Este trabalho é uma análise das relações entre os Estados Unidos e o Brasil durante o governo Lula. Mais especificamente, investigamos como a relação foi vista pelas lentes do imperialismo norte-americano, o que fizemos a partir da...
moreEste trabalho é uma análise das relações entre os Estados Unidos e o Brasil durante o governo Lula. Mais especificamente, investigamos como a relação foi vista pelas lentes do imperialismo norte-americano, o que fizemos a partir da análise dos 2.866 telegramas enviados pela Embaixada e Consulados estadunidenses no Brasil para o Departamento de Estado em Washington. Os documentos foram vazados em 2010 por Chelsea Manning e publicados pela WikiLeaks, que organizou as fontes na “Biblioteca Pública da Diplomacia Estadunidense” (PlusD), arquivo histórico digital que nos mune, de forma inédita, com vestígios da ação recente dos Estados Unidos no Brasil (oficialmente, os telegramas liberados pelo National Archives vão até, no máximo, 1980).
O objetivo central desta pesquisa foi, além de analisar como a diplomacia norte-americana viu o Brasil de Lula, investigar como esses/as agentes formularam e operacionalizaram táticas e estratégias para promover os interesses do capitalismo estadunidense no Brasil. Percebemos como a Embaixada agiu tendo como estratégia desestabilizar setores do governo brasileiro que consideravam mais hostis aos interesses norte-americanos, como o Ministério das Relações Exteriores (MRE – Itamaraty), operando com a tática de explorar as fissuras internas entre setores divergentes do governo. Nossa investigação revelou como a Embaixada teceu, em conjunto com organizações empresariais norte-americanas e brasileiras, uma ampla rede de influência sobre agentes do governo brasileiro.
Após uma discussão sobre os aspectos metodológicos da análise de fontes caracterizadas por serem documentos digitais (1.1), do tempo presente (1.2) e diplomáticos (1.3) e uma reflexão teórica sobre o capital-imperialismo (2.1) e sobre a inserção da burguesia brasileira na sua dinâmica (2.2), analisamos como a Embaixada viu as políticas do Brasil durante o governo lula e como agiu em relação a essas políticas nos assuntos das esferas política (3), militar (4) e econômica (5) da relação bilateral. No capítulo sobre as estratégias na esfera política, após discutir como o Departamento de Estado viu o Itamaraty (3.1), analisamos a atuação da Embaixada para a contenção e engajamento do projeto de integração regional e projeção global do Brasil, focando nas questões das negociações da ALCA e da aproximação do Brasil com a Venezuela (cenário regional – 3.2) e das negociações na OMC e da aproximação do Brasil com a China (cenário global – 3.3). O tema do capítulo 4 são as relações militares, especificamente como a Embaixada atuou em relação à Estratégia Nacional de Defesa (END) do Brasil e seus desdobramentos nas questões relativas à Central de Lançamentos de Alcântara (4.1), no monitoramento da Amazônia (4.2), no programa do submarino nuclear (4.3) e no projeto FX-2 para a compra da nova geração de caças do Brasil – leilão que a Boeing disputava e agia com o suporte da Embaixada para ser a escolhida (4.4). E, no capítulo 5, analisamos o suporte da Embaixada e do Consulado no Rio de Janeiro às petrolíferas estadunidenses (em especial à Chevron e Exxon) que tinham interesse em explorar o petróleo do pré-sal – especificamente o lobby para derrubar a lei que dava prioridade à Petrobras na exploração.
Concluímos que, na visão da Embaixada e dos Consulados, a política do governo Lula contribuiu para o aprofundamento dos tensionamentos históricos da relação bilateral, especialmente em relação ao aprofundamento da integração regional e das coalizões sul-sul, ao projeto de desenvolvimento militar tecnologicamente independente dos EUA e à prioridade concedida à Petrobras para a exploração do petróleo do pré-sal. Esse aprofundamento das tensões não foi resultado de políticas anti-imperialistas ou mesmo de uma política externa independente dos governos petistas, e sim consequência das rivalidades decorrentes da inserção do Brasil na dinâmica capital-imperialista. No epílogo, argumentamos que esses atritos levaram os EUA a mobilizar suas táticas de regime change (7.1, 7.2 e 7.3) para derrubar o governo Dilma, treinando e dando suporte aos agentes da Lava Jato por meio do Projeto Pontes da Embaixada (7.4) e aos militantes do MBL através do think tank Atlas Network (7.5), sendo a Lava Jato e o MBL os dois principais movimentos que causaram a queda de Dilma.