tem uma característica moral e uma puramenTese Axiológica 1) (derivada da TT1) A paz é o obje- te racional. A parte moral traz uma tese normativa, será a
base para a formação do método da proporcionalidade:
tivo final.
Tese Normativa 1) A desproporcionalidade é imoral.
Tese Metodológica 1) A medida dos custos é o número
O exemplo de fracasso usado é o fire bombing em
de mortos (“level of killing”).
Tóquio, durante a 2a Guerra Mundial. Pois, se a guerra
Proponho então que a principal contribuição de tivesse sido perdida pelos aliados, os americanos seriam
McNamara é sua 1a tese metodológica para a análise das considerados criminosos por esse bombardeio incendiárelações internacionais. Elaborada de outra forma ela fi- rio. Logo, por que é imoral perder e não é imoral ganhar, se
caria assim:
o método foi o mesmo?
TM1) A unidade de medida para calcular os custos e
A parte puramente racional do argumento diz que a
benefícios é a vida humana.
proporcionalidade é um princípio moral (de prudência)
McNamara dá uma unidade de medida para o custo de que mantém o equilíbrio de poder por meio de uma restrium conflito armado, a saber, a vida humana dizimada, com ção interna, fazendo com que, externamente, haja de fato
equilíbrio; dessa forma,
a proporcionalidade poAteoriadeMcNamarapropõeumaunidadedemedida
deria ser encarada como
método.
paraavaliaroimpactodaatuaçãodosEstadosnasrelações
Para encerrar essa liinternacionais.
ção, faço aqui uma tradução livre de uma fala de
McNamara
em
que
vemos
as
teses
acima serem corroboisso, tem-se a unidade de medida para o benefício: vidas
poupadas com o impedimento do conflito ou com seu uso radas: “Às vezes temos que fazer o mal, mas devemos minimizá-lo. É uma posição difícil para seres sensíveis ter que
racionalizado.
Levando-se em conta que a paz eterna não pode ser matar pessoas para salvar a nação”.
imediatamente alcançada, mas que pode ser alcançada no
longo prazo, o que terminaria com a dinâmica de momen- Lesson #2: he indefinite combination of human fallibility
tos de paz intercalados com momentos de guerra, ou seja, and nuclear weapons will lead to destruction of nations.
com a operacionalização de TT1 e TT1.2, chega-se à:
TO2) O ser humano é falível.
Tese Epistemológica 1) A história é convergente.
TO2.1) (corolário de TO2) O ser humano não está
Perceba-se que há uma dimensão temporal na lição de
sempre em plena posse da razão.
McNamara (“in this century”), logo, podemos dizer que
TO2.2) (corolário de TO2.1) Há momentos em que o
para ele a guerra pode ser eliminada, mas antes temos que
ser humano é racional.
alcançar um objetivo intermediário, que deve ser posto em
prática para que o objetivo final seja alcançado. Assim, deTO3) O individuo é objeto do conhecimento no estudo
rivada da TA1, temos:
das relações internacionais.
TA2) A redução da brutalidade (custos) da guerra é
TT4) É indefinido o momento em que armas nucleares
um objetivo intermediário, a ser alcançado imediaestarão a ser controladas por alguém que não esteja
tamente.
de plena posse da razão.
Para isso é preciso que já se tome alguma atitude, e teTT5) O momento de TT4 poderá levar à destruição de
mos que:
nações.
TT3) A prudência é um princípio que já se pode apliAqui cabem mais duas falas de McNamara, a primeira
car.
indica uma noção de uso racional da história e a segunda
TM2) Os objetivos de TA1 e TA2 podem ser obtidos mostra que a adoção da prudência não é condição sufipor meio da adesão aos princípios da guerra justa, ciente para o alcance imediato da paz: “Devemos aprender
em especial o da proporcionalidade.
com nossos erros” (não cometer o mesmo erro duas vezes
Aqui temos então um nome e uma regulação para o é preceito do sucesso); “Mas não há tempo para aprender
preceito moral da prudência: a guerra justa, regulada pelo com erros no uso de armas nucleares; basta um erro e se
princípio pragmático da proporcionalidade.
destruirá nações”.
McNamara nos mostra como o século XX é um exemplo
Temos então uma nova tese ontológica e outra epistede insucesso na busca de uma paz duradoura, pois não se mológica:
obedeceu ao princípio da proporcionalidade. Tivemos 160
TO4) O indivíduo é perfectível.
milhões de mortos em conflitos. O argumento da proporCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
43
TE2) A história é inteligível.
Aqui McNamara indica um exemplo de sucesso pelo
uso da prudência, levando em conta a proporcionalidade.
Trata-se da Crise dos Mísseis, nela os EUA tinham 17 vezes
mais armas nucleares que a URSS; o que pode ser convertido em destruição de vidas. A ação irracional foi de Fidel
Castro, que mesmo sabendo que Cuba seria inteiramente destruída, recomendou a Khrushchev que usasse suas
bombas.
Observemos a transposição teórica da teoria de
Morgenthau para a de McNamara. A teoria de Morgenthau
diria: evitou-se o conflito. A de McNamara diria: evitou-se
um conflito em que um determinado número (na casa dos
milhões) de pessoas morreria.
Assim, devemos tentar aprender e entender o que aconteceu, elaborar planos de ataque específicos, calcular as
conseqüências e avaliar os resultados. McNamara cita uma
frase de T.S. Eliot: “We shall not cease from exploring, and in
the end of exploration we were returned to where we started,
and know the place for the first time”. Podemos tirar daqui
um corolário da TE2:
TE2.1) O conhecimento da história é que possibilita o
conhecimento do mundo.
McNamara diz que é assim que ele se sente hoje, e expõe alguns dados atuais: há no mundo 7500 ogivas nucleares ofensivas, dessas, 2500 estão em alerta de 15 minutos
para ser lançadas pela decisão de um ser humano apenas.
Com isso temos:
TT6) Corremos grande risco de catástrofe;
e:
TM3) Deve-se evitar o uso de armas nucleares enquanto fazemos uso da razão.
Pois a falta de razão pode levar à destruição, e certos
indivíduos como Castro não se continham nem pelo medo
da morte (como na Crise dos Mísseis), o que contrasta,
a meu ver, com a ontologia hobbesiana, dado que seria o
medo da morte que, em último caso, faria o homem obe-
domina o indivíduo.
Para finalizar a discussão sobre essa lição tiramos uma
última tese:
TO6) As nações são objeto das relações internacionais.
Lesson #3: We are the most powerful nation in the world economically, politically and militarily - and we are likely to
remain so for decades ahead. But we are not omniscient.
If we cannot persuade other nations with similar interests
and similar values of the merits of our proposed use of that
power, we should not proceed unilateraly except in the
unlikely requirement to defend directly the continental U.S.,
Alaska and Hawaii.
Reconstruindo a lição de McNamara em forma de teses
temos:
TO7) Os EUA são a nação mais poderosa do mundo,
economicamente, politicamente e militarmente.
TO7.1) A condição exposta em TO7 se manterá por
décadas.
TO8) Os EUA não são oniscientes.
Sendo que as nações são conjuntos de indivíduos:
TO8.1) O ser humano não tem conhecimento completo do mundo.
Disso derivamos nossa próxima tese epistemológica:
TE3) O conhecimento do mundo é incompleto.
e:
TE4) O modelo de verdade é a incerteza.
Se a TO7 é uma constatação e a TO8 é uma preocupação que se opõe ao que é dito na TO7, o objeto da TO7 e
da TO8 são pertencentes a uma mesma categoria; o poder.
Uma vez que a TO8 trata do conhecimento, temos que:
TO9) A informação é uma esfera do poder.
Podermos dizer que informação ou conhecimento é
uma esfera do sot power, tendo como característica diferente da ideologia a função de
operacionalizar o poder miliOsEUAenviaramtropasaoVietnãporquetinhama
tar, o econômico e o ideológico.
Assim, não basta ter os antigos
convicçãodequefariamumaguerralibertáriaparaos
poderes para fazer o inimigo dovietnamitas.ComopensavamemtermosdeGuerraFria,os brar-se à sua vontade, é preciso o
norte-americanosnãoperceberamquesuaaçãoseriavista, conhecimento para tanto.
McNamara nos dá um exempelosvietnamitas,comoimperialista.
plo de fracasso quando de uma
ilusão de onisciência: os EUA
decer ao Leviatã. Não digo que uma teoria confronta outra, enviaram tropas ao Vietnã mesmo sem o apoio de qualjá que podemos pensar o indivíduo hobbesiano como um quer um dos aliados. Tinham a convicção de que fariam
modelo que descreve a maioria dos casos, mas para cada uma guerra libertária para os vietnamitas; isso se deu porontologia é preciso uma solução institucional distinta. que os EUA pensavam em termos da Guerra Fria e não
Dessa maneira, o medo não é um bom garantidor da busca percebiam que sua ação era vista pelos vietnamitas como
da paz. Então:
imperialista também.
TO5) O medo da morte não é sempre o sentimento que
Um caso de sucesso exposto por McNamara é o da
44
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Crise dos Mísseis. Nesse episódio houve uma confusão devido ao fato de a URSS enviar dois documentos de teores
distintos entre si. Um propunha um acordo e o segundo
era bem mais agressivo. McNamara diz ter recomendado
ao presidente Kennedy a responder o primeiro recado. Isto
foi feito e a crise foi solucionada.
Dessa forma, temos que, além da proporcionalidade, é
parte constituinte de uma tomada de escolha prudente a
sabedoria da limitação de nosso conhecimento. Isso nos
traz à memória nossa TE3, que diz ser incerto o conhecimento do mundo. Podemos então lançar mais duas teses
metodológicas:
TM4) O conhecimento incerto do mundo nos recomenda agir de forma prudente; em caso de uma crise isto significa evitar o conflito o máximo possível.
TM5) Deve-se tentar persuadir nações que compartilhem interesses e valores para a ação que envolva
poder.
TO10) Nações têm interesses.
TO11) Nações têm valores.
TM5) A guerra deve ser usada apenas como último recurso.
Lesson #4: Moral principles are oten ambiguous guides to
foreign policy and defence policy, but surely we can agree
what we should establish as a major goal of U.S. foreign
policy and, indeed, of foreign policies across the globe: the
avoidance in this century of the carnage – 160 million dead
– caused by conflict in the 20th century.
TE5) Princípios morais podem levar a ações diferentes.
TE6) Baseando-se em um critério objetivo (número de
mortos), pode-se chegar a um objetivo principal comum.
TT7) O objetivo principal comum para o século 21 é a
prevenção da carnificina (morte aos milhões).
TM6) A prevenção da carnificina é o primeiro passo
para a paz final.
Como já foi dito, para por em prática os métodos de
diminuição dos malefícios da guerra, é preciso que as nações adotem um princípio moral que serviria como uma
contenção interna ao uso desenfreado do poder, a saber,
o princípio moral da prudência. Isso faria com que a desigualdade de poder existente – de forma material – entre
as nações, fosse reduzida a uma igualdade de fato no uso
desse poder.
Lesson #5 We, the richest nation in the world, have failed in
our responsibility to our own poor and to the disavantaged
in the most fundamental terms of nutrition, literacy, health
and employment.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
TO 12) A pobreza e a desigualdade social são objeto
das relações internacionais.
TO 12.1) Questões sociais, econômicas e educacionais
são objeto das relações internacionais.
TM7) Certas condições sociais, e não apenas militares,
são necessárias para o equilíbrio de poder.
Lesson #6 Corporate executives must recognize there is no
contradiction between a sot heart and a hard head. Of
course, they have responsabilities to stockholders but they
also have responsabilities to their employees, their customers
and to society as a whole.
TO13) O capital privado é objeto das relações internacionais.
TM8) O capital privado deve contribuir para diminuir
as desigualdades sociais.
TM9) A igualdade social é mais um passo para a paz.
A TM9 funcionaria como uma solução externa para o
equilíbrio de poder, sobrepondo igualdade material com a
igualdade de uso do poder.
Lesson #7 President Kennedy believed a primary
responsability of a president – indeed the primary
responsability of a president – is to keep the nation out of
war, if at all possible.
TM10) O primeiro objetivo dos chefes de estado deve
ser evitar, se possível, que seus paises entrem em
guerra.
Vemos em TM10 o uso da prudência como uma solução interna de equilíbrio, o que mostra o Idealismo entrando no Realismo, ou seja, a concepção realista de relações
internacionais sendo modificada pela concepção idealista.
TM11) a guerra não é o primeiro recurso na solução de
problemas internacionais.
Todavia,
TM12) A guerra não é um recurso excluído.
Aqui vemos a junção das duas concepções: tem-se um
fim – a paz –, um recurso último – a guerra – e um moderador – o não uso imediato da guerra.
Retiraremos agora mais algumas teses dessa fala de
McNamara: “a responsabilidade da guerra é do presidente”.
TN2) Os chefes de estado são responsáveis pela entrada
em um conflito armado.
TO14) As nações têm sempre um chefe.
TO15) Um indivíduo é responsável por uma guerra.
Levando-se em conta TO2 e seus corolários e TO15,
temos:
TT7) A guerra pode ser iniciada racionalmente ou ir-
45
racionalmente.
McNamara, comentando o termo he Fog of War, afirma que a guerra é tão complicada que a capacidade humana não dá conta de todas suas variáveis, nosso julgamento e
nossa compreensão não as alcançam e, devido a isso, matamos gente desnecessariamente. Nós somos racionais, mas
a razão humana tem limites. Assim:
TE7) O conhecimento da guerra é incompleto.
Todavia, o estudo da guerra é um campo de trabalho
racional, temos então que:
TE8) O conhecimento da guerra é incerto, é probabilístico.
Concluindo a lição, vale observar outra fala de
McNamara em que recomenda desconfiarmos dos sentidos, pois corremos o risco de só ver o que queremos ver;
em uma atividade técnica, deixar de lado as crenças. O
exemplo dado é o de um soldado que pensou ter percebido
um ataque vietnamita no sonar de seu submarino, quando
na verdade tratava-se de animais marítimos. O erro, contudo, só foi compreendido depois que os EUA retaliaram
fortemente o Vietnam. O bombardeio ficou conhecido, aliás, como Rolling hunder. Disso retiramos:
TE9) Os sentidos são a fonte do conhecimento.
TE10) Os sentidos são influenciados pela razão.
Lesson #8 War is a blunt instrument by which to settle
disputes between or within nations, and economic sanctions
are rarely effective. herefore, we should build a system of
jurisprudence based on the International Court – that the
U.S. has refused to support – which would hold individuals
responsible for crimes against humanity.
TM13) A guerra é um instrumento grosseiro na solução de problemas.
É como cortar algo com uma faca cega, ao cortar causam-se danos colaterais indesejados ao produto (“a guerra
termina quando se passa por cidades e vilarejos semeando
morte e destruição, pois essa é a lógica da guerra”). Aos
olhos de McNamara essa é uma lógica inevitável, por isso a
guerra deve ser evitada, e, se existir, deve seguir os preceitos
da prudência e do sucesso para ser a mais justa possível.
TO16) A guerra causa muitos estragos.
Mas:
TM14) Sanções econômicas não são eficazes.
TM15) Deve-se melhorar a guerra.
Como?
TM16) Equilibrando seus poderes antagônicos.
Isso se torna possível regulando os atos pelo fator moral
da prudência – a proporcionalidade. A desproporcionalidade seria um crime contra a humanidade.
TM17) Punindo atos abusivos.
46
De que maneira?
TM18) Julgando os indivíduos em vez das nações.
Por meio de quê?
TM19) Por meio de uma corte internacional.
TO17) A humanidade é objeto das relações internacionais.
Lesson #9 If we are to deal with terrorists across the globe, we
must develop a sense of empathy – I don`t mean “sympathy”,
but rather “understanding” – to counter their attacks on us
and the Western World.
TM20) Deve haver negociação com terroristas.
Nesse caso:
TM21) Entender como o inimigo atua.
Para isso:
TM22) Colocar-se na perspectiva do inimigo para entender como ele pensa.
TE11) O pensamento humano pode ser compreendido.
TE12) A ação humana pode ser compreendida.
TE13) Conhecemos a ação humana por experiência de
pensamento.
Essa última tese propõe o método apriorístico, e provisório, do thought experiment ou Gedanken experiment.
Isso nos permitirá começar a conhecer o inimigo, procurar
saber o que deseja, abrindo-se a chance de negociação, em
vez da guerra diretamente.
TM23) O diálogo deve antecipar-se à guerra.
Lesson #10 One of the greatest dangers we face today is
the risk that terrorists will obtain access to weapons of
mass destrution as a result of the breakdown of the NonProliferation Regime. We in the U.S. are contributing to that
breakdown.
TO18) Terroristas são objeto das relações internacionais.
TM24) O tratado de não proliferação de armas nucleares – TNP – deve ser mantido.
Consideraçõesfinais
Este artigo procurou mostrar que o pensamento de
Robert S. McNamara a respeito das relações internacionais encaixa-se bastante bem com as proposições de Hans
Morgenthau a respeito do mesmo tema. A idéia principal
foi trabalhar as proposições dos dois teóricos numa perspectiva de alinhamento, isto é, em seqüência. Procurei
mostrar que há uma transferência teórica de problemas
entre as duas teorias, o que indicaria uma progressividade
no programa de pesquisa. A minha principal tese a esse
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
respeito é que McNamara fornece uma unidade de medida
para o preceito moral e o pragmático de Morgenthau, qual
seja, a vida humana – sua manutenção ou destruição.
Preciso dizer que um ponto falho nesse artigo é a falta
de uma discussão sobre o que seria o núcleo do programa
de pesquisa analisado, bem como o que seria sua heurística positiva. Esta é uma questão que exige ser enfrentada
uma vez que se queira prosseguir em uma análise usando o termo programa de pesquisa em sentido lakatosiano.
Pretendo empenhar-me em tal investigação em um artigo
posterior.
Também é necessário dizer que os trabalhos na área
de relações internacionais que procuram quantificações
- unidades de medida – pra fundamentar melhor metateoricamente suas análises, o fizeram em relação à medida
de poder. Esse parece ser o caso de Ray S. Cline em World
Power Assesment 1977: a Calculus of Strategic Drit. Dessa
forma, a medida proposta nesse artigo seria apenas
componente de um aspecto do poder, o militar, deixando
de lado outros campos importantes como o econômico
e as dimensões do sot power. Todavia, essa discrepância
com outras linhas de estudo não parece impedir que se
procure quantificar os pressupostos de Morgenthau – a
prudência e o sucesso.
Notas
McNamara, Robert S. “Ten Lessons”. In Morris, Errol.
(diretor), Fog Of War – Eleven Lessons from the Life of Robert S.
McNamara, 2003.
1
Chiappin, José R.N., “Racionalidade, Decisão, Solução de
Problemas e o Programa Racionalista”. Ciência & Filosofia, no 5,
155-210, São Paulo, 1996.
2
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Chiappin, José R.N. “Os fundamentos teóricos do programa
do realismo em política internacional: a concepção de
Morgenthau e a política de poder”. Carta Internacional,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.
3
47
DeHavanaaDoha:osistema
multilateraldecomércioem
perspectivahistórica
IvanTiagoMachadoOliveira
U
ma análise ponderada, e que pretenda ser
bem-feita, dos acontecimentos contemporâneos exige o conhecimento dos processos históricos que formaram o caminho
seguido até o presente. Isto é, ao analisarmos o comportamento dos agentes ao longo dos anos precedentes, a história da interação, os argumentos a serem
utilizados acerca do cenário atual ganham maior embasamento e consistência analítica. Assim, realizaremos, nesta
seção, uma avaliação do processo evolutivo ocorrido no
sistema multilateral de comércio (SMC), desde o imediato
pós-Segunda Guerra até a criação da OMC, identificando
as interações entre as transformações históricas mundiais
tanto no plano político quanto econômico e a estruturação
do sistema multilateral.
As primeiras iniciativas relativas ao re-ordenamento da
economia mundial no após guerra tomaram lugar mesmo
antes do fim do conflito. Em agosto de 1941, o presidente dos EUA, Roosevelt, e o primeiro-ministro britânico,
Winston Churchill, assinaram a Carta do Atlântico, “documento fundador” dos princípios que viriam a nortear a
reconstrução da ordem internacional na segunda metade
do século XX e ao qual o Brasil aderiria no início de 1943.
Ivan Tiago Machado Oliveira é pesquisador do Laboratório
de Análise Política Mundial (LABMUNDO) da Faculdade
de Administração da UFBA. Foi membro do Núcleo de
Estudos Conjunturais da FCE/UFBA na área de economia
internacional.
48
Entrementes, a estruturação do novo sistema econômico mundial só viria a começar a tomar forma a partir da
Conferência de Bretton Woods, em 1944.
Em Bretton Woods, foram criados o Fundo Monetário
Internacional (FMI), que viria a funcionar como provedor
de liquidez internacional e atenuador de crises das contas
externas dos países associados, e o Banco Internacional
para a Reconstrução e o Desenvolvimento (BIRD), que,
como o próprio nome já indica, foi encarregado de financiar a reconstrução e o desenvolvimento econômico pelo
mundo, principalmente das economias européias destruídas durante a Segunda Guerra Mundial. Em relação ao
comércio internacional, apesar de se ter ratificado a necessidade da construção de um sistema multilateral de livrecomércio para o conserto do sistema econômico mundial
no pós-guerra, não houve condições de se tratar do assunto durante a Conferência. Deste modo, ficou acertado que
uma reunião especial deveria ser convocada nos anos seguintes para tratar do tema, como de fato ocorreu.
A construção da ordem liberal pretendida no imediato pós-guerra trazia consigo um ar otimista relativamente
às construções institucionais da época. Não foi diferente
com a pretensão de se criar uma organização voltada para
o comércio internacional. A proposta norte-americana de
realizar uma reunião especial para negociações acerca da
criação de tal organização foi colocada em prática e, sob
os auspícios da recém criada ONU, aconteceu, em Londres
(em outubro de 1946), a primeira reunião da Comissão
preparatória à Conferência sobre Comércio e Emprego
das Nações Unidas, na qual seriam estabelecidos os fundaCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
mentos organizativos de uma Organização Internacional
do Comércio (OIC).
Entre abril e novembro de 1947, ocorreu, em Genebra,
a segunda reunião da Comissão preparatória para a
Conferência de Havana. Nesse encontro, ainda num ambiente de crença e expectativas positivas em relação à criação da OIC num futuro próximo, vinte e três países (dentre
eles três latino-americanos: Brasil, Chile e Cuba) assinaram
o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), destinado a ser incorporado à Carta constitutiva da OIC. Ocorreu,
então, a primeira rodada de negociações multilaterais para
a redução de barreiras tarifárias. Ademais, foram definidos
os princípios básicos do Sistema Multilateral de Comércio
contemporâneo e acertada a adoção temporária do GATT,
que entraria em vigor a partir de janeiro de 1948, até que
brasileira, pautada em visões multilateralistas defendidas
pelos EUA, apresentava reservas relativamente ao tema.
Voltando à Carta de Havana e sua ratificação pelos
países signatários, vale mencionar que, como levantado
por Paulo Roberto de Almeida (2004, p. 114), “a Carta da
OIC incluía tantas exceções, lacunas e ambigüidades deliberadas que mesmo seus partidários mostravam muito
pouco entusiasmo por ela – apenas dois países chegaram
a ratificá-la: a Austrália de forma condicional e a Libéria
incondicionalmente”. No entanto, o relativo desânimo acima relatado veio sendo “construído”, não apenas baseado
em eventuais problemas de origem da Carta, mas também
a partir de dois aspectos importantes, complementares e
inter-relacionados, que tomavam contornos distintos no
final da década de 1940 comparativamente àqueles percebidos no período logo posterior à
guerra, quais sejam: 1) a mudança
Anão-ratificaçãodaCartadeHavanapelosEUAfoio
no contexto geopolítico mundial. O
decretodemortedanascenteOIC.Anaçãoqueliderava inicial convívio pacífico e respeitoso
omundoocidentalpreferiunãolevaradiantesuaprópria entre a URSS e os EUA no imediato
pós-guerra havia se tornado tenso
propostadecriaçãodeumaverdadeirainstituiçãopara
alguns anos após, a Guerra Fria degerirocomérciointernacional.
sabrochava; e 2) o Congresso norte-americano, autoridade maior da
a OIC fosse discutida e aprovada pelas partes contratan- política comercial externa dos EUA, se mostrava cada vez
tes. O GATT teria um secretariado – chamado oficial- menos desejoso em abrir mão de determinados controles
mente de Interim Commission for the International Trade sobre a política comercial e tarifária dos EUA, o que podeOrganization (Icito), com vinculação, ainda que apenas ria vir a acontecer com a ocasional criação da OIC.
formal, à ONU – atuando em Genebra no sentido de servir
O “resumo da ópera” relativo à Carta de Havana, juscomo fórum para negociações de acordos específicos que tamente na confluência das tendências acima abordadas,
almejassem a redução de tarifas alfandegárias e outras bar- pode ser feito a partir da decisão do Congresso dos EUA de
reiras ao comércio internacional.
não ratificar a Carta. Na realidade, com o aumento dos focos
Durante as negociações da Conferência sobre Comércio de tensão internacional, os assuntos relativos à segurança
e Emprego das Nações Unidas, que veio a acontecer entre internacional, políticas estratégicas como o próprio Plano
novembro de 1947 e março de 1948 em Havana, mais de Marshall, passaram a ter maior relevância no Congresso
cinqüenta países acordaram acerca da Carta de Havana, dos EUA comparativamente a temas predominantemente
documento oficial que criava a OIC enquanto instituição econômico-comerciais, como a Carta da OIC, com interesresponsável pelo comércio internacional. Tendo a Carta ses focados numa temporalidade mais estendida.
sido aprovada pelos participantes da Conferência, a consA não-ratificação da Carta da Havana pelos EUA foi o
tituição efetiva da OIC ficou dependendo apenas da ratifi- decreto de morte da nascente OIC. A nação que liderava
cação do documento pelos países signatários segundo suas o mundo ocidental em sua reconstrução no pós-guerra
normas internas.
achou por bem não levar adiante sua própria proposta de
Algo digno de nota sobre a Conferência de Havana diz criação de uma verdadeira instituição para gerir o comérrespeito à visão que os países mais pobres tinham acerca das cio entre as diversas nações do globo.
negociações e resultados da mesma. Em geral, acreditavam
Nesse contexto, o GATT, pensado inicialmente enquanque o tom desenvolvimentista presente na Conferência (o to instrumento temporário e que não demandava ratificapróprio nome traz algo nesse sentido) pudesse fornecer ção congressual pelo fato ser um acordo executivo, entra
instrumentos factíveis de auxílio àqueles países que esbo- em cena de forma permanente e irá servir como uma quaçavam uma saída em direção ao “paraíso” do mundo desen- se-instituição internacional organizadora do SMC contemvolvido, industrializado. Não obstante tal fato, alguns tons porâneo por mais de quatro décadas. Como abordado por
destoantes eram ouvidos entre as vozes “subdesenvolvidas”. Sato (2001, p. 5):
Vários países latino-americanos deram apoio, por exemPode-se dizer que o GATT foi, de um lado, a forma
plo, a propostas que colocavam a constituição de zonas de
contratual possível dentro do quadro das dificuldades
preferências comerciais como mecanismo legal dentro do
econômicas e limitações institucionais do pós-guerra
documento final da Conferência. Entrementes, a posição
e, de outro, o arranjo que melhor se adequava à econoCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
49
mia política internacional que se configurou na esteira
da Segunda Guerra Mundial.
Valls (1997, p. 3) afirma que o Acordo Geral “emergiu
de negociações que visavam remover barreiras ao comércio e não de negociações que tivessem por objetivo o estabelecimento de regras gerais de comportamento das relações comerciais entre os países”. Sendo assim, não obstante
a existência de um tímido sistema de enforcement (panels)
desde o Acordo de 1947, reformado parcialmente em 1952,
o SMC, sob os auspícios do GATT, não tinha poder disciplinatório efetivo sobre as partes contratantes. Tal aspecto
acabava por trazer algum grau de incerteza e arbitrariedade das potências, principalmente dos EUA, para as trocas
internacionais.
No GATT, em seu Artigo I, está a cláusula da nação mais
favorecida (NMF) na qual a idéia da não-discriminação é
ratificada, ficando também garantida a multilateralização
do processo negociador. A cláusula da reciprocidade é vista
como estímulo importante para as negociações, uma vez
que os países tendem a não realizar movimentos unilaterais de liberalização comercial, mas sim a fazerem uso de
uma concepção mercantilista do comércio para a condução do processo negociador da abertura comercial. Além
disso, a proibição de restrições quantitativas e o princípio
do tratamento nacional, no qual os produtos importados
devem ter o mesmo tratamento que seus similares nacionais, se apresentam como princípios complementares de
suporte do SMC.
Desde o início, com o processo de entrada do Benelux
e, posteriormente, quando da criação da Comunidade
Européia em 1957, o princípio da NMF foi desrespeitado.
Porém, tais acontecimentos ocorreram dentro da legalidade presente na cláusula de escape do Artigo XXIV, que
trata da criação de zonas de livre comércio e uniões aduaneiras, como já apresentado no presente trabalho. Assim,
práticas que iam de encontro aos pilares fundamentais gattianos se tornaram aceitáveis segundo parâmetros específicos. No Artigo XII, por exemplo, os países podem fazer uso
de medidas temporárias que restrinjam as importações
devido a problemas em seus Balanços de Pagamentos. No
Artigo XVIII, admite-se o uso de instrumentos de assistência governamental para promover o desenvolvimento
econômico, como no caso de indústrias nascentes, por países em desenvolvimento, condicionado à aprovação pelas
demais partes contratantes. Já no Artigo XIX (Cláusula de
Salvaguarda), restrições ao comércio podem ser impostas,
segundo regulamento, caso as concessões negociadas no
GATT impliquem em aumentos inesperados e danosos à
indústria nacional.
Observamos, pois, que as condições de excepcionalidade aos princípios fundadores do GATT foram criadas
no sentido de adaptar as normas à realidade das condições
econômicas e políticas. Esse aspecto, como bem apresentado por Seitenfus (2005, p. 212), advém do duplo caráter do
Acordo Geral enquanto organização responsável pelo trato
do comércio entre as nações:
O GATT deve ser considerado como sendo uma organização internacional especial na medida em que possui duas faces distintas: por um lado, trata-se de um
rol de normas procedimentais sobre as relações comerciais entre os Estados-Partes. Estas atividades são
de cunho jurídico, pois dizem respeito à elaboração,
prática e controle de regras de direito material. Por
outro, trata-se de um fórum de negociação comercial
onde, através de instrumentos próprios a diplomacia
parlamentar, de natureza comercial, procura-se aproximar posições entre os Estados-Partes. Essa face é de
natureza essencialmente política.
Uma rápida avaliação do histórico do sistema multilateral sob os auspícios do GATT nos trará alguns elemen-
Quadro1
AsrodadasdenegociaçõescomerciaisdoGATT
Ano
Local(nome)
Assuntoscobertos
Países
1947
1949
1951
1956
1960-1961
1964-1967
1973-1979
Genebra
Annecy
Torquay
Genebra
Genebra(RodadaDillon)
Genebra(RodadaKennedy)
Genebra(RodadaTóquio)
1986-1994
Genebra(RodadaUruguai)
Tarifas
Tarifas
Tarifas
Tarifas
Tarifas
Tarifasemedidasantidumping
Tarifas,medidasnão-tarifáriaseacordosjurídicos
Tarifas,medidasnão-tarifárias,normas,serviços,propriedade
intelectual,têxteis,agricultura,soluçãodecontrovérsias,
criaçãodaOMC
23
13
38
26
26
62
102
123
Fonte:OMC.
50
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
tos comprobatórios de que o lançamento periódico de rodadas de negociação fundamenta-se na crença de que as
mesmas são importante mecanismo para a criação de um
ambiente mais propício ao debate político-diplomático,
tendendo a ser observada uma melhora apreciável na facilitação do processo político de construção de regras para o
comércio internacional no GATT. Ocorreram oito rodadas
de negociações no âmbito do GATT. Nessas rodadas tanto as reformas do próprio GATT quanto os processos de
mudança nas barreiras comerciais das partes contratantes
eram discutidos.
De 1947 a 1956, as negociações multilaterais se desenrolaram de forma relativamente positiva, ocorrendo,
contudo, certa “lentidão progressiva” em relação à liberalização comercial negociada durante as rodadas do GATT.
Cabe lembrar que, em 1956, em Genebra, foi realizada uma
mundial, trazendo conseqüências importantes sobre o ordenamento do sistema de comércio internacional. A perda
relativa de hegemonia econômica dos EUA para o Japão e
a Europa veio a se juntar a alguns outros fatores, como o
fim do padrão dólar-ouro e do câmbio fixo e os aumentos
importantes nos preços internacionais do petróleo, na conformação de um ambiente internacional novo.
Nesse contexto, tornou-se freqüente o uso de novos
mecanismos de proteção comercial destinados àquelas
indústrias nacionais com menor competitividade internacional por partes dos países desenvolvidos, principalmente
os EUA. Tais mecanismos eram fundamentados em barreiras não-tarifárias que visavam à redução quantitativa de
importações, como restrições voluntárias de exportações,
anti-dumping, direitos compensatórios, salvaguardas, etc.
Com a onda neo-protecionista aflorada, os EUA passaram
a adotar novas estratégias de neno GATT, podendo-se
AsnegociaçõesnoGATTtratavambasicamentederedução gociação
observar tal fato de forma mais
debarreirastarifáriasparaprodutosindustrializados.
visível a partir da Rodada Tóquio
SomentenaRodadaUruguaiseriamincluídostemascomo de negociações multilaterais do
GATT. Dias (1996) apresenta, de
agricultura,têxteiseserviços.
forma sucinta, esse novo comportamento da potência econô“reforma” do SMC, necessária em virtude da não-imple- mica do mundo capitalista relativamente às negociações
mentação da OIC, criando um protocolo de emenda ao comerciais, indicando a mudança em dois importantes
Preâmbulo e às Partes II e III do GATT.
conceitos negociadores. A autora afirma que:
A Rodada Dillon (nome do Secretário do Comércio dos
A partir da Rodada Tóquio (1973-1979), os Estados
EUA de então) teve como principal motivação, segundo
Unidos começaram a utilizar dois novos conceitos
Rêgo (1996, p.07), a criação da Comunidade Econômica
negociadores, cujo significado foi explicitado ao lonEuropéia (CEE) através do Tratado de Roma de 1957 e os
go dos últimos anos, tornando-se, com o tempo, mais
impactos de sua política comercial comum sobre as deevidente a sua contradição com o contexto de liberalimais partes contratantes do GATT. Vale notar que as nezação do comércio. Primeiro, a noção de livre comérgociações no GATT tinham foco primordial, e quase que
cio foi substituída pela de comércio “eqüitativo” (fair
exclusivo, na redução de barreiras tarifárias para produtrade), e a noção de reciprocidade efetiva no acesso a
tos industrializados. Tal fato será observado até a Rodada
mercados, em termos de resultados, substituiu a reciUruguai, quando novos (e antigos, mas pendentes) temas,
procidade anterior, associada à igualdade de oportucomo produtos agrícolas, têxteis e serviços, serão inseridos
nidades. (Dias, 1996, p. 61)
na agenda negociadora.
Esses novos conceitos se afastam de vez da idéia de libeDurante a Rodada Kennedy (1964-1967), o SMC passou por mudanças significativas, iniciando uma nova etapa ralismo administrado, qualificação do marco institucional
de sua existência. Tais transformações estão fundamenta- do comércio internacional vislumbrado no GATT através
das tanto na organização dos países em desenvolvimento da cláusula da NMF e da reciprocidade anterior, aproxino G-77 e na UNCTAD, dando aos mesmos um papel mais mando-se assim da idéia de comércio administrado, conativo na construção da ordem econômico-comercial de ceito esse ligado a uma visão na qual os governos atuam
então, quanto no começo de outras modificações no SMC, internacionalmente no sentido de dividir mercados entre
que incluem a ampliação progressiva dos temas relaciona- suas empresas de forma mutuamente satisfatória.
Tais mudanças de posicionamento dos EUA trouxeram
dos ao comércio internacional tratados pelo GATT, como
consigo
um potencial de conflito de interesses mais signianti-dumping e comércio de produtos agrícolas, que viriam
a ser negociados paulatinamente em rodadas posteriores. ficativo dentro do GATT. Como aborda Abreu (1998): “In
Ademais, na Rodada Kennedy, observou-se a continuação the Tokyo Round (1973-1979) there was for the first time
do aprofundamento das concessões tarifárias sobre produ- a clear clash between the more advanced developing countos industrializados, com participação crescente de países. tries such as Brazil and the United States, seeking reciprocAs décadas de 1970 e 1980 foram marcadas por ity in terms of concrete concessions” (Abreu, 1998, p. 6).
O fruto mais importante gerado na Rodada Tóquio
modificações substanciais no quadro político-econômico
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
51
foi, provavelmente, a reforma do GATT com a incorporação efetiva de um tratamento diferenciado e mais favorável para países em desenvolvimento através da Enabling
Clause (Cláusula de Habilitação). Entretanto, os resultados
efetivos da Rodada em relação às barreiras não-tarifárias
foram pífios. Segundo Rego (1994, p. 8), o relativo fracasso de tais negociações em relação a questões não-tarifárias
deveu-se a dois fatores: “o sucesso das negociações quanto
à redução das tarifas para níveis baixos e as recessões econômicas dos anos 70 e início dos anos 80 (desencadeadas,
em parte, pelos dois choques de petróleo)”.
Embora os EUA tenham tentado, já em 1982, dar início
a uma nova rodada de negociações no GATT, buscando
internacional. Fechava-se, assim, uma lacuna nunca muito bem preenchida na ordem internacional do pós-guerra, quando a OIC não entrou em funcionamento. Sobre os
resultados finais da Rodada Uruguai, Lampreia (1995, p.
247) afirma:
O conjunto de textos de instrumentos legais negociados
desde o lançamento da Rodada, em setembro de 1986,
apresenta-se na Ata Final sob a forma de anexos ao Acordo
que cria a Organização Mundial de Comércio (WTO), que
não fora prevista em Punta del Este, mas cuja constituição
foi julgada necessária para fins de abrigar, dentro de uma
única moldura institucional: o Acordo Geral sobre Tarifas
e Comércio, tal como modificado pela Rodada Uruguai
(Gatt); todos os acordos e arranjos
concluídos desde 1947 sob os ausOregionalismonãoéummovimentoatual.OBeneluxfoi
pícios do mesmo Gatt; e os resultacriadoem1947,aComunidadeEuropéiafoicriadaem
dos completos da recém-concluída
1957ediversosmecanismosdeintegraçãoregionalforam Rodada.
criadosporpaísesemdesenvolvimentonosanos60.Mas
adécadade90viuumaexpansãogigantescadestetipode
acordocomercial.
tratar dos temas mal-resolvidos na rodada anterior, o consenso necessário para o lançamento de uma nova rodada
de negociações no GATT só foi alcançado na Reunião
Ministerial de Punta del Este, no Uruguai, em setembro de
1986. Ficou, então, acordado que tanto temas pendentes
(como agricultura, têxteis, subsídios) quanto novos temas
(como serviços, propriedade intelectual, investimentos)
seriam negociados. Contudo, as negociações de bens e
serviços seriam realizadas de forma separada, atendendo
a demandas do G-10 e alguns outros países em desenvolvimento1. O mandato negociador da Rodada Uruguai se
comprometia em realizar a mais ampla e complexa negociação multilateral da história. A previsão inicial era a de
que a rodada duraria quatro anos, porém, a complexidade
das negociações fez com que os trabalhos da rodada durassem praticamente o dobro.
Depois de idas e vindas, as negociações da Rodada
Uruguai foram finalmente concluídas em dezembro de
1993 em Genebra. Permaneceram, contudo, em aberto
algumas questões mais controversas para as quais não se
conseguiu consenso, como aquelas relativas ao comércio
de produtos audiovisuais, à abertura do setor financeiro, a
cláusulas sociais e ambientais, tendo as partes contratantes
assumido o compromisso de continuar as discussões a respeito nos anos seguintes.
Em abril de 1994 os representantes das partes contratantes do GATT assinam a Ata Final da Rodada Uruguai, em
Marraqueche. Provavelmente, a principal novidade trazida
pela Ata foi a criação em bases concretas da Organização
Mundial do Comércio (OMC), primeira instituição, de fato,
responsável pelo trato das questões relativas ao comércio
52
Quase cinqüenta anos depois
da tentativa de criação da natimorta OIC, o mundo comercial
construía as bases, pela via multilateral, para a edificação de uma
“nova” ordem comercial internacional, fundamentada no
direito e com mecanismos que davam caráter impositivo
às decisões tomadas multilateralmente. Embora seja possível que se faça uma relativização do poder efetivo da OMC
enquanto marco jurídico internacional, é inegável a importância do papel que tal instituição veio a desempenhar,
desde a sua criação, num cenário internacional marcado
pelo incremento substancial das trocas comerciais.
AOMCnummundointerdependente.
Antes de realizarmos uma análise das modificações
ocorridas no SMC com a entrada em cena da OMC, assim
como de sua trajetória durante a última década do século XX, é interessante que façamos uma avaliação honesta,
ainda que relativamente rápida e superficial, dos impactos
que o processo de liberalização comercial pela via multilateral ajudou a gerar sobre os fluxos mundiais de comércio,
auxiliando, deste modo, o crescimento da economia mundial.
O Gráfico 1 mostra claramente a trajetória de crescimento do comércio e produção mundiais de bens.
Tomando o ano de 1950 como ano-base, observaremos
que o crescimento do volume das exportações mundiais de
bens tenderá a manter um crescimento maior do que aquele ocorrido no volume da produção mundial de bens. Tal
diferença entre o crescimento do comércio e a produção
mundial começou a se tornar mais evidente nas décadas
de 1970 e 1980. Contudo, é a partir da década de 1990 que
a diferença entre o crescimento observado no comércio de
bens e aquele da produção dos mesmos será alargada de
forma significativa.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
O que explica tais estatísticas? Acreditamos que um
conjunto de fatores complementares deva ser levado em
conta, dentre eles o papel desempenhado pelo GATT
na retirada dos gravames ao comércio internacional.
Logicamente, as políticas de recuperação econômica do
pós-guerra, de cunho fundamentalmente keynesiano, tiveram importante impacto na geração de renda e comércio
no mundo. Entretanto, vale a pena lembrar que a queda
progressiva das barreiras aos produtos industrializados negociada multilateralmente acabou ampliando as áreas de
contato econômico-comercial entre as nações do mundo,
principalmente, num primeiro momento, entre a Europa
e os EUA2.
Ademais, principalmente na década de 1990, quando os
efeitos da Rodada Uruguai começam a ser sentidos, as iniciativas minilateralistas (tanto bilaterais quanto regionais)
de realização de acordos visando à liberalização do comércio internacional seguidas por diversos países (dentre
eles os EUA) vieram a auxiliar no vigoroso incremento das
trocas internacionais. O que o Gráfico 1 deixa claro é que
uma parte cada vez mais significativa do produto mundial
passou a ser gerado pelas exportações, denotando com evidência o aumento da interdependência econômico-comercial no mundo.
Em falando de regionalismo, é importante relembrar
que tais acordo minilateralistas sempre foram identificados
como sendo um desafio ao SMC. Para uns, o regionalismo
poderia vir a ferir a tendência globalizante do capitalismo, observada de forma mais clara no momento atual, e
a descaracterizar o processo multilateral de liberalização
comercial. Para outros, o regionalismo é visto como auxiliar no processo de abertura comercial no mundo. De toda
forma, como ressalta Paulo Roberto de Almeida (2005, p.
3), é fato que:
A construção normativa do sistema multilateral de comércio registrou, de certo modo, uma evolução paradoxal. De
um lado, houve o reforço dos princípios tradicionais de nação-mais favorecida, de tratamento nacional, de reciprocidade, de transparência e de igualdade de direitos e de obrigações, este último temperado parcialmente pelo tratamento diferencial e mais favorável para as partes contratantes
menos desenvolvidas. De outro, ocorreu o aprofundamento
e a disseminação dos esquemas minilateralistas e dos arranjos geograficamente restritos, ofendendo a primeira dessas
cláusulas, a de NMF.
É claro que o regionalismo não é, fundamentalmente, um movimento atual. O próprio Benelux, criado em
1947, e a Comunidade Européia, em 1957, além de diversos mecanismos de integração regional criados por países
Gráfico1
Crescimentodovolumedaproduçãoeexportaçãomundialde
bens,1950-2004
2700
2400
2100
1800
1500
1200
900
600
300
0
1950
1955
1960
1965
1970
1975
1980
1985
1990
1995
2000
Crescimentodaexportaçãomundialdebens(1950=100)
Crescimentodaproduçãomundialdebens(1950=100)
Fonte:OMC.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
53
ser mais rule-oriented, dando maior efetividade e legitimidade ao SMC. Uma outra importante inovação ocorrida no
SMC, no pós-Rodada Uruguai, foi a criação do Órgão de
Exame de Políticas Comerciais, através do qual são feitas
análises acerca das políticas comerciais dos países membros, servindo como mecanismo de vigilância quanto aos
cumprimentos dos compromissos
Omaiorpoderefetivodosistemaderesoluçãodeconflitos assumidos.
No entanto, vale frisar que,
existentenaOMC,fundamentadonodireitointernacional, mesmo com um sistema de solução de controvérsias mais eficaz
éamaiordistinçãoentreestaorganizaçãoeo“velho”
e poderoso, por vezes será obsersistemaGATT.
vado que principalmente as grandes potências terão algum espaço,
3
assinados entre os anos 1991 e 2001. Assim, como con- mesmo que “ilegal”, para o uso de seus “estoques de poder”
clui Paulo Roberto de Almeida (2005, p. 12) ao falar dos no descumprimento de compromissos assumidos multilaacordos regionais de comércio disseminados por toda a teralmente, o que mostra a complexidade da interação enAmérica (a exemplo do NAFTA, Mercosul, CAN, etc.):
tre as nações quando estas tentam construir regras gerais
e objetivas para gerir suas trocas materiais. Sobre este fato,
Esses exemplos americanos, ao lado da estratégia assistenLima (2004, p. 36) afirma:
em desenvolvimento na década de 1960, atestam tal fato.
Contudo, a última década do século passado será marcada
pela expansão gigantesca desse tipo de acordo comercial
entre nações. Segundo dados da OMC, apresentados por
Oatley (2003, p. 22), existiam em vigor, em 2001, cerca de
134 acordos regionais de comércio. Desse total, 90 foram
cialista desenvolvida pela UE em direção da clientela periférica dos países de menor desenvolvimento relativo – os
PMDRs, do chamado grupo ACP -, configuram, portanto,
a confirmação cabal de que o multilateralismo atual tem
de conviver com um regionalismo disforme, oportunista
e basicamente disfuncional em relação aos princípios do
sistema econômico multilateral definido no imediato pósSegunda Guerra. Provavelmente ele terá de enfrentar uma
longa travessia do deserto antes de reencontrar terreno
mais favorável para seu florescimento e expansão.
É nesse contexto que entra em atividade, em 1995, a
Organização Mundial do Comércio (OMC), institucionalizando a regulação comercial mundial. A OMC tem como
princípios basilares aqueles mesmo que davam suporte ao
“velho” SMC sob os auspícios do GATT 47, quais sejam:
não-discriminação (Cláusula da NMF), reciprocidade e
tratamento nacional. Além disso, o quadro legal que sustenta o SGP, a discriminação positiva relativamente aos países em desenvolvimento foi herdado e mantido no “novo”
sistema.
Dentre as funções capitais da OMC, está a de ser o organismo administrador tanto de acordos multilaterais, como
o GATT 94, GATS, TRIPS, quanto dos plurilaterais, relacionados ao comércio de aeronaves civis, compras governamentais, comércio e produtos lácteos e de carne bovina.
Ademais, a Organização serve como um fórum permanente para negociações multilaterais internacionais e também
como organismo imbuído de capacidade jurídica para a
resolução de desavenças comerciais entre seus membros,
através do Órgão de Solução de Controvérsias. É justamente o maior poder efetivo, fundamentado no direito internacional, do sistema de resolução de conflitos existente na
OMC que se coloca como ponto fundamental de distinção
relativamente ao “velho” sistema GATT. Tal aspecto traz
consigo a conformação de um sistema caracterizado por
54
Os países não se desfazem da sua autonomia voluntariamente e as regras que compõem o sistema raramente são
auto-executáveis. Em vez de criar uma lei para controlar o
comportamento dos Estados, as instituições internacionais
servem para estabelecer expectativas a respeito do comportamento de outras nações.
A OMC tem, no topo da estrutura funcional, a
Conferência Ministerial, onde os representantes de todos
os seus membros se reúnem pelo menos uma vez a cada
dois anos, podendo deliberar sobre qualquer assunto relacionado aos acordos multilaterais de comércio. No intervalo das reuniões ministeriais, os trabalhos da OMC são
realizados por diversos órgãos, sendo o principal deles o
Conselho Geral, ao qual estão subordinados o Conselho
para Comércio de Mercadorias, o Conselho para Direitos
de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio
e o Conselho para Comércio de Serviços4. Aos últimos, por
sua vez, ficam subordinados numerosos outros grupos de
trabalho e comitês. Ademais, existem outros quatro comitês responsáveis por assuntos relacionados com as temáticas comércio e meio ambiente, comércio e desenvolvimento, restrições de balanço de pagamentos e administração e
orçamento da OMC.
Na primeira reunião ministerial da OMC, realizada em
Cingapura em 1996, foram iniciadas negociações sobre novos temas dentro da agenda da Organização como comércio e investimento, comércio e competição, transparência
nas compras governamentais e facilitação de comércio, seguindo o que fora acordado ao fim da Rodada Uruguai. Já
nessa reunião, por iniciativa liderada pela UE, foi proposto
o lançamento de uma nova rodada de negociações multilaterais que tivesse como foco os temas acima referidos.
Entretanto, a oposição consistente de diversos países em
desenvolvimento, dentre eles o Brasil, fez com que tal proCARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
posta fosse adiada. Ademais, os países em desenvolvimento
levaram a cabo um conjunto de proposições que visavam a
tentar resolver os muitos problemas que ainda persistiam
relativamente à implementação do acordado na Rodada
Uruguai, principalmente naqueles setores que mais lhe
eram benéficos, como o agrícola e o têxtil. Vale também
lembrar que os temas ligados a questões sociais e ambientais, que deveriam ser discutidos na reunião, acabaram por
ganhar atenção marginal, sem resolução aparente no curto
prazo. É fato que existe uma enorme resistência, principalemente por grande parte dos países em desenvolvimento, de se incorporar normas no SMC relativas a questões
sociais e ambientais, tendo por base a idéia de que alguns
dos fatores geradores de suas vantagens comparativas poderiam ser contestados em benefício de uma minoria nos
países desenvolvidos.
Reunidos em Seattle, nos EUA, em 1999, os Ministros
dos países membros da OMC tentaram pavimentar o caminho para o lançamento da então chamada Rodada do
Milênio. Contudo, por fatores diversos, surgiram impasses
e a reunião resultou num retumbante fracasso. Como elementos capitais na geração de tal fracasso, podemos destacar a falta de efetiva motivação política e de consenso entre
os atores internacionais mais poderosos quando à agenda
a ser negociada. Por um lado, os EUA tentavam avançar na
abertura do setor de serviços, movimento iniciado na década de 1980 onde se observa a liberalização dos serviços
como mecanismo a ser usado na tentativa de melhora das
contas externas do país. Já os japoneses e europeus, sabendo que uma nova rodada puxaria necessariamente o tema
agrícola para o centro das discussões, queriam ampliar as
negociações na área de investimentos e concorrência, temas que lhes eram mais convenientes. 5
Cabe aqui apresentar, de forma sucinta, algumas modificações ocorridas na posição da diplomacia econômica brasileira no decorrer da década de 1990 relativamente
ção pela via multilateral.
É importante lembrar que muitos países em desenvolvimento continuam a manifestar freqüente descontentamento com as mudanças só marginais nas normas internacionais de comércio relativamente aos setores onde
possuem maior competitividade, desde o GATT-1947 até
a atualidade. Mesmo existindo um arcabouço de medidas
que busca dar maior proteção aos países em desenvolvimento dentro da OMC, a insatisfação fica clara e fundamentada quando os principais produtos exportados pelos
mesmos encontram significativas barreiras de entrada nos
mais diversos mercados mundiais, sejam elas ligadas a ‘picos’ e escalonamentos tarifários ou a quotas, barreiras fitosanitárias, etc.
Para alguns, como Gonçalves (2003a), a falta de democracia no sistema multilateral de comércio leva à elaboração de agendas que interessam aos países desenvolvidos.
Assim, muitos vêem a OMC como uma instituição usada
pelos países fortes como instrumento de política externa.
Destarte, os países em desenvolvimento vêm apresentando
especial interesse em modificar, no âmbito da OMC, normas e fundamentos das negociações, tendo em vista um
maior foco no desenvolvimento, voltando aos fundamentos da Carta de Havana, pensada há quase cinqüenta anos
atrás.
Tentando conciliar os interesses de países em desenvolvimento (Grupo de Cairns, dentre outros) com aqueles
dos países desenvolvidos (EUA, UE e Japão), ocorre em
Doha, no Catar, a quarta reunião ministerial da OMC. É
importante lembrar que os trabalhos político-diplomáticos em Doha, em novembro de 2001, ocorreram numa
conjuntura em que os traumas dos ataques terroristas aos
EUA estavam muito presentes e a economia mundial não
andava muito bem, existindo grande incerteza acerca do
seu desempenho futuro. Destarte, o mundo pressionava
pela emissão de sinais positivos pela OMC, tendo em vista
que um novo fracasso nas negociações em Doha poderia
Grandepartedospaísesemdesenvolvimentoresistemà
trazer mais trevas ao cenário
incorporaçãoaoSMCdenormasrelativasaquestõessociais
mundial, já bastante negaeambientais,poistememquealgunsdosfatoresgeradores
tivo. Ao final do encontro,
a Declaração Ministerial de
desuasvantagenscomparativaspossamsercontestadosem
Doha lançou um documenbenefíciodeumaminorianospaísesdesenvolvidos.
to repleto de “ambigüidades
construtivas” que colocavam
ao SMC. As próprias transformações da economia com a a questão das concessões às preocupações dos países em
abertura comercial iniciada no início dos anos 1990 atua- desenvolvimento como ponto primordial a ser discutido.
ram sobre o posicionamento do país frente às negociações Estava lançada a nova rodada de negociações multilaterais
internacionais. A diplomacia toma um tom mais liberal, da OMC: a Rodada do Desenvolvimento.
não deixando de ter, pelo menos retoricamente, o objetivo
primordial de ser elemento auxiliar na busca pelo desenvol- ARodadaDoha:desafioseexpectativas.
vimento econômico brasileiro. A construção do Mercosul
O SMC, seguindo seu processo histórico-evolutivo destambém influenciou o trato diplomático do Brasil no mun- crito anteriormente, chega ao século XXI com uma nova
do, passando o país a ter de harmonizar interesses dentro roupagem, mais robusta e efetiva na condução da regudo bloco para seguir adiante nas negociações de liberaliza- lação internacional do comércio. A OMC tornou-se uma
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
55
instituição central enquanto componente de suporte à atual onda de globalização. Ademais, neste início de século,
a luta pelo desenvolvimento das regiões mais pobres do
planeta também passou a ecoar de forma mais relevante
nas instituições internacionais como a OMC. Observa-se,
aqui, uma certa volta às demandas dos países mais pobres
colocadas em meados no século passado, quando das negociações acerca da Carta de Havana que criava a OIC.
Conceito-chave que norteou as ações do mundo econômico nos mais diversos países durante boa parte da segunda metade do século XX, estando marginalizado nas
últimas décadas do mesmo pelas crises que assolaram o
mundo, o desenvolvimento volta à cena internacional no
início de século XXI buscando fazer com que uma parte cada vez maior da população mundial tire proveito dos
benefícios trazidos com a, por vezes tão vilipendiada, globalização.
É nesse contexto que os membros da OMC lançam a
atual rodada de negociações comerciais multilaterais, a
Rodada Doha. Como colocado ao findar o seção anterior,
a retórica desenvolvimentista em prol dos países menos
targeted, sustainably financed technical assistance and capacity-building programmes have important roles to play.
(CONFERÊNCIA MINISTERIAL DA ORGANIZAÇÃO
MUNDIAL DO COMÉRCIO, 2001, p. 1)
Desde a quarta Conferência Ministerial da OMC, em
Doha, quando o mandato negociador sobre os variados
temas foi acordado, as negociações tomaram corpo de
forma permanente em Genebra, tendo ocorrido eventos
posteriores que buscaram diminuir as divergências entre
posicionamentos dos países relativamente aos temas negociados. Num primeiro momento, pode-se citar a quinta
Conferência Ministerial, ocorrida em Cancun em setembro de 2003, fracassada pela falta de entendimento entre
os países em desenvolvimento e seus pares desenvolvidos
sobre a liberalização agrícola e ditos temas de Cingapura.
Vale ressaltar que, do ponto de vista dos interesses brasileiros na Rodada (focados no tema agrícola), a Conferência
em Cancun trouxe à tona a participação do G-20 como
interlocutor importante nas negociações.
As negociações comerciais multilaterais ficaram relativamente estagnadas até meados de julho de 2004, quando se conseguiu chegar a um
Paraalguns,afaltadedemocracianosistemamultilateralde acordo para a retomada efetiva das negociações (he July
comérciolevaàelaboraçãodeagendasqueinteressamaos
2004 package). As negociações
paísesdesenvolvidos.Porisso,muitosvêemaOMCcomouma prosseguiram por um ano e
meio até a sexta Conferência
instituiçãousadapelospaísesfortescomoinstrumentode
Ministerial da OMC, realizapolíticaexterna.
da em Hong Kong em dezembro de 2005. Nesse encontro,
algumas arestas foram apaavançados foi a base de lançamento da Rodada, apontan- radas em relação aos temas mais controversos e um prodo para o tema agrícola como pilar fundamental das ne- gresso relativo foi obtido em áreas específicas, como em
gociações. Embora a liberalização do comércio agrícola relação aos subsídios à exportação agrícola, que devem ser
seja considerada como elemento central da Rodada, no- extintos completamente até 2013. Entrementes, muito ainvas negociações acerca de diversos outros temas (como da resta de controverso e não-acordado acerca de temas
serviços, produtos não-agrícolas, propriedade intelectual, muito importantes para a Rodada, como aqueles relacioinvestimentos, comércio eletrônico, etc.) foram também nados à agricultura (acesso a mercado e apoio interno),
lançadas em Doha, buscando uma óbvia harmonização de serviços e bens não-agrícolas. Ademais, na Conferência de
interesses entre os países em desenvolvimento e os países Hong Kong, estabeleceu-se um novo cronograma para as
desenvolvidos.
negociações em 2006, tendo em vista que o deadline estaA importância dada aos interesses dos países em desen- belecido inicialmente para a Rodada Doha, 1º de janeiro
volvimento na atual rodada de negociações da OMC, pelo de 2005, havia sido perdido já há algum tempo.
menos retoricamente, pode ser vislumbrada de forma clara
Portanto, os resultados de Hong Kong não devem ser
no seguinte excerto da Declaração Ministerial de Doha:
comemorados de forma irrealista, tendo em vista que
a reunião apenas conseguiu manter as negociações da
International trade can play a major role in the promotion
Rodada nos trilhos, dando alguma perspectiva para um
of economic development and the alleviation of poverty.
possível, mas pouco provável, acordo final ao final do novo
We recognize the need for all our peoples to benefit from
deadline, dezembro de 2006.
the increased opportunities and welfare gains that the mulNão obstante tenha ocorrido alguma aproximação entilateral trading system generates. (...) we shall continue to
tre as propostas dos principais grupos interessados no tema
make positive efforts designed to ensure that developing
agrícolas desde o início das negociações, o mesmo conticountries, and especially the least-developed among them,
nua a ser tanto o foco principal do mandato negociador de
secure a share in the growth of world trade commensuraDoha quanto o elemento mais controverso e de complexa
te with the needs of their economic development. In this
negociação da Rodada. Os EUA e a Europa Comunitária
context, enhanced market access, balanced rules, and well
56
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
continuam bastante reticentes relativamente aos seus pontos mais sensíveis da negociação agrícola. Por um lado, a
UE pressiona os norte-americanos por uma proposta mais
agressiva em relação ao apoio interno. Por outro, os EUA
afirmam que sem uma proposta européia de liberalização
efetiva no acesso ao seu mercado no setor agrícola, não
podem fazer concessões de forma mais rápida em outras
áreas.
Como líder do G-20, o Brasil tem desempenhado um
papel fundamental no processo negociador agrícola, empenhando-se na árdua tarefa de não deixar que o tema
agrícola venha a apresentar resultados negociados, ao fim
da Rodada, que sejam puramente fundados nos interesses
das grandes potências. Contudo, vale lembrar que, como
contraponto a uma possível liberalização para os bens
agrícolas, será demandado dos países em desenvolvimento, principalmente daqueles com maior grau de avanço
econômico como o Brasil, compromissos de reduções de
gravames ao comércio de bens industriais e de serviços.
É necessário, pois, que os países em desenvolvimento estejam atentos às oportunidades e desafios gerados ao seu
desenvolvimento econômico através das negociações na
OMC.
Por fim, é importante frisar que mesmo que o resultado efetivo obtido ao fim da Rodada Doha não seja o first
best para os interesses dos países em desenvolvimento, os
mesmos devem observar atenciosamente a importância
da defesa do SMC fundamentado no direito como instrumento que possibilita certa restrição ao exercício do poder
e da arbitrariedade pelas potências mundiais. Como diria
Lacordaire: “Entre o forte e o fraco, entre o rico e o pobre,
entre o mestre e o servo, é a liberdade que oprime e a lei
que liberta.”
Notas
Vale notar que, ao final da Rodada Uruguai, as negociações
do comércio de bens e de serviços haviam se fundido,
resultando no pacote global da rodada sendo tratado como um
single undertaking, importante inovação ocorrida na Rodada
Uruguai.
1
A legitimidade do SMC sob os auspícios do GATT advinha
parcialmente do crescimento substancial do comércio
internacional. Contudo, é logico que a anuência da potência
econômica mundial com o que era acordado multilateralmente
tinha peso mais significativo enquanto ação legitimadora do
SMC.
2
Chega, aqui, à discussão o problema do hegemom. Muitos
estudiosos colocam que essa tendência minilateralista existente
no sistema comercial internacional atualmente adviria do
“problema de liderança”, no qual o exemplo dado pelas
principais potências mundiais (fundamentalmente os EUA, UE
e Japão) nas últimas décadas reforçaria a constituição de um
ambiente favorável a esses arranjos militaleralistas mundo afora.
3
Cabe salientar que o Conselho Geral também atua tanto como
Órgão de Exame de Políticas Comerciais quanto como Órgão
4
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
de Solução de Controvérsias Comerciais.
Gonçalves (2003b), em seu capítulo 2, faz uma interessante
análise sobre as principais interpretações acerca do fracasso
da reunião de Seattle, bem como divergências e impasses lá
gerados.
5
Referências
ABREU, Marcelo de P. Brazil, the GATT and the WTO:
history and prospects. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 1998.
(Texto para discussão n° 392). Disponível em: <www.
puc-rio.br>. Acesso em: 10 maio 2006.
ALMEIDA, Paulo Roberto de. “Diplomacia comercial:
de Bretton Woods e Havana à OMC”. In: __________.
Relações internacionais e política externa do Brasil: história e sociologia da diplomacia brasileira. 2o ed., Porto
Alegre: Editora da UFRGS, 2004, cap. 3, pp. 111-144.
____________. “Acordos minilaterais de integração e de
liberalização do comércio: uma ameaça potencial ao
sistema multilateral de comércio”. IN: NEGOCIAÇÕES
INTERNACIONAIS: MAIS DO QUE PRODUZIR, É
PRECISO SABER NEGOCIAR, 1, nov. 2005. American
Chamber, São Paulo. Disponível em: <www.pralmeida.
org>. Acesso em: 28 jan. 2006.
BAUMANN, Renato et ali. Economia Internacional: teoria
e experiência brasileira. 1a ed. Rio de Janeiro: Elsevier,
2004. 442 p.
CONFERÊNCIA MINISTERIAL DA
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO,
4., 2001, Doha. Ministerial declaration. Genebra:
OMC, 2001. 10 p. Disponível em: <www.wto.org>.
Acesso em: 30 abr. 2006.
DIAS, Viviane Ventura. “O Brasil entre o poder da
força e a força do poder”. In: BAUMANN, Renato
(Org). O Brasil e a economia global. Rio de Janeiro:
Campus: SOBEET, 1996, cap. 4, pp. 55-73.
GONÇALVES, Reinaldo. Economia política internacional: fundamentos teóricos e as relações internacionais do
Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.
____________. “Globalização comercial”. In: ________.
O nó econômico. 1.ed. Rio de Janeiro: Record, 2003a.
Cap. 4, pp. 97-122.
____________. O Brasil e o comércio internacional: transformações e perspectivas. 2a ed. São Paulo: Contexto,
2003b.
GUIMARÃES, Feliciano de Sá. A Rodada Uruguai do
GATT (1986-1994) e a política externa brasileira: acordos assimétricos, coerção e coalizões. Dissertação de
Mestrado em Relações Internacionais do Programa
San Tiago Dantas – UNESP, UNICAMP, PUC-SP.
Campinas, 2005.
JANK, Marcos S.; THORSTENSEN, Vera (Org.). O Brasil
57
e os grandes temas do comércio internacional. 1a ed. São
Paulo: Aduaneiras, 2005.
RÊGO, Elba C. L. “Do Gatt à OMC: o que mudou, como
funciona e para onde caminha o Sistema Multilateral de
Comércio”. Revista do BNDES, v.3, n.6, dez. 1996.
JANK, Marcos S.; TACHINARDI, Maria H. “Prioridades
agrícolas na Rodada Doha em 2006: subsídios domésticos e acesso a produtos sensíveis”. Revista brasileira de
comércio exterior, n. 86, jan./mar. 2006.
RICUPERO, Rubens. “Os Estados Unidos e o comércio
mundial: protecionistas ou campeões do livre-comércio?” Estudos avançados, v. 16, n. 46, set./dez. 2002.
LAMPREIA, Luiz Filipe P. “Resultados da Rodada
Uruguai: uma tentativa de síntese”. Estudos avançados. v.
9, n. 23, 1995.
RIOS, Sandra P. “O impasse em Cancun e os impactos
sobre a agenda brasileira”. Revista brasileira de comércio
exterior, n. 77, out./dez. 2003.
LIMA, Tatiana Macedo N. GATT/OMC: uma análise institucional. Dissertação (Pós-graduação em
Economia) – Faculdade de Economia, Administração
e Contabilidade, Universidade de São Paulo. São Paulo,
2004.
SATO, Eiiti. “Mudanças estruturais no sistema internacional: a evolução do regime de comércio do fracasso da
OIC à OMC”. Maio 2001. Disponível em: <www.ufrgs.
br/irel>. Acesso em: 10 mar. 2006.
OATLEY, homas. International political economy: interests and institutions in the global economy. Londres:
Longman, 2003.
OMC. International trade statistics 2005. Genebra: OMC,
2005b. 274 p. Disponível em: <www.wto.org> . Acesso
em: 20 abr. 2006.
58
SEITENFUS, Ricardo A. S. Manual das organizações internacionais. 4 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2005.
VALLS, Lia. Histórico da Rodada Uruguai do GATT.
Rio de Janeiro: UFRJ, 1997 (Texto para discussão).
Disponível em: <www.ie.ufrj.br>. Acesso em: 20 mar.
2006.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Aeconomiapolíticainternacional
entreoregionalismoeo
multilateralismo
ElóiMartinsSenhoras
A
s relações entre o multilateralismo e os processos de regionalização da economia mundial constituem um dos temas mais interessantes do debate de relações internacionais.
A proliferação de esquemas de integração
econômica sub-regional ou regional, num momento em
que a Organização Mundial de Comércio (OMC) adquiriu um perfil alto, fez com que se incrementasse a atenção
em torno à interação que necessariamente se dá entre os
processos econômicos regionais de integração e o multilateralismo que opera no nível do sistema de comércio internacional.
A literatura recente dedicou-se à análise do processo a
partir de diversos ângulos, particularmente de perspectivas econômicas, jurídicas e de economia política, configurando um rico acervo que alimenta o debate da economia
internacional neste campo.
Por um lado, o sistema multilateral implica a definição
de regras e princípios comuns pelos quais se pauta a interação numa economia mundializada. Estas regras e princípios representam o denominador comum entre os mais
de 150 países membros da OMC, que têm contextos históricos, culturais, políticos e econômicos diferentes e aspirações distintas. Como as preferências coletivas e o poder de
Elói Martins Senhoras é mestrando em Relações
Internacionais no programa Santiago Dantas (UNESP,
UNICAMP, PUC-SP) e em Geografia na UNICAMP.
Visiting scholar na University of Texas at Austin (UT) e na
Universidad de Buenos Aires (UBA).
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
voto de cada país variam consideravelmente e limitam a
possibilidade de acordo sobre regras comuns, estas regras
constituem-se apenas em alicerces e não em cobertura do
sistema multilateral.
É neste contexto que o regionalismo tem um valor
acrescentado: entre países de uma mesma região que partilham um patrimônio comum, é muitas vezes mais fácil
alinhar preferências coletivas e integrar não só mercados,
mas também as políticas horizontais, necessárias para a
construção de uma verdadeira comunidade. Em outras palavras, o regionalismo tende a reforçar a dimensão da cooperação, enquanto o multilateralismo é necessariamente
mais centrado na concorrência.
Porém, é também necessário progredir na via multilateral a fim de imprimir uma direção e um sentido de eqüidade ao processo de globalização, tal como foi acordado
em Doha. Sem um maior desenvolvimento de regras e sem
um maior equilíbrio do sistema em favor dos países em
desenvolvimento, não seria possível enfrentar o desafio da
globalização, uma vez que esta tarefa não pode ser levada a
cabo unicamente com uma abordagem regionalista, dada a
natureza mundial dos desafios que são enfrentados e uma
vez que muitos países não participam de processos de integração regional.
Verifica-se, assim, uma grande divisão entre multilateralistas e regionalistas. De um extremo, os acordos regionais são vistos como um obstáculo ao multilateralismo. Do
outro, são considerados complementares com o multilateralismo no sistema de comércio internacional.
O mundo contemporâneo cada vez mais interdepen-
59
unilateral e multilateral do mercado global
tendam a condicionar
as macropolíticas econômicas dos Estados
É a via direta para o livre comércio, no entanto sofre oposição política de grupos nacionais e dos esqueLiberalização
influentesquepossivelmentepodemperdercomelasetorialmenteemcadapaís.Há mas regionais a que
docomércio
evidências,quandoasnegociaçõesmultilateraisparamoudesacelerampormotivos pertencem, a lógica do
pelavia
políticos,queasnegociaçõesregionaiseatéasbilateraissedesenvolvemouretomam mercado não esgota toMultilateral
commaiorintensidade.
dos os possíveis condiÉaviaemqueospaísesqueparticipamdosblocosregionaisdecomércioremovem cionamentos, uma vez
Liberalização tambémváriastarifascomerciaisparaosdemaispaísesdomundo.Nestetipode que os blocos e demais
docomércio
regionalismo,acriaçãolíquidadecomércioépositiva,ealiberalizaçãoregionalajuda processos de integração
pelaviado
a atingir o comércio livre tal qual a liberalização multilateral. Há evidência que a refletem paralelamente
Regionalismo maioriadosblocosdeintegraçãoregionaldocomérciodosúltimostrintaanostem interesses políticos, esAberto
tidoumamaioraberturaeconômicatambémaospaísesnãomembrosaoregionalismo tratégicos para o fortalecimento da posição
aberto.
relativa dos países no
dente tem a necessidade de regras e políticas previsíveis e
cenário internacional,
objetivas, que só um Estado de Direito internacional pode criando um processo de interdependência entre as trocas
assegurar. Dessa forma, além das idealizações irrealizáveis multilaterais e regionais.
no curto prazo, devido aos interesses conflitivos pelo poSegundo Mansfield e Milner (1999, p. 600), nos anos
der entre as nações, os desafios para alcançar um sistema 90, 50% do comércio mundial passou a ser realizado no
comercial mais eqüitativo são consideráveis, e somente âmbito de acordos regionais, assim como a grande maioria
podem ser ultrapassados com negociações que avaliem as dos países afiliados à OMC participaram de pelo menos
limitações da conjuntura política internacional e o neces- um destes acordos.
sário tempo para transformações.
Isto significa que o incremento de acordos regionais
Dentro desse cenário de legitimação internacional, a deu-se em paralelo ao processo de liberalização multilainserção segura na economia mundial atual pode ser ob- teral, uma vez que de fato, os acordos multilaterais não
jeto de transformações dinâmicas somente através de duas foram abandonados, mas pelo contrário, com a criação
abordagens complementares: o regionalismo e o multilate- da OMC houve uma expansão do alcance da liberalização
ralismo, uma vez que o unilateralismo é hoje em dia uma comercial.
opção não válida, pois é uma política insustentável, que
Considerando o incremento significativo dos acordos
leva a uma ordem econômica internacional instável.
de regionalismo aberto no mundo durante os anos 90, o
Promover essas transformações é tarefa complexa e que incremento no comércio mundial pode ser um indicador
pressupõe a compreensão do funcionamento do mundo, de como o regionalismo aberto pode apoiar um novo mulpor isso faz-se necessário entender as lógicas de funcio- tilateralismo.
namento do multilateralismo e do regionalismo, que são
Devido a esses dados, o regionalismo tem sido justificaprocessos distintos relacionados a uma maior interdepen- do conceitualmente como um instrumento de integração
dência econômica entre os Estados e que se desenvolveram econômica compatível com as modernas teorias explicadesde os anos 50 de forma paralela e nem sempre harmo- tivas do comércio, além de ser complementar ao processo
niosa.
histórico de progressiva liberalização, em curso no capitaApesar da profusão de acordos comercias e de integra- lismo contemporâneo.
ção econômica no mundo ter aberto um debate sobre a
De fato, o recente aumento de acordos de integração
compatibilidade ou antagonismo - building blocks ou stum- regional é função do crescente êxito de negociações mulbling blocks - entre os acordos regionais e o progresso do tilaterais, especialmente da conclusão da Rodada Uruguai.
livre comércio no marco multilateral da OMC, a dinâmica Como atesta Ethier (1998, p. 1160), “o Novo Regionalismo
contemporânea demonstra que não há nenhum conflito é, em grande parte, um resultado direto do sucesso da libeentre o regionalismo e o multilateralismo, uma vez que o ralização multilateral”.
regionalismo aberto é apenas um dos três componentes do
Por isso, o multilateralismo e o regionalismo são fenôprocesso de liberalização atual: unilateral, multilateral e re- menos simultâneos e sucessivos, pois além da regionalizagional, portanto representando um processo complemen- ção ser um fenômeno sucessivo em relação ao multilateratar ao marco da OMC, que ajuda na segura consolidação lismo, ou seja, uma conseqüência ou resposta ao progresinterna de uma região à sua inserção internacional.
sivo processo de liberalização multilateral, os movimentos
Mesmo que as exigências econômicas de liberalização coexistem numa mesma realidade internacional, sendo
Tabela1
Comoatingirolivrecomércio:multilateralismoou
regionalismo?
60
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Tabela2
Visõesdesfavoráveisoumultilateralistas
Visõesfavoráveisouregionalistas
Consistênciaentreregionalismoemultilateralismo?2
Onovoregionalismocomo
partedaglobalizaçãoeda
transnacionalizaçãoda
economiamundial1
Oregionalismoaberto
comoumasegunda
melhoralternativaao
multilateralismodireto2
Os acordos regionais são implementados por governos que tentam manter certo controle de suas
economiasdiantedapressãodaglobalizaçãoedaperdadeidentidadepelocrescentepoderdasempresas
multinacionaiseorganizaçõesmultilaterais
Osacordosregionaistrazemváriosbenefícios:asseguraroacessoanovosmercadosparaexportações
de non-tradables, as quais são mais limitadas e instáveis no mercado internacional; fortalecer a
especializaçãoeaseconomiasdeescala;melhoraracapacitaçãodamão-de-obra;transferirtecnologia
ereduziroscustosdetransaçãonaquelaseconomiasqueseencontramemprocessodeliberalização
decomércio,poisasnovasimportaçõesintra-regionaispodemsercompensadaspornovasexportações
intra-regionais.
Oregionalismoabertoéumpré-requisitoparaumnovomultilateralismoestruturadoaoredordeblocos
Oregionalismoabertocomo
regionais,ondeospaísesdefinemsuaposiçãoregionalmenteemlugardefazermultilateralmente.Este
pré-requisitoparaumnovo
multilateralismosobrepassaadistorçãoatualgeradapelaliderançadealgunspaísespoderososoudas
multilateralismo3
instituiçõesdeBrettonWoodstípicasdoantigomultilateralismo.
Odesviodecomércioproporcionadopelosblocosregionaispodesermuitocustosoepodeconstituir-seem
umaopçãodepolíticainferioraosacordosdelivrecomércio.Amultiplicaçãodeacordosdeintegraçãono
Oregionalismoabertocomo
âmbitomundialcriaumaarquiteturadotipospaghettibowl,ondeváriosblocosregionaistêmdiferentes
inconsistentecomosistema
regrasdeorigemetarifas,tornandodifícilaidentificaçãoindividual.Estadificuldadetenderiaalevar
multilateralGATT-OMC4
ao problema que os acordos regionais tentam evitar: o aumento de protecionismo e dos custos de
transação.
Oprotecionismoproporcionadopelospaísesintegrantesdosblocosseriaprejudicialaosmesmosouao
comérciointernacionalnamedidaemqueprovocaperdadeeficiênciaeconômica.OBancoMundialaponta
paraosperigosdeaumentodaineficiênciaedeperdadearrecadaçãodosgovernosemacordosSul-Sul.O
Oregionalismocomo
FMI,utilizando-sedoexemplodosEUA,declaraqueosobjetivosmaisimportantesdosacordosNorte-Sul
ineficiênciaeconômicadevido
nãosãoosdeaumentodaeficiêncianaproduçãodebenscomopregaoBancoMundial,maspartemde
àsdiretrizespolíticas5
incentivospolíticos.Assim,osnovosacordosdecomérciobilateraiseregionaisestariamrelacionadosa
questõesgeopolíticasedesegurança,nasquaisosacordossãovistoscomoumveículoparaaprofundar
relaçõespolíticasecombateroterrorismo.
também simultâneos.
Afirmar que o novo regionalismo ou regionalismo
aberto é um processo complementar ao multilateralismo
significa dizer que os acordos integracionistas atuais não
pretendem isolar seus países-membros do resto do mundo.
De fato, se a regionalização é uma resposta à morosidade dos processos multilaterais de liberalização via OMC, é
ao mesmo tempo, um estímulo às forças microeconômicas
que são o motor da globalização. Dessa forma, regionalismo e multilateralismo não são fenômenos antitéticos ou
antagônicos, uma vez que no momento em que a regionalização contribui para consolidar o jogo da concorrência,
os dois processos tendem principalmente a se reforçar.
Ambas as tendências, o multilateralismo e o regionalismo, ao expressarem formas atualizadas de realização de
um determinado regime de acumulação e de uma determinada distribuição de poder no plano mundial, modificam as relações entre os planos transnacionais, internacionais, regionais e nacionais, assim como suas estruturas de
autoridade e a configuração dos espaços políticos em que
operam.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Ainteraçãoentreoregionalismoeomultilateralismo
naagendainternacional
O sistema multilateral progressivamente obteve com as
diversas rodadas de liberalização do GATT e a formação
da OMC em 1995 importantes instrumentos de suporte
e fortalecimento. Nesse percurso, surgiu a expectativa de
que as exceções ao sistema multilateral, admitidas pela
OMC, tais como acordos regionais de comércio, não seriam mais importantes alternativas a serem adotadas pelos
países, ou caso ainda se constituíssem como alternativas,
seriam adotadas de maneira aberta ou outward-oriented e
não fechadas ou inward-looking, de modo a se tornarem
building blocks para o sistema multilateral.
Apenas a alternativa outward-oriented foi observada
durante os anos 90. No total, foram notificados na OMC
até o ano de 2003 duzentos e oitenta e cinco acordos regionais, dos quais a maior parte já está em vigor (WTO,
2003). Quase todos os países do mundo e todos os países
membros da OMC são membros ou estão negociando pelo
menos um acordo regional.
Os tratados de integração regional têm sido um dos
maiores movimentos nas relações internacionais, pois pra-
61
ticamente todos os países do globo são membros de um
bloco, e muitos pertencem a mais de um, de forma que
quase dois terços do comércio mundial se dá por meio desses “mercados comuns” (Hilaire e Yang, 2003).
Pode-se observar, no entanto, que essa inter-relação entre OMC e os acordos regionais tem levantado um debate
com relação às vantagens e desvantagens de cada tipo de
acordo e a relação entre eles.
Embasando-se nos efeitos positivos e negativos das
integrações regionais sob o prisma da crescente evolução
multilateral do comércio, duas questões importantes precisam ser respondidas:
A) Quais os ganhos de bem estar provenientes de uma
abertura multilateral versus aqueles provenientes de
uma liberalização preferencial, ou seja, qual a linha de
liberalização comercial que poderia beneficiar mais as trocas
e os ganhos de bem estar para os membros participantes,
países terceiros e o mundo em geral?
Com relação ao primeiro ponto, a CEPAL (2004b)
menciona que a integração regional é capaz de gerar ganhos estáticos e dinâmicos para seus países participantes.
Os ganhos estáticos podem ser calculados simplesmente
pela análise das trocas intra-bloco. Entretanto, partindo
desse ponto, observa-se que os acordos regionais podem
gerar dois tipos de efeitos. Um seria o de aumentar o nível das trocas entre os membros às custas do produtor doméstico menos eficiente (trade creation), o que é um ponto
julgado positivo. E o outro seria o de aumentar às custas
de um terceiro país altamente eficiente (trade diversion),
o que seria um ponto julgado negativo. Portando, o efeito
dos acordos regionais sobre o bem estar geral depende da
soma desses dois efeitos, e isso depende de uma variedade
de suposições e condições, incluindo a complementaridade da estrutura produtiva entre os países participantes do
acordo.
Os efeitos dinâmicos que resultam de uma integração
regional incluem efeitos competitivos e de escala. Segundo
Mansfied e Milner (1999), os estudos recentes examinam
a capacidade dos acordos regionais em criar economias de
escala e promover uma maior especialização e competitividade das economias, além de realizar um intercâmbio no
processo de produção entre os países membros. Os efeitos
competitivos têm sido a razão maior para a formação dos
acordos regionais mais recentes. Esses efeitos mais dinâmicos foram observados com maior intensidade na União
Européia e no NAFTA.
Quadro1
Esquemasteóricosdefuncionamentodomultilateralismoedo
regionalismo
Análise
Vantagens
Comparativas
Livre-comércio
global
Livre-comércio
global
Concorrência
Imperfeita
Sul-Sul
Regionalismo
Aberto
Norte-Sul
Norte-Norte
Multilateralismo
Objetivos
Livre-comércio
global
Institucionalidade
Fóruns
Multilaterais
Vantagenspara
membros
Riscosparapaísesem
desenvolvimento
• Welfaremundial
• Deterioraçãodostermosdetroca
• Especializaçãoregressiva
• Unilateralismo
• Protecionismoviabarreirasnão-tarifárias
• Welfaremundialmais
eficiente
• Acessoamercados
• Reduçãodacapacidadedeatrair
• Economiasdeescala
IDE
UniõesAduaneiras
• InvestimentoDireto
• Isolamento
Externo(IDE)
• Unilateralismoeprotecionismo
• Poderdebarganha
• Segurança
AcordosdeLivre
Comércio
• Idem
• Idem
• Progressotécnico
Desenvolvimento
• Competitividade
sustentávelda UniõesAduaneiras
• Inserçãoativana
periferia
globalização
• Deterioraçãodostermosdetroca
• Especializaçãoregressiva
• Unilateralismoeprotecionismo
• ReduçãodeWelfare
• Isolamento
AdaptadodeSabbatini(2001).
62
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
B) Quais as implicações sobre
a economia política dos acordos regionais sobre o sistema
multilateral e vice-versa, ou
seja, a regionalização constitui um building block ou
um stumbling block para o
sistema multilateral de liberalização comercial?
Tabela3
FormatosdeliberalizaçãonaAméricaLatina
Processo
deabertura
unilateral
Proporcionaramasmaiselevadasmedidasdeaberturadaseconomiasdevidoàs
profundasreformasqueforamfeitasnaAméricaLatinanosanos90.Nomodelo
neoliberal,acompetitividadeinternacionaleasexportaçõespassamaterum
papelpreponderante,umavezqueamaioriadospaísesbuscouumaestratégia
export-led de desenvolvimento. Ao contrário das nações do sudeste asiático,
o principal instrumento da reforma na América Latina fora a liberalização
indiscriminadaerápidadasimportações3.
Com relação ao esquema multilateral, observa-se na região uma maior
participaçãodospaísesnaOMCeumaintensificaçãodosacordosmultilaterais,
vistoquearegiãosecomprometeuemadotarasnovasdisciplinasquesurgiram
comarodadadoUruguai.
A liberalização através da integração regional passou a ser um instrumento
adicionalparaabriraseconomiasparaacompetiçãoecomplementarosdois
primeirosprocessosdeliberalização.Defato,ainserçãodaintegraçãoregional
noprocessodeliberalizaçãodosanos90fezcomqueosblocosadquirissema
característicaderegionalismoaberto.
Com relação às implicações da economia política Processode
dos acordos regionais sobre o participação
sistema multilateral, a CEPAL multilateral
(2004b) explicita vários argumentos a favor e contra o regionalismo. A favor, os acor- Processode
dos regionais possibilitam integração
aos países participantes mo- regional
verem-se mais rapidamente
em direção a um comércio BeseadaemDevlin&Ffrench-Davis(1998)
mais livre, além do fato de
inward-looking, discriminatórias e protecionistas. O efeique os países passariam a ter
um maior controle sobre uma variedade maior de bens e to negativo recairia principalmente sobre os não membros
serviços do que aquele que poderia ser alcançado no nível de grandes acordos regionais, cujos participantes cobrem
multilateral. Os acordos regionais também poderiam atuar a maior parte das trocas globais. O efeito final seria o de
como um laboratório para testar novos assuntos e observar trade diversion, ao invés de trade creation.
Além disso, ao possibilitar uma integração mais rápia sua operacionalidade, de modo a criar as bases para uma
da
e
mais profunda, a nova geração de acordos regionais
futura negociação multilateral com o objetivo de desenpode
reduzir as vantagens dos países em participar de uma
volver as regras para aplicação no nível multilateral. Nesse
caso, os acordos regionais poderiam ser considerados com abordagem multilateral para a liberalização das trocas.
A proliferação de acordos regionais, com cada vez mais
o Building Blocks para o sistema multilateral.
Frankel (1997), entende que elementos positivos que países participando em mais acordos, pode criar blocos
favorecem a formação de building blocks têm prevalecido competitivos e antagônicos, o que inviabilizaria o regime
sobre fatores que poderiam colocar em risco a trajetória multilateral.
Analisando a operação inversa que seria as implicações
multiliberalizante de blocos regionais ou levar a blocos
fechados, prejudiciais ao objetivo maior da liberalização da política econômica dos acordos do sistema multilateral
sobre os acordos regionais, ou seja, a supremacia da OMC
geral.
Analisando os efeitos negativos, observa-se que os sobre os acordos regionais, observa-se que muitos dos traacordos regionais podem dirigir-se para estratégias tados feitos recentemente colocam que os acordos preci-
Tabela4
NíveisdeinterdependênciaentreMultilateralismoeRegionalismo
OprimeironívelseriaodasregrasdaOMCquegovernamasoperaçõesdosacordosregionais.Elasdefinem
especificamenteascondiçõesemqueosacordosregionaissãopermitidosdeexistireoperarsobosistema
multilateral.Essasregras4incluemoArtigoXXVIdoGATT5,paraosintercâmbiosdebens,oartigoVdoGATS,
paraastocasemserviçoseaEnablingClause6paraacordospreferenciaissul-sul.
Nosegundonível,oscompromissosdeacessoamercado,sejamdebensouserviços,feitossobosistema
multilateralcomoresultadodesucessivasrodadasdenegociações,determinamograudepreferências
disponíveisparaosparceirosdosacordos.
Noterceironível,asdisciplinasmultilaterais-queincluembarreirasnãotarifáriasebehind-the-border
regulatoryissues-constituemumpiso,oumínimomúltiplocomum,adotadoportodososmembrosdaOMC,
inclusivepelosparceirosdosacordosregionais.
1onível:
regrasdaOMC
2onível:
compromissosde
acessoamercados
3onível:
compromissos
multilaterais
BeseadaemCEPAL(2004b)
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
63
O discurso contemporâneo sobre desenvolvimento tem, como
elemento central, a articulação. Este é o eleOrigem/
América América
Europa
Oriente
mento a inspirar novas
Mundo
Europa
África
Ásia
Destino
doNorte Latina
Oriental
Médio
formas de pensamento
e ação. A polarização
Mundo
6.21%
8.54%
10.35%
4.12%
6.76%
3.14%
4.78%
8.17%
regionalismo-multilaAméricado
7.33%
8.95%
12.00%
4.54%
1.91%
2.92%
5.19%
5.60%
teralismo precisa ser
Norte
superada em favor de
América
9.35%
12.69% 11.64%
3.74%
-8.57%
4.05%
1.82%
4.35%
uma concepção inteLatina
gral e complementar
Europa
para o desenvolvimen4.08%
7.45%
6.45%
3.53%
7.64%
0.89%
2.71%
5.21%
Ocidental
to dos países.
Europa
Evitando a defini9.90%
16.27%
7.09%
9.68%
11.13%
2.75%
8.99%
5.97%
Oriental
ção de modelos e conceitos invariantes, os
África
3.35%
5.28%
11.01%
1.84%
-6.75%
5.97%
3.27%
11.92%
teóricos do desenvolOriente
6.95%
8.17%
-4.41%
2.86%
-7.54%
9.69%
6.89%
8.94%
vimento internacional
Médio
têm contribuído para
Ásia
8.36%
7.30%
11.76%
6.49%
0.82%
7.39%
7.14%
10.00%
desvelar um conjunto
Fonte:WTO(2001).
variado de práticas e
de perspectivas, que
sam ser consistentes com a OMC. Isso indica que os futuros acordos regionais deverão ser construídos na OMC e refletem, simultaneamente, os diferentes sentidos atribuque eles procurarão manter a compatibilidade com as suas ídos à noção de desenvolvimento, a multiplicidade de atores engajados e a variabilidade dos espaços de gestão entre
disciplinas desse organismo.
o regionalismo e o multilateralismo.
AsDinâmicasdoRegionalismoedoMultilateralismono
O crescimento do comércio internacional mostra como
Desenvolvimento
a integração econômica e sua relação com a modernização
O processo de globalização tem demonstrado que não justificam a aceitação da integração comercial como a seexiste uma evolução natural de desenvolvimento e de inte- gunda melhor opção frente à impossibilidade da existêngração dos países da periferia, a mundialização, apesar de cia de um comércio livre puro em nível internacional, que
sua importância, não é mais que um elemento de êxito ou se ratificou pelo fracasso (ou sucesso relativo) observado
fracasso de desenvolvimento. O que pesa, em definitivo, com as duas últimas rodadas de negociações presididas
é a qualidade das políticas internas, ou seja, a capacidade pelo GATT e pela OMC.
A criação do comércio entre os países membros de
institucional e a vontade política de aplicá-las, aceitando
simultaneamente a mudança social que acompanha o cres- acordos preferenciais de troca pode aumentar o bem estar
dos países participantes através dos efeitos sobre os termos
cimento e que exige o desenvolvimento.
A chave do desenvolvimento está na capacidade e na de troca e também pela capacidade de realizar economias
vontade de interagir pró-ativamente frente à globalização, de escala. As economias de escala levariam à uma maior
aproveitando a abertura dos mercados, uma vez que o con- competitivade e especialização, além de permitir o interceito de desenvolvimento, hoje em dia, passa a significar câmbio produtivo entre os membros.
Este novo modelo de desenvolvimento reconhece as exo encontro no justo equilíbrio entre o jogo das forças do
mercado e o papel dos poderes públicos na oferta de bens portações de manufaturas como o eixo central da política
coletivos e na consolidação do Estado de Direito. Cada econômica e destaca a política de integração como sendo o
país tem a responsabilidade de descobrir a via que corres- passo seguinte na estratégia de inserção internacional.
O desenvolvimento por essa via internacional se forponde à sua geografia, à sua história e ao caráter específico
ma
através do adensamento dos vetores de promoção do
do seu povo.
intercâmbio
em dois sentidos complementares, primeiro
Dentro desse cenário, o enfoque integrado do desencom
o
entrelaçamento
da aliança estratégica de atores na
volvimento e sua eficácia como estratégia para melhorar a
inserção no sistema internacional depende de fatores que promoção de uma nova lógica de regionalização, simultapodem ser ordenados em 2 níveis internacionais de ação neamente com construção de negociações multilaterais.
Dadas as condições de inferioridade em que se encondos Estados: regional e multilateral, que estão inter-relatram as economias mais desfavorecidas dentro de um marcionados entre si.
Tabela5
CrescimentoAnualdasExportaçõesporRegião
Econômica(1990-2000)
64
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
co multilateral na qual a defesa
Tabela6
dos seus interesses se torna uma
tarefa crescentemente difícil, não
é surpreendente que desde a perspectiva periférica se interprete
Arazãoeconômicaéanecessidadedeadequaçãodosespaçosintegrados,
a formação de grupos regionais
regionaisousub-regionaisàlógicavigentedaproduçãocapitalista,emque
como uma estratégia de desen- Razão
econômica
predominamascorporaçõestransnacionaiseaespecializaçãodasfábricas,
volvimento alternativa ao modecomlinhasprodutivasintegradasemváriosespaçosnacionais.
lo de globalização neoliberal em
curso. O regionalismo Sul-Sul
Arazãojurídicaéaobediênciadospaísesaoregimenormativoestabelecido
trata-se da estratégia de fortaleci- Razão
em bases do direito internacional pela Organização Mundial do Comércio
mento dos países membros frente jurídica
(OMC).
às assimetrias de negociação com BeseadaemPfeifer(1998,p.117)
diferentes poderes de negociação
na esfera multilateral.
desenvolvimento econômico.
Como parte integrante dos esforços para alavancar o
Como as trajetórias e os desempenhos econômicos depleno desenvolvimento econômico e social, os países pro- siguais entre as nações devem-se essencialmente às distincuram estimular os processos regionais de integração atra- tas construções institucionais, as inovações institucionais
vés de acordos de livre comércio e de complementaridade orientadas segundo as necessidades de proteção, garantias
econômica, esquemas preferenciais ou outras formas aper- e informação dos mercados regionais e multilaterais consfeiçoadas de integração, dinâmicas bilaterais de abertura e tituem, dessa forma, o processo essencial do desenvolvisimplificação administrativa, assim como a consolidação mento econômico.
das novas regras multilaterais de comércio.
Por oposição, o não-desenvolvimento é o resultado
Nesse quadro, o regionalismo aberto constitui um também de uma causação circular e cumulativa da falta de
complemento aos elementos centrais do desenvolvimen- instituições que consolidam o funcionamento do comércio
to como são o fortalecimento da democracia, o acesso à internacional em marcos multilaterais, instabilizando os
inovação tecnológica, a estabilidade macroeconômica, o contratos, atropelando os direitos de propriedade e crianimpulso ao crescimento econômico, a coesão social e as do inibidores das trocas.
políticas do meio ambiente.
Dessa forma, o que identifica o desenvolvimento através
da via internacional não é propriamente o determinismo
ÀGuisadeÚltimasConsiderações
da instituição livre-mercado, mas é o caminho moldado
O novo regionalismo e as instituições internacionais por instituições embebidas na lógica do multilateralismo,
multilaterais são elementos diretamente influenciadores mesmo que estando embasadas nos processos graduais de
do desenvolvimento econômico, pois através de suas evo- liberalização dos acordos regionais.
luções institucionais ampliam a eficiência dos mercados e
Ainda que a análise do desenvolvimento orientado pela
reduzem os custos de transação, possibilitando a redução via internacional inclua um conjunto complexo de instituidas incertezas e estimulando o crescimento econômico.
ções regionais e multilaterais, é indiscutível que o Estado
Dentro desse contexto, a evolução das relações de co- nacional e as instituições políticas, o mercado e a demomércio multilateral demanda instituições internacionais cracia assumem uma essencial importância.
– mesmo que oriundas de uma lógica multilateral ou de
No contexto de interdependência internacional, o
um regionalismo aberto – que, através da diminuição dos Estado, o mercado e a democracia7 são conceituados como
riscos e da proteção dos contratos privados, impulsionem as instituições necessárias para a promoção do desenvolviestas relações num movimento cumulativo e favorável ao mento através do comércio internacional nas atuais sociedades complexas, pois
elas se reforçam muTabela7
tuamente como esferas
de promoção da eficiência alocativa dos reTrocadaproduçãodeumfornecedorineficientenacionalpelaimportaçãode cursos internacionais.
Criaçãodecomércio
umfornecedormaiseficientedeumpaísdobloco.
Planejar o desenTroca da importação de um fornecedor eficiente não-membro do bloco pela volvimento, no contexDesviodecomércio
importaçãodeumfornecedormenoseficientedeumpaísdobloco.
to de interdependência
Seacriaçãolíquidadecomércioépositiva,oefeitolíquidodaintegraçãore- mundial atual, é de
Efeitolíquidosobreo
gionalépositivo;seacriaçãolíquidadecomércioénegativa,oefeitolíquido certo modo planejar
comércio
também a participação
daintegraçãoregionalénegativo.
RazõescomplementaresentreRegionalismoe
Multilateralismo
Efeitospositivosenegativosdaintegraçãoregional
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
65
modo de atuação nos espaços públicos e em especial no
plano econômico. Com esta reestruturação não há a perda
de soberania, e sim uma transferência de um determinado grau num setor específico, que será regulamentada e
dirigida de forma coletiva, tal como ocorre nos blocos regionais e nos foros multilaterais, como na OMC – onde as
regras são elaboradas e aplicadas através do consenso .
Neste novo cenário o Estado,
enquanto entidade soberana
NãoseriacorretofalardodesaparecimentodoEstado,e
simnamudançadanaturezadesuasfunções,noseumodo que atua de modo a garantir
o bem-estar e a segurança dos
deatuaçãonosespaçospúblicoseemespecialnoplano
cidadãos, para não ser considerado débil, precisa reciclar-se e
econômico.Nestesentido,oEstadointegralcede
buscar uma nova forma de atulugaraumEstadocatalítico,conformandoumanova
ar de forma a não ver seu papel
dinâmicadegovernançanacionaleinternacional.
questionado, mesmo diante das
bases econômicas liberais.
cia seria também assimétrica. Assim, a interdependência
De acordo com Bull (2002), mesmo com novos temas
não afeta a soberania, mas vem a afetar a autonomia dos na agenda global, novos atores e inovações nos vários seEstados.
tores, os Estados continuam a representar os indivíduos na
A interdependência mundial relativiza a soberania dos cena internacional, pois é ele que defende seus interesses
Estados, culminando na perda de autonomia econômica e nas distintas instâncias internacionais.
cultural, sendo que o maior ou menor grau de autonomia
A tensão entre a esfera nacional e a global não significa
dos países depende da posição em que os mesmos ocupam um prelúdio de morte do Estado-Nação, mas apenas um
momento de transição para novos padrões de articulação
na relação de forças em nível internacional.
Dessa forma, nos últimos tempos o Estado vem sofren- entre uma governabilidade puramente nacional e novas
do uma transformação a fim de continuar a ser o centro formas de atuação nos planos regional, internacional e
da tomada de decisão. Muito se fala sobre o declínio do multilateral, contrariando assim, a crença liberal de que o
Estado, enquanto espaço público que regula econômica e mercado é o único candidato viável, na ordem atual, para
socialmente a nação. Tal reestruturação está ocorrendo nos substituir ou compartilhar a função reguladora e integradiversos níveis a fim de atender as antigas e novas deman- dora do Estado nacional.
das do mercado interno e externo, com vistas a propiciar o
Como as respostas às pressões internacionais são dimelhor para os cidadãos.
ferentes para cada país, diante das diferenças políticas e
Não seria correto falar do desaparecimento do Estado, institucionais e das estratégias adotadas, estas têm tido
e sim, na mudança da natureza de suas funções, no seu dois sentidos: a) bottom-up, através de coalizões acima
dos países, no nível regional e internacional; e
b) up-down, através de
Tabela8
coalizões abaixo dos países, no nível microeconômico através de alianças Estado-Empresas no
Fatorespositivos
Fatoresnegativos
mercado interno.
Neste contexto, o
Manipulaçãodeinteressesporpartedesetores
Crescimentocontínuodeoutrosblocosregionais.
Estado integral cede lugar
beneficiadoscomacordoregional.
a um Estado catalítico,
Obtençãodeapoiopolíticoàliberalizaçãoapartirde
Apoioesgotáveldasfirmasàliberalizaçãocon- que está constantemente
fortalecimentodeagentesexportadores.
tínua,podendosesatisfazerapenascomare- compartilhando arranjos
Liberalização competitiva através do incentivo de gionalização.
de poder transescalar,
sucessivasrodadasdenegociação.
Recursoslimitadosparanegociação,podendose conformando uma nova
Efeitolock-inemobilizaçãoregional.
dinâmica de governança
exaurirnarodadaregionaldeliberalização.
nacional e internacional
Eficiênciadanegociaçãoapartirdemaioresunida- Poder de barganha dos blocos incentivando o
através das agendas do
des:ganhodeescala.
protecionismocontraterceiros.
multilateralismo e do reBaseadaemFrankel(1997)eCepal(2004b)
gionalismo.
na construção de um sistema multilateral democrático e
sustentável através de fortes instituições.
Todavia, com as instituições multilaterais atuais, a interdependência traz benefícios e custos, uma vez que os
custos das relações não são igualmente distribuídos entre
as partes, pois os países mais poderosos transferem seus
custos para os mais fracos e desta forma a interdependên-
Fatoresdeinfluêncianaconstruçãodebuilding
blocks
66
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Notas
Economista e cientista político (UNICAMP). Especialista pósgraduado lato-sensu em Administração: Gestão e Estratégia de
Empresas (UNICAMP). Atualmente realizando mestrado em
Relações Internacionais no programa Santiago Dantas (UNESP,
UNICAMP, PUC-SP) e em Geografia (UNICAMP). Visiting
scholar na University of Texas at Austin (UT) e na Universidad
de Buenos Aires (UBA).
1
A título de ilustração, são apresentadas algumas referências
representativas das discussões numeradas: 1) Stallings (1995)
e Axline (1994) e Sideri (1996); 2) Ffrench-Davis (1995); 3)
Mistry (1995); Blackhurst e Henderson (1993) e Cepal (2004);
4) Bhagwati, Greenaway e Panagariya (1998) e Yeats (1997); e
finalmente 5) Schiff e Winters (2003) e Hilaire e Yang (2003).
2
O objetivo era de expor os produtores nacionais à competição
internacional, ao mesmo tempo em que encorajava a produção
de produtos exportáveis, esperando-se que isso resultaria numa
maior produtividade, com a absorção de novas tecnologias e
aumento da especialização.
3
O Artigo XXVI do GATT, o artigo V do GATS e a Enabling
Clause permitem que os membros da OMC se desviem do
mais importante princípio da OMC (Artigo I do GATT), sob
certas condições, e estabelece os requerimentos necessários que
4
devem ser preenchidos pelos membros dos acordos regionais
que estejam de acordo com a OMC.
O Artigo XXVI do GATT estabelece que tarifas e outros
regulamentos de comércio devem ser eliminados em todas as
trocas entre os países membros de acordos, e que as barreiras
para países terceiros não devem ser no geral mais altas ou
mais restritivas. Observa-se, com isso, que principal função
desse artigo é a de facilitar as trocas entres os membros e não
permitir que aumentem as barreiras a países terceiros.
5
A Enabling Clause possibilita a isenção do Artigo I do GATT
para um elevado número de arranjos preferenciais, incluindo
acordos regionais feitos entre países menos desenvolvidos,
com o intuito de reduzir ou eliminar as tarifas. A sua
principal função é a de promover as trocas entres os países em
desenvolvimento e não permitir o aumento das barreiras e o
surgimento de dificuldades de intercâmbio com outros países.
Observa-se, com isso, que um grande número de acordos SulSul têm sido feitos sob a Enabling Clause.
6
“A democracia reforça e preserva as condições institucionais
apropriadas à vigência do mercado e o faz por meio da
imposição de limites à atuação de todas as forças individuais e
coletivas capazes de subvertê-lo, a começar pela domesticação
do próprio Estado, submetido à vontade soberana do eleitor”
(Pio, 2002).
7
Bibliografia
AXLINE, W. A. “Cross regional comparisons and the
theory of regional cooperation: Lesson from Latin
America, the Caribbean, South East Asia and the South
Pacific”. In: AXLINE, W. A. (ed.). he Political Economy
of Regional Cooperation: Comparative case studies.
Associated University Press, 1994.
BHAGWATI, J., GREENWAY, D. & PANAGARIYA,
A. “Trading preferentially: theory and policy”. he
Economic Journal, vol. 108, Julho, 1998.
BLACKHURST, R. & HENDERSON, D. “Regional integration agreements, world integration and the GATT”.
In: ANDERSON, K. & BLACKHURST, R. (eds.),
Regional Integration and the Global Trading System.
New York: St. Martin’s Press, 1993.
BULL, H. A Sociedade Anárquica – Um estudo da ordem
na Política Internacional. Brasília: IPRI, 2002.
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina
e Caribe. “Bilateralism and Regionalism in the
Atermath of Cancun: Re-establishing the Primacy of
Multilateralism”. Round Table of Executives Secretaries of
the United Nations Regional Commissions at Unctad XI.
São Paulo, 2004a.
CEPAL - Comissão Econômica para a América Latina
e Caribe. “Multilateralism and Regionalism: he new
interface”. Round Table of Executives Secretaries of the
United Nations Regional Commissions at Unctad XI, São
Paulo, 2004b.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
DEVLIN, R. & FFRENCH-DAVIS, R. “Towards an
Evaluation of Regional Integration in Latina America
in the 1990s”. Documento de Trabalho do Banco
Interamericano de Desenvolvimento, n°2. Washington:
BID, 1998.
ETHIER, W. “he New Regionalism”. he Economic
Journal, vol. 108, Julho, 1998.
FFRENCH-DAVIS, R. “Trends in regional cooperation
in Latin America and the Caribbean: he crucial role
of intra-regional trade”. In: TEUNISSEN, J. J. (ed.).
Regionalism and the global economy: he case of Latin
America and the Caribbean. he Hague: FONDAD,
1995.
FRANKEL, J. Regional trading blocs in the world economic system. Washington: Institute for International
Economics, 1997.
HILAIRE, A. & YANG, Y. he United States and the New
Regionalism/Bilateralism. Washington: IMF, 2003.
MANSFIELD, E. D. & MILNER, H. V. “he New Wave of
Regionalism”. International Organization, vol. 53, n° 3,
Summer 1999.
MISTRY, P. “Open regionalism: Stepping stone or millstone toward an improved multilateral system?”. In:
TEUNISSEN, J. J. (ed.). Regionalism and the global
economy: he case of Latin America and the Caribbean.
he Hague: FONDAD, 1995.
67
MIYAMOTO, S. “O Brasil e as Negociações Multilaterais”.
Primeira Versão, n° 93. Campinas: Ifch-Unicamp, 2001.
PIO, C. Relações internacionais: economia política e globalização. Brasília: IBRI, 20002.
PFEIFER, A. “O Nata e a Alca: O caso do México”. In:
ALBUQUERQUE, J. A. G. & OLIVEIRA, H. A. (orgs).
Relações Internacionais e sua Construção Jurídica. São
Paulo: FTD, 1998.
RÊGO, E. C. L. “Do GATT à OMC: O que mudou, como
funciona e para onde caminha o sistema multilateral
do comércio”. Revista do BNDES, vol. 3, no 6. Rio de
Janeiro: Bndes, 1996.
RUGGIE, J. G. Multilateralism Matters: he heory and
Praxis of an Institution Form. New York: Columbia
University Press, 1993.
RUGGIERO, R. “Multilateralismo y regionalismo en el
comercio”. Perspectivas Económicas, vol. 1, no 16, noviembre de 1996.
68
SABBATINI, R. C. Regionalismo, multilateralismo e
Mercosul: Evidência da inserção comercial brasileira após
alguns anos de abertura. Tese de Doutorado. Campinas:
Ie-Unicamp, 2001.
SCHIFF, M. & WINTERS, A. Regional Integration and
Development. Washington: World Bank and Oxford
University Press, 2003.
STALLINGS, B. Global Change, Regional Response: he
new international context of development. Cambridge:
Cambridge University Press, 1995.
WTO - World Trade Organization. International Trade
Statistics. Geneva: WTO, 2001.
YEATS, A. “Does Mercosur’s trade performance
raises concerns about effects of Regional Trade
Arrangements?”. Policy Research Working Paper of the
World Bank, no 1729. Washington: WB, 1997.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
Resenha
Cooperaçãointernacional
paraofimdapobreza
BrunoAyllón
A
Jeffrey Sachs aparecem crí- Rubens Ricupero.
em sua tentativa de subir a escada do
ticas, pela esquerda e pela
O volumoso livro pode ser rapi- desenvolvimento e de outros que já
direita, a uma velocidade in- damente dissecado apesar de seu ta- puseram o primeiro pé ou que, como
versamente proporcional aos avan- manho, que pode assustar o leitor te- no caso da China, sobem os degraus
ços para financiar os Objetivos de meroso de deparar-se com uma obra de três em três. Depois de caracteriDesenvolvimento do Milênio. As confusa, densa e carregada de dados, zar os pobres, quem são e onde estão,
mais recentes, e talvez as mais consis- estatísticas e curvas econométricas. Sachs avança na sua obra graças ao
tentes, são as do economista Jagdish Nada mais afastado da intenção do recurso da história econômica, isto
Bhagwati, autor do livro Em defesa autor, que reconhece abertamente seu é, à análise dos fatores e causas explida globalização, que o acusa de mis- propósito de explicar como poderia cativas da extensão da prosperidade
turar boas intenções com ignorância ocorrer o fim da pobreza e a possibili- econômica desde o século XIX. Se alem sua campanha, cuja conseguns foram muito bem, outros
qüência seria prejudicar as ponão conseguiram prosperar por
pulações que pretende ajudar1.
suas carências em matéria de
O livro que comentamos estieconomia, pelas dificuldades
O fim da pobreza. Como acabar com a
mulou mais ainda estas críticas,
para comercializar, pela ausênmisériamundialnospróximos20anos.
na medida que o economista
cia de tecnologia, pela diminuiJeffreySachs
norte-americano decidiu unir a
ção dos recursos naturais, por
sua campanha para conseguir o
padecer transtornos em forma
CompanhiadasLetras,2005.
aumento da ajuda financeira dide doença ou desastres naturais,
reta à África a estrelas midiátiou por apresentar altas taxas de
cas como o cantor do U2, Bono
crescimento demográfico, denVox, que, além disso, escreve
tre outras causas.
o prefácio ao Fim da Pobreza.
Mas este processo não foi liNesta versão para o Brasil, o encarre- dade que nossa geração tem de erradi- near nem homogêneo. Enquanto uns
gado de prefaciar a obra de Sachs foi cá-la até o ano 2025.
que eram pobres conseguiram crescer,
o ex-secretário-geral da UNCTAD,
Ainda que não se encontre estrutu- outros sofreram uma decadência e alrado assim, o livro contém três partes guns mais, como os países de renda
claramente diferenciadas. Um primei- média da América Latina, se estagnaBruno Ayllón é doutor em Relações
ro bloco, que abrange até o capítulo ram. O principal desafio para todos,
Internacionais pela Universidade
Complutense de Madrid e Pesquisador quarto, nos apresenta um “retrato nos conta Sachs, é superar a armadilha
de família mundial” com diferentes da pobreza, e para isso os países popós-doutoral do MEC/Espanha no
exemplos de países que fracassaram bres tiveram de lançar mão da “econoNUPRI.
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006
69
mia clínica”, isto é, tiveram de recorrer
a uma “economia do desenvolvimento” que nem sempre se caracterizou
pelo rigor, pela perspicácia e pelo sentido prático. Como nos diz o autor,
esta economia se parece bastante com
a medicina do século XVIII, quando
os médicos usavam sanguessugas para
extrair o sangue de seus pacientes. É
do undécimo capítulo e até o final da
obra, Sachs mergulha nas soluções
que devem ser desenvolvidas sobre o
terreno para acabar com a pobreza,
sempre no marco mais amplo dos esforços das Nações Unidas e do Projeto
do Milênio.
O diagnóstico e os caminhos para
atalhar o problema da pobreza são
ter urgente: desenvolvimento agrícola, investimentos em saúde primária,
investimentos em educação, energia/
transporte/comunicações, água potável e saneamento. Também pressiona
a elaboração de estratégias para reduzir a pobreza que devem conter cinco
elementos: um diagnóstico diferencial, um plano de investimentos, um
plano econômico, um plano dos
países doadores e um plano de
Existempaíseseregiõesque,semaajudadacooperação
gestão pública. Sem esquecer a
internacional,continuarãotendoenormesdificuldades
urgência de políticas globais de
parasairdamiséria.Oesforçodomundoricoparaajudaro redução da pobreza que incluam
mundopobretemsidomuitopequenoemcomparaçãocom temas como a dívida, a política
comercial global, o sistema fiosbenefíciosquepodemserobtidos.
nanceiro internacional, a ciência
aplicada ao desenvolvimento e a
uma semelhança que nos faz lembrar meridianamente claros, segundo o au- gestão ambiental.
os programas de ajuste estrutural das tor, e existem motivos para o otimisSachs não é, sem dúvida, o douinstituições financeiras internacio- mo. De uma população mundial de tor Pangloss do Cândido de Voltaire,
nais.
6,3 bilhões de pessoas, quase cinco bi- aquele que vivia no melhor dos munO segundo bloco do livro, entre lhões já alcançaram o primeiro degrau dos possíveis. É plenamente conscieno capítulo quinto e décimo, pode ser do desenvolvimento econômico, e 4,9 te das dificuldades para alcançar o
lido como uma crônica do viajante, na bilhões vivem em países nos quais objetivo de erradicar a pobreza. Sabe
qual Sachs nos narra seu périplo pelo a renda média cresceu entre 1980 e que é possível acabar com o ceticismundo em desenvolvimento e extrai 2000. O grau de amplitude da pobreza mo de quem repete a cantiga de que o
ensinamentos e conselhos de países está se reduzindo, em números abso- mundo rico não deve salvar o mundo
como a Bolívia, a Polônia, a Rússia, a lutos e em porcentagem da população pobre, que a pobreza é um problema
China, a Índia ou o continente africa- mundial. No entanto, existem países e deles, que não é possível fazer nada
no, lugares onde o autor desenvolveu regiões que, sem a ajuda da coopera- enquanto estamos concentrados na
atividades como assessor de diferentes ção internacional, continuarão tendo luta contra o terrorismo internacional
governos em suas desesperadas ten- enormes dificuldades para sair da mi- ou que as elites corruptas dos países
tativas de conseguir estabilizar ou di- séria. O esforço do mundo rico para pobres impedem a chegada da ajuda a
namizar suas respectivas economias. ajudar o mundo pobre é muito peque- seus destinos. Acabar com a pobreza
Este bloco é perfeitamente prescindí- no em comparação com os benefícios é, na visão de Sachs, um problema de
vel se o leitor mais familiarizado com que podem ser obtidos.
vontade política e nunca de ausência
os temas do desenvolvimento econôDo que necessitamos então? Sachs de capacidade técnica.
mico não se encontra com ânimos de assinala os principais instrumentos.
lembrar a história de profecias que se Em primeiro lugar, investir em armas Nota
autocumprem.
de salvação em massa (como medica1
Uma síntese das críticas de
Do ponto de vista do interesse no mentos contra a AIDS, mosquiteiros
Jagdish Bhagwati – “no hay que
atual debate sobre o desenvolvimen- contra a malária e poços para extrair
dar más ayuda a los países pobres”
to, o terceiro bloco do livro é o que água potável). Além disso, como cida– pode ser encontrada em http://www.
mais contribui e onde podem ser en- dãos, devemos exercer nossas obriga- periodistadigital.com/periodismo/object.
contrados alguns elementos originais. ções pressionando os poderes públi- php?o=330393&print=1
Não tanto pela novidade do que se diz cos e os poderes econômicos para que
e sim pela ênfase e o convencimento se comprometam com a luta contra a
com que é dito. Com efeito, a partir pobreza. Cinco atuações teriam cará-
70
CARTA INTERNACIONAL
JULHO 2006