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revista Fronteiras – estudos midiáticos 20(3):321-333 setembro/dezembro 2018 Unisinos – doi: 10.4013/fem.2018.203.05 A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad1 The anti-hero’s journey: An analysis of narrative complexity in Breaking Bad Melina Meimaridis2 melmaridis@hotmail.com Krystal Cortez Luz Urbano2 krystal.cortez@gmail.com RESUMO O artigo visa analisar a questão da complexidade narrativa no drama televisivo Breaking Bad por meio de um olhar exploratório em torno dos arcos narrativos, personagens apresentados em sua primeira temporada e na construção do anti-herói Walter White. Utilizando uma metodologia baseada em uma observação sistemática dos sete episódios da primeira temporada, argumentamos que, embora a produção se utilize de diversos elementos pertencentes à categoria das narrativas complexas, entendemos que a estrutura da série é organizada em torno da tradição da serialização narrativa, em que se alterna elementos de variação e repetição por intermédio de seus personagens e no entrelaçamento de três principais arcos narrativos: câncer, crime e família. ABSTRACT The article aims at analyzing the issue of narrative complexity in the television drama Breaking Bad through an exploratory evaluation of its narrative arcs, characters presented during its first season and in the construction of Walter White as an antihero. Using a methodology based on a systematic observation of the seven episodes of the first season, we argue that, although the production uses several elements belonging to the complex narrative category, we understand that the show’s structure is organized around the tradition of narrative serialization in which elements of variation and repetition alternate through its characters and by intertwining three main narrative arcs: cancer, crime, and family. Palavras-chave: séries televisivas, complexidade narrativa, estrutura da simpatia, anti-herói. Keywords: TV series, narrative complexity, structure of sympathy, anti-hero. Introdução suírem qualidade estética e narrativa. Devido a essa notoriedade, existe atualmente uma literatura acadêmica que aborda esses produtos culturais, analisando todo o circuito de produção, circulação e consumo dessas obras (Jost, 2012; Pérez-Gómez, 2011; Silva, 2014). Notadamente, O consumo da ficção seriada televisiva americana tem aumentado exponencialmente no Brasil e ao redor do mundo. Essas produções têm sido reconhecidas por pos- 1 Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). 2 Universidade Federal Fluminense. Rua Professor Marcos Waldemar de Freitas Reis, s/n, Bloco A, 4º andar, São Domingos, 24210201, Niterói, RJ, Brasil. Este é um artigo de acesso aberto, licenciado por Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC-BY 4.0), sendo permitidas reprodução, adaptação e distribuição desde que o autor e a fonte originais sejam creditados. Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano as séries americanas passaram por diversas modificações desde o surgimento da televisão nos Estados Unidos, principalmente, devido a criação do sistema de televisão a cabo na década de 1970 que permitiu uma maior quantidade de canais competindo pela atenção dos espectadores (Lotz, 2007). Mais recentemente, o surgimento dos veículos de streaming, como a Netflix, tem contribuído para um aumento na quantidade de séries produzidas anualmente, número que em 2018 se aproximará da marca de 500 produções (Goldberg, 2018). Toda essa competição tem levado a uma ampliação, diversificação e reformulação de gêneros e narrativas direcionadas a mídia televisiva e na implementação das mais variadas estratégias para atrair e fidelizar espectadores. Dentre as produções populares dos últimos anos Breaking Bad (AMC, 2007-2013) nos chama a atenção pela forma específica em que o drama constrói sua narrativa complexa (Mittell, 2006, 2015a) através da manipulação de duas lógicas, aparentemente, antagônicas: a inovação e a previsibilidade. Tradicionalmente, a ficção seriada televisiva foi dividida em dois modelos estabelecidos a série – narrativa episódica – e o seriado. Essas produções dependem de um conjunto extenso de fatores direcionados à sua audiência para sobreviverem à imensa competição que existe atualmente no cenário audiovisual global e, em particular, americano (Hilmes, 2002; Magder, 2004; Mittell, 2009). Assim, elas precisam ser capazes de atrair o espectador e mantê-lo interessado ao longo da temporada e dos diversos recessos de sua exibição. Para isso, a televisão americana tem se utilizado de formas e estratégias distintas para produzir as chamadas “Long-Form Narratives”, descritas por Murray et al. como “séries que apresentam vários personagens continuamente e com arcos narrativos que perduram ao longo de múltiplos episódios e até mesmo durante inúmeras temporadas” (2012, p. 1, tradução nossa). Dentre as estratégias mais populares encontra-se obras procedurais3, em que um conjunto de personagens ao longo de diversos episódios realizam alguma tarefa, como salvar uma vida em House M.D. (FOX, 2004-2012). Outra opção é construir uma narrativa mais serializada, com arcos mais longos, focando no desenvolvimento dos personagens como em Mr. Robot (USA, 2015-Presente). Pode-se ainda, criar vilões que os protagonistas devem derrotar a cada temporada, como em The Flash (CW, 2014-Presente). Embora as categorias “série” e “seriado” ainda sejam muito utilizadas, a linha que separa esses modelos tem se tornado mais tênue, à medida que as produções televisivas têm mesclado ambas as lógicas (Ndalianis, 2005; Newman, 2006), no processo intitulado por Mittell (2006, 2015a) de “Complexidade Narrativa”. O seriado americano da emissora AMC, Breaking Bad, é elucidativo para entendermos melhor esse processo e discutirmos algumas das transformações enfrentadas pela ficção seriada televisiva nos últimos anos, especialmente, o boom de narrativas de anti-heróis4. Além de se constituir num dos maiores fenômenos da TV americana dos últimos anos, a série gira em torno da vida de Walter White, um professor de escola pública que, ao descobrir que tem câncer terminal, se envolve com um jovem traficante e começa a utilizar seus conhecimentos de química para produzir metanfetamina. De modo semelhante ao mafioso Tony Soprano de The Sopranos (HBO, 1999-2007) e ao serial killer Dexter Morgan de Dexter (Showtime, 2006-2013) Walter se utiliza de uma série de mecanismos para justificar seus desvios éticos, e, portanto, pode ser considerado um anti-herói (Fahy, 2013; Dietrich, 2015; Mittell, 2015b). Esses três personagens são apenas alguns dos “Homens Difíceis” que têm surgido nos dramas americanos nas últimas duas décadas (Martin, 2014), e que vêm rompendo com a convenção de que protagonistas de ficção seriada televisiva precisariam sempre ser simpáticos, ou em outras palavras, “pessoas que você convidaria para sua casa toda semana” (Mittell, 2015b, p. 74, tradução nossa). Ao mesmo tempo em que a trajetória de anti-herói vivida por Walter agrega camadas de complexidade a narrativa, entendemos que a história que, a princípio, poderia ser classificada como um drama familiar, através do arco narrativo do câncer, se torna muito mais complexa em suas linhas narrativas ao misturar um universo aparentemente cotidiano dos espectadores - a família -, acionando uma sucessão de acontecimentos caóticos provocados pelo envolvimento do protagonista Walter White com o mundo do narcotráfico –, isto é, o mundo do crime. Analisa-se, portanto, a estrutura narrativa de Breaking Bad através de um olhar exploratório em torno 3 Procedural é um modelo narrativo onde os episódios da série apresentam narrativas independentes umas das outras. Cada episódio contém uma situação específica que os personagens principais devem solucionar até o fim do mesmo. Modelo geralmente associado ao gênero dos workplace dramas. 4 Aqui, entende-se que Walter se configura como o herói e protagonista de Breaking Bad. Na narrativa seu personagem se manifesta na forma do arquétipo do anti-herói. 322 Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad dos arcos narrativos e personagens apresentados na trama em sua primeira temporada. Sobretudo, interessa-nos enquanto objeto de reflexão neste artigo, a forma como o drama constrói sua complexidade narrativa. Partimos do pressuposto que, apesar de complexa, a estrutura narrativa da série continua seguindo as tradições da serialização narrativa ao alternar elementos de variação e repetição. Enquanto o primeiro recompensa o espectador, apresentando-o momentos “memoráveis” da série, o segundo se apresenta enquanto estrutura comum, englobando convenções narrativas e de gêneros facilmente reconhecidas e frequentes, acionando a identificação dos espectadores. Para atingir os objetivos propostos, o artigo foi dividido em três partes. Na primeira, apresentamos brevemente a estrutura de serialização das séries ficcionais televisivas americanas. Em seguida, exploramos o boom de anti-heróis nos dramas americanos e acompanhamos a “jornada do anti-herói”5 para conquistar a simpatia do público, especificamente, a partir da trajetória de Walter White e dos outros personagens que movimentam a trama em sua primeira temporada. Por fim, estendermos nossa análise aos três principais arcos previamente identificados na primeira temporada - o câncer, o crime e a família. Nossa aposta é que a complexidade que se apresenta na série é gerada, sobretudo, pela profundidade na qual seus personagens se relacionam através dos arcos narrativos identificados na primeira temporada. A estrutura narrativa das séries televisivas americanas Historicamente as produções seriadas televisivas foram divididas em dois grupos, as séries (narrativa episódica) e os seriados (Porter et al., 2002). As séries contemplam as narrativas episódicas, em que os mesmos personagens aparecem a cada episódio, porém as histórias são independentes, e assim, “os problemas levantados no início de um episódio são resolvidos ao término do mesmo” (Newman, 2006, p.18, tradução nossa). Já no formato seriado, as tramas resistem ao fechamento, e desse modo os mesmos personagens possuem tramas que continuam a cada episódio (Fiske, 1987). Embora ainda se encontre o uso recorrente dessas categorias, a linha que separa esses modelos tem se tornado mais turva, à medida que as produções televisivas têm mesclado ambos os modelos (Newman, 2006; Mittell, 2006, 2015a). Dessa forma outros modelos de serialização têm sido propostos. Um dos principais modelos de serialização televisiva proposto para fugir no binarismo das séries e dos seriados foi elaborado por Omar Calabrese, na obra A Idade NeoBarroca (1999). O autor propõe cinco protótipos para se classificar as produções ficcionais televisivas seriadas, se utilizando de cinco séries americanas para exemplificar seus modelos. São elas: The Adventures of Rin-Tin-Tin (ABC, 1954-1959), Zorro (ABC, 1957-1959), Bonanza (NBC, 1959-1973), Columbo (NBC, 1968-1978) e Dallas (CBS, 1978-1991). O primeiro modelo é marcado pela repetição. Os episódios de Rin-Tin-Tin são independentes e não existe uma história da série. Já o segundo modelo, que toma como exemplo a narrativa de Zorro, se aproxima do primeiro com episódios independentes, entretanto, por ser uma adaptação, a história possui uma temporalidade e espacialidade própria e assim existe um objetivo maior a ser alcançado. O terceiro modelo baseado na série de velho-oeste Bonanza começa a entrelaçar as lógicas seriadas e episódicas, existindo, assim, um plot que será resolvido em cada episódio, enquanto há tramas abertas, que serão resolvidas em alguns episódios (arcos do personagem) e outras que só encontrarão resolução no fim da série. Columbo, seriado policial, tipifica a quarta estrutura apresentada pelo autor. No modelo, um personagem principal se mantém constante, e os episódios são variações em cima de um tema. O quinto modelo, a partir da série Dallas, mistura elementos do terceiro e quarto modelo, ao unir a utilização de arcos com a técnica de uma variável regulável apresentada em Columbo. Embora apresente uma das poucas tipologias existentes acerca da ficção seriada televisiva, a análise de Calabrese peca por sua especificidade e por logo se tornar datada, uma vez que o autor considera que cada novo modelo substitui o anterior, sendo, portanto, cada um, uma evolução do anterior (1999). Por mais que Calabrese considere a existência de um período de transição onde mais de um modelo possa co-existir, Angela Ndalianis propõe que na televisão americana os cinco modelos coexistem (2005, p. 87). Além disso, Ndalianis (2005) ainda indica que uma mesma série pode oscilar entre os modelos dependendo da temporada. Lançando mão do exemplo da sitcom I dream of Jeannie (NBC, 5 Nomeamos de “jornada do anti-herói” o processo pelo qual um anti-herói percorre para conquistar a simpatia do público. Trata-se apenas de um trocadilho com a já consolidada teoria da “Jornada do Herói” proposta por Campbell (2008) e depois mais aprofundada por Vogler (1989). Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos 323 Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano 1965-1970), a autora afirma que apesar de inicialmente se enquadrar no segundo modelo de Calabrese, a sitcom transita para o terceiro modelo ao longo das suas temporadas. A série gira em torno de um astronauta, o Major Nelson (Larry Hagman), que encontra uma “gênia da lâmpada”, Jeannie (Barbara Eden), após retornar de uma missão. O objetivo da gênia é se casar com seu mestre ao longo da progressão da série, porém cada episódio contém histórias independentes que apresentam as confusões que ela causa na vida de Major Nelson e seu amigo, o Major Healey (Bill Daily). De acordo com Ndalianis à medida que Jeannie se aproxima de seu objetivo, a fórmula episódica começa a se fragmentar, e assim arcos entre os episódios começam a ser construídos, como na segunda temporada, quando é revelado que Jeannie não sabia a data de seu aniversário. Ao longo de quatro episódios a gênia e os majores tentam descobrir o dia exato em que ela nasceu e, assim, os episódios vão lentamente deixando de serem independentes. Ao fim da produção Ndalianis observa que a série já havia transitado totalmente para o terceiro modelo (2005, p. 91). Embora tente tornar os modelos de Calabrese mais flexíveis, a análise de Ndalianis ainda peca por sua especificidade, e, portanto, não dá conta de uma das formas mais recentes de narrativas seriadas televisivas denominadas “narrativas complexas” (Mittell, 2006, 2015a). O termo “narrativa complexa” proposto por Jason Mittell, no artigo Narrative Complexity in American Television (2006) e depois melhor explorado em seu livro Complex TV (2015a), propõe que as séries americanas têm passado por um processo de complexificação. Para o autor, esse modelo de narrativa envolve mais do que apenas uma trama serializada, e sim a “redefinição de formas episódicas sob a influência da narração seriada não necessariamente uma fusão da forma episódica com a seriada, mas, sim, um equilíbrio inconstante” (2006, p. 32, tradução nossa). Mittell argumenta que esse processo só foi possível devido aos inúmeros avanços tecnológicos que permitiram aos espectadores assistir os episódios com mais atenção, pausando e revendo-os múltiplas vezes de modo a compreender melhor as pequenas riquezas do roteiro. Paralelamente, a complexidade dessas produções tem tornado os espectadores mais exigentes, visto que o entrelaçamento dos arcos curtos e longos, tem proporcionado a combinação das lógicas episódicas aos prazeres da narrativa seriada. Mittell (2006) indica algumas características das narrativas complexas como o uso de metalinguagem, uso de prolepses e analepses6, foco em anti-heróis, dentre outras inovações. Embora o autor tenha identificado um processo que tem transformado as produções seriadas televisivas, Mittell fornece poucos caminhos metodológicos para se analisar estas narrativas7. Nesse trabalho, buscamos contribuir com a discussão de complexidade narrativa ao argumentar que a complexidade pode ser gerada pela sobreposição e o entrelaçamento de três arcos em Breaking Bad, como argumentaremos mais à frente. Antes, porém, apresentaremos a questão da “jornada do anti-herói” no drama, uma vez que para conquistar a simpatia do espectador a construção do anti-herói irá contribuir para a complexidade da produção. A jornada do anti-herói Ao longo de décadas a televisão americana apresentou narrativas centradas na figura do herói, muitas vezes um médico atencioso que curava seus pacientes, como em Ben Casey (1961-1966) ou um policial competente que capturava os bandidos, como em Dragnet (NBC, 1951-1959). De acordo com Sepinwall os executivos acreditavam que os espectadores não iriam se interessar em acompanhar semanalmente as vidas de “um besta, um bandido, ou pior” (Sepinwall, 2012, p. 33) e, dessa forma, as séries televisivas tinham que envolver protagonistas simpáticos e de fácil reconhecimento (Mittell, 2015b). Entretanto, essa convenção foi se desgastando ao longo dos anos, começando a dar seus primeiros sinais de enfraquecimento na década de 1980 com os dramas institucionais St. Elsewhere e Hill Street Blues que apresentavam médicos e policiais, respectivamente, que se deparavam com sistemas institucionais injustos e corruptos (Holoweiko, 1998; Sepinwall, 2012). Anos depois em 1990 a tendência continuou com o surgimento de Oz (HBO, 1997-2003), série que fugia diretamente 6 Prolepse é “Toda manobra narrativa consistindo em contar ou evocar de antemão um acontecimento ulterior”, em oposição a analepses que é “toda a ulterior evocação de um acontecimento anterior ao ponto da história em que se está” (Genette, 1995, p. 38). 7 Nos últimos anos críticas começaram a serem feitas a categoria de “Narrativas Complexas” proposta por Mittell. Dentre elas, a noção de que “ao congregar numa mesma terminologia diversas tendências narrativas distintas da televisão contemporânea, o autor [Mittell] permite chamar de “narrativamente complexos” seriados que só incorporam uma ou duas destas características [...], tornando-o ao mesmo tempo maleável, redutor, e mesmo cego a certas especificidades” (Araújo, 2015, p. 45). 324 Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad da convenção de “protagonistas simpáticos” ao focar na vida dos presos da prisão Oswald State Correctional Facility. Chris Albrecht, presidente de conteúdo original da Home Box Office (HBO) entre os anos de 1995-1999, justifica a criação do drama ao afirmar que “eu não me importo se os personagens são simpáticos contanto que sejam interessantes” (Albrecht in Sepinwall, 2012, p. 21, tradução nossa). A produção abriu espaço para que, em 1999, o canal lançasse The Sopranos (HBO, 1999-2006) série que acompanhava o dia-a-dia da vida do mafioso Tony Soprano, um homem violento e assombrado por seus diversos desvios éticos e morais. O sucesso de The Sopranos é tido por alguns autores como o marco inicial para o “boom” de dramas de anti-heróis na televisão americana (Martin, 2014). O mafioso Tony Soprano foi seguido pelo policial sem escrúpulos Vick Makye de The Shield (FX, 2002-2008), o serial killer Dexter Morgan de Dexter e pelo publicitário Don Draper de Mad Men (AMC, 2007-2015). O jornalista americano Brett Martin (2014) percebendo a popularidade de narrativas centradas no arquétipo do anti-herói, propõe chamá-los de “Homens Difíceis”, categoria que representaria personagens que colocam em xeque a questão da fragilidade masculina ao apresentar protagonistas que vivem vidas conturbadas, regadas de contendas, disputas, violência e de decisões de moral duvidosa. Apesar de existirem diversas razões para o sucesso dos dramas de anti-heróis, Alberto García (2016) propõe que além de questões contextuais do pós-modernismo e do incremento no número de canais televisivos na televisão Americana, a própria complexificação das estruturas narrativas têm contribuído para esta popularização, visto que a narrativa desprende menos tempo “relembrando enredos”, dessa forma favorecendo que “os conflitos e dilemas se multipliquem, enriquecendo a diversidade moral, emocional e política da história” (2016, p. 55, tradução nossa). Com isso em mente, o autor argumenta que através do entrelaçamento de arcos e o prolongamento das tramas, essas produções conseguem expor os seus espectadores a personagens antipáticos, que serão aprofundados no decorrer dos episódios. Todos esses personagens mencionados acima têm sido abordados pela literatura acadêmica como representantes do arquétipo do anti-herói (Donnelly, 2012; Shafer e Raney, 2012; Wayne, 2014; Castellano e Meimaridis, 2018). Para Vaage (2015), a narrativa de anti-herói estimula o espectador a torcer por um personagem “moralmente falho”, ao mesmo tempo em que ela questiona a orientação positiva do espectador com o anti-herói. Assim, para a autora o espectador se encontra em uma posição constante de conflito interno por estar torcendo por um anti-herói, como, por exemplo, torcer para que um serial killer escape da polícia. Embora haja algumas definições diferentes para este arquétipo, neste artigo iremos trabalhar com a visão endossada por Murray Smith em seu livro Engaging Characters (1995). O autor, intrigado pelos motivos que permitiam aos espectadores sentirem “simpatia” por personagens tão detestáveis, propõe que os espectadores firmam alianças morais ambíguas com um anti-herói, pois estes conheceriam suas ações e suas motivações (Smith, 1995). De acordo com Smith (1995), para o personagem conseguir conquistar a “simpatia” de um espectador, é preciso acionar três níveis de engajamento que, compõem assim, o que o autor denomina como Estrutura da Simpatia. O primeiro nível depende do reconhecimento do personagem pelo espectador. Geralmente, tal reconhecimento ocorre, em grande parte, através de características físicas e, em menor escala, com características psicológicas dos personagens da trama. Já o segundo nível depende de informações adicionais (e desconhecidas) lançadas pouco a pouco na trama acerca do personagem principal. Essas informações promovem certo tipo de aproximação entre o espectador e o personagem e, quando isso ocorre, os espectadores se alinhariam com o personagem. O último e terceiro nível de engajamento, onde o espectador reconhece as decisões morais e visões ideológicas dos personagens, através do conhecimento prévio (atingido no segundo nível) das situações que circundam suas decisões, é denominado aliança. Smith (1995) argumenta que uma vez que esses três níveis de engajamento forem acionados – reconhecimento, alinhamento e aliança –, ocorre um aumento substancial no potencial de engajamento do espectador, que resultará num tipo de contrato de comunicação (aliança baseada na simpatia) entre espectadores e anti-heróis. Visando firmar essa aliança, Smith (1999) argumenta que a narrativa comumente apresenta personagens moralmente inferiores ao protagonista, como em Mad Men, o mau comportamento de Don Draper é visto em comparação com as ações mais imorais de outros personagens, como as manipulações de Pete Campbell. Mittell enxerga que esta justaposição do anti-herói com um personagem mais imoral contribui para “ressaltar as qualidades mais redimíveis do anti-herói” (2015a, p.75, tradução nossa). A moralidade relativa pode ser observada em The Sopranos no episódio “Second Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos 325 Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano Opinion” (T03:EP07 8) quando, por exemplo, Tony ameaça a vida do médico que vem negligenciando Junior, seu tio idoso que está com câncer. Para Smith, se separarmos apenas esta cena entre Tony e o médico “não há nenhuma dúvida de que Soprano aparece como o personagem mais simpático, em grande parte por razões morais” (2011, p.78, tradução nossa). O espectador, ao acompanhar o desenrolar da cena, apoia a atitude de Tony, que seria justificada pelo fato do Dr. Kennedy não estar cumprindo seu dever como médico. Entretanto, deve-se observar que para Vaage (2014), a questão do espectador visualizar um personagem como moralmente inferior a outro perpassa questões para além das atitudes propriamente ditas. Para a autora, a familiaridade com um personagem torna o espectador predisposto a concordar com ele. Vaage ao abordar o mesmo exemplo de “Second Opinion” argumenta que “o médico pode ser arrogante e negligente com seus pacientes, mas enquanto Junior recebe o tratamento adequado, isso não é um crime; entretanto, intimidar com ameaças de violência é” (2014, p.268, tradução nossa). Assim, a autora propõe que quanto mais familiar o espectador é com um anti-herói, mais ele irá se esforçar para justificar seus desvios éticos e morais. Contudo, observa-se que a aliança firmada entre o espectador e o anti-herói é conflituosa uma vez que o espectador (re)conhece as atitudes imorais dos anti-heróis. Este tipo de aliança só é possível devido a alguns fatores. Primeiro, o conhecimento de informações intimas, como, por exemplo, saber que Dexter testemunhou a morte violenta de sua mãe quando pequeno e que agora como adulto faz justiça com as próprias mãos contribui para que os espectadores relativizem diversas ações imorais do personagem. Segundo, os amigos e familiares dos anti-heróis são recorrentemente usados como certa justificativa de suas atitudes moralmente questionáveis, como, Tony Soprano mandar matar alguém que está colocando sua família em perigo. Paralelamente, os laços familiares permitem ao anti-herói expor seu: lado paterno – Dexter cuidando dos filhos de Rita Bennett –, lado romântico – o relacionamento “duradouro”9 entre Tony e Carmela, sua esposa –, e lado altruísta – Walter White chantageando Gretchen e Elliott Schwartz obrigando-os a deixar uma elevada quantia para seus filhos após sua morte (T05:EP16). É importante ressaltar que essa aliança não é incondicional, como argumenta García (2016). Tendo em vista a estrutura proposta por Smith e sua articulação com o drama Breaking Bad, pode se dizer que a partir do instante em que a série apresenta Walter White como protagonista e, consequentemente, o público o reconhece enquanto tal, o primeiro nível de engajamento descrito pelo autor é atingido. Walter é um homem que sempre seguiu as regras e aceitou sua condição ordinária de vida, porém, ao descobrir que está com câncer em estágio avançado, se revolta e começa a tomar medidas mais reativas em relação ao seu destino. O personagem se vê obrigado a tomar uma atitude antes impensável: entrar no mercado do tráfico em sua cidade, com o objetivo de deixar um legado para a família após sua morte. Walter então se alia a um ex-aluno e traficante local, Jesse Pinkman, visando produzirem e, posteriormente, distribuírem metanfetamina. Na medida em que as situações e assuntos obscuros que cercam a vida de Walter são apresentados e os espectadores conseguem enxergar os valores morais e éticos do personagem, o alinhamento com o protagonista ocorre e, posteriormente, a aliança passa a ser alcançada. Decerto, seja numa relação extensiva ou intensiva10 em termos de engajamento do público, o espectador é cada vez mais convocado pelas narrativas complexas a legitimar a própria existência dos personagens, como pode se perceber a partir da estrutura de análise em questão. A princípio, Walter White se mostra um personagem muito humano, lutando com sua consciência acerca da decisão de não combater o câncer que lhe acomete e tornar-se efetivamente um traficante. A narrativa apresenta uma versão de Walter que se preocupa deveras com sua família, 8 Ao longo do trabalho citamos alguns episódios específicos utilizando a seguinte nomenclatura: T=temporada; EP=episódio. Assim, T03:EP07 seria o sétimo episódio da terceira temporada. 9 Tony e Carmela Sopranos se conhecem no colegial e começaram a namorar. Quando a série começa, eles já estão casados há muitos anos, apesar das brigas, traições e dificuldades enfrentadas pelo casal. 10 “A relação extensiva é aquela que não é característica desse fã, mas do telespectador normal, eventualmente um apreciador da série. Ele assiste, pode acompanhar a série e pode até colecionar algumas imagens, por motivos estéticos ou emocionais, mas isso não quer dizer que ele se entregue a algum tipo de exegese especial desse material ou mesmo da série. Já a relação intensiva implica uma atitude exegética que exige uma outra relação do fã com a série, com as personagens e com o material visual relativo a elas. Para começar, esse fã é capaz de retomar várias vezes o mesmo episódio, as mesmas sequências e cenas. Enfim, o episódio, a temporada e a série passam a constituir um corpus fechado, permitindo várias formas de interpretação expressas nas manipulações que vão se sucedendo a cada retomada das imagens” (Gomes, 2007, p. 334). 326 Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad o que justificaria suas atitudes moralmente incorretas, dentro de uma lógica ocidental. O espectador tem a chance de acompanhar a transformação do personagem ao longo dos episódios da primeira temporada. Esse personagem, assim como Tony Soprano e Dexter Morgan, demonstra como personagens com moral duvidosa vêm ganhando destaque nas narrativas seriadas televisivas, sendo aceitos amplamente pelo público contemporâneo como legítimos protagonistas (Kotsko, 2012; Martin, 2014). Ainda é importante salientar que os demais personagens em Breaking Bad auxiliam na construção de uma imagem de Walter White como um anti-herói controverso, que seria vítima do mundo e das circunstâncias da vida (Mittell, 2015b). Neste sentido, torna-se imperioso nos perguntarmos como exatamente os demais personagens contribuíram na construção discursiva da figura do protagonista. Para fins de análise, apresentaremos os personagens principais da trama articulados a três eixos fundamentais, a saber: o câncer – a família – o crime. No primeiro eixo, temos como figura fundamental o protagonista da série, Walter White. Já no segundo eixo, apresenta-se o núcleo familiar da série, composto pela esposa do protagonista – Skyler –, o filho do casal – Walter Jr. –, e seus cunhados, Hank e Marie, completando assim, o núcleo familiar de Walter. No âmbito do crime, temos o personagem de Jesse Pinkman, como figura chave que propicia as ferramentas que Walter White precisa para alcançar seus fins, representando um contraponto a figura “politicamente correta” de Walter, apresentada nessa primeira temporada da série. Como parte do eixo família, temos a figura fundamental de Skyler White, a esposa grávida do protagonista e, portanto, vulnerável aos olhos do marido. Porém Skyler não se visualiza enquanto uma mulher frágil. Pelo contrário: ela se apresenta não só como a mãe de Walter Jr, mas como “mãe de todos” em sua família. Ela é controladora e autoritária, chegando até a ameaçar a masculinidade do marido. Ela constantemente se envolve nas questões do filho e do seu esposo, buscando solucionar os problemas deles. Skyler representa para Walter a razão de suas atitudes e assim justifica a trajetória criminosa do personagem. Assim, Walter não estaria na vida do crime porque quer ganhar dinheiro; ele estaria de fato preocupado com sua família e, ao tentar suprir sua ausência iminente, comete inúmeros delitos em nome de tal objetivo “nobre”. Desse modo, Skyler contribui para uma visão mais humana de Walter. Seu papel na narrativa é muito mais do que uma simples esposa e mãe, uma vez que os atos de Walter são justificados e racionalizados principalmente na figura de Skyler. Walt Junior, juntamente com sua mãe também é apresentado na trama como um rapaz vulnerável, uma vez que possui uma deficiência ao falar e anda de muletas. É um personagem com pouco destaque na primeira temporada, entretanto, sempre aparece nas cenas de rotina e de cotidiano familiar. O personagem é núcleo de atenção nas diversas cenas de refeições da série, servindo como elo para a completa caracterização da família de Walter White. Walt Junior é revoltado com a vida e com todos, sofre bullying na escola por conta de suas deficiências e considera seu pai um covarde por não proporcionar melhores condições de vida para sua família. Walt Jr. possuí uma função clara em relação ao seu pai: ele humaniza as atitudes de seu pai, tornando Walter apenas um pai preocupado e dedicado, em detrimento a figura de traficante que mata pessoas usando seus conhecimentos de química. Walter Junior (assim como Skyler) representa para Walter White, os fins para sua trajetória. O casal Hank e Marie completa o núcleo familiar de Walter. Hank é um policial da D.E.A. (Drug Enforcement Administration), e impulsiona a narrativa para frente, uma vez que é através dele que Walter tem a ideia de entrar para o tráfico local. Além disso, Hank sempre está próximo da descoberta da “segunda profissão” de Walter; o personagem vai encontrando pistas e, lentamente, monta o quebra-cabeça complexo do esquema de produção e distribuição de metanfetamina na cidade. Desse modo, o personagem é o principal criador de conflitos para Walter. Por outro lado, Hank também vive uma relação interna conflituosa entre ser um homem da lei e um homem que tira proveito da lei. Dessa maneira, o personagem cria uma prerrogativa para tornar complexas as questões de ética e moral dentro da narrativa. Assim, a instituição policial cuja qual Hank faz parte é questionada ao longo dos episódios, uma vez que a dualidade entre bem vs mal/certo vs errado é colocada em xeque. Da mesma forma, a esposa de Hank, também contribui para essa problematização. Marie é irmã de Skyler e se apresenta como a irmã e esposa perfeita, sendo aquela que tomou as decisões mais “acertadas” na vida, quando comparada a Skyler. A personagem possui uma condição de vida melhor que a da irmã mais velha, visto que é casada com um policial renomado. Entretanto Marie esconde um segredo: ela possui impulsos cleptomaníacos. Desse modo, tanto Marie quanto Hank servem para amenizar as atitudes desviantes de Walter, uma vez que em determinados momentos eles se apresentam como personagens mo- Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos 327 Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano ralmente inferiores11 (Smith, 1999) ao protagonista, estabelecendo, desta forma, uma linha nebulosa entre os ideais de certo e errado na narrativa. Sobretudo, os personagens que possuem uma “aura” de perfeição e de integridade, tal como Hank e Marie, também possuem uma dupla face, uma dualidade de caráter, assim como o protagonista. Assim, são personagens que abrem caminho, pouco a pouco, para versões mais corruptas e obscuras de Walter ao longo das demais temporadas. Por fim, no eixo crime temos Jesse Pinkman, representando os meios para se alcançar os fins. Jesse cumpre a função de “sidekick” de Walter, ele conhece bem os negócios (usuários e fornecedores), tem os contatos das ruas que Walter tanto precisa para obter sucesso como traficante. Jesse é isolado dos outros personagens, porque não se encaixa na utopia de perfeição que Walter e Skyler e, também, Hank e Marie, tanto buscam aparentar. Assim, Jesse possui uma relação muito diferenciada com Walter e os demais personagens da trama: não só se configura no parceiro de Walter no crime, mas antes de tudo, um pupilo controverso de Walter, representando o outro lado do jogo. Além disso, o personagem ainda possui uma função cômica dentro da narrativa, cortando os momentos carregados de tensão com seus comentários sarcásticos e ácidos acerca das dificuldades encontradas por eles para entrar na vida do tráfico. Jesse desempenha então o que James Francis (2010) chama de Serious Relief. Seriam momentos onde a tensão é tanta que o espectador necessita de um corte (alívio) nela para que depois a tensão possa voltar a aumentar (Francis, 2010). Jesse cumpre essa função na narrativa, se mostrando um personagem primordial para o desenvolvimento da trama e, sobretudo, de evolução da trajetória do protagonista. Assim, cada personagem de Breaking Bad tem uma função em relação ao protagonista, como Skyler e Walt Jr. que justificam as atitudes de Walter, tornando-o mais simpático ao olhar do público. Ou Jesse Pinkmam, que proporciona a Walter os meios para conseguir entrar no mercado de metanfetamina da cidade e deixar um legado financeiro para sua família. Ainda existem Marie e Hank que ajudam a problematizar a questão entre o “certo e o errado”, criando uma brecha para as atitudes de Walter serem mais facilmente digeridas pelo público. Desse modo, a narrativa como um todo converge para que os espectadores firmem uma aliança moralmente ambígua com Walter White. Dos arcos narrativos em Breaking Bad: análise do caso Muitos autores ao analisarem o drama americano Breaking Bad recorrem a expressão narrativa complexa para descrever a produção, visto que o drama se utiliza de uma riqueza de mecanismos narrativos como as cold openings12, as prolepses e analepses, a presença de um anti-herói como protagonista, além de outros recursos que agregariam “complexidade” ao storytelling. A série ainda é construída a partir da premissa de uma narrativa “puzzle”, em que os espectadores vão aos poucos desvendando os mistérios do universo, recebendo sempre apenas pedaços de um extenso e complexo quebra-cabeça. Através de uma observação sistemática dos sete episódios da primeira temporada (e seus personagens) de Breaking Bad, identificamos os principais arcos narrativos que movimentam a trama inicial do drama. Propomos que Breaking Bad é organizado a partir de uma estrutura “simples” por meio do entrelaçamento de apenas três arcos principais. O uso da palavra simples para categorizar a estrutura narrativa da série não deve, de forma alguma, desmerecer sua organização narrativa, a palavra é apenas usada para ressaltar que o drama Breaking Bad continua a longa tradição da serialização narrativa que opõe duas lógicas antagônicas: a repetição e a variação. Assim, na primeira fase da investigação, encontramos três principais arcos narrativos sobressalentes na narrativa: câncer, crime e família13. Tais arcos relacionam-se entre si e representam no âmbito da 11 Ao longo do drama outros personagens de moral mais duvidosa que Walter aparecem como Gustavo Fring, Tuco Salamanca, Lydia Rodarte-Quayle, Mike Ehrmandtraut, dentre tantos outros. 12 Teaser rápido e chocante, utilizado para chamar a atenção do público e convencê-lo a continuar assistindo. 13 Em sua dissertação de mestrado João Araújo (2015) trabalha com a noção de “fios”, “trama” e “tecido” narrativos, e identifica a presença de 13 fios ao longo das 5 temporadas de Breaking Bad. Na primeira temporada da série Araújo identifica quatro fios: (1) vida de Walter no mundo do tráfico, (2) vida familiar do protagonista, (3) as investigações de Hank ao caso Heisenberg e os impactos delas sobre a vida do agente, (4) descoberta por Skyler da cleptomania da irmã e modo como ela reage a essa descoberta. Neste trabalho optamos por trabalhar apenas com a noção de arco narrativo, e identificamos três arcos na primeira temporada, porém, é possível encontrar semelhanças com a pesquisa de Araújo: tanto o primeiro quanto o terceiro fios fazem parte do nosso arco do Crime, enquanto o segundo e quarto fios fazem parte do nosso arco da Família. A principal diferença da nossa proposta aqui é lidar com o Câncer como um arco que também impulsiona a narrativa para a frente. 328 Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad trama três funções principais: causa (eixo - câncer), meios (eixo - crime) e fins (eixo - família). A partir dessa análise preliminar, elaboramos uma tabela comentada (em Google docs)14 com os dados que obtivemos na observação sistemática, com a compilação do desenvolvimento de cada arco e como eles se entrelaçam em cada um dos episódios ao longo da primeira temporada da série. Por fim, na terceira e última fase, optamos por um recorte mais preciso para a investigação proposta. Por isso, selecionamos três episódios (dentre os sete) da temporada analisada, divididos em três tabelas respectivas: o primeiro episódio (piloto), o quarto episódio e o quinto episódio. Os episódios escolhidos para a análise ilustram de um modo bastante eficiente as funções dos três arcos narrativos previamente identificados na temporada analisada. Conforme observamos na Tabela 1, os três arcos são visualizados logo no primeiro episódio da série, sendo observada uma predominância dos arcos crime e família. O arco câncer, embora apareça brevemente no episódio, possui uma importante e dupla função nesse momento inicial: de introdução do “problema” do protagonista ao espectador e também de inserção do arco do crime em movimento na narrativa. No começo do primeiro episódio, nenhum dos personagens tem conhecimento sobre o câncer, e termina com apenas Walter possuindo essa informação. Ao mesmo tempo, apenas Jesse e Walter sabem dos planos ilegais do protagonista. A produção então brinca com os níveis de informação que cada personagem possui, da mesma forma como apresenta e esconde informações do espectador. O drama se utiliza dos segredos/ mistérios de diversos modos como forma de atribuir certa ambivalência a figura do anti-herói. A esfera do segredo é indicada por Dietrich (2015) como sendo fundamental dos dramas de anti-herói, visto que: A outra parte da existência do protagonista é vivida na esfera do segredo relativo ou absoluto, consistindo em ações socialmente desviantes e ilícitas (muitas vezes sob a forma de uma carreira criminal alternativa), e precisa ser mantida tanto fora do alcance da instituição doméstica e social da família e do lar como escondida das instituições do Estado, particularmente dos agentes policiais. A esfera secreta está, portanto, ligada de maneira complexa ao público e ao domínio doméstico, en- 14 quanto precisa permanecer invisível para ambos de modo que não sejam sujeitos às forças de controle que demandam conjuntamente transparência (Dietrich, 2015, p. 196-197, tradução nossa). Ao término do piloto, os espectadores acreditam que Krazy-8 e seu primo estão mortos dentro do trailer. No segundo episódio é revelado que eles ainda estão vivos. Observa-se que a figura de Krazy-8 e seu primo servem para relativizar as ações e decisões de Walter, se configurando como personagens moralmente inferiores ao protagonista. A relação existente entre os arcos crime e família pode ser ilustrada no primeiro sinal de empoderamento por parte do protagonista, presente nesse episódio. Logo no princípio da trama, nota-se que Walter tem tido dificuldades no relacionamento com sua esposa, uma vez que Skyler assume um papel de liderança no relacionamento. No entanto, ao adentrar para o mundo do crime, Walter retoma sua posição de autoridade e, consequentemente, melhora sua vida pessoal (e sexual) com a esposa. Através de uma atividade desviante, ele ganha a confiança necessária, se empodera como “homem” no seu relacionamento com Skyler e como “marido” na dinâmica familiar. No quarto episódio, observou-se um maior desenvolvimento dos arcos câncer e crime, em detrimento ao arco família (Tabela 2). De fato, a família de Walter fica em segundo plano no episódio e, desse modo, o arco que representaria os “fins” para as ações de Walter, recebe menos destaque, configurando-se, portanto num episódio de transição na temporada, onde as “causas” e os “meios” recebem mais enfoque. O episódio começa com Walter compartilhando a informação de seu câncer com a família. Ao longo da trama, a questão dos melhores métodos para seu possível tratamento é debatida abertamente por todos da família. A família de Walter quer que ele receba o tratamento, mesmo sabendo o seu alto custo. Walter, entretanto, não está tão certo de que essa é a melhor opção, uma vez que sua mulher está grávida e o tratamento não garante a cura do câncer, muito menos a sua sobrevivência. Novamente, o arco do câncer coloca as atividades criminosas de Walter em movimento, as quais chegarão ao ápice no episódio seguinte, com Walter retornando aos negócios com Jesse. Já o personagem de Jesse ganha destaque nesse episódio, não só por conta da maior ênfase no eixo Tabela completa disponível em: https://bit.ly/2QJPAmt Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos 329 Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano Tabela 1. Análaise dos arcos narrativos do primeiro episódio de Breaking Bad. Table 1. Analyzes of the narrative arcs of the first episode of Breaking Bad. Câncer Crime Família Descoberta do câncer. Notícia sobre o tráfico de metanfetamina na televisão durante a festa de aniversário Walter White. Café da manhã em família. Decisão de esconder. Walter participa de uma operação policial, na qual ele vê Jesse, seu ex-aluno, fugindo. Festa de aniversário de Walter. Walter procura Jesse e faz a proposta da parceria. Vida sexual ruim com Skyler. Walter rouba material escolar e Jesse compra o trailer. Compras no shopping. Walter perde a cabeça com uns jovens que estão zombando de Walt Jr. Jesse e Walter cozinham metanfetamina no deserto. Walter volta pra casa e melhora sua vida sexual com a esposa. Jesse procura Krazy-8 e é obrigado a levá-lo até o Walter. Conflito no deserto, que acaba com 1 morto e 1 inconsciente. Tabela 2. Análise dos arcos narrativos do quarto episódio de Breaking Bad. Table 2. Analyzes of the narrative arcs of the fourth episode of Breaking Bad. Câncer Crime Família Walter revela pra família que está com câncer. Investigação policial se aproxima de Walter. Hank acredita que existe um novo fornecedor de metanfetamina. Churrasco com a família na casa de Walter. Família discute o câncer. Jesse com os amigos usando drogas. Jesse começa a ter alucinações. Volta para a casa de seus pais. Família se reúne a noite. Skyler liga pros médicos e descobre o alto preço do tratamento. Walter leva o dinheiro da venda de metanfetamina pro banco e pede um cheque pra poder pagar pelo tratamento. Walter e Skyler vão ao oncologista. Jesse recebe ligação de um amigo que quer comprar metanfetamina. Walter e Skyler conversam, Walter se mostra relutante ao tratamento. Jesse procura Walter para cozinharem novamente. Walter recusa a proposta. Jesse entrega dinheiro para Walter. Jesse é expulso de casa. Walter põe fogo num carro. crime, mas também pelo foco nos conflitos internos do personagem, até então, desconhecido do espectador. É dada ênfase na relação conflituosa que Jesse mantém com seus pais, sua amizade sincera com o irmão caçula e seu drama individual no circuito dos narcóticos, como usuário 330 e traficante. Neste episódio, apresenta-se de maneira mais evidente o conflito individual do personagem, formalizando outra imagem do personagem, mais humanizada, para além da questão traficante/usuário, tal como apresentada até então nos episódios anteriores. Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos A jornada do anti-herói: uma análise da complexidade narrativa em Breaking Bad Outrossim, neste mesmo episódio, Walter White é levado ao extremo por conta dos fatídicos acontecimentos do seu cotidiano. O momento em que Walter explode um carro no posto de gasolina é similar ao instante no primeiro episódio em que Walter surta com seu chefe no lava-jato. Ambos os momentos, apresentam Walter sendo levado ao limite pelas constantes ofensas e humilhações pelas quais é submetido ao longo de sua vida. A narrativa então apresenta Walter como um homem que apenas está se defendendo contra as injustiças diárias. Essa forma de apresentar o protagonista, o torna digno de certa admiração e identificação por parte do público, pois como Silverblatt (2007) aponta, “existe uma necessidade das pessoas tomarem para si o controle de suas vidas, acessando o mito cultural americano do individualismo bruto e da autodeterminação” (Silverblatt, 2007, p. 12, tradução nossa). Assim, todos esses acontecimentos, concatenados, auxiliam no engajamento do público para com a causa de Walter. O quinto episódio explora a reação da família de Walter White quanto à notícia do seu câncer (Tabela 3). Após descobrirem o estado de saúde de Walter e o fato de que ele não quer gastar o pouco dinheiro que possuem com um tratamento custoso, os familiares do protagonista resolvem promover uma reunião familiar, tendo em vista mudarem o posicionamento do protagonista quanto ao tratamento. Após a discussão com sua família, Walt resolve ceder e aceitar o tratamento, entretanto, para arcar com os custos do tratamento, volta a procurar Jesse para produzirem a metanfetamina. Por outro lado, Jesse não consegue reproduzir a qualidade da droga que ele e Walter fizeram no primeiro episódio, e percebe que precisa de Walter novamente, culminando no retorno da parceria dos dois, interrompida após o fracasso no deserto no primeiro episódio e o assassinato de Krazy-8 e seu primo no episódio seguinte. Neste episódio, especificamente, os três arcos mostram como a linha entre eles é extremamente tênue. Nele demonstra-se como uma decisão familiar (arco família) impacta as atividades criminosas que Walter está envolvido (arco do crime). Essa relação próxima entre os arcos já foi mencionada acima, ocorrendo desde o início com o arco do câncer, que impulsiona para frente o arco do crime. Com efeito, os três arcos estão conectados ao protagonista e, desse modo, as decisões que se passam na realidade de Walter afetam não só a sua vida, mas também dos demais personagens, promovendo mudanças em todo o universo narrativo da série. Ao longo dos sete episódios da primeira temporada é possível observar a alternância entre a decisão de Tabela 3. Análise dos arcos narrativos do quinto episódio de Breaking Bad. Table 3. Analyzes of the narrative arcs of the fifth episode of Breaking Bad. Câncer Crime Família Antigo sócio de Walter oferece pagar pelo tratamento (indiscrição). Jesse procura emprego, mas o serviço é horrível. Decide voltar a cozinhar sem o Walter. Walter e Skyler vão a festa de antigos amigos de Walter. Família tenta convencer Walter a fazer o tratamento. Jesse cozinha metanfetamina com seu amigo, mas ela não fica boa. Walter briga com Skyler por ter contado para Gray (ex-sócio de Walter) sobre o câncer. Walter recusa fazer o tratamento. Jesse resolve fazer de novo e mesmo assim não fica boa. Café da manhã em família, Walt Jr. e Skyler estão bravos com Walter por não aceitar a oferta do Gray. Walter fala pra Skyler que vai fazer o tratamento, e faz um MRI. Jesse quer jogar a metanfetamina fora, mas seu amigo o impede, ele vai embora. Walt Jr. é detido ao tentar comprar cerveja, pede ajuda pra Hank. Walter procura Jesse pra eles voltarem a cozinhar. Skyler conta pra Hank que não era Walt. Jr. que estava usando maconha e sim Walter. Walter chega em casa e sua família que conversar com ele. (INTERVENÇÃO). A família vai com Walter ao hospital. Vol. 20 Nº 3 - setembro/dezembro 2018 revista Fronteiras - estudos midiáticos 331 Melina Meimaridis, Krystal Cortez Luz Urbano Walter de entrar para a vida criminosa, se deparar com contratempos, e desistir da decisão. Desse modo, o que é apresentado inicialmente como uma atitude inexplicável e surpreendente, vai aos poucos se tornando mais plausível e previsível. Ao mesmo tempo, os momentos de excesso de raiva de Walter, como o surto dele com seu chefe ou a decisão de explodir o carro vão aos poucos se repetindo na trama – lógica da previsibilidade – enquanto as decisões que fogem do controle do protagonista acionam a lógica da inovação, fornecendo, assim, conflitos para a narrativa. Considerações finais O drama Breaking Bad estipula em sua primeira temporada os principais personagens e arcos narrativos que irão movimentar o drama até seu fim, na quinta temporada. Os três arcos mencionados – câncer, família e crime – revezam o papel central dentro dos episódios dessa temporada. Tomada como um todo, a estrutura de Breaking Bad recorrentemente é exaltada por sua complexidade, porém a estrutura da produção revela uma sobreposição de três grandes arcos que, ao serem entrelaçados, exigem mais esforço por parte do roteiro e do espectador. Desse modo, o drama consegue elaborar uma proposta muito atraente do ponto de vista da serialização, visto que brinca com as fronteiras dos arcos desenvolvidos dentro da trama. Um dos grandes exemplos desse jogo entre variação e repetição está relacionado ao conhecimento ou desconhecimento de informações importantes entre os personagens e, consequentemente, dos espectadores. Assim, nota-se que desde o princípio a série trabalha com uma economia de informações, apresentando no decorrer dos episódios como os personagens lidam com as informações que vão se revelando. O segredo das atividades criminosas de Walter também é explorado ao longo de toda a série, com cada personagem tendo a oportunidade de descobrir e reagir à tal novidade inesperada. Dessa forma, o espectador tem a oportunidade de ver e rever as mesmas situações (repetição) relacionadas a outros personagens e em outros contextos narrativos específicos (variação). A utilização de um anti-herói como protagonista também serve como outro fator de variação e repetição. Primeiro, pode-se configurar como uma inovação visto que em 2008, quando a série foi lançada, a televisão americana estava apenas começando a ser povoada por esse arquétipo narrativo, com Walter White se juntando a Tony Soprano, Dexter Morgan e Don Draper, alguns dos poucos anti-heróis presentes na televisão no início dos 332 anos 2000. Ao mesmo tempo, pode-se configurar como repetição uma vez que o anti-herói precisa conquistar a simpatia do público, visto que os espectadores e o anti-herói formam uma aliança conflituosa, e para isso a narrativa se utiliza de recapitulações e analepses para lembrar e revelar informações sobre as motivações e o passado do protagonista. Por fim, defendemos que o universo narrativo de Breaking Bad depende muito da construção discursiva ocorrida nos episódios de sua primeira temporada, uma vez que os principais conflitos são apresentados e muito bem estruturados nela, conforme vimos ao longo do artigo. Estes logo mais serão trabalhados e retrabalhados ao longo das outras temporadas. O seriado então investe grande parte do tempo narrativo da primeira temporada construindo esses conflitos ao apresentar os três arcos principais que, a nosso ver, estão intimamente conectados e que continuarão sendo desenvolvidos ao longo das outras quatro temporadas do drama, apenas encontrando resolução ao término da produção. Referências ARAÚJO, J.E.S. de. 2015. Crystal blue persuasion: a construção do mundo ficcional no seriado televisivo Breaking Bad. Salvador, BA. Dissertação de mestrado, Universidade Federal da Bahia, 167 p. CALABRESE, O. 1999. A Idade Neobarroca. Lisboa, Edições 70, 216 p. CAMPBELL, J. 2008. 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