Informativo Migalhas. , v.1, p.1 - 1, 2020, 2020
"Peste, fome e guerra, morte e amor, a vida de Tereza Batista é uma história de cordel"2: tal e q... more "Peste, fome e guerra, morte e amor, a vida de Tereza Batista é uma história de cordel"2: tal e qual a epígrafe do romance de Jorge Amado já anuncia, a mulher representada pela personagem é uma guerreira. Enfrenta sua infância roubada, supera violências das mais variadas espécies, vence na batalha constante e cotidiana da desigualdade de gênero arraigada em nossa sociedade e, por fim, após liderar uma greve das minorias e vencer uma epidemia que se alastrava (seria uma premonição de Jorge Amado?), ainda encontra forças para exercer o seu lado feminino e o seu protagonismo social.
Há várias Terezas em nossa sociedade. Convivem em desigualdade de oportunidades com seus parceiros do sexo masculino e são abafadas pelo negacionismo histórico, que, de tão intrínseco, chega a não divulgar tantas heroínas em nossos livros de história3. Nas proximidades de uma nova eleição, e em tempos de "novo normal", essa observação nunca foi tão necessária.
Em verdade, a guerreira do romance de Jorge Amado, passado no recôncavo baiano do início do século XX, é um estereótipo atemporal. O cenário de lutas, preconceitos, estigmatização e banimento do protagonismo social, é um fenômeno que, ainda nos dias atuais, se repete cotidianamente. As diversas Terezas transitam entre posições sociais, profissionais, religiosas e familiares, cujo registro secular faz parte da estrutura edificante e paralisante de nossa cultura. Mais recentemente, assim como a heroína baiana, nossas heroínas veladas lutam contra a peste viral silenciosa, cujos efeitos se espraiam para além dos prejuízos biológicos, e colocam na mulher mais uma missão multifacetada. As Terezas desses tempos de "novo normal" ganham mais um fardo infindável: o de se adaptar a uma rotina sem intervalos ou empatia, coadunar o seu trabalho com a agenda sem férias ou respiros da promoção da harmonia familiar que lhe é imposta como papel, e, ainda, vencer a missão impossível de travar suas lutas cotidianas sem fazer alarde.
A cobrança de funções paradoxais da mulher não existe por acaso. Esse caráter multifacetado e dinâmico que é peculiar à psique feminina não dá margens à compaixão, ou à percepção do impossível. A fortaleza feminina, de todas as nossas Terezas, acaba sendo arduamente construída sobre tal característica. Justamente por se desdobrar em vários papeis desde a história mais remota, nós, Terezas do século XXI, adquirimos como ninguém um conhecimento ímpar acerca das características de cada membro de nosso Estado- Nação, em cada uma das suas múltiplas funções como cidadãos.
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Em um ano como 2020, no qual a generalização das vulnerabilidades e o regime de excepcionalidade das relações foram a tônica, não surpreende que a obra em questão tenha obtido o segundo lugar na lista dos sete livros mais vendidos em uma das maiores empresas de vendas de obras literárias online da atualidade .
O distanciamento social nos proporcionou, sem dúvidas, um dos grandes paradoxos do cenário pandêmico: num contexto de dilemas sanitários, econômicos e sociais, o novo normal imposto aproximou as vulnerabilidades, esfregou na cara da sociedade dita cool e tecnológica do século 21 suas maiores mazelas e tornou insustentável a manutenção da banalização da exclusão e da desigualdade.
A desigualdade de gênero, fatalmente, se insere nesse contexto. No último dia 8, o Dia Internacional da Mulher foi comemorado, em quase sua integralidade, na modalidade telepresencial, e, fazendo jus ao novo normal incorporado em nossas rotinas, os dizeres de Jorge Amado do início do século 20 ecoam: "Peste, fome e guerra, morte e amor, a vida de Tereza Batista é uma história de cordel". Tal e qual a epígrafe do romance de Jorge Amado já anuncia, a mulher representada pela personagem é uma guerreira. Há várias Terezas em nossa sociedade.
Há várias Terezas em nossa sociedade. Convivem em desigualdade de oportunidades com seus parceiros do sexo masculino e são abafadas pelo negacionismo histórico, que, de tão intrínseco, chega a não divulgar tantas heroínas em nossos livros de história3. Nas proximidades de uma nova eleição, e em tempos de "novo normal", essa observação nunca foi tão necessária.
Em verdade, a guerreira do romance de Jorge Amado, passado no recôncavo baiano do início do século XX, é um estereótipo atemporal. O cenário de lutas, preconceitos, estigmatização e banimento do protagonismo social, é um fenômeno que, ainda nos dias atuais, se repete cotidianamente. As diversas Terezas transitam entre posições sociais, profissionais, religiosas e familiares, cujo registro secular faz parte da estrutura edificante e paralisante de nossa cultura. Mais recentemente, assim como a heroína baiana, nossas heroínas veladas lutam contra a peste viral silenciosa, cujos efeitos se espraiam para além dos prejuízos biológicos, e colocam na mulher mais uma missão multifacetada. As Terezas desses tempos de "novo normal" ganham mais um fardo infindável: o de se adaptar a uma rotina sem intervalos ou empatia, coadunar o seu trabalho com a agenda sem férias ou respiros da promoção da harmonia familiar que lhe é imposta como papel, e, ainda, vencer a missão impossível de travar suas lutas cotidianas sem fazer alarde.
A cobrança de funções paradoxais da mulher não existe por acaso. Esse caráter multifacetado e dinâmico que é peculiar à psique feminina não dá margens à compaixão, ou à percepção do impossível. A fortaleza feminina, de todas as nossas Terezas, acaba sendo arduamente construída sobre tal característica. Justamente por se desdobrar em vários papeis desde a história mais remota, nós, Terezas do século XXI, adquirimos como ninguém um conhecimento ímpar acerca das características de cada membro de nosso Estado- Nação, em cada uma das suas múltiplas funções como cidadãos.
Da luta pela sobrevivência coletiva, emerge a importância do diálogo social como ferramenta eficaz na solução de dilemas aparentemente inconciliáveis.
Certamente, a resposta rápida, eficaz e produtiva de um Judiciário atento a tais dilemas tem vital importância para apaziguar as angústias decorrentes destes novos e desconhecidos tempos. Contudo, ela não pode se isolar em seus tradicionais limites de atividades dita solitária, sob pena de aumentar a distância já existente pela imposição do isolamento social. Em verdade, essa tendência já havia sido prenunciada pelo Direito Processual, por meio da teoria normativa da comparticipação ou da cooperação, conclamando a participação responsável e cooperativa de todos os atores sociais envolvidos para a solução dos conflitos, e adotada explicitamente pelo Código de Processo Civil de 2015, por exemplo, em seu artigo 6º.
Em um ano como 2020, no qual a generalização das vulnerabilidades e o regime de excepcionalidade das relações foram a tônica, não surpreende que a obra em questão tenha obtido o segundo lugar na lista dos sete livros mais vendidos em uma das maiores empresas de vendas de obras literárias online da atualidade .
O distanciamento social nos proporcionou, sem dúvidas, um dos grandes paradoxos do cenário pandêmico: num contexto de dilemas sanitários, econômicos e sociais, o novo normal imposto aproximou as vulnerabilidades, esfregou na cara da sociedade dita cool e tecnológica do século 21 suas maiores mazelas e tornou insustentável a manutenção da banalização da exclusão e da desigualdade.
A desigualdade de gênero, fatalmente, se insere nesse contexto. No último dia 8, o Dia Internacional da Mulher foi comemorado, em quase sua integralidade, na modalidade telepresencial, e, fazendo jus ao novo normal incorporado em nossas rotinas, os dizeres de Jorge Amado do início do século 20 ecoam: "Peste, fome e guerra, morte e amor, a vida de Tereza Batista é uma história de cordel". Tal e qual a epígrafe do romance de Jorge Amado já anuncia, a mulher representada pela personagem é uma guerreira. Há várias Terezas em nossa sociedade.
Há várias Terezas em nossa sociedade. Convivem em desigualdade de oportunidades com seus parceiros do sexo masculino e são abafadas pelo negacionismo histórico, que, de tão intrínseco, chega a não divulgar tantas heroínas em nossos livros de história3. Nas proximidades de uma nova eleição, e em tempos de "novo normal", essa observação nunca foi tão necessária.
Em verdade, a guerreira do romance de Jorge Amado, passado no recôncavo baiano do início do século XX, é um estereótipo atemporal. O cenário de lutas, preconceitos, estigmatização e banimento do protagonismo social, é um fenômeno que, ainda nos dias atuais, se repete cotidianamente. As diversas Terezas transitam entre posições sociais, profissionais, religiosas e familiares, cujo registro secular faz parte da estrutura edificante e paralisante de nossa cultura. Mais recentemente, assim como a heroína baiana, nossas heroínas veladas lutam contra a peste viral silenciosa, cujos efeitos se espraiam para além dos prejuízos biológicos, e colocam na mulher mais uma missão multifacetada. As Terezas desses tempos de "novo normal" ganham mais um fardo infindável: o de se adaptar a uma rotina sem intervalos ou empatia, coadunar o seu trabalho com a agenda sem férias ou respiros da promoção da harmonia familiar que lhe é imposta como papel, e, ainda, vencer a missão impossível de travar suas lutas cotidianas sem fazer alarde.
A cobrança de funções paradoxais da mulher não existe por acaso. Esse caráter multifacetado e dinâmico que é peculiar à psique feminina não dá margens à compaixão, ou à percepção do impossível. A fortaleza feminina, de todas as nossas Terezas, acaba sendo arduamente construída sobre tal característica. Justamente por se desdobrar em vários papeis desde a história mais remota, nós, Terezas do século XXI, adquirimos como ninguém um conhecimento ímpar acerca das características de cada membro de nosso Estado- Nação, em cada uma das suas múltiplas funções como cidadãos.
Da luta pela sobrevivência coletiva, emerge a importância do diálogo social como ferramenta eficaz na solução de dilemas aparentemente inconciliáveis.
Certamente, a resposta rápida, eficaz e produtiva de um Judiciário atento a tais dilemas tem vital importância para apaziguar as angústias decorrentes destes novos e desconhecidos tempos. Contudo, ela não pode se isolar em seus tradicionais limites de atividades dita solitária, sob pena de aumentar a distância já existente pela imposição do isolamento social. Em verdade, essa tendência já havia sido prenunciada pelo Direito Processual, por meio da teoria normativa da comparticipação ou da cooperação, conclamando a participação responsável e cooperativa de todos os atores sociais envolvidos para a solução dos conflitos, e adotada explicitamente pelo Código de Processo Civil de 2015, por exemplo, em seu artigo 6º.