Desigualdade: o flagelo do Brasil (Adriana Cruz, Daniel Sarmento, Roger R. Rios, orgs.). São Paulo: Migalhas., 2022
Nossa linha de investigação é inspirada na noção de “justiça reprodutiva” desenvolvida originalme... more Nossa linha de investigação é inspirada na noção de “justiça reprodutiva” desenvolvida originalmente por Afrodescendentes feministas na América do Norte (Ross e Solinger 2017). Reagindo contra séculos de controle opressivo de suas práticas reprodutivas, ativistas forjaram essa noção para sublinhar seu direito não só de ter filhos se e quando os querem, mas também, o direito a condições dignas para criar os filhos que parem. Olhar para a justiça reprodutiva significa levar em consideração a complexidade de dinâmicas interseccionais de classe, raça, geração e gênero em jogo nas formas de injustiça e discriminação agindo contra um contingente não-negligenciável da população. Mais importante ainda, chama atenção à dimensão política das rotinas reprodutivas que, de outra forma, passaria despercebida, apagada pelas representações naturalizantes de gênero e família tão presentes no imaginário público (ver Villalta 2021).
Haveria muitos temas a explorar em relação à radical desigualdade social, econômico e político que vivenciamos todos os dias no Brasil e suas repercussões materiais e simbólicos para a vida familiar. Resolvemos nos concentrar aqui num assunto que, embora exista há tempo, parece ter se exacerbado ultimamente com as circunstâncias da pandemia: o que chamamos as maternidades “interditadas” isto é, aquelas maternidades enredadas na retirada compulsória de um bebê de seus genitores e a anulação irrevogável não só do vínculo, mas da própria identidade familiar. A seguir, damos uma ilustração concreta do assunto em pauta.
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Claudia Fonseca - Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Brasil
Diana Marre - Universitat Autònoma de Barcelona – Espanha
Fernanda Rifiotis - Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Brasil
As pesquisas aqui apresentadas revelam complexos arranjos de convivência entre diversos atores presentes nos espaços periféricos. Atores estatais fornecem serviços em áreas como saúde, educação e assistência social, porém com graus variados e seletivos de intervenção e eficácia. No mesmo espaço, A expansão de mercados criminais—hoje hegemonizados, em São Paulo, pelo Primeiro Comando da Capital—divide espaço com os resultados das políticas de expansão do acesso a crédito e a mercados de consumo dos anos 2000. Apesar da queda significativa na taxa de homicídios, a atuação das forças de segurança pública se tornou cada vez mais violenta e a sensação de insegurança permanece difusa. Não menos importante, ONGs e movimentos sociais seguem importantes e adotam estratégias inovadoras na busca por resolver problemas, velhos e novos, nos espaços periféricos.
A série dos Seminários Mapeando Controvérsias, iniciada em 2013, tem contribuído para a difusão de trabalhos pioneiros e novos experimentos etnográficos envolvendo os debates sobre simetrização, hibridismo, distribuição de agência, redes sociotécnicas, multiespécies, tecnossocialidades, biossocialidades, os quais representam, por sua vez, um amplo e diversificado conjunto de desafios que, no nosso entender, configuram um campo de tensões aporéticas contemporâneas para a produção antropológica. Uma primeira publicação de resultados dos nossos Seminários foi o dossiê “Simetrização, Hibridismo e Agência na Antropologia”, publicado na Revista Ilha (volume 17, n. 2, 2015), organizado por Theophilos Rifiotis, Jean Segata e Oscar Calavia Saez. Um segundo desdobramento dos nossos Seminários foi a publicação dos trabalhos apresentados, em 2016, no IV Seminário Mapeando Controvérsias Contemporâneas na Antropologia, no formato de livro, sob os auspícios editoriais da Associação Brasileira de Antropologia, com apoio do CNPq, CAPES e FAPESC – esse livro, intitulado “Políticas Etnográficas no Campo da Cibercultura”, foi organizado por Jean Segata e Theophilos Rifiotis.
A presente obra é composta de seis capítulos, todos inscritos num esforço que os aproxima, para além da diversidade dos recortes temáticos e dos distintos referenciais teóricos. Rompendo com os debates epistemológicos, todos os trabalhos aqui publicados trazem uma marca comum: a problematização, a fricção ontológica, na feliz expressão cunhada por Frédéric Keck, Ursula Regehr e Saskia Walentowitz (2008, p. 35) na Introdução ao dossiê “Anthropologie: le tournant ontologique en Action”. Trata-se de um conjunto de trabalhos que operam, a partir de referências particulares, com o desdobramento das multiplicidades – as “políticas ontológicas”, de que falava John Law (2014, p. 143) – e que mantêm, sem dúvida, forte relação com os trabalhos de Eduardo Viveiros de Castro, Marilyn Strathern, Isabelle Stengers e Bruno Latour, dentre outros autores que vêm contribuindo para esse grande projeto antropológico. Portanto, não se trata de uma simples reunião de trabalhos voltados a uma temática específica: nosso projeto editorial supõe que cada leitor, conforme seus interesses, possa encontrar, num ou noutro destes capítulos, cruzamentos com suas próprias pesquisas. Nesse sentido, o presente livro foi concebido com a ambição de servir a diferentes leitores – não exclusivamente do campo antropológico – que estejam interessados em dispor de um mapeamento plural das controvérsias contemporâneas na antropologia e, a partir daí, ampliar e aprofundar seus próprios argumentos e modos de fazer seus trabalhos etnográficos.
vasto material existente na Antropologia sobre
a adoção transnacional de crianças. Nosso
objetivo não é duplicar as informações apresentadas
em resenhas disponíveis em publicações
especializadas (p. ex., Howell, 2009a;
Ouellette e Belleau, 2001; Terrell e Modell,
1994), e, sim, demonstrar como esse material
enriquece debates não só sobre família, filiação
e parentesco, mas também sobre desigualdade
e violência, sobre tecnologias de governo em
um mundo globalizado e sobre subjetividades
variantes diante de dinâmicas multiculturais.
Claudia Fonseca - Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Brasil
Diana Marre - Universitat Autònoma de Barcelona – Espanha
Fernanda Rifiotis - Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Brasil
As pesquisas aqui apresentadas revelam complexos arranjos de convivência entre diversos atores presentes nos espaços periféricos. Atores estatais fornecem serviços em áreas como saúde, educação e assistência social, porém com graus variados e seletivos de intervenção e eficácia. No mesmo espaço, A expansão de mercados criminais—hoje hegemonizados, em São Paulo, pelo Primeiro Comando da Capital—divide espaço com os resultados das políticas de expansão do acesso a crédito e a mercados de consumo dos anos 2000. Apesar da queda significativa na taxa de homicídios, a atuação das forças de segurança pública se tornou cada vez mais violenta e a sensação de insegurança permanece difusa. Não menos importante, ONGs e movimentos sociais seguem importantes e adotam estratégias inovadoras na busca por resolver problemas, velhos e novos, nos espaços periféricos.
A série dos Seminários Mapeando Controvérsias, iniciada em 2013, tem contribuído para a difusão de trabalhos pioneiros e novos experimentos etnográficos envolvendo os debates sobre simetrização, hibridismo, distribuição de agência, redes sociotécnicas, multiespécies, tecnossocialidades, biossocialidades, os quais representam, por sua vez, um amplo e diversificado conjunto de desafios que, no nosso entender, configuram um campo de tensões aporéticas contemporâneas para a produção antropológica. Uma primeira publicação de resultados dos nossos Seminários foi o dossiê “Simetrização, Hibridismo e Agência na Antropologia”, publicado na Revista Ilha (volume 17, n. 2, 2015), organizado por Theophilos Rifiotis, Jean Segata e Oscar Calavia Saez. Um segundo desdobramento dos nossos Seminários foi a publicação dos trabalhos apresentados, em 2016, no IV Seminário Mapeando Controvérsias Contemporâneas na Antropologia, no formato de livro, sob os auspícios editoriais da Associação Brasileira de Antropologia, com apoio do CNPq, CAPES e FAPESC – esse livro, intitulado “Políticas Etnográficas no Campo da Cibercultura”, foi organizado por Jean Segata e Theophilos Rifiotis.
A presente obra é composta de seis capítulos, todos inscritos num esforço que os aproxima, para além da diversidade dos recortes temáticos e dos distintos referenciais teóricos. Rompendo com os debates epistemológicos, todos os trabalhos aqui publicados trazem uma marca comum: a problematização, a fricção ontológica, na feliz expressão cunhada por Frédéric Keck, Ursula Regehr e Saskia Walentowitz (2008, p. 35) na Introdução ao dossiê “Anthropologie: le tournant ontologique en Action”. Trata-se de um conjunto de trabalhos que operam, a partir de referências particulares, com o desdobramento das multiplicidades – as “políticas ontológicas”, de que falava John Law (2014, p. 143) – e que mantêm, sem dúvida, forte relação com os trabalhos de Eduardo Viveiros de Castro, Marilyn Strathern, Isabelle Stengers e Bruno Latour, dentre outros autores que vêm contribuindo para esse grande projeto antropológico. Portanto, não se trata de uma simples reunião de trabalhos voltados a uma temática específica: nosso projeto editorial supõe que cada leitor, conforme seus interesses, possa encontrar, num ou noutro destes capítulos, cruzamentos com suas próprias pesquisas. Nesse sentido, o presente livro foi concebido com a ambição de servir a diferentes leitores – não exclusivamente do campo antropológico – que estejam interessados em dispor de um mapeamento plural das controvérsias contemporâneas na antropologia e, a partir daí, ampliar e aprofundar seus próprios argumentos e modos de fazer seus trabalhos etnográficos.
vasto material existente na Antropologia sobre
a adoção transnacional de crianças. Nosso
objetivo não é duplicar as informações apresentadas
em resenhas disponíveis em publicações
especializadas (p. ex., Howell, 2009a;
Ouellette e Belleau, 2001; Terrell e Modell,
1994), e, sim, demonstrar como esse material
enriquece debates não só sobre família, filiação
e parentesco, mas também sobre desigualdade
e violência, sobre tecnologias de governo em
um mundo globalizado e sobre subjetividades
variantes diante de dinâmicas multiculturais.
Haveria muitos temas a explorar em relação à radical desigualdade social, econômico e político que vivenciamos todos os dias no Brasil e suas repercussões materiais e simbólicos para a vida familiar. Resolvemos nos concentrar aqui num assunto que, embora exista há tempo, parece ter se exacerbado ultimamente com as circunstâncias da pandemia: o que chamamos as maternidades “interditadas” isto é, aquelas maternidades enredadas na retirada compulsória de um bebê de seus genitores e a anulação irrevogável não só do vínculo, mas da própria identidade familiar. A seguir, damos uma ilustração concreta do assunto em pauta.