ANÁLISE DE ATITUDES DE ALUNOS
UNIVERSITÁRIOS EM RELAÇÃO À ESTATÍSTICA
POR MEIO DA TEORIA DE RESPOSTA AO ITEM
Analysis of attitudes of university students in relation
to statistics through the Theory of Response to item
Claudia Turik1 Lori Viali2 João Feliz Duarte de Moraes3
Resumo: O presente estudo faz uma análise das respostas fornecidas por uma amostra de 360 graduandos à Escala de Atitudes em relação à Estatística (EAE). Para tanto, o ajuste do Modelo de Resposta
Gradual da Teoria de Resposta ao Item foi efetuado no software PARSCALE. A escala apresentou
parâmetros de discriminação dos itens (ai) indo de moderado a alto. Os parâmetros de dificuldade dos
itens (bi) mostraram que a proposição de mais fácil concordância por parte dos alunos foi referente à
tensão sentida, pelos mesmos, durante as aulas de estatística. As variáveis que mostraram influenciar
no nível de atitudes foram: área de estudo, autopercepção de desempenho na disciplina e reconhecimento da aplicabilidade da estatística. Esses resultados sugerem que sejam adotadas estratégias para
desenvolvimento de um ambiente de ensino-aprendizado estimulante, agradável, e que reforce as
aplicações da estatística no contexto do curso de cada estudante.
Palavras-chave: Educação estatística. Teoria de Resposta ao Item.
Abstract: In this study we analyze the responses provided by a sample of 360 students at a private
university in a Scale of Attitudes towards Statistics (EAE) test. The fit of the Graded Response Model
of the Item Response Theory was made using the software PARSCALE. The scale showed the discrimination of items (ai) going from moderate to high level. The parameters of difficulty of the items
(bi) showed that the proposition of easy agreement on the part of students was effected by the tension
felt doing statistics classes. The variables that showed significance in the level of influence attitudes
were: area of study, self-perception of performance in the discipline and the applicability of statistics.
These results suggest that strategies have to be adopted to develop an environment for teaching and
learning that is exciting and enjoyable, and to enhance the applications of statistics in the context of
the subject for each student.
Keywords: Statistics Education. Item Response Theory.
1
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS). Rua Eng. Alfredo, 475,
Centro. Rio Grande, RS, Brasil. 96.201-460. claudia.turik@riogrande.ifrs.edu.br
2
Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática, Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS, Brasil.
3
Departamento de Estatística, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS, Brasil.
231
Ciência & Educação, v. 18, n. 1, p. 231-243, 2012
Turik, C.; Viali, L.; Moraes, J. F. D.
Introdução
Em muitos estudos da área educacional o interesse recai sobre variáveis que não
podem ser observadas diretamente por se tratarem de características implícitas pessoais. Variáveis dessa natureza são chamadas de traços latentes. Não sendo observável, o traço latente
necessita ser inferido com base em variáveis secundárias, observáveis, e que estejam relacionadas a ele. Para isso, frequentemente é utilizado um conjunto de itens que compõem um instrumento de medida.
No contexto da educação estatística, o conjunto de atitudes dos alunos com relação a
esta disciplina tem se mostrado uma variável significativa para a compreensão dos fatores que
influenciam o processo de ensino-aprendizagem. Um estudante com atitudes positivas em
relação à disciplina de estatística tem maior probabilidade de sucesso na sua aprendizagem. Se
apresentarmos atitudes favoráveis ao objeto de estudo, provavelmente, estaremos mais motivados para a aprendizagem (BRAGHIROLLI; PEREIRA; RIZZON, 1999).
As atitudes representam um esquema mental, não observável, que atua como mediador entre o pensamento e o comportamento. Trata-se, portanto, de um traço latente, o qual
pode ser estimado a partir de instrumentos de medida, como a Escala de Atitudes em Relação
à Estatística (EAE) (CARZOLA et al., 1999).
Pasquali (2003) coloca que a modelagem estatística utilizada na estimação de traços
latentes, chamada de Teoria Clássica dos Testes (TCT), apresenta algumas restrições quanto a
sua aplicação para medidas de outros traços que não aptidões, o caso da medida de atitudes,
onde não existem respostas certas ou erradas. A TCT é centrada na explicação do resultado
final de um teste dado pela soma dos escores brutos obtidos em seus itens. Esta teoria apresenta limitações que podem ser solucionadas pela Teoria de Resposta ao Item (TRI), também
chamada de teoria psicométrica moderna.
A Teoria de Resposta ao Item foi construída a partir da ideia de traços latentes. Ela é
composta de uma família de modelos matemáticos que fornecem a probabilidade de determinada resposta a um item ser escolhida. A resposta depende dos parâmetros que caracterizam o
item e do nível do respondente quanto ao traço latente que está sendo medido. No caso de uma
escala de atitudes, a TRI procura formas de representar a relação entre a probabilidade de um
indivíduo concordar com um item, as características do item e a atitude enquanto traço latente,
variando de mais favorável para mais desfavorável. O processo psíquico das atitudes do sujeito
é a causa da expressão comportamental indicada por este na escolha da resposta ao item.
O impacto causado pela TRI se deve ao fato de ela superar várias limitações da Teoria
Clássica dos Testes, de modo que:
1 O cálculo dos parâmetros de dificuldade e discriminação de um item passa a ser
independente da amostra que foi utilizada;
2 A avaliação do traço latente dos sujeitos passa a ser independente do instrumento
utilizado para medi-la;
3 Cada item é analisado em particular, independentemente do restante dos itens que
compõem o instrumento de medida;
4 O traço latente passa a ser mensurado com maior precisão, pois são atribuídos
pesos diferentes para itens com características distintas.
5 A TRI oferece uma medida de precisão para cada nível de traço latente (informação
do teste).
232
Ciência & Educação, v. 18, n. 1, p. 231-243, 2012
Análise de atitudes de alunos universitários ...
Este estudo tem por objetivo analisar as atitudes dos estudantes do terceiro grau em
relação à estatística por meio da TRI, explorando os diferentes aspectos possibilitados pelo
uso desta teoria.
Escala de Atitudes em Relação à Estatística (EAE): A escala é do tipo Likert e
sua composição compreende vinte itens, dez relacionados a atitudes positivas e dez relacionados a atitudes negativas em relação à estatística. Cada item conta com quatro alternativas:
discordo totalmente (um), discordo (dois), concordo (três) e concordo totalmente (quatro).
Modelo de Resposta Gradual: O modelo da TRI utilizado neste estudo para a
análise dos dados foi o Modelo de Resposta Gradual (MRG), proposto por Samejima (1969).
Ele é adequado para analisar os dados da Escala de Atitudes em relação à Estatística, pois a
mesma é composta de itens com respostas politômicas e ordenadas.
Supondo que os escores das categorias de resposta de um item i estejam dispostos em
ordem crescente, e denotando por k = 0, 1, 2,..., mi onde (mi + 1) é o número de categorias do
i-ésimo item, a probabilidade de um indivíduo j escolher uma determinada categoria k no item
i pode ser dada pela equação (1).
Pi,k (θj) =
1
1+e
- Da j (θj - b i.k )
Com: i = 1, 2,..., i
-
j = 1, 2,... , n
1
1+e
- Da j (θ j - b i.k+1 )
k = 0, 1, 2,..., mi
(1)
bi,1 < bi,2 < ... < bi,m
Onde:
i: Número de itens do teste;
j: Número de respondentes;
θj: Atitudes em relação à estatística do j-ésimo indivíduo (traço latente);
ai: Parâmetro discriminação do item i. Representa a capacidade do item de
diferenciar indivíduos com diferentes níveis do traço latente.
bi,k: Parâmetro de dificuldade da k-ésima categoria do item i. Pode ser particionado
em dois termos, sendo bi o parâmetro de dificuldade geral do item. Um item é considerado
tanto mais difícil quanto maior for o nível de traço latente que o sujeito necessita apresentar
para aceitá-lo;
D: Constante equivalente a 1 para a curva logística ou a 1,7 para obter a aproximação
para a distribuição normal.
Método
A amostra foi constituída de trezentos e sessenta alunos, regularmente matriculados
em uma disciplina de estatística de uma universidade particular gaúcha no segundo semestre
de 2006. Os participantes responderam à Escala de Atitudes em relação à Estatística (EAE) de
Carzola et al. (1999) e a um questionário composto de oito questões que visavam obter informações sobre os mesmos. A participação foi opcional e precedida de uma explicação a respeito do caráter não avaliativo da referida pesquisa.
Para proceder à análise via TRI, foi utilizado o software PARSCALE (2003).
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Resultados e discussão
A idade dos alunos da amostra variou entre 17 e 56 anos, com média de 23,59 e
desvio-padrão de 6,89 anos. Com relação ao gênero, 42,58% dos entrevistados foram do gênero masculino e 57,42% do gênero feminino. Quanto à ocupação, 37,99% dos avaliados estavam apenas estudando, 28,21% eram estagiários e 33,80% exerciam algum trabalho remunerado. A maior parte dos alunos estava cursando a disciplina pela primeira vez, porém 18,44% já
haviam sido reprovados na disciplina, cancelado ou desistido de cursá-la antes do seu término
em semestres anteriores.
Os entrevistados foram agrupados de acordo com a respectiva área de conhecimento
do seu curso. As frequências são apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1. Frequências por área de conhecimento
Área do conhecimento
Ciências Sociais Aplicadas
Ciências Biológicas
Ciências Humanas
Ciências Exatas
Total
Cursos selecionados
Alunos
Percentual (%)
Administração de empresas, relações públicas.
Biologia
Educação, psicologia, geografia.
Engenharia
160
63
106
31
360
44,4
17,5
29,4
8,6
100,0
Fonte: Dados de pesquisa.
Uma minoria dos alunos acredita não haver nenhuma aplicação da estatística no cotidiano (8,06%), porém, quando estes são tomados em conjunto com os alunos que consideram
que exista pouca aplicação da estatística em problemas reais, este percentual chega a 52,22%
de alunos que não percebem uma grande contribuição prática do aprendizado de estatística.
Em relação ao desempenho na disciplina de estatística, 24,44% dos alunos o consideraram
fraco, 37,78% regular e 37,78% bom.
A pontuação média, em termos de escore bruto (TCT), alcançada na Escala de Atitudes em Relação à Estatística foi de 47,91 pontos (desvio-padrão = 11,20), variando de vinte a
oitenta pontos. Tomando o ponto médio da escala (cinquenta pontos) como ponto de corte,
tem-se que 56,39% dos alunos apresentaram atitudes desfavoráveis, enquanto 43,61% apresentaram atitudes favoráveis em relação à estatística.
Para a aplicação do Modelo de Resposta Gradual de Samejima (1969) da TRI, foram
verificados seus pressupostos teóricos do MRG, a saber: unidimensionalidade e independência local.
A dimensionalidade da EAE foi verificada com uma análise fatorial exploratória da
escala (método dos fatores principais), rotação ortogonal varimax, adotando-se, para a extração dos fatores, o critério de autovalores maiores que um. O modelo produziu dois fatores
relacionados aos vinte itens da escala utilizada. O modelo obtido explicou 64,05% da variância total, com o primeiro fator responsável por 53,02% da explicação da variância total, e o
segundo, por 11,03%. A estatística KMO (Kaiser-Meyer-Olkin), utilizada como medida de
ajuste da amostra foi de 0,96 e o Teste de Esfericidade de Bartlett forneceu uma estatística de
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Análise de atitudes de alunos universitários ...
teste, χ2, significativa ao nível de 0,01, indicando que a técnica de análise fatorial estava adequada para analisar a escala.
A Tabela 2 mostra que foram encontrados dois fatores relacionados às atitudes: o
primeiro com itens relacionados a atitudes favoráveis e o segundo relacionado a atitudes desfavoráveis.
Tabela 2. Cargas fatoriais dos itens
Cargas fatoriais
Itens
Fator 1
Fator 2
Eu gosto realmente de estatística.
A estatística me faz sentir seguro (a) e é, ao mesmo tempo, estimulante.
A estatística é fascinante e divertida.
A estatística é uma das matérias que eu realmente gosto de estudar na faculdade.
Eu tenho uma reação definitivamente positiva com relação à estatística: Eu gosto e
aprecio essa matéria.
A estatística é algo que eu aprecio grandemente.
Eu me sinto tranquilo (a) em estatística e gosto muito dessa matéria.
Eu fico mais feliz na aula de estatística do que na aula de qualquer outra matéria.
Eu acho a estatística muito interessante e gosto das aulas de estatística.
O sentimento que tenho com relação à estatística é bom.
“Dá um branco” na minha cabeça e não consigo pensar claramente quando estudo
estatística.
Eu tenho sensação de insegurança quando me esforço em estatística.
A estatística me faz sentir como se estivesse perdido (a) em uma selva de números
e sem encontrar a saída.
Pensar sobre a obrigação de resolver um problema estatístico me deixa nervoso (a).
Eu encaro a estatística com um sentimento de indecisão, que é resultado do medo
de não ser capaz em estatística.
A estatística me deixa inquieto (a), descontente, irritado (a) e impaciente.
Eu nunca gostei de estatística e é a matéria que me dá mais medo.
Eu fico sempre sob uma terrível tensão na aula de estatística.
Eu não gosto de estatística e me assusta ter que fazer essa matéria.
Quando eu ouço a palavra estatística, eu tenho um sentimento de aversão.
0,81
0,81
0,81
0,79
0,78
-
0,75
0,72
0,72
0,72
0,55
-
0,80
-
0,79
0,78
-
0,75
0,73
-
0,73
0,69
0,68
0,65
0,62
Fonte: Dados de pesquisa.
8
8
O diagrama de declividade (scree plot) possibilita a visualização gráfica dos dois fatores
com autovalores acima de um (Figura 1).
Para satisfazer o postulado da unidimensionalidade, é suficiente admitir que haja uma
dimensão dominante no conjunto de itens (PASQUALI, 2003), o caso do modelo obtido, que
forneceu um fator principal responsável por 53,02% da explicação da variância total. Visto
que o teste pode ser considerado unidimensional, assume-se que somente as atitudes em
relação à estatística constituem um fator de influência nas respostas dos itens, determinando a
independência local.
O parâmetro θ, que representa o traço latente, pode assumir, teoricamente, qualquer
valor entre e + . É preciso, portanto, estabelecer uma origem e uma unidade de medida
para definição da escala de atitudes. Estes valores são determinados de forma a representar,
respectivamente, a média e o desvio-padrão das atitudes dos alunos em relação à estatística.
No presente estudo usou-se uma escala com média igual à zero (µ = 0) e desvio-padrão igual
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a um (θ = 1). Vale ressaltar que os valores referentes ao nível de atitudes em relação à estatística não possuem um significado prático, o importante são as relações existentes entre seus
pontos. As estimativas dos parâmetros do traço latente variaram de -3,00 a 3,34, distribuídos
de acordo com a Figura 2.
Figura 1. Diagrama de declividade.
12
Autovalor
10
8
6
4
2
1
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
Número do componente
Fonte: Dados de pesquisa.
Figura 2. Histograma dos escores latentes.
40
Frequência
30
20
10
0
-3,00
-2,00
-1,00
0,00
-1,00
escores latentes
Fonte: Dados de pesquisa.
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2,00
3,00
19
20
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Uma das características que refletem a qualidade de um item é o seu poder de discriminar sujeitos com magnitudes distintas no traço latente avaliado. A investigação de cada um
dos itens da EAE mostrou os parâmetros de discriminação (a-i) variando entre 0,81 (item 1) e
2,24 (item 20). De acordo com as categorias sugeridas por Baker (2001 apud ALBUQUERQUE; TRÓCCOLI, 2004), o nível de discriminação dos itens variou de moderado a muito
alto (Tabela 3).
Tabela 3. Classificação dos itens da EAE de acordo com seus índices de discriminação
Discriminação
Moderada
Alta
Muito alta
Pontos de corte
Itens
0,65 a 1,34
1,35 a 1,69
1,70 ou mais
1, 2, 6, 7, 8, 10, 13, 16, 17
3, 4, 5, 9, 11, 12, 15, 18
14, 19, 20
% de itens
45
40
15
Fonte: Dados de pesquisa.
Os itens 14 (Eu gosto realmente de estatística), 19 (Eu me sinto tranquilo (a) em estatística e
gosto muito dessa matéria) e 20 (Eu tenho uma reação definitivamente positiva com relação à estatística: Eu
gosto e aprecio essa matéria) são aqueles que melhor discriminam a população quanto ao nível de
atitudes em relação à estatística.
Os itens 1 (Eu fico sempre sob uma terrível tensão na aula de estatística), 7 (Eu tenho sensação
de insegurança quando me esforço em estatística) e 10 (A estatística me faz sentir como se estivesse perdido(a)
em uma selva de números e sem encontrar a saída) são os que menos discriminam a população quanto
ao traço latente.
As estimativas do parâmetro de dificuldade do item (bi) estão na mesma escala que as
estimativas do traço latente (θ). Os valores obtidos apontam que o item 18 (Eu fico mais feliz na
aula de estatística do que na aula de qualquer outra matéria) é o que requer atitudes mais intensamente favoráveis para que o aluno esteja de acordo com ele (bi = 2,24). A Figura 3 mostra quatro
curvas, representando cada uma das quatro categorias de resposta possíveis para o item 18.
Tais curvas são chamadas de Curvas Características do Item e mostram a relação, dada pela
equação (1), entre a probabilidade de escolha em cada categoria de resposta e o nível de
atitudes em relação à estatística. Percebe-se que, mesmo indivíduos com um nível razoável de
atitudes positivas frente à estatística, têm maior probabilidade de discordar do que de concordar com sua proposição: A probabilidade de concordância com o item 18 (curva 3) torna-se
superior à probabilidade de discordância (curva 2) somente para indivíduos com traço latente
(θ) superior a 1,2. Ainda, a probabilidade de um sujeito concordar plenamente com o item 18
é superior às probabilidades das demais categorias somente para indivíduos com traço latente
extremamente alto (θ >3).
O motivo da dificuldade de concordância com esse item, por parte dos alunos, provavelmente se deve ao fato de os participantes cursarem outros cursos que não o de graduação
em estatística, tendo outros interesses principais. Como forma de aproveitar a motivação dos
alunos por outras disciplinas, é conveniente que os professores de estatística busquem integrar
o conhecimento construído ao longo do semestre com as demais disciplinas que os alunos
cursam, adaptando e contextualizando os conteúdos.
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Turik, C.; Viali, L.; Moraes, J. F. D.
Em situação oposta, o primeiro item (Eu fico sempre sob uma terrível tensão na aula de
estatística) foi com o que os alunos mais facilmente concordaram (bi = - 0,56). Para reverter este
quadro, os docentes devem procurar estabelecer um ambiente aprazível em sala de aula. Silva
et al. (2002) colocam a importância da experiência agradável de aprendizagem no desenvolvimento das atitudes positivas em relação à estatística, e sugerem como meios de alcançá-la o
uso de estratégias estimulantes e desafiadoras, com a utilização adequada de pacotes computacionais estatísticos.
Figura 3. Curva das categorias de resposta do item 18.
1,0
probabilidade de resposta
0,8
0,6
0,4
0,2
0
-3
-2
-1
0
traço latente
1
2
3
Fonte: Dados de pesquisa.
A Tabela 4 mostra os itens ordenados do mais fácil ao mais difícil. Percebe-se que os
itens com que os alunos mais facilmente concordam remetem ao afeto negativo, enquanto os
itens mais difíceis estão ligados ao afeto positivo.
Um teste é caracterizado pelos itens que o compõem. Os itens envolvidos devem ser
suficientes para possibilitar que o instrumento seja informativo nos diferentes níveis da escala
de escore latente. Considerando os vinte itens aos quais foi ajustado o Modelo de Resposta
Gradual, analisou-se a Curva de Informação do Teste (Figura 4). A curva com linha contínua
mostra que a EAE fornece maior quantidade de informações para alunos com intensidade de
atitudes variando de – 2,00 a 2,81. A curva com linha tracejada mostra que as atitudes são mais
precisamente mensuradas, com menor erro, no mesmo intervalo, de -2,00 a 2,81. Dos sujeitos
participantes deste trabalho, 3,33% possuem traços latentes abaixo de - 2,00 e 0,83% acima de
2,81.
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Tabela 4. Índices de dificuldade dos itens ordenados
Itens
b
01. Eu fico sempre sob uma terrível tensão na aula de estatística.
17. Eu nunca gostei de estatística e é a matéria que me dá mais medo.
02. Eu não gosto de estatística e me assusta ter que fazer essa matéria.
13. Eu encaro a estatística com um sentimento de indecisão, que é resultado do medo de não ser capaz
em estatística.
10. A estatística me faz sentir como se estivesse perdido(a) em uma selva de números e sem encontrar
a saída.
12. Quando eu ouço a palavra estatística, eu tenho um sentimento de aversão.
08. A estatística me deixa inquieto(a), descontente, irritado(a) e impaciente.
07. Eu tenho sensação de insegurança quando me esforço em estatística.
06. “Dá um branco” na minha cabeça e não consigo pensar claramente quanto estudo estatística.
09. O sentimento que tenho com relação à estatística é bom.
16. Pensar sobre a obrigação de resolver um problema estatístico me deixa nervoso(a).
03. Eu acho a estatística muito interessante e gosto das aulas de estatística.
14. Eu gosto realmente de estatística.
20. Eu tenho uma reação definitivamente positiva com relação à estatística: Eu gosto e aprecio essa
matéria.
11. A estatística é algo que eu aprecio grandemente.
19. Eu me sinto tranquilo(a) em estatística e gosto muito dessa matéria.
05. A estatística me faz sentir seguro(a) e é, ao mesmo tempo, estimulante.
04. A estatística é fascinante e divertida.
15. A estatística é uma das matérias que eu realmente gosto de estudar na faculdade.
18. Eu fico mais feliz na aula de estatística do que na aula de qualquer outra matéria.
- 0,56
- 0,49
- 0,44
- 0,28
- 0,25
- 0,24
- 0,18
- 0,13
- 0,07
- 0,02
0,00
0,09
0,56
0,62
0,66
0,67
0,75
0,85
0,86
1,27
Fonte: Dados de pesquisa.
Informação
Figura 4. Curva de Informação do Teste.
30
0,51
25
0,41
20
0,31
15
0,21
10
0,10
5
0
-3
-2
-1
0
1
2
3
0
escores latentes
Fonte: Dados de pesquisa.
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Para verificar se a análise TRI fornece indícios de diferença no nível de atitudes em
relação à estatística estimadas pelo escore latente entre grupos distintos de alunos, foram
procedidas análises de variância. Nos casos em que foram detectadas diferenças, os dados
foram submetidos ao teste post-hoc de Tukey. Os critérios para o agrupamento dos sujeitos
(fatores) foram baseados nas respostas dadas ao Questionário do Aluno. Foram estes: diferentes gêneros, áreas de estudo, níveis de conhecimento da utilidade da estatística no cotidiano e
níveis de desempenho autopercebido na disciplina de estatística. Os resultados estão dispostos na Tabela 5.
Tabela 5. ANOVA para as variáveis: número de créditos, aplicabilidade da estatística e percepção do
desempenho (escores latentes)
Média
Desviopadrão
Feminino
Masculino
- 0,02a
- 0,02a
Ciências sociais aplicadas
Ciências biológicas
Ciências humanas
Ciências exatas
Variável
F
p
0,89
1,06
0,00
0,979
- 0,21a
- 0,12ab
0,22b
0,38b
0,97
0,80
1,10
0,72
6,34
< 0,001
Não conheço nenhuma aplicação na realidade - 0,75a
Pouca aplicação em problemas reais
- 0,26b
Há muita aplicação no cotidiano
0,32c
principalmente em pesquisas
1,01
0,89
0,94
26,30 < 0,001
Fraco
Regular
Bom
0,90
0,78
0,89
60,70 < 0,001
Respostas
Gênero
Área de estudo
Aplicabilidade da estatística
Percepção do desempenho
- 0,75a
- 0,01b
0,53c
Fonte: Dados da pesquisa.
Nota: Médias com letras diferentes diferem estatisticamente ao nível de 5% de significância - Teste de Tukey.
O agrupamento dos participantes revelou que não houve diferença significativa entre
as atitudes dos estudantes do gênero masculino e feminino. Esses resultados são semelhantes
aos das pesquisas de atitudes em relação à estatística, tais como as de Mendes (2003); Silva et
al. (2002); Vendramini e Brito (2001); Quintino, Guedes e Martins (2001) e Silva (2000).
Quando as áreas de estudos são analisadas como fator de possível influência, percebe-se que os estudantes da área de ciências sociais aplicadas apresentaram atitudes mais desfavoráveis do que os alunos de ciências exatas e humanas (F = 6,74; p < 0,001). Em média, as
ciências exatas tiveram atitudes mais favoráveis em relação à estatística, seguidas das humanas,
biológicas e ciências sociais aplicadas, porém as demais diferenças não foram estatisticamente
significativas. As pesquisas anteriores não mostraram consenso em seus resultados, sendo
que, por vezes, não foram verificadas diferenças significativas entre as áreas (VENDRAMINI;
BRITO, 2001; QUINTINO; GUEDES; MARTINS, 2001), e, por vezes, a área de humanas
240
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Análise de atitudes de alunos universitários ...
foi apontada como tendo atitudes mais desfavoráveis (SILVA, 2000; SILVA et al., 2002). Um
motivo a ser considerado para esta discrepância é o de que os critérios de escolha e agrupamento dos cursos de graduação em áreas de conhecimento são distintos conforme a pesquisa,
fazendo com que uma mesma área de conhecimento seja representada por cursos diferentes
ou com que um mesmo curso pertença a categorias diferentes de áreas do conhecimento.
O fato de a média das atitudes em relação à estatística dos alunos de exatas ser
superior à dos demais pode ser consequência de um melhor relacionamento que estes alunos
têm com a linguagem matemática. Existem livros com foco na parte conceitual da estatística,
sem o uso de fórmulas matemáticas (DANCEY; REIDY, 2006; MAGNUSSON; MOURÃO,
2003), abordagem essa que pode ser adotada completa ou parcialmente por professores de
disciplinas voltadas para os cursos de outras áreas científicas.
As atitudes dos alunos que reconhecem o uso da estatística no cotidiano tendem a ser
mais positivas dos que as atitudes dos alunos que conhecem poucas aplicações, e estas mais
positivas do que as atitudes dos alunos que desconhecem quaisquer aplicações (F = 25,15; p
< 0,001). Esse resultado está de acordo com os estudos revisados que se propuseram a averiguar tal relação (SILVA, 2000; QUINTINO; GUEDES; MARTINS, 2001; VENDRAMINI;
BRITO, 2001). Para reforçar a aplicabilidade da estatística, Vendramini e Brito (2001) sugerem
que as aulas sejam iniciadas com a exposição de técnicas aplicadas e com a discussão de
pesquisas já concluídas na área de interesse do estudante. A introdução dos conceitos teóricos
da estatística ficaria para um segundo momento, visando o desenvolvimento de atitudes positivas dos alunos e consequente aumento da predisposição para o aprendizado.
A autopercepção dos alunos quanto a seu desempenho na disciplina é uma variável
importante na análise das atitudes. O grupo de alunos que se percebe com bom desempenho
também é aquele que possui atitudes mais positivas, da mesma forma que o grupo que se
percebe com desempenho fraco tem atitudes significantemente menos positivas. (F = 65,32; p
< 0,001). Este resultado é condizente com estudos anteriores (SILVA; CARZOLA; BRITO,
1999; QUINTINO; GUEDES; MARTINS, 2001; VENDRAMINI; BRITO, 2001; MENDES, 2003). As atitudes positivas dos estudantes podem ter influenciado no seu desempenho
ao longo da disciplina, ao mesmo tempo em que um bom desempenho pode ter levado ao
desenvolvimento de atitudes mais favoráveis.
Considerações finais
O ensino de estatística tem tido sua importância reconhecida, ao passo que sua prática se dá desde o Ensino Fundamental até grande parte dos cursos universitários. Em um
âmbito geral, o aprendizado desta ciência é necessário para que a população tenha entendimento crítico das informações quantitativas que têm sido divulgadas por diversos canais de
comunicação. De modo mais específico, os profissionais devem saber recorrer aos dados provenientes de pesquisas de suas áreas, para a busca de informação útil e confiável.
Instrumentos de avaliação como a EAE permitem um diagnóstico inicial das atitudes
dos alunos de uma nova turma, possibilitando uma ação estratégica do professor no decorrer
do curso. A melhoria das atitudes em relação à matéria influirá no ambiente da aula, no aprendizado dos alunos e na predisposição dos mesmos ao uso da estatística no futuro.
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Turik, C.; Viali, L.; Moraes, J. F. D.
O reconhecimento do estudante quanto à utilidade do conteúdo e a sua autopercepção de desempenho na disciplina são fatores que se mostram relacionados com as atitudes em
relação à estatística. Como tal, estes devem ser explorados pelos docentes e instituições de
ensino, favorecendo uma visão integrada e adaptável do ensino de estatística de acordo com o
contexto de cada curso.
Um resultado relevante obtido com a análise psicométrica da EAE por meio do Modelo de Resposta Gradual foi a diversidade das características dos itens avaliados (parâmetros
de discriminação e de dificuldade dos itens), indicando um ganho de precisão na aferição das
atitudes por meio da TRI em relação à soma de escores brutos da TCT.
Entretanto, a Curva de Informação do Teste mostra que há necessidade de outros
estudos testando a inclusão de novos itens visando obter um questionário que se configure
como um instrumento com maior capacidade de discriminar estudantes com níveis de atitudes
bastante baixos (atitudes desfavoráveis).
É importante a busca continuada por formas de desenvolver o ensino de estatística
levando em conta os aspectos afetivos envolvidos neste processo. Vêm contribuir com tal
objetivo, novos estudos que analisem possíveis fatores de influência nas atitudes em relação à
estatística não explorada neste trabalho, tais como a opinião de amigos/parentes e características da instituição de ensino e do professor.
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Artigo recebido em 18/02/2011. Aceito em 30/09/2011.
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