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View metadata, citation and similar papers at core.ac.uk brought to you by CORE provided by Repositório Institucional da UFSC UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA Ani Carla Marchesan AS RELATIVAS LIVRES EM PORTUGUÊS BRASILEIRO E OS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE Florianópolis, março de 2008. 1 Ani Carla Marchesan AS RELATIVAS LIVRES EM PORTUGUÊS BRASILEIRO E OS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE Dissertação submetida ao Programa de PósGraduação em Lingüística do Departamento de Lingüística do Instituto de Letras da Universidade Federal de Santa Catarina como parte dos requisitos para a obtenção do Grau de MESTRE em Lingüística. Área de Concentração: Lingüística Teórica – as interfaces da gramática. Orientador: Prof. Dr. Carlos Mioto Florianópolis, março de 2008. 2 Ani Carla Marchesan AS RELATIVAS LIVRES EM PORTUGUÊS BRASILEIRO E OS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE Dissertação defendida e aprovada no Programa de Pós-Graduação em Lingüística do Instituto de Letras da Universidade Federal de Santa Catarina como parte dos requisitos para a obtenção do Grau de MESTRE em Lingüística, pela comissão examinadora composta pelos professores: Comissão examinadora: _________________________ Professor Doutor Carlos Mioto - orientador Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). __________________________ Professora Doutora Maria Cristina Figueiredo e Silva – Membro interno Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). ___________________________ Professora Doutora Mary Aizawa Kato – Membro externo Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). ___________________________ Professora Doutora Roberta Pires de Oliveira - Suplente Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Florianópolis, março de 2008. 3 A todos os lingüistas. 4 AGRADECIMENTOS A meu orientador Carlos Mioto, a quem disse várias vezes que nunca agradeceria, pois estava apenas fazendo seu trabalho como orientador. Meu mais sincero agradecimento vai a ele, por me mostrar que existem ORIENTADORES e “orientadores”. Por seu brilhantismo, segurança, compreensão, dedicação e, sobretudo, à paciência com que me ensinou várias vezes a mesma coisa até eu compreender de fato o que estava acontecendo; À profª Drª. Silvia Helena Lovato do Nascimento, que me iniciou nos estudos gerativistas, despertando minha curiosidade para a pesquisa acadêmica. Agradeço por me apoiar e me incentivar a seguir em frente. À minha família, que sempre apoiou incondicionalmente e sempre acreditou que eu seria capaz. Em especial a minha mãe, Emilda, por ser meu porto seguro, por me incentivar a trocar de universidade e a procurar o que eu realmente gostava fazer e que, mesmo à distância, acompanhou toda a minha dor e angústia nesses dois anos; Aos verdadeiros amigos que aqui encontrei e dos quais nunca esquecerei (Patrícia, Andréa, Salete, Rodrigo, e tantos outros). Agradeço pelas palavras reconfortantes, pela amizade verdadeira, pelas muitas discussões e pelo incentivo em me fazer seguir em frente. Ninguém consegue chegar a lugar algum sozinho. Vocês, sem dúvida, são responsáveis por esse trabalho também; Aos colegas do NEG, ALERS e VARSUL pelo companheirismo de sempre; Ao Medeiros Júnior, por ter cordialmente disponibilizado sua dissertação, que foi muito importante para o desenvolvimento desta. Em especial, a Deus, que me deu a vida e a quem recorri sempre que não conseguia enxergar uma luz; Às professoras, Mary Kato, Maria Cristina Figueiredo Silva e Roberta Pires de Oliveira por aceitarem o convite para participar da banca examinadora. Agradeço pela atenção e pelas valiosas sugestões; Ao Programa de Pós-graduação em Lingüística da UFSC e, em especial, ao Cnpq pelo suporte financeiro durante toda a minha pesquisa; À UFSC e à UFSM, universidades ainda públicas e de qualidade; A mim mesma, por ter conseguido chegar até aqui; E finalmente, meu muito obrigada a todos que porventura tenha esquecido. Eles sabem que a maior expressão de amor é dar sem esperar, é aceitar sem exceção. 5 Estudar sintaxe gerativa é como tentar descobrir o segredo de um cofre: cada pequeno ajuste no mecanismo parece levar a nada. Apenas quando tudo entra no lugar a porta se abre. (adaptado de Ludwig Wittgenstein) 6 RESUMO Este trabalho é dedicado ao estudo do funcionamento das relativas livres do português brasileiro sob o escopo de estudos gerativistas como os de Bresnan & Grimshaw (1978), Groos e Van Riemsdijk (1981), Hirschbüher & Rivero (1983), Izvorski (1996), Caponigro (2002), entre outros. A idéia básica é que nas relativas livres o pronome relativo-wh embute o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo e, por isso, somente pronomes-wh com essa capacidade de incorporação podem iniciar uma relativa livre. Além disso, o pronome relativo-wh tem um duplo papel: respeitar os requisitos de caso e/ou categoria de um núcleo da sentença matriz e da sentença encaixada simultaneamente (chamado de Requerimentos de Compatibilidade). Assim, por meio do estudo das relativas livres objetivamos: a) distinguir uma relativa livre de uma interrogativa encaixada e de uma completiva; b) estabelecer que posições sintáticas uma relativa livre pode desempenhar; c) observar como ocorre o requerimento de compatibilidade nas línguas, com especial atenção ao português brasileiro; d) verificar por que o requerimento de compatibilidade não ocorre nas chamadas ‘relativas livres infinitivas’; e, e) delimitar, entre três hipóteses (Hipótese do Núcleo, Hipótese do Comp e Hipótese do complemento de D) a melhor para a análise dos dados do português brasileiro. Com esse estudo constatamos, entre outros aspectos, que os pronomes relativos que, qual e cujo não iniciam uma relativa livre, pois não conseguem embutir o que seria o um núcleo nominal de uma relativa com núcleo. Ainda, verificamos que os pronomes relativos são DPs, porém quando estão em posição AdvP eles são ambíguos entre ser DP ou PP. Em adição, constatamos que as chamadas ‘relativas livres infinitivas’ que não respeitam os requerimentos de compatibilidade na verdade não são relativas livres, mas sim relativas com núcleo. Palavras-chave: Gramática Gerativa; Relativas Livres; Requerimentos de Compatibilidade. 7 ABSTRACT This work is concerning the study of the free relatives in Brazilian Portuguese based on generative studies from Bresnan & Grimshaw (1978), Groos and Van Riemsdijk (1981), Hirschbüher & Rivero (1983), Izvorski (1996), Caponigro (2002), among others. The basic idea is that the relative pronoun of free relatives incorporates what would be the head of a headed relative. Thus only wh-pronouns with this incorporation ability can initiate a free relative. Furthermore, the wh-relative pronoun has a dual role: comply with the requirements of case and/or category of the matrix and embedded sentence simultaneously (called Matching Requirements). Thus, through free relative’s study we aim at: a) distinguishing free relative from embedded questions and embedded clauses; b) establishing syntactic positions that a free relative can play; c) observing how the matching requirement occurs in languages with special attention to Brazilian Portuguese; d) verifying why the matching requirement does not occur in the so-called 'infinitival free-relatives'; and e) defining, among three hypothesis (Head Hypothesis, Comp Hypothesis and D-complement Hypothesis) the best for the analysis of data from the Brazilian Portuguese. Due to this study, we noticed, among other aspects, that the relative pronouns que, qual and cujo do not start a free relative because they are unable to embed what would be a head of a headed relative. Furthermore, we noticed that the relative pronouns are DPs, but when they are in an AdvP position they are ambiguous between being DP or PP. We also noticed that the so-called ‘infinitival free relatives’ that do not respect the matching requirement actually are not free relative, but headed relative. Key-words: Generative Grammar; Free Relatives; Matching Requirement. 8 SUMÁRIO: INTRODUÇÃO ..............................................................................................................................10 CAPÍTULO I: SENTENÇAS RELATIVAS ....................................................................................13 1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 13 2 DEFINIÇÃO ....................................................................................................................... 13 2.1 RELATIVAS COM NÚCLEO ........................................................................................... 17 2.2 RELATIVAS LIVRES....................................................................................................... 21 2.2.1 Relativa livre X Interrogativa encaixada.................................................................... 25 2.2.2 Requerimentos de compatibilidade .......................................................................... 33 3 A SEMÂNTICA DAS RELATIVAS LIVRES ........................................................................ 35 4 RESUMO DO CAPÍTULO .................................................................................................. 39 CAPÍTULO II: REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE .....................................................41 1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 41 2 AS FUNÇÕES SINTÁTICAS DAS RELATIVAS LIVRES E OS PRONOMES RELATIVOS 41 3 ASSENTANDO OS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE ..................................... 45 4 A MANIFESTAÇÃO DOS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE NAS LÍNGUAS... 50 4.1 LÍNGUAS QUE APRESENTAM RELATIVAS LIVRES COM MR OBRIGATÓRIO........... 50 4.2 LÍNGUAS QUE APRESENTAM RELATIVAS LIVRES COM INCOMPATIBILIDADE DE CASOS OU DE CATEGORIAS............................................................................................. 51 4.2.1 Incompatibilidade de categorias (categorial matching) ............................................. 51 4.2.2 Incompatibilidade de casos (case matching) ............................................................ 51 4.2.2.1 Sincretismo ........................................................................................................... 52 4.2.2.2 Atração de caso .................................................................................................... 52 a) Islandês: ....................................................................................................................... 53 b) Alemão A: ..................................................................................................................... 53 c) Alemão B: ..................................................................................................................... 54 d) Gótico e romeno: .......................................................................................................... 55 e) Grego moderno:............................................................................................................ 56 4.2.2.3 Inserção de um pronome resumptivo para receber caso ....................................... 56 4.3 RESUMO: ....................................................................................................................... 57 5. REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE NO PORTUGUÊS BRASILEIRO................ 58 9 5.1 INCOMPATIBILIDADE DE CASOS................................................................................. 58 5.2 INCOMPATIBILIDADE DE CATEGORIAS...................................................................... 60 6 A QUESTÃO DAS CHAMADAS RELATIVAS LIVRES INFINITIVAS ................................. 63 6.1 AS INFINITIVAS NÃO SÃO INTERROGATIVAS ............................................................ 65 6.2 ALGUMAS INFINITIVAS NÃO SÃO RELATIVAS LIVRES .............................................. 66 7 RESUMO DO CAPÍTULO .................................................................................................. 69 CAPÍTULO III: ANÁLISE DAS RELATIVAS LIVRES .................................................................72 1 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 72 2 HIPÓTESE DO NÚCLEO................................................................................................... 72 3 HIPÓTESE DO COMP....................................................................................................... 79 4 ANÁLISE DO COMPLEMENTO DE D ............................................................................... 81 4.1 ANÁLISE DE CAPONIGRO (2002) ................................................................................. 82 4.2 ANÁLISE DE MEDEIROS JÚNIOR (2005)...................................................................... 84 5 PROPOSTA PARA O PORTUGUÊS BRASILEIRO ........................................................... 86 6 RESUMO DO CAPÍTULO .................................................................................................. 90 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................................92 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................95 10 INTRODUÇÃO As relativas são sentenças encaixadas que apresentam um constituinte que é compartilhado com a sentença matriz. Esse compartilhamento, como veremos, se dá através do SpecCP que contém um pronome relativo-wh ou um complementizador mais um operador nulo. Dada essa definição consideramos como relativas as sentenças abaixo: (1) a. Eu conheço a pessoa [que foi assaltada]. b. Eu conheço [quem foi assaltado]. Não temos dificuldade de reconhecer a sentença destacada entre colchetes em (1a) como uma relativa, pois temos um constituinte NP pessoa que é compartilhado pelas duas sentenças. Já em (1b) temos um pouco mais de dificuldade de reconhecer a sentença entre colchetes como relativa, pois não temos claramente um constituinte, como pessoa, compartilhado pelas duas sentenças. O pronome relativo-wh quem pertence à sentença encaixada, mas não é certo que ele sozinho pertença à sentença matriz. Entretanto, como a sentença (1b) é uma paráfrase de (1a), ela é reconhecida como relativa. Além disso, veremos no decorrer dessa dissertação que o pronome relativo-wh de (1b) é compartilhado com a sentença matriz porque tem que apresentar certas propriedades compatíveis com um constituinte dela. A relativa de (1a) por ser antecedida por um nome é chamada de relativa com núcleo nominal. Ao contrário, (1b) por não ter um nome antes, é chamada de relativa livre. Dentre os lingüistas que estudam(ram) as relativas com núcleo, destacamos os trabalhos feitos por Chomsky (1977), Kayne (1994), Bianchi (1999), De Vries (2002), Áreas (2002), entre outros. Já no estudo das relativas livres encontramos trabalhos de pesquisadores como Bresnan & Grimshaw (1978), Larson (1987), Van Riemsdijk (2000), Medeiros Júnior (2005), entre outros. Neste trabalho, que utiliza a abordagem teórica da Gramática Gerativa, optamos pela análise das relativas livres (cf. (1b)), primeiro, por haver pouquíssima literatura sobre esse assunto que analise dados do português brasileiro; segundo, porque esse tipo de construção envolve muitos problemas ainda não solucionados e, terceiro, pelo interesse em verificar como ocorrem os requerimentos de compatibilidade nas relativas livres do português brasileiro. Assim, objetivamos: a) distinguir uma relativa livre (2a) de uma interrogativa encaixada (2b): 11 (2) a. João devolveu [o que a Maria roubou da loja]. b. João perguntou [o que a Maria roubou da loja]. b) distinguir uma relativa livre (3a) de uma completiva (3b): (3) a. Ter medo de [quem nos assusta] é normal. b. Ter medo (de) [que sobrevenha um furacão] é normal. c) observar como ocorre o requerimento de compatibilidade, que é uma propriedade específica das relativas livres (brevemente, o requerimento de compatibilidade estipula que o pronome relativo-wh deve respeitar os requisitos de caso e/ou categoria de um núcleo da sentença matriz e da encaixada simultaneamente): (4) João devolveu [DP [DP o que]i a Maria roubou eci da loja]. d) verificar por que o requerimento de compatibilidade não ocorre nas chamadas ‘relativas livres infinitivas’, como em (5): (5) João não tem [DP [PP com quem]i conversar eci]. e) delimitar, entre as três estruturas abaixo, que foram elaboradas para as relativas livres, a melhor análise para os dados do português brasileiro: (6) a. Eu conheço [NP [NP quem][S você conhece [pro]]]. b. Eu conheço [NP[NP [ec] [S’ [Comp [quem]i [S você conhece eci]]]]]. c. Eu conheço [DP [quem]i [D ec [CP você conhece eci]]]. Esta dissertação se estrutura em três capítulos. No capítulo I, definimos com cuidado o que é uma relativa livre diferenciando-a de uma relativa com núcleo, de uma interrogativa encaixada e de uma completiva. Além disso, delimitamos todas as funções sintáticas que uma relativa livre pode desempenhar, bem como descrevemos brevemente a semântica das relativas livres, que é uma semântica de maximização. No capítulo II, apresentamos de forma detalhada como o requerimento de compatibilidade se manifesta nas línguas, com especial atenção aos dados do português 12 brasileiro. Dedicamos a última seção desse capítulo ao estudo das chamadas ‘relativas livres infinitivas’ que são um problema para a análise das relativas livres, já que, como veremos, algumas delas não respeitam os requerimentos de compatibilidade. No último capítulo, capítulo III, apresentamos as análises propostas para as relativas livres: Hipótese do Núcleo (cf. (6a)), Hipótese do Comp (cf. (6b)) e a Hipótese do Complemento de D (cf. (6c)). Ao analisar essas estruturas, elaboramos uma proposta para as relativas livres do português brasileiro com base em Caponigro (2002) que utiliza a hipótese do Complemento de D. 13 CAPÍTULO I SENTENÇAS RELATIVAS 1 INTRODUÇÃO As relativas são sentenças encaixadas que apresentam um constituinte que é compartilhado com a sentença matriz. Essas sentenças se dividem em relativas com núcleo e relativas livres. As relativas livres, foco deste estudo, se assemelham, em alguns aspectos, às relativas com núcleo e em outros às interrogativas encaixadas. Por causa dessa semelhança, dedicaremos este capítulo ao estudo das características das relativas livres, bem como suas diferenças frente às relativas com núcleo e às interrogativas encaixadas. Na seção 2 definiremos, de maneira geral, as características de uma sentença relativa. A seção 2.1 é dedicada às características específicas das relativas com núcleo e a seção 2.2 às características das relativas livres. Dentro dessa última seção abordaremos as diferenças entre uma relativa livre e uma interrogativa encaixada (seção 2.2.1) e, brevemente, o que é o Requerimento de Compatibilidade (seção 2.2.2) que é uma característica específica das relativas livres. Por fim, a seção 3 é dedicada à semântica das relativas livres. Encerramos o capítulo I com a seção 4 que contém o resumo dos tópicos mais importantes vistos neste capítulo. 2 DEFINIÇÃO Uma relativa é uma sentença encaixada. Como todo constituinte encaixado, uma relativa é encaixada como argumento de um núcleo ou, podemos assumir, como adjunto. Assim, por exemplo, a relativa pode ser o argumento interno (1a) ou o argumento externo de um verbo (1b): (1) a. Ele vai comprar [o que você vender]. b. [O que você fez] abalou a cidade. 14 Pode também ser adjunto de um nome como mercadorias (2a) ou adjunto adverbial (2b): (2) a. Ele vai comprar as mercadorias [que você vender]. b. Ele abalou a cidade [quando chegou]. Ser uma sentença encaixada é uma condição necessária para uma relativa, muito embora não seja condição suficiente. Evidentemente, existem sentenças encaixadas que não são relativas. Comparemos as sentenças de (3): (3) a. Este é o motivo [por que ele foi embora]. b. Ele foi embora por[que estava triste]. Em (3a) temos entre os colchetes uma relativa, que funciona como adjunto do nome motivo (de acordo com a análise de CHOMSKY, 1977). Em (3b) a sentença encaixada entre colchetes não é relativa, mas uma completiva, que funciona como complemento da preposição por. Distinção semelhante tem que ser feita entre as sentenças de (4): (4) a. Ter medo de [quem nos assusta] é normal. b. Ter medo (de) [que sobrevenha um furacão] é normal. Em (4a) temos uma relativa, que funciona como argumento de medo, mas em (4b) temos uma completiva, que também funciona como argumento de medo. Qual a propriedade que nos permite identificar (3a) e (4a) como relativas? Como o nome sugere, uma relativa possui um constituinte que é relativizado (chamado de núcleo nominal, NPrelativo, pivô, etc.). Esse constituinte é compartilhado pela sentença matriz e pela sentença encaixada. Sendo assim, uma resposta possível à pergunta acima é dizer que uma relativa sempre possui um constituinte que é relativizado. Em (3a) motivo é o constituinte relativizado, pois pertence tanto à sentença matriz, sendo parte do predicativo, quanto à sentença encaixada, onde é retomado pelo pronome relativo que, que funciona como complemento da preposição. Em (4a) podemos dizer que o constituinte compartilhado é o pronome relativo-wh quem, que é parte do complemento de medo e, ao mesmo tempo, sujeito de assustar. 15 É preciso expor ainda a forma como um constituinte é compartilhado: se não for exposto isso, poderíamos chamar a sentença encaixada em (5) de relativa, pois menina é compartilhado pelas duas sentenças: (5) A meninai disse [que eci está contente]. Em (5) o DP a menina pode ser considerado o constituinte compartilhado, pois, funciona como sujeito do verbo dizer (na sentença matriz) e, mediante a categoria vazia (ec), como sujeito do verbo estar. No entanto, essa sentença encaixada não pode ser considerada uma relativa como veremos a seguir. Tomando por base o modelo tradicional (Modelo Transformacional) podemos considerar que a sentença que contém uma relativa pode ser dividida, para efeitos de interpretação, em duas sentenças simples (6a', a''): (6) a. Maria viu o rapaz [CP que fugiu da cadeia ec]. a'. Maria viu o rapaz. a''. O rapaz fugiu da cadeia. Por meio desse processo, recuperamos integralmente o constituinte relativizado da relativa. Por isso dizemos que, embora nunca possa ocorrer como nome na relativa, rapaz é o constituinte relativizado. O compartilhamento de constituinte que a relativa mantém com a sentença matriz é especial: se dá via CP. Ou seja, em (6a) o NP rapaz é co-referente da categoria vazia (ec) e essa co-referência é feita através do SpecCP. Se entendemos que o que em (6a) é um pronome relativo, ele ocupa a posição de SpecCP para realizar a relativização; se entendemos que o que é um complementizador, o que o SpecCP vai conter é um operador nulo (OP) (CHOMSKY, 1977) 1. Se (6a) é ambígua quanto ao preenchimento do SpecCP, existem relativas que não apresentam essa ambigüidade. Consideremos, por exemplo, (7): 1 O compartilhamento do núcleo nominal só não ocorre via SpecCP em relativas resumptivas (cf. seção 2.1): (i) O livro [que a Maria leu ele] é extenso. Em (i) a posição em que a categoria vazia deveria estar localizada é preenchida pelo pronome resumptivo ele. Claramente não temos movimento-wh e, portanto, não temos um OP que preencha o SpecCP. Assim, para que a sentença seja interpretada o pronome ele é coindexado diretamente ao núcleo nominal livro (TARALLO, 1983, p. 15). 16 (7) Este é o homemi [CP [com quem]i C me casei eci]. Em (7) o NP homem é co-referente a categoria vazia (eci) através da expressão-wh com quem que está em SpecCP. Como quem é nitidamente um pronome relativo, ele deve preencher o SpecCP. Por fim, uma relativa (restritiva)2 realiza uma predicação sobre o NP compartilhado com a matriz via SpecCP. Por isso, não podemos dizer que a sentença introduzida pelo complementizador que em (5) seja uma relativa. O complementizador em (5) apenas possibilita o encaixe do IP que é complemento do verbo dizer. Em seu Spec não existe nenhum OP como o que supomos existir nas relativas sem pronome relativo-wh para realizar a predicação, o que se pode provar com exemplos de extração que veremos na seção (2.2.1). Em resumo, uma relativa é uma sentença encaixada; apresenta um constituinte que é compartilhado com a sentença matriz; esse compartilhamento se dá através do CP que vai conter um pronome relativo-wh ou um complementizador mais um operador nulo OP. Dada a definição de sentença relativa, temos que reconhecer como relativas as sentenças entre colchetes de (8): (8) a. Eu vi a pessoa [que roubou a loja]. b. Eu vi [quem roubou a loja]. As duas sentenças de (8) são paráfrases uma da outra e a interpretação delas é como (9): (9) ∃x, x = pessoa, [eu vi x & x roubou a loja]. Não temos dificuldade de reconhecer a sentença destacada entre colchetes em (8a) como uma relativa, pois temos um constituinte NP pessoa que é compartilhado pelas duas sentenças. Já em (8b) temos um pouco mais de dificuldade de reconhecer a sentença entre colchetes como relativa, pois não temos claramente um constituinte como pessoa compartilhado pelas duas sentenças. O pronome relativo-wh quem pertence à sentença encaixada, mas não é certo que ele sozinho pertença à sentença matriz. Entretanto, de forma simplificada, como a sentença (8b) é uma paráfrase de (8a), ela é reconhecida como uma relativa. Além disso, como veremos 2 Uma relativa apositiva (explicativa), como o próprio nome sugere, funciona como um aposto, o que motiva análises que assumem que o encaixe, neste tipo de relativa, é diferente (DE VRIES, 2002; BIANCHI, 1999). 17 mais tarde, o pronome relativo-wh é compartilhado com a sentença matriz porque tem que apresentar certas propriedades compatíveis com um constituinte dela. Observamos que as sentenças de (8) são relativas mesmo sendo formalmente diferentes. Em (8a) a sentença relativa é antecedida de um nome pessoa e, por isso, é chamada relativa com núcleo nominal. Por não ter um nome antes, a relativa em (8b) é chamada de relativa livre. Essas últimas são encabeçadas necessariamente por um pronome relativo-wh, como veremos. 2.1 RELATIVAS COM NÚCLEO O primeiro tipo de relativas é chamado de relativa com núcleo porque elas sempre dependem sintaticamente desse núcleo, que é um nome. Elas funcionam como modificadores do nome e tradicionalmente são representadas como adjunto do NP, como em (10): (10) [NP [NP O alunoi [CP que eci rasgou o livro] foi descuidado]]. Em (10) o NP aluno é o constituinte relativizado e funciona, simultaneamente, como parte do sujeito do verbo matriz ser e, por co-referência, como sujeito do verbo encaixado rasgar, que é foneticamente nulo. Se entendemos que o que em (10) é um pronome relativo-wh, ele nasce na posição de argumento externo do verbo rasgar (ec) e se move para a posição de SpecCP para realizar a relativização; se entendemos que o que é um complementizador, a posição de argumento do verbo rasgar é preenchida por um OP que, posteriormente, se desloca a SpecCP. Ou seja, todo o DP [o aluno que rasgou o livro] satisfaz os requisitos do núcleo da sentença matriz e a ec (co-referente ao NP) satisfaz os requisitos da sentença encaixada. Por isso, nesse tipo de relativa o NP e a ec podem apresentar papel temático, função sintática e categoria independentes, na sentença matriz e na encaixada: (11) a. Ela gosta do menino [que eu vi ec na festa]. b. João conheceu a menina [que ec mora com sua irmã]. Em (11a) o constituinte NP menino, que faz parte do complemento da preposição de (selecionada pelo verbo gostar) e, por co-referência, do verbo ver, é o constituinte relativizado. 18 O NP na sentença matriz integra um PP e na sentença encaixada um DP. Na sentença matriz o menino recebe papel temático de tema e caso oblíquo da preposição de; na encaixada a ec recebe papel temático de tema e caso acusativo do verbo ver. Caso semelhante ocorre em (11b) em que o NP menina integra um DP, recebe papel temático de tema e caso acusativo do verbo da sentença matriz conhecer, e a ec, também do tipo DP, recebe papel temático de agente e caso nominativo da flexão (Iº) do verbo morar. Essas sentenças evidenciam que, mesmo sendo co-referentes, o NP e a ec são independentes quanto ao papel temático, função sintática e tipo de categoria. As relativas com núcleo podem ser divididas em relativas com pronome resumptivo e relativas sem pronome resumptivo. Começando com as primeiras temos: (12) a. O livro [que a Maria leu ele] é interessante. b. A pá [que o João cavou o buraco com ela] quebrou. Em (12a) o constituinte relativizado livro é retomado por um pronome resumptivo (ele), que está no lugar onde deveria estar a ec. A presença do pronome resumptivo indica que não há movimento do que, já que não temos uma ec envolvida. O mesmo ocorre em (12b) em que o pronome resumptivo (ela) é selecionado por uma preposição. As sentenças do tipo de (12) são chamadas por Tarallo (1983) de relativa resumptiva (ou copiadora). O constituinte que de (12) é considerado um complementizador3, primeiro porque não há movimento do que, e segundo por causa da agramaticalidade de (13): (13) a. *O livro [CP o qual a Maria leu ele] é interessante. b. *A pá [CP com a qual o João cavou o buraco com ela] quebrou. 3 Apesar de afirmarmos que o que em (12) é um complementizador, sabemos que ainda não há um consenso na literatura no que diz respeito a esse operador que. Tarallo (1983) considera que o que das relativas é um complementizador, com exceção da relativa padrão (pied piping), como em (i): (i) a. *This is the pen with that I wrote the book. b. Esta é a caneta com que eu escrevi o livro. c. Esta é a caneta com a qual eu escrevi o livro. (ÁREAS, 2002, p. 73) Segundo Tarallo, as relativas pied piping do inglês são formadas por uma preposição mais um pronome relativo, o que explica a agramaticalidade de (i.a). Assim, o que em construções pied piping, como em (i.b), é um pronome relativo e não um complementizador. Nos demais tipos de relativas o que é sempre um complementizador. Em trabalho subseqüente ao de Tarallo; Kato (1993) faz uma análise das relativas resumptivas e cortadoras e propõe que o operador que utilizado nessas estruturas é “um pronome relativo extraído de uma posição nãocanônica” (KATO, 1993, p.226) ao contrário do que dizia Tarallo. Para dar força a sua tese, Kato argumenta que se compararmos o que, do português brasileiro, com o that do inglês (que é sem sombra de dúvidas um complementizador), verificaremos que o que é mais parecido com um pronome relativo. 19 As sentenças relativas, entre colchetes, em (13) mostram que, em português brasileiro, se uma sentença tem pronome resumptivo ela não pode ter pronome relativo-wh4. Assim, o pronome resumptivo dentro da relativa atesta que não temos um pronome relativo-wh introduzindo a sentença entre colchetes em (12). Por isso, o que de (12) é um complementizador e não um pronome relativo-wh. O que também é um complementizador em (14), em que não há um pronome resumptivo: (14) Esta é a pá [CP que o João cavou o buraco com]. A sentença entre colchetes de (14) é chamada de relativa cortadora, pois há o apagamento da preposição. Aqui, o que também é considerado um complementizador. Se houvesse pronome relativo-wh em CP ele deveria ser antecedido de uma preposição: (15) Esta é a pá [CP com que o João cavou o buraco]. Entretanto, a preposição não está presente em (14), o que nos leva a supor que o que é um complementizador e que um OP preenche o SpecCP. Ao contrário, em (15) o que é um pronome relativo-wh. Se fosse um complementizador ele deveria aceitar o resumptivo: (16) a. *Esta é a pá [CP com que o João cavou o buraco com ela]. b. Esta é a pái [CP com a quali o João cavou o buraco eci]. (16a) não aceita o pronome resumptivo, pois o que é um pronome relativo-wh, o que pode ser confirmado pela gramaticalidade de (16b) em que temos o pronome relativo-wh qual. Nesse tipo de sentença há, com certeza, movimento do pronome relativo-wh para o início da sentença 4 O pronome resumptivo tem que estar dentro da relativa. Caso contrário, as sentenças do alemão, abaixo, seriam um contra-exemplo (VOGEL, 2001, p. 108): (i) [Wer einmal lügt], (der) lügt auch ein zweites Mal. Quem-NOM uma+vez mente, (ele-NOM) mente também uma segunda vez. (ii) [Wer einmal lügt], *(dem) glaubt man nicht. Quem-NOM uma+vez mente, *(ele-DAT) acredita nele-NOM não. ‘Ninguém mais acredita em pessoas que mentiram uma vez’ As duas sentenças apresentam uma relativa livre entre colchetes que sempre é iniciada por um pronome relativowh. Elas também contêm um resumptivo der, dem. A sentença é boa porque o resumptivo está fora da relativa. 20 encaixada. O NP pá é co-referente a categoria vazia (ec) através da expressão-wh com a qual em SpecCP. A esse tipo de relativa, em que o pronome relativo-wh se move para a periferia esquerda da sentença e leva junto consigo a preposição, chamamos de relativa padrão pied piping. Temos que admitir que há movimento do pronome relativo-wh para a periferia esquerda da sentença, pois se o deixarmos in situ a sentença será mal formada: (17) * Esta é a pái [CP [C’ o João cavou o buraco com a quali]]. Salvo casos especiais, como (18a) abaixo, em português brasileiro, quando a preposição não é apagada o pronome relativo-wh leva consigo a preposição, formando relativas padrão pied piping (18b,c): (18) a. O casamento [que ele é contra ec]. b. O homem [com quem eu falei ec] ontem passou no vestibular. c. A casa [na qual eu vivi ec] é pequena. Ao contrário do português brasileiro, em algumas línguas, como o inglês, é muito comum o pronome relativo se mover e deixar pra trás a preposição: (19) This is the man Este é o [who I talked to ec]. homem quem eu falei com. Quando isso ocorre (preposição in situ) temos a chamada relativa com preposição órfã (ou preposition stranding). O último tipo de relativa sem pronome resumptivo é o descrito abaixo: (20) a. A pái [que eu comprei eci] não estava afiada. b. Eu encontrei o rapazi [que eci assaltou sua casa]. A ec das sentenças em (20) são um DP. Em (20a) a ec está na posição de argumento interno do verbo comprar e em (20b) na posição de argumento externo do verbo assaltar. Neste tipo de relativa não sabemos se o que é um pronome relativo-wh (originado por movimento) ou um complementizador. Tarallo (1983) diz que o que presente nesse tipo de sentença é sempre um 21 complementizador; já Kato (1993) argumenta que esse que é um pronome relativo-wh5. Aqui, vamos assumir que o que em sentenças do tipo de (20) é sempre um pronome relativo-wh. 2.2 RELATIVAS LIVRES O outro tipo de relativas são as relativas livres. Como definimos na seção 2, uma relativa com núcleo modifica um núcleo nominal. Já em uma relativa livre esse núcleo nominal não é explicito: (21) a. João comeu [o que a Maria cozinhou]. b. João comeu a comida [que a Maria cozinhou]. A sentença entre colchetes em (21a) é uma relativa livre. Uma relativa livre pode ser parafraseada por uma relativa com núcleo nominal, como em (21b)6. Como uma relativa é sempre uma sentença encaixada, ela pode ser construída como argumento externo de um verbo (22a) ou argumento interno (22b)7: (22) a. [O que aconteceu] abalou João. b. Maria não comprou [o que eu pedi]. Pode também ser adjunto de um VP, como em (23): (23) Maria saiu [quando Pedro chegou]. 5 Como o foco desse estudo não é as relativas com núcleo, não vamos entrar nos detalhes/evidências que diferenciam essas duas análises (que = complementizador ou que = pronome relativo). Para maiores informações ver Tarallo (1983) e Kato (1993). 6 Às vezes, uma relativa livre pode ter mais do que uma paráfrase: (i) (ii) João ligou para quem estava na casa da Maria. a. João ligou para a pessoa que estava na casa da Maria. b. João ligou para as pessoas que estavam na casa da Maria. O pronome relativo quem pode ser usado para designar uma ou mais pessoas, dentro do universo do discurso que contém o conjunto da(s) pessoa(s) que estavam na casa da Maria. 7 Vamos deixar de lado, por enquanto, a discussão acerca do lugar em que o pronome relativo-wh está localizado: dentro ou fora da relativa. Vamos assumir, por facilidade, que o pronome relativo-wh está dentro da relativa livre. 22 Ou então, funcionar como um predicativo: (24) Ana é [quem está com medo do tigre]. O que não pode ocorrer é uma relativa livre com função sintática de adjunto adnominal. Quando for adjunto de um nome, a relativa formada será uma relativa com núcleo: (25) Maria comprou as frutas [que eu pedi]. Assim, as relativas livres podem exercer as funções sintáticas de argumento, adjunto ou predicativo. Já as relativas com núcleo exercem somente a função sintática de adjunto adnominal. Uma característica saliente de uma relativa livre é que ela só pode ser iniciada por pronomes relativos-wh especiais. Esses pronomes relativos-wh são especiais porque sempre incorporam o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo: (26) Não me lembro [onde eu deixei as chaves do carro]. Em (26) o pronome relativo-wh onde incorpora o núcleo nominal lugar que seria o constituinte compartilhado em uma relativa com núcleo: (27) Não me lembro do lugar [em que deixei as chaves do carro]. De forma semelhante ao onde, o pronome relativo quem sempre incorpora o núcleo nominal pessoa; o que incorpora o núcleo nominal coisa; quando incorpora o núcleo nominal momento; como incorpora o núcleo nominal modo e, por fim, o pronome relativo quanto incorpora o núcleo nominal quantia: (28) a. Eu vou encontrar [quem eu estou procurando]. a'. Eu vou encontrar a(s) pessoa(s) [que eu estou procurando]. (29) a. Eu vou comprar [o que você escolheu]. a'. Eu vou comprar a(s) coisa(s) [que você escolheu]. 23 (30) a. Maria saiu [quando João entrou]. a'. Maria saiu no momento [em que João entrou]. (31) a. Ele procedeu [como João ordenou]. a'. Ele procedeu da maneira [que João ordenou]. (32) a. Ele vai cobrar [quanto quer pelo vinho]. a'. Ele vai cobrar a quantia [que quer pelo vinho]. Os pronomes relativos-wh que não embutem o núcleo nominal não podem encabeçar uma relativa livre. Este é o caso do que, do qual e do cujo que não embutem nada8 (podem ser usados tanto pra coisa como pra pessoa) e, por isso, são sempre usados com antecedente nominal explícito: (33) a. *Eu vi [que você acha bonito]. b. Eu vi o meninoi [que você acha elei bonito]. (33a) é agramatical porque o que não incorpora nenhum núcleo nominal da sentença matriz. Atenção especial deve ser dada à expressão o que. Há situações, como a exemplificada em (34), em que o o é claramente um artigo definido precedendo um nome foneticamente não realizado: (34) (Dos livros,) eu vou comprar o ec [que você escolheu]. Em (34) a ec corresponde ao nome recuperado anaforicamente a partir do tópico dos livros. Neste caso, é acidental que os dois itens ocorram adjacentes. A tradução desta sentença para o inglês seria como (35): (35) 8 I will buy the one [that you chose]. O pronome-wh por que não entra nessa regra de embutir ou não um núcleo nominal pois, ele é o único dos pronomes-wh que é usado somente em contextos interrogativos, ou seja, ele é [+interrrogativo]. 24 O que a tradução inglesa revela é que, na falta de nome nulo, existe um núcleo nominal que antecede a relativa: one. Então, não se debate que (35) contém uma relativa com núcleo nominal. Entretanto, há situações, como a exemplificada em (36), em que não é tão claro que uma análise como a esboçada em (35) se sustente: (36) a. O João comprou o [que a Maria pediu para ele]. b. O João comprou aquilo [que a Maria pediu para ele]. Muitas vezes se considera que (36a) pode ser analisada como contendo o pronome demonstrativo o (=aquilo) e o pronome relativo-wh que. Essa forma de analisar a expressão implica que não temos uma relativa livre em (36a), mas uma relativa com núcleo nominal: o demonstrativo neutro faria o papel de núcleo, assim como em (36b). Mas se traduzimos (36a) para o inglês, temos em lugar de o que o pronome relativo-wh what: (37) John bought what Mary asked him. Isto é, se se sustenta a análise que diz que o é o demonstrativo neutro aquilo, teríamos uma situação em que a relativa numa língua, português, seria considerada relativa com núcleo e em outra, inglês, relativa livre. Não achamos que isso deva ser considerado um problema. O que nos parece problemático é a arbitrariedade que a análise de o como demonstrativo implica: no português (brasileiro) não podemos fazer relativa livre com um pronome relativo que não embute nenhum núcleo nominal (ou seja, que pode ser usado tanto para coisa quanto para pessoa). Para resgatar a idéia de que o que pode ser um pronome relativo e eliminar a arbitrariedade, Carlos Mioto (em conversa pessoal) me apontou o exemplo em (38): (38) O que a Maria é é escandalosa. De modo interessante, (38) pode ser usado em favor da hipótese de que o que≡what. O raciocínio vai assim: se o fosse o pronome demonstrativo neutro (e, portanto, o núcleo nominal que antecede a relativa), o adjetivo teria que concordar com ele, assumindo a forma do nãomarcada; como (38) é gramatical com o adjetivo na forma marcada pela flexão de feminino, o o 25 não pode ser o demonstrativo neutro e, portanto, o que≡what. Em suma, (38) mostra que existe a equivalência o que≡what. Dessa forma, os pronomes relativos-wh (ditos especiais) que iniciam uma relativa livre são aqueles que incorporam o núcleo nominal da sentença matriz: o que, quem, onde, como, quando e quanto. Os outros pronomes relativos-wh, por não incorporarem esse núcleo, nunca podem iniciar uma oração relativa livre: que, qual, cujo. Ao contrário, uma relativa com núcleo pode conter qualquer pronome relativo-wh, até mesmo um complementizador. 2.2.1 Relativa livre X Interrogativa encaixada Por serem iniciadas por um pronome-wh, as relativas livres são freqüentemente confundidas com as interrogativas encaixadas: (39) a. Eu me pergunto [quem a Maria convidou para a festa]. b. Eu conheço [quem a Maria convidou para a festa]. A sentença entre colchetes em (39a) é uma interrogativa encaixada e a de (39b) é uma relativa livre. Essa semelhança do pronome-wh também ocorre em algumas línguas como o alemão (VAN RIEMSDIJK, 2000, p. 22) em que o pronome-wh utilizado para construir sentenças interrogativas (40a) e relativas livres (40b) são pronomes iniciados por w (wen) e o pronome-wh utilizado para construir relativas com núcleo (40c) são pronomes iniciados por d (den). Vejamos os exemplos do autor9: (40) a. Peter fragte wen ich worziehe. Peter perguntou quem eu prefiro. b. Peter hasst wen ich vorziehe. Peter odeia quem (quer que) eu prefira. 9 Caponigro (2002, p. 144) aponta que, além do alemão, o italiano também usa os mesmos pronomes-wh para introduzir uma relativa livre e uma interrogativa enquanto as relativas com núcleo são introduzidas por outros pronomes-wh. Ele afirma que nunca iremos encontrar uma língua que use um determinado tipo de pronome-wh com relativas livres e relativas com núcleo e outro tipo de pronomes-wh com as interrogativas encaixadas. 26 c. Peter hasst den Mann, Peter odeia o den ich vorziehe. homem que eu prefiro. Essa semelhança sugere duas coisas: primeiro que uma relativa livre não pode ser simplesmente um subtipo de uma relativa com núcleo e, segundo, que as relativas livres parecem ser diretamente relacionadas às interrogativas, já que são introduzidas pelos mesmos pronomes-wh em todas as línguas. Assim, dada a definição de relativa livre elaborada na seção anterior, temos que reconhecer como relativa a sentença (41) abaixo: (41) Eu vi [o que você comprou] na feira ontem. A sentença entre colchetes em (41) é uma relativa livre, pois é uma sentença encaixada; não possui um núcleo nominal explícito, mas pode ser parafraseada por uma relativa com núcleo; e, é iniciada por um pronome relativo-wh (o que) que incorpora o núcleo nominal da sentença matriz (coisa). Entretanto, só essas características não bastam para determinar uma relativa livre, caso contrário poderíamos chamar a sentença encaixada em (42) de relativa livre: (42) Eu quero saber [o que você comprou] na feira ontem. Em (42) a sentença entre colchetes é uma sentença encaixada; não possui um núcleo nominal explícito e é iniciada por um pronome-wh (o que). No entanto, (42) não contém uma relativa livre, mas sim uma interrogativa encaixada, como veremos a seguir através de três testes: a) inserção do constituinte (é) que logo após o pronome-wh; b) inserção do quer que logo após o pronome-wh e c) substituição do pronome-wh por uma expressão claramente interrogativa. Além disso, verificaremos algumas propriedades que caracterizam essas duas estruturas: a) diferença de significado; b) diferença quanto à extração em contexto de ilha; e, c) propriedades selecionais do verbo da sentença matriz. O primeiro teste que diferencia uma relativa livre de uma interrogativa encaixada, foi elaborado por Alvarenga (1981) e adaptado por Baker (1988 apud MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 17). O teste consiste em inserir (é) que logo após o pronome-wh. Se a sentença resultante for bem formada, como em (43a') o que temos é uma interrogativa encaixada; caso contrário (43b') temos uma relativa livre: 27 (43) a. A Maria perguntou [quem roubou o banco]. a'. A Maria perguntou [quem (é) que roubou o banco]. b. Maria convidou para a festa [quem João indicou]. b'. *Maria convidou para a festa [quem (é) que João indicou]. Pelo teste, a sentença entre colchetes em (43a) é uma interrogativa encaixada, pois aceita a inserção do (é) que. Já a sentença entre colchetes em (43b) é uma relativa livre. Compreendemos o funcionamento do teste observando que a sentença com é que é uma clivada (44a), sentença que, como afirmam Modesto (2000); Kato & Ribeiro (2007) e Mioto10 (no prelo), é designada para focalizar. Também o que das sentenças com Comp duplamente preenchido (44b), chamada por Kato et al. (1996) de clivada reduzida, é usado para isolar o foco: (44) a. O João é que gosta de voar. a'. Quem é que gosta de voar? b. O João que gosta de voar. b'. Quem que gosta de voar? Se temos em mente que o pronome interrogativo-wh sozinho é o foco da sentença interrogativa, entendemos por que se pode usar o (é) que com ele. Se, por outro lado, temos em mente que o pronome relativo-wh não pode ser sozinho o foco de uma sentença (45a) enquanto toda a relativa livre pode (45b), entendemos a razão da impossibilidade de usar (é) que. (45) a. *[O que] (é) que o João comprou agradou a Maria. b. [O que o João comprou] (é) que agradou a Maria. O segundo teste que pode ser aplicado foi proposto por Medeiros Júnior (2005a,b, p. 94- 95). O teste consiste em inserir quer que logo após o pronome-wh efetuando as alterações necessárias no modo do verbo11. Se a sentença resultante for bem formada, como em (46a'), temos uma relativa livre; caso contrário (46b') temos uma interrogativa encaixada: 10 11 MIOTO, Carlos. Pseudo-clivadas no português brasileiro. Esse teste é uma adaptação da língua inglesa. Os pronomes relativos-wh, em inglês, podem conter o sufixo -ever (i.a) o que não é permitido nas interrogativas encaixadas (i.b): 28 (46) a. Pedro convence [quem ele conhece] a trabalhar com ele. a'. Pedro convence [quem quer que ele conheça] a trabalhar com ele. b. Pedro quer saber [quem trabalha com ele]. b'. *Pedro quer saber [quem quer que trabalhe com ele]. O terceiro e último teste, para distinguir uma relativa livre de uma interrogativa encaixada, foi proposto por Carlos Mioto (em conversa pessoal). O teste consiste em substituir o pronome-wh por uma expressão claramente interrogativa: (47) a. João sempre lê [o que a Maria escreve]. a'. *João sempre lê [que tipo de livro a Maria escreve]. b. João perguntou [o que a Maria escreve]. b'. João perguntou [que tipo de livro a Maria escreve]. Nas interrogativas o pronome interrogativo-wh sempre precede um NP e por estar em distribuição complementar com determinantes, pode ser considerado um determinante (D). Por exemplo, o quem é sempre descrito como que pessoa; o que como que coisa; e assim por diante: (48) a. Que pessoa a Maria convidou para a festa? b. Que presente você quer ganhar no Natal? c. Qual sapato você quer comprar? (i) a. I’ll buy whatever he is selling. b. *I’ll inquire whatever he is selling. (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978, p. 334) Bresnan & Grimshaw (1978, p. 334) acrescentam que a palavra ever pode ser utilizada em interrogativas como um “quantificador temporal” (ii.a) ou um “intensificador retórico” (ii.b). Porém, quando o ever é usado em interrogativas ele nunca pode ser grudado com o pronome interrogativo-wh. Já nas relativas livres, o ever deve ser sempre concatenado com o pronome relativo-wh como um sufixo (ii.c); caso contrário, como mostra (ii.d), a sentença é agramatical: (ii) a. Who did he ever kiss? b. What ever is the matter with him now? c. I kissed whoever he kissed d. *I kissed who he ever kissed. 29 Todas as sentenças interrogativas de (48) são construídas na ordem: pronome interrogativo-wh mais nome (wh+NP). Ao contrário, nas relativas é o NP que é seguido pelo pronome relativo-wh (NP+wh): (49) a. João convidou para a festa a pessoa [que Maria pediu]. b. João comprou o presente [que Maria pediu]. c. Maria escolheu o sapato [do qual mais gostou]. (50) a. João convidou para a festa [quem a Maria pediu]. b. João comprou [o que a Maria pediu]. Nas relativas com núcleo (entre colchetes em (49)) o NP sempre precede o pronome-wh. Da mesma forma nas relativas livres (entre colchetes em (50)), o quem é descrito como a pessoa que, o que como a coisa que, o livro que; etc.. Portanto, como o pronome-wh o que, em (47b), pode ser substituído por que+NP (que tipo de livro) dizemos que ele está em uma estrutura claramente interrogativa. Além desses três testes, uma relativa livre pode ser distinguida de uma interrogativa encaixada de outras três maneiras. A primeira distinção diz respeito ao significado (CAPONIGRO, 2002, p. 141): (51) a. Eu vi [o que você comprou] na feira ontem. a'. Eu vi a(s) coisa(s) [que você comprou] na feira ontem. b. Eu quero saber [o que você comprou] feira ontem. b'. Eu quero saber [qual(is) coisa(s) você comprou] na feira ontem. Em (51) mesmo que o constituinte [o que você comprou] seja idêntico na relativa livre contida em (51a) e na interrogativa encaixada, contida em (51b), observamos que o pronome-wh o que possui significados diferentes. Quando faz parte de uma relativa livre, o pronome-wh tem uma leitura definida (maximização); quando faz parte de uma interrogativa encaixada, esse pronome-wh tem uma interpretação existencial12. 12 As características semânticas de uma relativa livre serão tratadas ainda neste capítulo (seção 3). 30 A segunda diferença que essas estruturas apresentam é quanto à extração, permitida nas interrogativas, mas bloqueada nas relativas13: (52) a. [Que poesia]i a Ana perguntou [quando o Pedro declamou ti]. b. *[Que poesia]i a Ana chorou [quando o Pedro declamou ti] Nenhum constituinte pode ser extraído de dentro da relativa livre de (52b). A extração da expressão que poesia para fora da relativa torna a sentença (52b) agramatical. Isso ocorre porque as relativas são ilhas fortes e, por isso, não permitem extração nem de adjunto, nem de complemento (ROSS, 1967). Já as sentenças interrogativas, que são ilhas fracas, permitem extração de complemento para fora do CP, como mostra a gramaticalidade de (52a) em que a expressão que poesia é extraída. A terceira diferença entre uma relativa livre e uma interrogativa pode ser inferida a partir do verbo matriz das sentenças em (53): o verbo devolver de (53a) seleciona um DP como complemento e o verbo dizer de (53b) seleciona um constituinte que não pode ser reduzido a um DP, ou seja, um CP interrogativo (VAN RIEMSDIJK, 2000, p. 3)14. Se a sentença for boa com a inserção de um DP, como fazemos com o livro em (53a'), logo após o verbo da sentença matriz, temos uma relativa livre; caso contrário, como mostra (53b'), temos uma interrogativa 13 Exceção a isso são as relativas livres transparentes (que não serão tratadas nesta dissertação): (i) a. John is what you might call angry about something. b. What is John what you might call angry about ec? (SCHELFHOUT; COPPEN & OOSTDIJK, 2004, p. 2) Em (i.a) temos uma relativa livre transparente. Esse tipo de sentença, diferentemente das relativas livres canônicas, permite extração de dentro da relativa como observamos em (i.b). Engdahl (1997 apud HOGOBOOM, 2003, p.78) observa que o norueguês parece permitir extração do sujeito de uma relativa livre quando toda relativa livre estiver em posição de objeto direto do verbo da matriz. Porém essa extração só ocorre em condições muito específicas, como em (ii) abaixo: (ii) [Denne kunstneren]i kjØper jeg hava enn ti produserer. Deste artista compro eu o+que quer+que produsa. ‘Eu compro o que quer que este artista produza’ Porém, ao contrário do que Engdahl afirma, essa sentença não parece ser um contexto de uma verdadeira extração. Para Cinque (1990) Denne kunstneren é um tipo de tópico (chamado de hanging topic): assume-se que este tipo de tópico é gerado diretamente na posição de tópico e é retomado como uma ec (um prozinho) ou um pronome na posição de sujeito do verbo produzir: (ii) 14 Este artista, eu compro o que ele produz. Alguém poderia argumentar que o verbo dizer, em (53b) pode selecionar um DP, como em (i.a): (i) a. [Você poderia me dizer [DP o nome do livro que está em cima da mesa?]]. b. [Você poderia me dizer [CP qual [DP o nome do livro que está em cima da mesa?]]]. Porém, (i.a) não constitui um contra-exemplo. Em (i.a) temos claramente um CP vazio, que pode ser preenchido por qual como observamos em (i.b). 31 encaixada. Alternativamente, se a sentença for gramatical com a inserção de um CP interrogativo logo após o verbo da sentença matriz, como fazemos com a sentença iniciada pelo complementizador se em (53b''), temos uma interrogativa; caso contrário (53a'') temos uma relativa livre: (53) a. Você deve devolver [o que você terminou de ler] para a biblioteca15. a'. Você deve devolver [NP o livro] para a biblioteca. a''. *Você deve devolver [CP se você terminou de ler o livro] para a biblioteca? b. Você poderia me dizer [o que você terminou de ler]? b'. * Você poderia me dizer [NP o livro]. b''. Você poderia me dizer [CP se você terminou de ler o livro]? Essa diferença é motivada, pois uma relativa livre tem a mesma distribuição sintática de DPs (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978, p. 336)16. Podemos formular duas conseqüências do fato de a relativa livre ser um DP. Se uma relativa livre é um DP, ela necessariamente precisa ser marcada por caso. Por isso, é de se prever que a ocorrência de uma relativa livre é favorecida em posições casuais, como a de sujeito em (54a): (54) a. [O que João fez] abalou os amigos. b. Abalou os amigos [que o João tenha sumido]. Isto é, [o que o João fez] figura naturalmente no SpecIP. Por outro lado, em (54b) [que o João tenha sumido], por não poder ser reduzido a um DP, não figura naturalmente no SpecIP: sua 15 As sentenças em (53) foram adaptadas de Van Riemsdijk (2000, p. 3): (i) 16 a. You should return [what you have finished reading] to the library. b. Could you tell me [what you have finished reading]. Temos que tomar cuidado com alguns verbos que são ambíguos como, por exemplo, o verbo saber: (i) a. Maria sabe [CP se Pedro chegou de viagem]? b. Maria sabe [DP o caminho para a Universidade]. (MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 17) A sentença entre colchetes em (i.a) é uma interrogativa encaixada do tipo sim/não. Em (i.b) o verbo saber seleciona um DP como seu complemento; portanto, a sentença entre colchetes poderia ser substituída por uma relativa livre (aqui o verbo saber tem o sentido de conhecer). 32 posição mais natural é à direita do verbo. Esta afirmação fica até mais clara se consideramos (55): (55) a. Ela tem medo de [quem a reprime]. b. *Ela tem medo [quem a reprime]. c. Ele tem medo [que o professor a reprima]. Sabemos que uma categoria [+N] é incapaz de atribuir caso. Quando um nome tem um argumento, como é o caso do nome medo em (55a), se esse argumento é um DP, ele precisa receber caso. Como o nome é incapaz de atribuir caso, uma preposição funcional é inserida para desempenhar essa função. (55b) mostra que, se a preposição não é inserida, a sentença fica agramatical. Portanto, o complexo [quem a reprime] deve funcionar como um DP; e o pronome relativo-wh deve ser a parte do complexo que assimila o caso. Por outro lado, a preposição não é obrigatória em (55c), o que nos permite concluir que [que o professor a reprima] não deve ser um DP. Em conclusão, o aparato para que o Filtro do Caso não seja violado deve estar disponível na estrutura. Consideremos, agora, uma relativa livre e uma interrogativa que funcionam como objeto direto de um verbo, como as de (56): (56) a. João esbofeteou [quem beijou a Maria]. b. João quer saber [quem beijou a Maria]. De acordo com o que estamos defendendo, a relativa livre precisa de caso. A fonte só pode ser o verbo transitivo esbofetear e o caso tem que ser acusativo. Como quem é um pronome relativo que corresponde a um DP, ele é capaz de assimilar o caso de que a relativa precisa. Assim, o caso acusativo é atribuído naturalmente. Poderíamos pensar que o mesmo ocorre em (56b), mas, de acordo com a distinção de Van Riemsdijk (2000), uma interrogativa encaixada não é um DP. Então, caso não é relevante para a interrogativa e o fato de ela ser introduzida por um pronome-wh, que é um DP, é acidental. De fato, introduzindo a interrogativa poderíamos ter qualquer pronome interrogativo-wh sem mudar o estatuto de complemento da sentença. É o que mostra (57): (57) a. O João perguntou [com quem/onde/quando/por que/como a Maria vai casar]. b. quer saber [para quem a Maria comprou o presente]. 33 c. [que dia a Maria vai casar]. d. [qual roupa deve usar no casamento]. e. [quem vai casar]. f. [de quem a Maria gosta]. Já a relativa livre que é o complemento do verbo esbofetear, por ser um DP e por precisar ser marcada por caso, só pode ser introduzida por um pronome relativo-wh compatível com o que o verbo atribui: acusativo. Na próxima seção, abordamos rapidamente, estes requerimentos de compatibilidade que são impostos a uma relativa livre. 2.2.2 Requerimentos de compatibilidade Como foi apontado na seção anterior, uma relativa livre figura como um DP e por isso precisa ser marcada por caso. Dessa forma o pronome relativo-wh, que inicia uma relativa livre, tem que ser compatível com o caso que o núcleo da sentença matriz atribui: (58) Eu vou comprar [DP [DP o que]i você está vendendo eci]. Em (58) o verbo da sentença matriz comprar atribui caso acusativo à relativa livre que é introduzida pelo pronome relativo-wh o que (DP). Na relativa é a ec (co-referente ao pronome relativo-wh) que satisfaz os requisitos do verbo vender, que também seleciona um DP como seu complemento, e atribui a ele caso acusativo. Como uma relativa livre é sempre iniciada por um pronome relativo-wh, no final das contas é esse pronome relativo-wh que tem que satisfazer os requisitos de caso e/ou categoria dos dois núcleos envolvidos na sentença. Essa igualdade sintática que o pronome relativo tem que respeitar é chamada de Requerimento de Compatibilidade (Matching Requirement) por Bresnan & Grimshaw (1978). Quando o pronome relativo-wh não consegue satisfazer os requerimentos de um dos núcleos envolvidos na sentença, a estrutura formada pode ser agramatical: (59) a. *Eu conheci [DP [PP com quem]i a Maria se casou eci]. b. * Eu conheci [PP [DP quem]i a Maria se casou eci]. 34 (59a) é agramatical porque o verbo da sentença encaixada casar seleciona um PP como seu complemento (com quem). Embora esse PP seja selecionado pelo verbo da sentença encaixada, ele não está em conformidade categorial com o verbo da sentença matriz conhecer que seleciona um DP como seu complemento. Portanto, há uma incompatibilidade de categorias e também caso, tornando (59a) agramatical. O mesmo ocorre em (59b) em que, embora o pronome relativo-wh seja selecionado categorialmente pelo verbo da sentença matriz conhecer, não está em conformidade categorial com o verbo da sentença encaixada casar que seleciona um PP. Trocando um dos verbos de (59) a agramaticalidade é resolvida: (60) a. Eu conheci [DP [DP quem]i Maria ama eci]. b. Eu conversei [PP [PP com quem]i Maria se casou eci]. As sentenças em (60) são boas porque os verbos das sentenças matrizes (conhecer, conversar) e encaixadas (amar, casar) subcategorizam respectivamente os mesmos elementos: um DP em (60a) e um PP em (60b). Mioto (no prelo) afirma que coisa semelhante pode ser dita para as sentenças peseudo-clivadas: (61) a. [DP [DP O que a Maria é] é escandalosa]. b. ? [DP [PP Onde a Maria mora] é em Florianópolis]17. (61a) é boa, pois a relativa livre, que está na posição de sujeito, é um DP e o pronome relativowh também é da categoria DP. Por outro lado, (61b) não é tão boa, talvez agramatical, porque o pronome relativo-wh é um PP e toda relativa deveria ser um DP (incompatibilidade de categoria). No entanto, esses requerimentos de compatibilidade não funcionam da mesma forma em todas as línguas. Por isso, o capítulo II dessa dissertação, vai ser dedicado a esse fenômeno. Na seção 2.2 analisamos as características de uma relativa livre. Em resumo, elas são sentenças encaixadas e não apresentam um núcleo nominal explícito, pois esse núcleo é incorporado no pronome relativo-wh. Atenção especial foi dada à expressão o que. Há situações em que o o é claramente um artigo ou demonstrativo precedendo um nome 17 Durante a defesa dessa dissertação, Mary A. Kato afirmou que, para ela, essa sentença é boa. Porém, eu e outros informantes discordamos desse julgamento. Assim, usamos o ponto de interrogação (?) no início da sentença para marcar essa discordância quanto a (a)gramaticalidade de algumas sentenças. 35 foneticamente não realizado e há situações em que o o que equivale ao what do inglês (visto como uma expressão única o+que). Ainda, pelo fato de uma relativa livre e uma interrogativa serem iniciadas pelos mesmos pronomes-wh, na seção 2.2.1 apresentamos algumas diferenças entre essas duas estruturas. Por último, na seção 2.2.2, mostramos uma característica das relativas livres, os requerimentos de compatibilidade: o constituinte relativizado tem que atender as exigências que provêm tanto da sentença matriz quanto da sentença encaixada. Na próxima seção vamos nos aprofundar um pouco na semântica das relativas livres. 3 A SEMÂNTICA DAS RELATIVAS LIVRES A classificação semântica das relativas mais conhecida na literatura é aquela que distingue relativas restritivas de relativas apositivas (ou explicativas). Essa relação semântica ocorre entre o núcleo nominal e a sentença relativa. Vejamos os exemplos de De Vries (2002, p. 16) adaptados para o português: (62) a. João falou aos palestrantes que falham no teste de didática. b. João falou aos palestrantes, que falharam no teste de didática. Em (62a) temos uma relativa restritiva. Nesse caso a relativa forma um constituinte com o núcleo nominal NP palestrantes. Esse NP designa um conjunto que é interseccionado com o conjunto designado pela relativa (conjunto dos palestrantes ∩ conjunto de todos os indivíduos que não passaram no teste de didática). Nessa interseção a relativa restringe (ou determina) o significado do NP (palestrantes), ou seja, o significado de (62a) é [João vai falar somente com o grupo de palestrantes que falharam no teste] (ele não vai falar com possíveis palestrantes que passaram no teste de didática). Já (62b) significa que [João vai falar com todos os palestrantes no domínio do discurso, que, a propósito falharam no teste de didática]. Ou seja, a relativa especifica o significado do núcleo nominal e por isso é chamada de relativa apositiva (ou explicativa). Ao contrário, as relativas livres não modificam um núcleo nominal, pois não possuem um núcleo nominal explícito (esse núcleo é embutido no pronome relativo-wh): (63) Eu comi [o que o garçom colocou no meu prato]. 36 Em (63) não temos um núcleo nominal explícito no qual a relativa possa ser aplicada. Assim, Grosu & Landman (1998) ampliam a classificação semântica de relativas restritivas e apositivas e criam uma terceira tipologia: as relativas maximizadas. De acordo com Grosu & Landman (1998), Van Riemsdijk (2000), De Vries (2002), entre outros, a relativa livre pode ter interpretação definida ou universal18: (64) a. I ate what the waiter Eu comi o+que o a'. I ate garçom colocou no meu prato. on my plate. coisa que o garçom colocou no meu prato. will eat whatever the waiter Eu comerei o+que+quer+que o b'. I on my plate. the thing that the waiter put Eu comi a b. I put will eat anything / will put on my plate. garçom coloque no meu prato. everything the waiter Eu comerei qualquer coisa/tudo+o+que o put on my plate. garçom coloque no meu prato. Em (64a) temos uma leitura definida e, em (64b) uma leitura universal. Ainda não há um consenso a respeito do tipo de quantificador (anything/everything) envolvido na leitura universal (64b'). Assim, essa sentença apresenta duas leituras: na primeira leitura (com o quantificador anything) a paráfrase é [eu irei comer qualquer coisa de um conjunto de itens que o garçom colocar no meu prato]. Esta leitura é chamada de free choice any; na segunda leitura a paráfrase é (com o everything), [eu irei comer todos os itens (de comida) que o garçom colocar no meu prato]. Van Riemsdijk (2000) ressalta que (64a) pode ser ambígua, ou seja, também pode ter uma leitura universal (65): (65) I will eat what happens to be on the menu. Eu comerei o+que estiver no menu. Essa observação levou alguns lingüistas a se questionarem sobre a possibilidade de unificar essas duas leituras. Jacobson19 (1995 apud VAN RIEMSDIJK, 2000; CAPONIGRO, 2001), assim como Grosu e Landman (1998) sugerem que essa unificação seja feita pela noção 18 Os exemplos (64) e (65) são de Van Riemsdijk (2000, p. 23). 19 JACOBSON, Pauline. On the quantificational force of English Free Relatives. In: BACH, E., JELINEK, E., KRATZER, A. and PARTEE, B.H. (eds.). Quantification in Natural Languages. Dordrecht: Kluwer, 1995, p. 451486. 37 de entidade plural máxima (maximal plural entity). Ou seja, eles propõem uma leitura semântica de maximização para as relativas livres cuja interpretação é definida ou universal. Para Jacobson (1995 apud CAPONIGRO, 2001, p. 8) “wh-words denote a function that applies to a set P of individuals and returns the singleton set containing the maximal plural individual P”20, como na sentença abaixo21: (66) João perguntou/trouxe [CP [o que]i Maria comprou ti]. A sentença-wh em (66) [o que Maria comprou ti] pode ser tanto uma relativa livre quanto uma interrogativa (a escolha vai depender do verbo da sentença matriz). Mesmo assim, o significado do CP de ambas as estruturas é o mesmo: os dois denotam um conjunto de indivíduos plurais máximos que se origina da soma de todos os indivíduos atômicos que Maria comprou (se Maria comprou somente uma coisa, o único indivíduo plural atômico e o indivíduo plural máximo coincidem). Se Maria comprou sorvete, bananas e carne o conjunto de indivíduos plurais vai ser formado por todos esse indivíduos atômicos juntos (sorvete+ bananas+ carne): (67) Indivíduos atômicos que Maria comprou: s: sorvete b: banana c: carne (67) representa a lista dos indivíduos atômicos ou das coisas que Maria comprou. No diagrama abaixo temos a denotação do IP [IP Maria comprou ti]. Essa denotação é o conjunto de todos os indivíduos atômicos que Maria comprou mais todos os indivíduos plurais resultantes de todas as possíveis ‘somas’ dos indivíduos atômicos que Maria comprou: (68) [IP Maria comprou ti] . indivíduos plurais máximo 20 s+b+c s+b s+c s b+c b c }indivíduos plurais }indivíduos atômicos “palavras-wh denotam uma função que é aplicada a um conjunto P de indivíduos e dá como retorno um conjunto único que contém um indivíduo plural máximo”. 21 Essa explicação é adaptada de Caponigro (2001). 38 A combinação do pronome-wh com o IP muda a denotação de (68) para um conjunto unitário que contém somente os indivíduos plurais máximos de (68): (69) [CP o quei [IP Maria comprou ti]] = s+b+c Ou seja, a contribuição semântica do pronome-wh é transformar o conjunto plural descrito em (68) em um conjunto unitário de indivíduos plurais máximos. Para dar conta da diferença entre relativas livres e interrogativas Jacobson (1995 apud CAPONIGRO, 2001, p. 10) aplica duas operações semânticas diferentes no CP (que possui o mesmo significado). Se o CP [CP o que Maria comprou] for selecionado por trouxe, como em (70), teremos uma relativa livre e a ela é aplicada uma operação de type-shifting. Aqui a relativa livre termina denotando ela mesma um indivíduo plural máximo (tipo <e> e não do tipo <e,t>). Ou seja, a relativa livre funciona com um argumento. Grosu (2002, p. 147) acrescenta que o núcleo C dessas relativas livres contém um traço [+definido] “which has the essential (but not exact!) import of the definite article”22. É esse artigo definido em C que é visto como um operador de MAX (maximização), que mapeia um conjunto de indivíduos em um único conjunto singular máximo. (70) João trouxe [relativa livre o que a Maria comprou]. Caso o CP seja o complemento de um predicado interrogativo, como perguntar, teremos uma sentença interrogativa. Uma outra operação semântica de type-shifting será aplicada e a denotação final será uma única proposição verdadeira que afirma que [Maria comprou todas as coisas que ela comprou]. Em uma situação como (67), (71) abaixo, denota uma proposição que afirma que Maria comprou sorvete, banana e carne. Aqui o núcleo C contém um traço [+interrogativo]. (71) João perguntou [wh-interrogativo o que a Maria comprou]. Em resumo, quando o constituinte for uma relativa livre aplicaremos o type-shifting e a relativa livre denotará uma entidade, um indivíduo do tipo <e>. Da mesma forma quando o constituinte for uma interrogativa aplicaremos o type-shifting, só que agora a interrogativa 22 “o qual tem a característica essencial (mas não exata!) de um artigo definido”. 39 encaixada vai denotar um conjunto de proposições do tipo <e,t> que é uma sentença aberta que vai buscar seu valor de verdade nas respostas. Com essa semântica, descrita por Jacobson (1995 apud CAPONIGRO, 2001) podemos assumir que todas as relativas livres têm uma leitura de maximização que é feita pela noção de entidade plural máxima. Nas palavras de Van Riemsdijk (2000, p. 24): We may then assume that a FR like what Mary recommended denotes the set of maximal plural entities that Mary recommended (rather than any set of individuals that Mary recommended). Given the fact that this set may be limited to a single atomic entity, we now have an account for the fact that FRs at times seem to be singular definites and at times universals: we always have a singleton set. If there is only a single entity that Mary recommended, then the FR will be equivalent to a singular definite. And if there is more than one entity, then the FR will denote the single entity composed of all entities that Mary 23 recommended, which amounts to a universal interpretation . 4 RESUMO DO CAPÍTULO Neste capítulo definimos, com cuidado, as características das relativas. Em suma, elas são sempre sentenças encaixadas e apresentam um constituinte que é compartilhado com a sentença matriz através do SpecCP. Vimos também que as relativas são divididas em relativas com núcleo e relativas livres. As relativas com núcleo sempre modificam um núcleo nominal e por isso, são sempre adjunto de um nome. Elas são divididas em relativas com pronome resumptivo (relativa resumptiva) e relativas sem pronome resumptivo (relativa cortadora, relativa padrão e relativa com preposição órfã). Ao contrário, as relativas livres não possuem um núcleo nominal explícito e podem exercer as funções sintáticas de argumento, adjunto ou predicativo. Essas relativas só podem ser iniciadas por pronomes relativos que incorporem o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo, como quem, onde, como, etc.. Atenção especial foi dada à expressão o que: há situações em que o o é claramente um artigo ou demonstrativo precedendo um nome 23 Podemos assumir que uma relativa livre como [o que Maria recomendou] denota o conjunto de entidades plurais máximas que Maria recomendou (ao invés de qualquer conjunto de indivíduos que Maria recomendou). Dado que este conjunto pode ser limitado a uma entidade atômica singular, nós conseguimos explicar o fato de que relativas livres às vezes parecem ser definidos singulares e às vezes universais: nós sempre temos um conjunto singular. Se há apenas uma entidade singular que Maria recomendou, então a relativa livre será equivalente ao singular definido. Se houver mais de uma entidade, então a relativa livre denotará a entidade singular composta por todas as entidades que Maria recomendou, o que nos leva a uma interpretação universal. 40 foneticamente não realizado e há situações em que o o que equivale ao what do inglês (visto como uma expressão única o+que). Ainda, por serem iniciadas por um pronome-wh, as relativas livres são freqüentemente confundidas com as interrogativas encaixadas. Dessa forma, na seção 2.2.1 apresentamos algumas diferenças entre essas estruturas: a) diferença no significado; b) possibilidade ou não de extração para fora do CP (as relativas livres não permitem movimento); e, c) diferença quanto à seleção do verbo da sentença matriz (CP/NP). Além disso, apresentamos três testes: a) possibilidade de inserção ou não do constituinte (é)que, possível somente para as interrogativas encaixadas; b) inserção do quer que logo após o pronome relativo-wh (permitido unicamente para relativas livres); e, c) substituição do pronome-wh por uma expressão claramente interrogativa. Também verificamos que uma relativa livre figura como um DP e por isso, precisa ser marcada por caso. Dessa forma, o pronome relativo-wh, que inicia uma relativa livre, tem que ser compatível com o caso que um núcleo da sentença matriz atribui bem como tem que ser compatível com o caso que um núcleo da relativa atribui. Essa igualdade categorial/sintática é chamada de Requerimento de Compatibilidade (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978). Ou seja, o pronome relativo-wh tem que atender as exigências que provêm tanto da sentença matriz quanto da sentença subordinada. Por último, analisamos a semântica das relativas livres que é uma semântica de maximização (o pronome relativo-wh denota uma função que é aplicada a um conjunto de indivíduos e que dá como saída um conjunto único que contém um indivíduo plural máximo). No próximo capítulo nos aprofundaremos no estudo dos Requerimentos de Compatibilidade, que são uma característica específica das relativas livres. 41 CAPÍTULO II REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE 1 INTRODUÇÃO Neste capítulo iremos analisar uma característica excepcional das relativas livres: os Requerimentos de Compatibilidade (MR – Matching Requirement). Pelo MR o pronome relativowh deve respeitar os requisitos de caso e/ou de categoria de um núcleo da sentença matriz e encaixada simultaneamente. Assim, na seção 2 delimitamos as funções sintáticas das relativas livres bem como as categorias dos pronomes relativos que as encabeçam. De posse dessas funções sintáticas definimos, na seção 3, o que é o MR. Já na seção 4, dividimos as línguas naturais em duas categorias: 4.1) línguas que apresentam relativas livres com os MR e, 4.2) línguas que possuem relativas livres sem compatibilidade de casos e/ou sem compatibilidade de categorias. Veremos que o português brasileiro, seção 5, por ser uma língua sem marcação de caso na morfologia, apresenta somente restrições de combinação categorial. Por fim, na seção 6, vamos analisar um tipo especial de relativa livre, as infinitivas, que a princípio parecem ser o único tipo de estrutura encontrada no português em que os MR não ocorrem. 2 AS FUNÇÕES SINTÁTICAS DAS RELATIVAS LIVRES E OS PRONOMES RELATIVOS Como vimos no capítulo I (seção 2.1), nas relativas com núcleo é o constituinte do qual a relativa faz parte que satisfaz os requisitos de um núcleo da sentença matriz e a ec (coreferente ao pronome relativo-wh ou ao OP) que satisfaz os requisitos de um núcleo da sentença encaixada: (1) a. Hoje, vou encontrar a menina [[com quem]i vou casar eci]. b. Ele foge da menina [que ec trabalha pra ele]. 42 Os constituintes entre colchetes em (1) são relativas com núcleo. As relativas com núcleo são sempre adjunto de um nome, no caso de (1), adjunto do nome menina. Por ser um adjunto adnominal, a relativa pertence ao DP e, por isso, também faz parte do argumento de um núcleo da sentença matriz. Em (1a) o verbo encontrar seleciona um DP como seu argumento interno. Sendo assim, é todo o DP [a menina com quem vou casar] que satisfaz os requisitos do verbo da sentença matriz. Já o pronome relativo-wh quem (precedido pela preposição com), coreferente à ec, satisfaz os requisitos do verbo da sentença encaixada casar, que seleciona um PP como seu argumento. O mesmo ocorre quando o DP é selecionado por uma preposição: todo o PP [da menina que trabalha pra ele] é o argumento interno do verbo da sentença matriz fugir. Os requisitos do verbo da sentença encaixada são satisfeitos pela ec que é co-referente ao DP a menina através do SpecCP. Diferentemente das relativas com núcleo, as relativas livres podem estar na posição de argumento, adjunto adverbial ou predicativo. Por não apresentarem um núcleo nominal explícito toda a relativa (que é encabeçada pelo pronome relativo-wh) tem que desempenhar uma função sintática na sentença matriz e o pronome relativo-wh tem que desempenhar uma função sintática dentro da relativa: (2) a. [RL [O que]i você cozinhou eci] está mofado. b. Ele cozinhou [RL [o que]i eci estava mofado]. c. Eu falei [PP com [RL [quem]i eci votou em você]]. d. Ela tem medo [PP de [RL [quem]i eci grita]]. e. A Suzanita é [RL [quem]i eci está segurando a rosa]. f. Eu encontrei o João [PP com [RL [quem]i eci odeia você]]. Em (2), as sentenças entre colchetes funcionam como argumento. Em (2a), o constituinte [o que você cozinhou] é o sujeito da sentença e da small clause (SC) e é, também, uma relativa livre. A ec, co-referente ao pronome relativo [o que] funciona como argumento interno do verbo cozinhar. Em (2b) a relativa livre desempenha a função sintática de objeto direto do verbo cozinhar e o pronome relativo-wh desempenha a função de sujeito da relativa livre e da SC. Já em (2c) a relativa livre [quem votou em você] é complemento da preposição com, que é o núcleo do PP complemento do verbo falar. A relativa livre [quem votou em você] satisfaz os requerimentos da preposição com e a ec, que é um DP, satisfaz os requisitos da função de sujeito da sentença relativa. Em (2d) o constituinte [de quem grita] é complemento do nome medo, ou seja, da mesma forma que em (2c), a relativa livre é complemento da preposição 43 funcional de e a ec, que é um DP, desempenha a função sintática de sujeito do verbo gritar. Em (2e) a relativa livre é um predicativo (predicado de uma SC, se, de acordo com Kato et al.24 (no prelo), responde a pergunta: Quem é Suzanita?) e a ec desempenha a função sintática de sujeito da relativa livre e da SC. Por fim, o PP [com quem odeia você] em (2f) é adjunto adverbial. A relativa livre funciona como argumento da preposição com e a ec funciona como sujeito do verbo odiar. Em resumo, em todas as sentenças descritas em (2) o pronome relativowh equivale a um DP e a relativa livre, exceto em (2e) (onde é um DP predicativo), funciona como argumento. Sendo assim, para que a relativa livre satisfaça os requerimentos da sentença matriz, ela tem que ser introduzida por um pronome relativo-wh que seja compatível com a função que a relativa livre desempenha: nos casos de (2) tem que ser um pronome do tipo DP; realçamos novamente a obrigatoriedade da preposição em (2d) para que o pronome relativo-wh (e a relativa livre) seja marcado por caso. Dessa forma, os pronomes relativos tem que realizar uma função na sentença matriz e na relativa livre simultaneamente. Uma relativa livre funciona também como um adjunto adverbial: (3) a. Ela saiu [RL quando ele chegou]. b. João caminhou [RL onde estava nevando]. Quando a relativa funciona como adjunto o compartilhamento do pronome relativo-wh se dá de forma indireta. As relativas livres em (3) têm que preencher os requisitos necessários para que ela possa ser um adjunto adverbial. Sabemos que o que é talhado para ser um adjunto adverbial ou é um advérbio (4a) ou um PP (4b): (4) a. Ela saiu [ontem]. b. Ela saiu [no dia 25]. Em (4b), o DP o dia 25 é o complemento da preposição: recebe papel temático (tema) e caso (oblíquo) da preposição. Se uma relativa livre é do tipo DP (encabeçada por quem ou o que), em situações semelhantes a (4b), ela só pode pertencer ao adjunto se for complemento de uma preposição. Assim como o DP o dia 25 é o complemento da preposição em em (4b), a relativa livre [quem odeia você] tem que satisfazer os requerimentos da preposição com em (2f). 24 KATO, Mary Aizawa et al. As construções-Q no português brasileiro falado: relativas, clivadas e interrogativas. 44 Por outro lado, se a relativa livre é ela mesma o adjunto, a falta da preposição força que ela seja do tipo adverbial, como em (3). Os itens lexicais que marcam isso em (3) são os pronomes relativos-wh “adverbiais” quando e onde. Como vimos no capítulo anterior, os pronomes relativos quando e onde embutem o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo: momento e lugar. Devemos acrescentar que o quando e onde, por poderem ser parafraseados por todo o PP grifado em (5), embutem também a preposição (quando = no momento em que; onde = no lugar em que): (5) a. Ela saiu no momento (em) que ele chegou. b. João encontrou Maria no lugar (em) que Pedro disse. Larson (1987) postulou que o pronome relativo tem um marcador de caso inerente a ele (embutido nele). O caso que a preposição forneceria ao DP é incorporado pelo pronome relativo. Assim o quando incorpora o caso da preposição temporal; onde incorpora o caso da preposição locativa, etc.. Dessa forma, uma relativa livre que funciona como adjunto do VP tem que ser encabeçada por um pronome relativo-wh “adverbial”: esse pronome-wh vai ser compatível com a ec adjunto do VP da relativa (adjunto de tempo/lugar) e vai fazer com que a relativa livre possa ser adjunto do VP matriz. Entretanto, é preciso acrescentar que quando e onde parecem poder ser também pronomes relativos-wh do tipo DP. Consideremos os exemplos em (6)25: (6) a. Eu conheço Maria desde quando/desde [DP o tempo em que ela era uma garotinha sardenta]. b. Maria andou por onde/por [DP lugares em que andaram os primeiros invasores do Brasil]. As paráfrases mostram que o que vêm após as preposições desde e por é um DP: o complemento de uma preposição não pode ser um PP. Esses fatos ajudam a entender o alto grau de aceitabilidade que existe no português brasileiro em relação às sentenças de (7): 25 Em especial, como já foi observado por Pires de Oliveira (1999); Furlanetto (2004); Oliveira (2000), entre outros, o onde parece estar passando por uma inovação, como vemos em (i): (i) Houve um desmoronamento onde atingiu várias casas (de entrevista de Dário Berger, prefeito de Florianópolis, sobre as inundações de 2008). Este pronome relativo está simplesmente sendo usado em lugar do que. 45 (7) a. Quando a Maria chegou foi emocionante. b. Onde a Maria mora é bonito. Para serem aceitáveis encabeçando uma relativa livre que funciona como sujeito, os pronomes relativos-wh devem poder ser do tipo DP. Em resumo, as relativas livres normalmente funcionam como argumento, adjunto ou predicativo da SC. O pronome relativo-wh que as encabeça tem que ser apropriado para possibilitar o encaixe da relativa livre, como argumento, como adjunto ou como predicativo. 3 ASSENTANDO OS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE Como verificamos na seção anterior uma relativa livre pode funcionar como argumento, adjunto ou predicativo. Sendo assim, para que a relativa livre satisfaça os requerimentos da sentença matriz, ela tem que ser introduzida por um pronome relativo-wh que seja compatível com a função que a relativa livre desempenha. Além disso, as relativas livres se distribuem como sintagmas simples: (8) a. [Quem ganhou a corrida] correu descalço. b. [O João] correu descalço. (9) a. Eu comprei [o que você pediu]. b. Eu comprei [o livro]. (10) a. Eu cheguei [quando a Maria partiu]. b. Eu cheguei [ontem]. (11) a. John will be [however tall his father was]. b. John will be [six feet tall]. Em (8) e (9) a relativa livre é argumento do verbo da sentença matriz; em (10) ela é adjunto do VP e em (11) funciona como predicativo de uma SC. É visível que o argumento das sentenças matrizes em (8) e (9) são DPs e as descritas em (11) APs26. Já em (10) os constituintes entre colchetes são AdvP. Assim, ao analisarem dados como os descritos acima, Bresnan & 26 No português brasileiro parece que não temos relativas livres encabeçadas por APs, temos somente relativas livres nominais (precedidas ou não de preposição), locativas (iniciadas pelo morfema onde) (BRITO, 1991) e temporais (iniciadas pelo morfema quando). 46 Grimshaw (1978, p. 336) concluíram que as relativas livres, em (a), têm a mesma distribuição sintática dos sintagmas simples, dados em (b). Através dos constituintes destacados entre colchetes nas sentenças em (a), de (8) a (11), as autoras observaram que “the syntactic category of the wh-phrase is the same as that of the whole relative; that is, the same as that of the dominating node”27: (8') [DP [DP Quem] ganhou a corrida] correu descalço. (9') Eu comprei [DP[DP o que] você pediu]. (10') Eu cheguei [AdvP[AdvP quando] Maria partiu]. (11') John will be [AP [AP however tall] his father was]. Em (8') a relativa livre, entre colchetes, está em posição sintática de sujeito que é prototípica de DPs, por isso o pronome relativo-wh quem também é da categoria DP. Em (9') a relativa livre funciona como objeto do verbo comprar, por isso é um DP e o pronome relativo-wh também é dessa categoria. Coisa semelhante acontece em (10') e (11') em que a relativa e o pronome relativo-wh são um AdvP e um AP respectivamente. Sendo assim, o pronome relativo-wh e a relativa livre sempre são da mesma categoria. Ou seja, a relativa livre deve estar munida de todo aparato sintático para poder ser encaixada na sentença matriz e o aparato está refletido no pronome relativo-wh que a introduz. Ao mesmo tempo, o pronome relativo-wh deve estar aparelhado para desempenhar sua função dentro da relativa livre. No final das contas, como é o pronome relativo-wh que encabeça a relativa livre, é esse pronome-wh que tem que ser compatível com os requisitos de um núcleo da sentença matriz e da encaixada simultaneamente. Quando não se verifica essa compatibilidade, a sentença fica, em maior ou menor grau, danificada sintaticamente28: (12) a. * Eu vi ontem [de quem tu gostas]. b. *João detesta [quem o filho anda]. c. João se encontrou [com quem o filho anda]. Para analisar as sentenças em (12), tenhamos em mente que no português não se verifica o fenômeno da preposição órfã. Assim, em (12a) temos que mover o pronome relativo-wh quem para a periferia esquerda da sentença relativa, o que faz com que a preposição de seja 27 “a categoria sintática do sintagma-wh é a mesma de toda relativa livre; isto é, a mesma do nó dominante” (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978, p. 336). 28 Sentenças em (12a) e (12b) foram retiradas de Brito (1991, p. 204). 47 arrastada junto com o pronome-wh. Entretanto, o PP de quem, que satisfaz as condições para ser objeto indireto do verbo gostar, não preenche as condições para ser objeto direto do verbo ver. Dessa situação resulta a agramaticalidade da sentença. Em (12b), o DP quem na periferia esquerda da relativa satisfaz os requisitos para ser objeto direto do verbo detestar, mas falha em atender à condição de complemento PP (ou de adjunto) do verbo andar. Por outro lado, em (12c) o PP com quem atende tanto os requisitos para encaixar a relativa livre na sentença matriz quanto para encaixar-se como complemento do verbo da relativa. Nesse caso, a sentença é gramatical. A essa compatibilidade categorial que o pronome relativo-wh deve respeitar, como já dissemos anteriormente, chamou-se de Matching Requirement ou Requerimentos de Compatibilidade (MR). O MR é uma propriedade ‘excepcional’ (VOGEL, 2001) das relativas livres que foi observada por Bresnan & Grimshaw (1978) e formulada da seguinte maneira: (13) The Matching Requirement29: a. Case Matching: [FR wh-CASEi ...]-CASEi b. Categorial Matching: [FR [wh]XPi …]XPi Case matching (13a) ocorre quando o MR é realizado através da marcação de caso, ou seja, quando o pronome relativo-wh é tal que satisfaz os requisitos de caso de um núcleo da sentença matriz e encaixada simultaneamente. No categorial matching (13b), o sintagma que contém o pronome relativo-wh deve respeitar os requisitos de seleção (DP, PP, AP) categorial dos dois núcleos envolvidos na construção. Por essa hipótese, uma sentença que contém uma relativa livre só é gramatical se respeitar às exigências de caso e/ou categoria dos dois núcleos envolvidos na construção, como em (14): (14) a. [DP[DP Quem]i eci ganhou a corrida] correu descalço. b. João comprou [DP[DP o que]i a Maria pediu eci]. c. Ele vendeu o carro para [DP[DP quem]i você conhece eci]. d. A Maria é [DP[DP quem]i eci está de vestido branco]. e. A Maria é [DP[DP o que]i a mãe dela foi eci] (: professora). 29 Requerimentos de Compatibilidade: a. Compatibilidade de caso: : [FR wh-CASOi ...]-CASOi b. Compatibilidade de categoria: [FR [wh]XPi …]XPi 48 Em (14a) e (14b) temos o chamado full matching requirement (requerimento de compatibilidade total/pleno) porque ambos os núcleos selecionam um DP como seu argumento. Em (14a) os verbos, correr e ganhar selecionam um DP (categorial matching) como seu argumento externo, tendo, portanto, o pronome relativo-wh e a ec (que é co-referente ao pronome relativo-wh) caso nominativo (case matching). Em (14b) os verbos da sentença matriz comprar e o da encaixada pedir também selecionam um DP e a ele atribuem caso acusativo. Sendo assim, o pronome relativo-wh é um DP e satisfaz os requisitos de caso e categoria dos dois núcleos envolvidos na sentença. Em (14c), embora o pronome relativo-wh não tenha o mesmo caso na sentença matriz (recebe caso oblíquo da preposição para) e na encaixada (recebe acusativo do verbo conhecer), eles são da mesma categoria DP (quem), satisfazendo assim, os requerimentos categoriais de compatibilidade. Por fim, (14d) e (14e) contêm relativas livres que funcionam como DP predicativo de uma sentença copular especificacional e predicacional, respectivamente. Em (14d), ao mesmo tempo em que o DP relativo quem encabeça o predicativo, é o sujeito da relativa. Nesse caso, se, como sugeriu Carlos Mioto (c.p.), o predicativo tem caso nominativo por concordância com o sujeito, (como era explícito no latim) se verifica a compatibilidade de caso. Em (14e) a relativa livre é predicativo da sentença matriz e o pronome-wh é predicativo da relativa, verificando-se plenamente o MR. Por ser uma característica específica das relativas livres, o MR não está presente nas relativas com núcleo (15a), nem nas interrogativas encaixadas (15b): (15) a. Eu conheço [DP o rapaz] [PP de quem você falou [PP ec ]]. b. Maria perguntou [CP [PP com quem]i o João falou [PP eci]]. Em (15a) o PP que contém o pronome relativo-wh atende as exigências do verbo falar da sentença encaixada. Esse pronome relativo-wh está isento de respeitar os requisitos da sentença matriz, já que o todo o DP [o rapaz de quem você falou] se encarrega desse papel e recebe caso acusativo do verbo conhecer. Em (15b) o pronome interrogativo-wh faz parte de um PP selecionado pelo verbo da sentença encaixada falar. Entretanto, se o verbo perguntar seleciona um PP, como vemos em (16), a preposição que o encabeça não pode ser com: (16) Maria perguntou disso/sobre isso. 49 O que o verbo perguntar seleciona em (15b) é um CP que, de acordo com Mioto (1994) e Kato & Mioto (2005), precisa ser marcado como interrogativo: o pronome-wh está em SpecCP justamente para desempenhar essa função. Como mostram Kato et al. (no prelo), para o verbo perguntar, não importa se o pronome-wh é do tipo DP, PP ou adverbial, nem mesmo se o CP tem um pronome-wh. O que importa é tão somente que o CP complemento seja interrogativo, com qualquer pronome-wh ou com o complementizador interrogativo: (17) a. Maria perguntou o que o João comprou. b. Maria perguntou por que o João saiu. c. Maria perguntou quando o João saiu. d. Maria perguntou se o João saiu. Em 1981, Groos e Van Riemsdijk30 (apud VOGEL, 2001) observaram que nem todas as línguas apresentam o fenômeno do MR. Eles postulam que a existência ou não do MR depende da função sintática que a relativa livre exerce na sentença, bem como da língua em que ocorre. Além disso, Larson (1987, p. 244) afirma que a posição ocupada por um PP ou AdvP, por exemplo, em uma relativa livre nem sempre é uma posição exclusiva dessa categoria: (18) a. John will leave [AdvP subsequently]. (Ele partirá posteriormente) b. [PP on Thursday]. (... na terça-feira) c. [DP the day that Max arrives]. (... o dia que Max chegar) Através das sentenças em (18) observamos que a argumentação em favor da compatibilidade categorial/casual parece ser enfraquecida, muito embora em (18c), pelo menos no português, esteja implícita a preposição em (no dia em que Max chegar). Ou seja, o MR não é um fenômeno generalizado. Na próxima seção vamos verificar como o MR ocorre em algumas línguas e na seção 5, como ele ocorre com o português brasileiro. 30 GROOS, Anneke & VAN RIEMSDIJK, Henk. Matching Effects with free relatives: a parameter of core grammar. In: BELLETTI, A.; BRANDI, L. & RIZZI, L. (eds). Theories of markedness in Generative Grammar, Scuola Normale Superiore di Pisa, Pisa, 1981, p. 171–216. 50 4 A MANIFESTAÇÃO DOS REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE NAS LÍNGUAS A existência ou não do MR depende da função sintática que a relativa livre exerce na sentença, bem como da língua em que ocorre. Assim, com o intuito de encontrar alguma semelhança entre as línguas, vários lingüistas se dedicaram ao estudo desse fenômeno. Dentre eles Hirschbühler & Rivero (1983), Izvorski (1996), Van Riemsdijk (2000) e Vogel (2001). A partir desses estudos dividimos as línguas em duas categorias: a) línguas que apresentam relativas livres com MR obrigatório, e b) línguas que apresentam relativas livres sem a compatibilidade de caso e/ou categoria. Abaixo detalhamos cada uma dessas duas divisões. 4.1 LÍNGUAS QUE APRESENTAM RELATIVAS LIVRES COM MR OBRIGATÓRIO O francês e inglês (VOGEL, 2001; IZVORSKI, 1996; HIRSCHBÜHLER & RIVERO, 1983) são línguas que apresentam o MR obrigatório. Além disso, o holandês, uma variante do alemão - variante C - (GROOS & VAN RIEMSDIJK, 1981 apud HIRSCHBÜHLER & RIVERO, 1983) e o norueguês (AFARLI31, 1994 apud VOGEL, 2001) também têm MR obrigatório em todas as posições sintáticas. Vejamos um exemplo do inglês retirado de Izvorski (1996, p. 2): (19) *[FR With whom I talked] arrived last. Com quem eu conversei chegou tarde. (19) é agramatical, pois a relativa livre está na posição de sujeito, que é uma posição prototípica de NP ou DP, mas é encabeçada por um PP [with whom] (com quem). 31 ÅFARLI, Tor A. A promotion analysis of restrictive relative clauses. The Linguistic Review, n.11, p. 81–100, 1994. 51 4.2 LÍNGUAS QUE APRESENTAM RELATIVAS LIVRES COM INCOMPATIBILIDADE DE CASOS OU DE CATEGORIAS Existem línguas em que o pronome relativo-wh não respeita os requisitos de um dos dois núcleos envolvidos na construção e, mesmo assim forma sentenças com maior ou menor grau de gramaticalidade. Essa incompatibilidade pode ser de categorias ou de casos. A incompatibilidade categorial ocorre quando o pronome relativo-wh apresenta categorias diferentes na sentença matriz e na encaixada. A incompatibilidade de caso ocorre quando o caso fornecido por um núcleo da sentença matriz e da encaixada não coincidem e, mesmo assim a sentença formada é boa. 4.2.1 Incompatibilidade de categorias (categorial matching) A incompatibilidade de categorias ocorre quando o pronome relativo-wh não está em conformidade categorial com um dos núcleos envolvidos na construção da sentença. A princípio, não encontramos nenhuma língua com incompatibilidade categorial. Vejamos: (20) * Eu chamei [DP [PP com quem seu filho anda]]. A sentença (20) é agramatical, pois a expressão-wh [PP com quem] respeita os requisitos categoriais do verbo da sentença encaixada andar, mas não o do verbo da sentença matriz chamar que pede um DP como seu complemento. 4.2.2 Incompatibilidade de casos (case matching) De acordo com Van Riemsdijk (2000), a incompatibilidade entre o caso fornecido por um núcleo da sentença matriz e o caso fornecido por um núcleo da sentença encaixada pode ser resolvida de três formas diferentes: a) sincretismo, b) atração de caso; e, c) inserção de um pronome resumptivo que realiza o caso de um dos núcleos envolvidos na sentença. 52 4.2.2.1 Sincretismo O sincretismo de casos ocorre em línguas que apresentam pronomes relativos-wh com a mesma forma para um ou mais casos abstratos. No alemão, o pronome relativo-wh was tem a mesma forma para os casos neutro: nominativo e acusativo (VAN RIEMSDIJK, 2000, p. 18): (21) Was du gekocht hast ist schimmlig. O+que você cozinhou está mofado. Em (21) o pronome relativo was (o que) pode receber caso acusativo do verbo da sentença encaixada gekocht (cozinhou), já que é seu argumento interno; mas, também pode receber caso nominativo da flexão Iº do verbo da matriz ist (estar). Ou seja, o pronome-wh was pode ‘escolher’ seu caso. Isso ocorre porque esse pronome tem a mesma forma (was) para o acusativo e o nominativo. É importante lembrar que o pronome relativo-wh mesmo tendo a possibilidade de receber casos diferentes não fere o MR, pois a categoria do pronome-wh é a mesma (categorial matching). Parece que as relativas livres só estão sujeitas ao case matching em línguas com marcação casual na morfologia. 4.2.2.2 Atração de caso Aqui estão incluídas as línguas que têm relativas livres sem o case matching, mas que apresentam uma certa regularidade quanto à marcação de caso. Esse fenômeno é chamado de atração de caso (case attraction). Leung (2005, p. 280) aponta que, quando o pronome relativo-wh satisfaz os requisitos de caso de um núcleo apenas, normalmente ele satisfaz os requisitos do núcleo da sentença matriz (ele afirma que não encontrou nenhuma língua que não funcione dessa forma), salvo nos casos da hierarquia de caso (do alemão e de outras línguas). 53 Vogel (2001, 2002), que trabalha sob a perspectiva da Teoria da Otimalidade, analisou cinco línguas que apresentam atração de caso: islandês, alemão A32, alemão B, gótico e grego moderno33. Vejamos cada uma delas: a) Islandês: No islandês o pronome relativo-wh sempre carrega o caso fornecido por um núcleo da sentença matriz e apaga o caso que seria fornecido por um núcleo da relativa livre (= sentença encaixada): (22) Ég hjálpa hverjum / *hvern (sem) ég elska. Eu ajudo quem-DAT / *quem-ACC (que) eu amo. A sentença (22) só é aceitável se o caso realizado pelo pronome relativo-wh for o caso dativo, fornecido pelo verbo da sentença matriz hjálpa (ajudar). b) Alemão A: Nessa variante do alemão, ao contrário do islandês, o pronome relativo-wh tem que realizar o caso atribuído por um núcleo da sentença encaixada e apagar o caso que seria atribuído por um núcleo da sentença matriz. O caso atribuído pelo núcleo da matriz só não pode ser apagado se ele for da forma oblíqua (isto é, dativo, genitivo ou PP): (23) Er zerstörte was / wer ihm begegnete. Ele destruiu o+que/quem-NOM ele-DAT afrontou. ‘Ele destruiu o que/quem o afrontou’. 32 Vogel (2001, 2002) divide o alemão em três variantes: variante A e variante B, que serão trabalhadas aqui, e variante C que é aquela que possui o MR sempre/em todas as posições sintáticas. 33 Todos os exemplos dessa sub-seção, exceto os do português brasileiro, foram retirados de Vogel (2001, 2002). 54 Em (23) o pronome relativo-wh realiza o caso nominativo atribuído pela flexão Iº do verbo da sentença encaixada begegnete (afrontou) e por isso, tem a forma wer. O pronome relativo-wh também pode ter a forma was. Quando isso ocorre não sabemos quem é o atribuidor de caso, já que esse pronome-wh tem a mesma forma para o nominativo e acusativo. c) Alemão B: Nessa variante, as relativas livres são sensíveis à hierarquia de caso descrita por 34 Pittner (1991 apud VOGEL, 2001, p. 111): (24) nominativo < acusativo < dativo, genitivo, PP. Em (24) temos uma escala hierárquica de caso. O caso mais especificado ou mais marcado é aquele que está mais à direita na hierarquia de (24). Somente relativas livres que apagam o caso menos marcado são aceitáveis. Entretanto, isso só ocorre se o caso mais marcado for o caso atribuído por um núcleo da sentença encaixada. Ou seja, o pronome relativo-wh sempre realiza o caso fornecido por um núcleo da sentença encaixada, porém, esse caso tem que ser mais marcado/mais especificado do que o caso fornecido por um núcleo da sentença matriz. (25) Matriz = acusativo ; Encaixada = nominativo a. *Er zertörte, wer ihm begegnete. Ele destruiu quem-NOM ele-DAT afrontou. ‘Ele destruiu quem o afrontou’. Matriz = nominativo ; Encaixada = acusativo b. Ihm begegnete, wen ele-DAT afrontou er zerstören wollte. quem-ACC ele destruir queria. ‘Quem ele queria destruir o afrontou’. 34 PITTNER, Karin. Freie relativsätze und die kasushierarchie. In: FELDBUSCH, E. (ed.). Neue Fragen der Linguistik. p. 341–347, 1991. 55 Ao contrário do alemão A (cf. (23)), no alemão B a sentença em (25a) é agramatical. Em (25a) o pronome relativo-wh wer (quem) recebe caso nominativo da flexão Iº do verbo begegnete (afrontar) da sentença encaixada e apaga o caso acusativo do verbo zerstöre (destruiu) da sentença matriz. Pela hierarquia de casos em (24), o caso acusativo é mais marcado do que o nominativo e por isso, não poderia ser apagado. Ao contrário, (25b) é boa, pois o caso nominativo, que é apagado, é menos marcado do que o caso acusativo fornecido pelo verbo da sentença encaixada. d) Gótico e romeno: Nessas línguas é o caso mais marcado/especificado da hierarquia em (24) que é realizado pelo pronome relativo-wh, independente de ser de um núcleo da sentença matriz ou da sentença encaixada: (26) Romeno: Matriz = nominativo ; Encaixada = dativo a. Cuí í se d de mîncare trebuie s Quem-DAT ele mesmo dar de comer deve munceasc . SUBJ trabalhar. ‘Quem quer comida deve trabalhar’. Gótico: Matriz = acusatio ; Encaixada = nominativo b. Jah po-ei ist us Laudeikaion jus E ACC-compl é de Laodicea ussiggwaid. você lê. ‘E você lê o que é de Laodicea’. Em (26a) o caso mais marcado, de acordo com a hierarquia em (24), é o dativo, conseqüentemente o pronome relativo-wh cuí (quem) realiza o caso dativo do verbo d (dar) da encaixada. Em (26b) o caso acusativo, fornecido pelo verbo ussiggwaid (lê) da sentença matriz é realizado pelo pronome relativo-wh por ser mais marcado do que o nominativo da sentença encaixada fornecida pela flexão do verbo ist (ser). 56 e) Grego moderno: No grego moderno o pronome relativo-wh realiza o caso de um núcleo da sentença matriz. Porém, um clítico resumptivo terá que ser inserido se o caso fornecido por um núcleo da sentença relativa for o oblíquo. (27) Agapo opjon / Amo *opjos me agapa. quem-ACC / *NOM me ama. Em (27) o pronome relativo-wh tem que realizar o caso acusativo atribuído pelo verbo agapo (amo) da sentença matriz para a sentença ser boa. Ou seja, o pronome relativo-wh tem que ter a forma de acusativo opjon (quem) que é mais marcada do que a forma nominativa opjos recebida pelo verbo agapa (ama) da sentença encaixada. 4.2.2.3 Inserção de um pronome resumptivo para receber caso A última forma de resolver a incompatibilidade de caso, apontada por Van Riemsdijk (2000) é a inserção de um pronome resumptivo para receber caso. No grego moderno, como foi dito acima, o pronome relativo-wh realiza o caso atribuído por um núcleo da sentença matriz. Porém, se o caso da sentença encaixada for o oblíquo um clítico resumptivo é inserido. Se não fosse assim, a hierarquia de casos em (24) não seria respeitada: (28) Tha voithiso opjon Ajudarei tu dossis to onama um. quem+quer+que-ACC clit.-GEN der o nome meu. ‘Ajudarei quem tu deres meu nome’ Em (28) o caso acusativo do verbo tha voithiso (ajudarei) da matriz é atribuído ao pronome relativo-wh opjon (quem quer que). Como o caso atribuído pelo verbo da encaixada dossis (der) é o genitivo, o clítico tu é inserido para receber tal caso. 57 4.3 RESUMO: Em resumo, na seção 4 vimos que existem línguas com MR obrigatório, caso do inglês e francês, e existem línguas que não apresentam o MR ou pelo menos não apresentam compatibilidade de categorias ou de casos. A incompatibilidade categorial ocorre quando o pronome relativo-wh apresenta categorias diferentes na sentença matriz e na encaixada e, a incompatibilidade de caso ocorre quanto o caso fornecido por um núcleo da sentença matriz e da encaixada não coincidem e, mesmo assim a sentença formada é boa (a incompatibilidade de caso só ocorre em línguas que apresentam caso marcado na morfologia). Segundo Van Riemsdijk (2000) a incompatibilidade de caso é resolvida de três formas: a) sincretismo, b) atração de caso e c) inserção de um pronome resumptivo que realiza o caso de um dos dois núcleos envolvidos na sentença. O sincretismo ocorre quando o pronome relativo-wh possui a mesma forma para um ou mais casos abstratos (como é o caso do pronome relativo-wh was, do alemão, que tem a mesma forma para os casos neutro: nominativo e acusativo). Na atração de caso ou o pronome relativo-wh realiza o caso de um núcleo da sentença matriz, ou realiza o caso de um núcleo da encaixada. Dentro da atração de caso, temos as línguas que apresentam uma estratégia única para a marcação de caso (como o islandês em que o pronome relativo-wh sempre realiza o caso atribuído por um núcleo da sentença matriz e a variante A do alemão na qual o pronome relativo-wh realiza o caso atribuído por um núcleo da sentença encaixada – salvo quando o caso da matriz for da forma oblíqua). As outras línguas são sensíveis à hierarquia de caso (nom<acc<dat,gen,PP): a variante B do alemão respeita a hierarquia de caso, ou seja, sempre apaga o caso menos marcado (desde que o caso realizado seja fornecido pelo verbo da sentença encaixada); o gótico e o romeno realizam sempre o caso mais marcado dessa hierarquia; no grego moderno o pronome relativo realiza o caso atribuído por um núcleo da matriz, contudo, um clítico resumptivo terá que ser inserido se o caso da encaixada for o oblíquo. Na próxima seção vamos verificar como ocorre o MR no português brasileiro. 58 5. REQUERIMENTOS DE COMPATIBILIDADE NO PORTUGUÊS BRASILEIRO O português brasileiro é uma língua que não apresenta morfologia casual. O pronome relativo-wh quem, por exemplo, apresenta a mesma forma para o acusativo, nominativo e oblíquo. Sendo assim, é de se esperar que essa língua apresente relativas livres em que não seja possível averiguar o case matching. 5.1 INCOMPATIBILIDADE DE CASOS Como foi dito anteriormente, a incompatibilidade de caso ocorre quando o caso fornecido ao pronome relativo-wh por um núcleo da sentença matriz e o caso fornecido por um núcleo da sentença encaixada não coincidem e, assim, formam sentenças agramaticais. Porém, como os pronomes relativos-wh em português brasileiro, a não ser o arcaizante cujo, não apresentam marcação de caso na morfologia, essa incompatibilidade de casos não será relevante para a (a)gramaticalidade dessas sentenças. Além disso, por não apresentar marcação de caso na morfologia, os pronomes-wh do português vão apresentar, com grande freqüência, o sincretismo de casos (que é quando um pronome relativo-wh tem a mesma forma para um ou mais casos abstratos): (29) Matriz = nominativo ; Encaixada = acusativo a. [O que você cozinhou] está mofado. b. [Quem você viu] é meu irmão. Em (29) a relativa livre funciona como sujeito da SC. O pronome relativo-wh recebe caso nominativo da flexão Iº dos verbos da sentença matriz (estar, ser) e caso acusativo dos verbos da sentença encaixada (cozinhar, ver). Mesmo recebendo casos diferentes, a sentença é boa pois os pronomes relativos-wh o que, quem são da categoria DP (categorial matching) e tem a mesma forma para o acusativo e nominativo (=sincretismo de caso). (30) Matriz = acusativo ; Encaixada = nominativo a. João viu [o que caiu do armário]. 59 b. Ela reconheceu [quem cometeu o crime]. O pronome relativo-wh das sentenças em (30) também apresenta sincretismo de caso. Ao contrário de (29), aqui é o verbo da sentença matriz que atribui caso acusativo ao pronome relativo-wh e a flexão Iº do verbo da encaixada que atribui nominativo. As sentenças são boas porque os pronomes relativos-wh quem, e o que apresentam a mesma forma para o nominativo e acusativo. Salvo casos especiais (que serão discutidos abaixo), quando a preposição da sentença matriz atribui caso oblíquo e o verbo da sentença encaixada atribui caso acusativo, também temos sincretismo de casos: (31) Matriz = oblíquo ; Encaixada = acusativo a. João conversou com [quemi você conhece eci]35. b. João falou d[o quei ele viu eci na estrada]. c. João só obedece à [quemi ele conhece eci]. Em todas as sentenças de (31) todo o PP é argumento interno do verbo da matriz. Sendo assim, a relativa livre é complemento de uma preposição funcional. Em (31a) a preposição com atribui caso oblíquo ao pronome relativo-wh quem e o verbo conhecer (da sentença encaixada) atribui acusativo a ec que é co-referente ao esse pronome relativo-wh. O mesmo ocorre em (31b) e (31c): na sentença matriz, as preposições de e a atribuem caso oblíquo aos pronomeswh o que e quem respectivamente; na sentença encaixada, os verbos ver e conhecer atribuem caso acusativo a ec co-referente ao pronome relativo-wh. Aqui também, mesmo apresentando casos diferentes, o pronome relativo-wh é da categoria DP (categorial matching). O mesmo ocorre com as sentenças abaixo em que a relativa livre faz parte de um adjunto: (32) Matriz = oblíquo ; Encaixada = acusativo João saiu com [quemi você conhece eci]. Em (32) todo o PP [com quem você conhece] é adjunto adverbial. Da mesma forma que ocorre em (31), aqui a relativa livre é complemento de uma preposição. Porém, a preposição é lexical e não funcional. Assim, na sentença matriz, o pronome relativo quem recebe caso oblíquo dessa preposição e, na encaixada, a ec recebe caso acusativo do verbo conhecer. Por fim, também há 35 A sentença (31a) é de Medeiros Júnior (2005, p. 22). 60 sincretismo de caso quando a preposição da matriz fornece caso oblíquo e a flexão Iº do verbo da matriz, caso nominativo: (33) Matriz = oblíquo ; Encaixada = nominativo a. João só fala com [quemi eci é simpático]. b. João só fala mal de [quemi eci gosta da Maria]. c. Eu dei o presente para [quemi eci venceu a corrida]. Em (33) todo o PP é argumento interno do verbo da sentença matriz. A relativa livre é complemento da preposição funcional que atribui caso oblíquo ao pronome relativo-wh. Na encaixada, o verbo gostar (33b) e o verbo vencer (33c) atribuem caso nominativo à ec coreferente ao pronome relativo-wh quem. O mesmo ocorre na sentença encaixada de (33a) em que o pronome relativo-wh é sujeito da sentença e sujeito da SC. Lembramos, novamente, que mesmo o pronome relativo-wh recebendo casos diferentes ele não fere o MR, pois a categoria do pronome-wh é a mesma (categorial matching). Por isso, parece que as relativas livres só estão sujeitas ao case matching em línguas com marcação casual na morfologia (o que não é o caso do português brasileiro). 5.2 INCOMPATIBILIDADE DE CATEGORIAS A incompatibilidade de categoria ocorre quando o pronome relativo-wh não está em conformidade categorial com um dos núcleos envolvidos na construção da sentença: (34) a. *Eu chamei [com quem você saiu]. b. *Eu chamei [quem você saiu]. c. Eu chamei [quem você pediu]. Como já observamos, o português brasileiro não apresenta o fenômeno da preposição órfã. Assim, em (34a) quando o pronome relativo-wh quem se move para a periferia esquerda da relativa livre, ele leva consigo a preposição com. Entretanto, o PP com quem, que satisfaz as condições para ser adjunto da relativa livre, não preenche as condições para ser objeto direto do verbo chamar da sentença matriz e por isso, a sentença é agramatical. Em (34b), o DP 61 quem satisfaz os requisitos para ser objeto direto do verbo da matriz chamar, mas não atende as condições para ser adjunto adverbial da relativa. Ao contrário, (34c) é boa porque o pronome relativo quem atende tanto os requisitos da sentença matriz como os requisitos da sentença encaixada. A princípio, parece que o português brasileiro não apresenta nenhuma relativa livre em que a compatibilidade categorial não seja respeitada. Porém, nos casos em que o pronome relativo-wh é ambíguo entre embutir ou não uma preposição temos uma incompatibilidade de categoria: (35) a. Eu te conheço desde [quandoi você era um garotinho eci]. b. Eu vou avançar até [onde ele traçou a linha ec]. Como já foi definido na seção 2 somente PPs e advérbios são talhados para ser adjunto. Em (35a) todo o PP [desde quando você era um garotinho] funciona como adjunto adverbial. Assim, o pronome relativo quando é um DP e recebe caso oblíquo da preposição desde36. Ao contrário, na sentença encaixada, a ec co-referente ao pronome relativo-wh quando tem que ser do tipo “adverbial”: o pronome relativo-wh funciona como um adjunto na sentença encaixada e, por ser um DP, precisa receber caso. Portanto, em (35a) o pronome relativo-wh quando, que funciona como adjunto nas duas sentenças, vai ser do tipo DP na sentença matriz e do tipo PP na encaixada. O mesmo ocorre em (35b) em que o pronome relativo-wh onde é um DP, na sentença matriz, e recebe caso oblíquo da preposição até; e, embute um PP na encaixada para assim ser marcado com caso oblíquo. Fora esse tipo de sentença (em que o pronome relativo-wh é ambíguo entre embutir ou não uma preposição) o pronome relativo-wh de uma relativa livre em português brasileiro deve respeitar os requisitos categoriais de um dos núcleos envolvidos na construção da sentença. Vejamos como isso ocorre: (36) Matriz = DP ; Encaixada = PP a. *[Com quem eu quero casar] não me dá bola. b. ?[Com quem você conversou] ganhou a corrida. c. [Com quem eu precisava de conversar] veio ao porto. (Negrão, 1994, p.1040) 36 Sabemos que o quando é um DP, pois uma preposição nunca seleciona outra preposição como seu complemento. 62 Em (36) o pronome relativo-wh respeita os requisitos categoriais do verbo da sentença encaixada e não os da matriz37. A agramaticalidade, ou o baixo grau de aceitabilidade das sentenças em (36) se deve ao fato de que, como aponta Leung (2005, p. 280), quando o pronome relativo-wh satisfaz os requisitos de caso ou categoria só de um dos núcleos envolvidos na construção da sentença, normalmente ele satisfaz os requisitos do núcleo da sentença matriz (salvo nos casos de hierarquia de caso (cf. (24)): (37) a. Eu vou te dar [(*com) o que você sonha]. b. Eu vou te dar [(*do) o que você precisa]. As sentenças em (37) foram retiradas de Negrão (1994, p. 1041). As relativas livres que não atendem aos requerimentos de categoria só são gramaticais se o pronome relativo-wh for um DP requerido pelo verbo da sentença matriz. Se o pronome relativo-wh satisfizer os requisitos categoriais da sentença encaixada (que seleciona um PP), a sentença formada será agramatical. As sentenças de (36) e (37) nos levam a crer que no português brasileiro o pronome relativo-wh deve sempre respeitar os requisitos categoriais de um núcleo da sentença matriz: (38) Matriz = DP ; Encaixada = PP38 a. Eu só ajudo [quem eu gosto de]. b. Eu comprei [o que eu precisava do]. c. Eu vou te dar [o que você sonha com]. Em (38), o pronome relativo atende os requisitos do verbo da sentença matriz, que seleciona um DP, e não atende os requisitos do verbo da sentença encaixada, que seleciona um PP. Essas sentenças vão ao encontro do que diz Leung (2005): o pronome relativo-wh sempre é da categoria requerida por um núcleo da sentença matriz (salvo nas línguas de hierarquia casual). Como em (36) o PP com quem não atende os requerimentos do verbo da matriz, que seleciona um DP conseguimos explicar o seu baixo grau de aceitabilidade. 37 A sentença em (36c) é uma sentença encontrada em um corpus NURC/SP por Esmeralda Negrão. Porém, os falantes consultados por mim acharam a sentença estranha. Acho que precisaríamos verificar em que condições essa sentença foi proferida. O português brasileiro parece rejeitar o fenômeno chamado quirky subject que se manifesta em sentenças onde o SpecIP está preenchido por constituintes marcados por casos diferentes do nominativo (RIVERO, 2004). 38 (33b) e (33c) são de Esmeralda Negrão (1994, p. 1041). 63 Em resumo, podemos dizer que em português brasileiro, o pronome relativo-wh é sempre da categoria requerida por um núcleo da sentença matriz. Assim, dizemos que a propriedade que define uma relativa livre em português brasileiro é: sentença wh que não pode violar os requerimentos de categoria da sentença matriz. 6 A QUESTÃO DAS CHAMADAS RELATIVAS LIVRES INFINITIVAS Existe um tipo de sentença, considerada por alguns lingüistas como uma relativa livre, que se caracterizam por ter verbo no infinitivo39. Essas sentenças, que já foram estudadas por Hirschbühler40 (1978 apud CAPONIGRO, 2001), Grosu & Landman (1998), Izvorski (1998) e Caponigro (2001), ganham um destaque especial nesta dissertação, porque o pronome-wh da relativa livre nem sempre satisfaz os requisitos da sentença matriz, como vemos em (39): (39) Matriz = DP/acusativo ; Encaixada = PP/oblíquo41 a. João não tem [[com quem]i conversar eci]. b. Maria achou [[do que]i se lamentar eci]. c. Eu tenho [[para quem]i escrever/telefonar eci]. d. João procura [[para onde]i ir eci]. e. Paulo já arranjou [[com quem]i casar eci]. Em (39) o verbo da sentença encaixada está no infinitivo e seleciona um PP como seu argumento interno. Quando o elemento-wh se move para a periferia esquerda da sentença, ele leva consigo a preposição que lhe fornece caso oblíquo. Ou seja, o PP respeita os requisitos do verbo da sentença encaixada, mas não os do verbo da sentença matriz que seleciona um DP como seu complemento. Essas sentenças se caracterizam por: a) ocorrer principalmente como complemento de verbos existenciais “mainly the equivalents of existenctial be and existential have”42; e b) poder ser parafraseada por sentenças que contêm uma relativa antecedida por um DP indefinido: 39 Caponigro (2001) divide as relativas livres em definidas (que são as relativas livres canônicas) e indefinidas (do tipo de (39)); Grosu & Landman (1998) as separam em relativas realis (canônicas) e irrealis (as de (39)). Esses dois autores as classificam a partir da semântica, ignorando se elas são finitas ou infinitivas. Hirschbühler (1978), porém, as classifica levando em conta a forma: relativas livres finitas (canônicas) e infinitivas (as de (39)). 40 HIRSCHBÜHLER, P. The syntax and semantics of wh-constructions. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Lingüística), University of Massachusetts, Amherst, 1978. 41 As sentenças em (39a-c) foram adaptadas de Medeiros Júnior (2005, p.83). 64 (40) a. Paulo não tem [sentença infinitiva a quem pedir ajuda]. b. Paulo não tem [DP indefinido uma pessoa/alguém a quem pedir ajuda]. Para Grosu & Landman (1998), Izvorski (1998) e Caponigro (2001), o problema do MR das relativas livres infinitivas não se coloca, pois elas são CPs nus e, por isso, são sintaticamente iguais às interrogativas. Grosu & Landman (1998) elencam três argumentos para confirmar essa igualdade: 1º) Relativas livres infinitivas não apresentam os MR, assim como as interrogativas (cf. (39)); 2º) As infinitivas ((41b) do romeno), assim como as interrogativas, permitem múltiplos sintagmas-wh (empilhamento), o que as relativas livres não permitem ((41a) do inglês)43: (41) a. *[Who danced with whom Quem dançou com quem b. Nu maia vem [pe cine cu last night] will get married next week. passada noite casará na+próxima semana. cine împerechia]. Não mais temos [quem com quem jogar]. 3º) Extração para fora da relativa livre não é permitida. Já a extração para fora de interrogativas vai, dependendo da língua, de meio ruim (inglês) a bom (romeno, hebreu, português), como mostram os exemplos do romeno abaixo: (42) a. *Despre ce ai pe [cine vorbe te cu Maria] în clasa ta? Sobre o-que você-tem ACC wh é falando com Maria na classe sua. ‘[Sobre o que]i você tem quem está falando com Maria ti na sua sala?’ b. Despre ce (nu) ai Sobre o-que [cu cine s vorbe ti__]. (não) você-tem com quem SUBJ falar__ ? ‘[Sobre o que]i você não tem com quem falar ti ?’ c. Despre ce nu tii [cu cine s vorbesti__]. Sobre o-que não você-sabe com quem SUBJ falar__? ‘[Sobre o que]i você não sabe com quem falar ti?’ 42 43 “principalmente os equivalentes do existencial ser e do existencial ter” (CAPONIGRO, 2001, p.3). Sentença de (41) e (42) foram retiradas de Grosu & Landman (1998, p. 157). 65 Das sentenças de (42) não é permitido extrair o pronome-wh interrogativo apenas da relativa livre canônica em (42a). Extração da relativa livre infinitiva (42b) e da interrogativa (42c) são permitidas. Caponigro (2001), Izvorski (1998) e Grosu & Landman (1998) analisam as sentenças descritas acima pelo viés semântico. Por isso, esses autores incluem em suas análises relativas livres que, embora sejam formalmente diferentes, têm interpretação semântica parecida. Semanticamente essas sentenças podem ser parafraseadas por um DP indefinido, já que são selecionadas principalmente por verbos existenciais: (43) a. C’è [RL indefinida chi Há [ dice sempre di sì]. quem diga sempre sim]. a'. Ci sono [DP indefinido (delle) Há [ persone che dicono sempre di sì]. (algumas) pessoas que dizem sempre sim]. b. João tem [RL indefinida quem corte a grama pra ele]. b'. João tem [DP indefinido alguém que corte a grama pra ele]. Porém, como queremos analisar a parte formal (e não semântica) desse tipo de sentença, não vamos considerar as sentenças com verbo no subjuntivo porque nas sentenças em (43) o MR não é violado: em (43a) o verbo existencial seleciona um DP como seu complemento e o verbo dire (dizer), na encaixada também seleciona um DP. O mesmo ocorre em (43b), em que o pronome relativo-wh quem satisfaz os requisitos dos dois verbos envolvidos na sentença. 6.1 AS INFINITIVAS NÃO SÃO INTERROGATIVAS As relativas livres infinitivas apresentam três características (descritas na seção anterior) que as assemelham às interrogativas. Por causa dessas e de outras características, Izvorski (1998) considera que essas sentenças não são relativas livres, mas sim interrogativas. Porém, mesmo com as semelhanças descritas acima, as infinitivas não podem ser consideradas interrogativas. De acordo com Caponigro (2001) e Izvorski (1998), parece que, assim como ocorre com as relativas livres, não existem sentenças infinitivas encabeçadas por 66 palavras equivalentes a why ou what/which+NP, que, como vimos no capítulo anterior, são marcas de sentenças interrogativas44: (44) Mne est’ [(*katoruju)/ Me-DAT é-3sg os-quais/ kakuju / ’ju knigu itat’]. o-que/ cujo livro ler-INF. ‘Há alguns livros *os quais/ que eu posso ler’. Além disso, o verbo existencial que seleciona uma relativa livre infinitiva (cf. (39), (40)), nunca seleciona uma interrogativa, como mostra (45)45: (45) *C’è [interrogativa sim/não se Harold Há dice sempre di sì]. se Haroldo diz sempre sim. O último argumento, que sugere que essas sentenças não são interrogativas, é semântico. As relativas livres infinitivas podem ser parafraseadas por um DP indefinido (cf. (40)); já as interrogativas, geralmente, não podem ser parafraseadas por um DP, e tem a mesma distribuição das sentenças declarativas: (46) a. So [interrogativa wh chi Sei dice sempre di sì]. quem diz sempre sim. b. So [declarativa che Harold dice sempre di sì]. Sei que Haroldo diz sempre sim. Na próxima seção vamos estudar essas sentenças tendo em vista o português brasileiro. 6.2 ALGUMAS INFINITIVAS NÃO SÃO RELATIVAS LIVRES Observamos, em várias línguas, que as relativas livres apresentam as seguintes propriedades: a) obedecem os MR; b) não permitem extração; c) não permitem múltiplos 44 45 Sentença do russo retirada de Izvorski (1998, p. 6). Sentença retirada de Caponigro (2001, p. 7). 67 sintagmas-wh (empilhamento); e d) são interpretadas como DPs definidos. Quando confrontamos as relativas infinitivas com essas propriedades, vemos que elas se comportam de modo diferente. Consideremos a sentença em (47): (47) O João não tem [o que fazer nos sábados]. Como apontam Marchesan e Mioto (no prelo), a relativa de (47) apresenta uma única propriedade em comum com as relativas livres canônicas: obedece os MR já que o pronome relativo-wh o que é da categoria DP, como requerem os verbos ter e fazer. As outras propriedades elencadas acima não pertencem às relativas infinitivas. Primeiro, é permitido extrair uma expressão wh interrogativa de dentro da infinitiva: (48) Com quemi o João não tem [o que fazer eci no sábado]? 46 Em segundo lugar, as infinitivas parecem permitir múltiplos sintagmas wh: (49) ?João não tem mais [com quem jogar o que]. Em terceiro lugar, as infinitivas são interpretadas como DPs indefinidos, como mostra a paráfrase (50b) de (50a): (50) a. João tem [o que fazer no sábado]. b. João tem [DP indefinido alguma coisa para fazer no sábado]. Apesar da discrepância apresentada acima, alguns lingüistas consideram que sentenças como (47) são relativas livres. Confrontando essa situação com o português, devemos dizer que uma sentença que, no mínimo, obedece os MR deve ser considerada uma relativa livre. A propriedade que define uma relativa livre no português é: sentença wh que não pode violar os requerimentos de categoria da sentença matriz. 46 Como apontam Marchesan e Mioto (no prelo), essa propriedade não pode ser arrolada para defender que as infinitivas são semelhantes às interrogativas infinitivas encaixadas. Isto porque as interrogativas não permitem a extração de um adjunto enquanto as relativas infinitivas permitem isso perfeitamente: (i) a. *Quandoi o João quer saber [o que fazer eci]? b. Quandoi o João não tem [o que fazer eci]? 68 Vamos considerar, agora, a sentença em (51): (51) João não tem [com quem conversar no sábado]. Se queremos considerar que a sentença entre colchetes em (51) é uma relativa livre, como fazem alguns lingüistas (GROSU & LANDMAN, 1998 e CAPONIGRO, 2001), temos que admitir que nem os MR servem para definir uma relativa livre. De fato, o PP com quem não atende os requerimentos do verbo matriz ter, que seleciona um DP. A manutenção da definição exige que se descaracterize a sentença entre colchetes de (51) como relativa livre. Na aparência, (51) é semelhante a (47), pois não tem um núcleo nominal relativizado. Mas crucialmente existe uma diferença: a expressão relativa é um PP. Observemos que, quando uma relativa livre é encabeçada por um PP (por exemplo, quando é objeto indireto), a preposição é requerida pelo verbo matriz. Isto não é o que acontece em (51) onde a preposição é nitidamente requerida pelo verbo encaixado falar. A presença da preposição faz com que (51) possa ser parafraseada por uma sentença relativa com núcleo nominal, como vemos em (52): (52) João não tem uma pessoa com quem conversar no sábado. Em (52), o complemento do verbo ter é um DP, como requerido por suas propriedades selecionais. Esse comportamento é inesperado se o comparamos com o de uma relativa livre verdadeira, como observamos em (53): (53) a. Ela gosta de quem gosta de poesia. b. Ela gosta das pessoas que gostam de poesia. Em (53b) a preposição de, requerida pelo verbo gostar se mantém. Ao mesmo tempo, o elemento-wh em (53b) muda de forma: de quem para que. Observe que, em (52), o pronome relativo-wh mantém crucialmente a mesma forma que tem em (51). Retomando a observação (ver cap. I) de que os pronomes relativos-wh quem e o que não podem encabeçar relativas com núcleo a não ser que uma preposição quebre a adjacência entre o nome e eles, entendemos por que a paráfrase em (52) é permitida. Se tentamos parafrasear uma sentença infinitiva que é uma relativa livre verdadeira por uma relativa com núcleo, de modo semelhante a (52), não obtemos sucesso: 69 (54) a. João sempre tem quem perturbar. a'. *João sempre tem uma pessoa quem/que perturbar. a". João sempre tem uma pessoa para perturbar. b. João tem [o que fazer no sábado]. b'. *João tem alguma coisa o que/que fazer. b". João tem alguma coisa para fazer. As sentenças (54a) e (54b) podem ser parafraseadas por sentenças finais, mas a rigor não por relativas com núcleo. A conclusão que tiramos dessas observações é que sentenças como (51) não são relativas livres verdadeiras, mas relativas com núcleo nominal indefinido em que todo o DP antecedente é omitido. A questão que permanece é por que esse tipo de sentença permite a omissão do núcleo enquanto as outras relativas com núcleo nominal não permitem. A solução sugerida é que todo o DP antecedente pode ser omitido porque ele é previsível. Se é verdade que esse tipo de relativas ocorre com existenciais, como afirma Caponigro (2001, p. 3), “mainly the equivalents of existenctial be and existential have”47, é previsível que o DP antecedente esteja sempre sujeito aos Efeitos de Definitude (BELLETTI, 1988). Ao ser resgatado, ele só vai poder ser o equivalente de alguma pessoa/alguém ou alguma coisa/algo. 7 RESUMO DO CAPÍTULO Neste capítulo analisamos uma característica excepcional das relativas livres: o MR. Pelo MR o pronome relativo-wh deve respeitar os requisitos de caso e/ou de categoria de um núcleo da sentença matriz e encaixada simultaneamente. Existem línguas como o Hindi, Tok Pisin e Coreano que não apresentam relativas livres e por isso, usam outras estratégias para suprir essa falta (como por exemplo, relativas com núcleo). Há também relativas livres que possuem o MR obrigatório, como é o caso do francês, inglês, etc.. Por fim, analisamos relativas livres sem o case matching: algumas relativas livres apresentam uma estratégia única para a marcação de caso (ex. o islandês e a variante A do alemão); as outras línguas (alemão A, gótico, romeno, etc.) são sensíveis à hierarquia de caso 47 “principalmente equivalentes dos existenciais ser e ter”. 70 (nom<acc<dat,gen,PP). No português brasileiro o sincretismo de caso ocorre quase que obrigatoriamente. O sincretismo só não ocorre quando o caso oblíquo for atribuído por uma preposição selecionada pela sentença encaixada. Nesse caso, o pronome relativo-wh realiza o caso da sentença matriz (nominativo ou acusativo). Podemos resumir o que foi dito acima com a tabela 1: Grego Moderno R R R R RL R R R RL R R R M M M RL M RES RES M M M RL Português Brasileiro Gótico e Romeno M M M M M M RL Alemão B RL Alemão A - Islandês m=NOM; r=ACC m=NOM; r=OBL m=ACC; r=OBL m=ACC; r=NOM m=OBL; r=NOM m=OBL; r=ACC Inglês, Francês, Holandês, Alemão C, Norueguês Conflito Hindi, Tok Pisin, Coreano Tabela 1: Tipologia de conflitos de caso (tabela adaptada de VOGEL, 2001, p. 113). R/M (sincretismo) M M R/M (sincretismo) R/M (sincretismo) R/M (sincretismo) RL Legenda: m = caso da sentença matriz r = caso da sentença encaixada (relativa) M = o caso realizado é o da sentença matriz R = o caso realizado é o da sentença encaixada (relativa) RES = pronome resumptivo que realiza o caso do verbo da sentença encaixada. Além disso, na seção 6 analisamos o caso das relativas infinitivas que constituem um problema, pois o pronome relativo realiza os requisitos do verbo da sentença encaixada e não os da matriz. Analisando os dados do português brasileiro, concluímos que algumas infinitivas não são relativas livres. As infinitivas em que o pronome relativo-wh não é complemento de uma preposição (selecionada pelo verbo da encaixada), como por exemplo [João não tem quem incomodar] é uma relativa livre verdadeira e as infinitivas em que o pronome relativo-wh é argumento de uma preposição selecionada pelo verbo da encaixada, como por exemplo [João não tem com quem conversar] não é uma relativa livre, mas, sim, uma relativa com núcleo. Nesse último caso, o núcleo é omitido porque ele é previsível: essas relativas ocorrem com 71 verbos existenciais que estão sujeitos ao Efeito de Definitude, por isso o núcleo é facilmente recuperável. 72 CAPÍTULO III ANÁLISE DAS RELATIVAS LIVRES 1 INTRODUÇÃO As relativas livres não contém um núcleo nominal explícito. O pronome relativo-wh presente nessas sentenças sempre incorpora o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo. A partir disso, nos perguntamos se o pronome relativo-wh ocupa a posição do núcleo nominal, já que incorpora esse núcleo, ou permanece em sua posição canônica de SpecCP. A primeira análise que vamos apresentar é aquela em que não há movimento do pronome relativo-wh, ou seja, ele fica na posição do núcleo nominal. Essa análise é conhecida como Hipótese do Núcleo (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978). Na segunda análise, chamada de Hipótese do Comp, o pronome relativo-wh nasce dentro de IP e se move para a posição de SpecCP e foi elaborada por Groos & Van Riemsdijk (1981). Além dessas duas hipóteses, com os estudos de Kayne (1994), outra hipótese veio à tona: a hipótese que diz que a relativa é complemento de um determinante (hipótese do Complemento de D). Dessa forma, neste capítulo vamos analisar cada uma dessas três hipóteses e verificar qual é a mais adequada para tratar dos dados do português brasileiro. 2 HIPÓTESE DO NÚCLEO Como vimos, o MR estipula que a sentença relativa tem que ser da mesma categoria do pronome relativo-wh. A partir disso, Bresnan & Grimshaw (1978) propuseram que o pronome relativo-wh ocupa a posição que seria preenchida pelo núcleo nominal em uma relativa com núcleo. Na posição de núcleo é esse pronome-wh que inicia a relativa livre e por isso, para que a relativa livre satisfaça os requerimentos da sentença matriz, ela tem que ser introduzida por um pronome relativo-wh que seja compatível com a função que a relativa livre desempenha. 73 Nessa análise, também chamada de Hipótese de Base, a relativa livre está em uma estrutura de adjunção e não há movimento do pronome relativo-wh 48: (1) I’ll buy [NP [NP what ][S you are selling [pro]]]. ∅ Eu comprarei o+que você está vendendo. Uma proposta com movimento não conseguiria prever a necessidade de compatibilidade entre a categoria que domina a sentença e o pronome relativo-wh que se deslocasse para Comp. Além disso, o pronome relativo-wh é gerado na base para diferenciar essa estrutura das interrogativas (em que há movimento-wh) e assemelhá-la às relativas com núcleo (em que não há movimento-wh, segundo a análise de Chomsky, 1977). Além do MR, as autoras elencam quatro argumentos em favor da Hipótese do Núcleo. O primeiro argumento é a concordância: (2) a. The books she has *is/are marked up with her notes. Os livros ela têm *é/são marcados com suas anotações. b. What books she has isn’t/* aren’t certain. Quais livros ela tem não é/*são certo. c. Whatever books she has *is/are marked up with her notes. Quaisquer livros ela tem *é/são marcados com suas anotações. Na posição de sujeito, os sintagmas wh desencadeiam um processo de concordância com a forma verbal da sentença matriz, como vemos em (2a) que contém um relativa com núcleo e (2c) que contém uma relativa livre. Porém, essa concordância não é verificada nas interrogativas encaixadas, como em (2b). O segundo argumento é relacionado ao movimento-wh: nas interrogativas o pronomewh se move para uma posição e, normalmente, leva consigo os traços de caso; já nas relativas livres, o pronome-wh pode ter casos diferentes na sentença matriz e na encaixada (cf. cap. II): (3) a. [O que você viu ec] pertence a mim. b. João perguntou [quem]i eci comprou a televisão. 48 As sentenças em (1), (2), (4), (5), (7), (8), (9) foram extraídas do texto de Bresnan & Grimshaw (1978). 74 Em (3a) a relativa livre está na posição de sujeito (assim, o pronome relativo-wh recebe caso nominativo da flexão Aux (=Iº) do verbo pertencer) e a ec, que é co-referente ao pronome relativo-wh, está na posição de argumento interno do verbo ver (recebe caso acusativo). Já em (3b), que contém uma interrogativa encaixada, o pronome-wh nasce como argumento do verbo comprar e recebe caso nominativo da flexão desse verbo. Ao se mover para S’ esse pronomewh leva consigo o caso recebido antes do movimento. O terceiro argumento diz respeito à preposição órfã que não ocorre nas interrogativas indiretas, mas ocorre nas relativas livres, como vemos em (4): (4) I’ll live in [whatever town you live in]. Eu viverei em qualquer cidade você viver na. Por fim, o quarto argumento é relacionado ao fenômeno pied piping, permitido nas relativas com núcleo (5a) e nas interrogativas encaixadas (5b), mas impossível nas relativas livres (5c), por causa do MR: (5) a. I’ll read the paper on which John is Eu lerei o b. I’d like working. jornal no qual João está trabalhando. to know on which paper John is working. Eu gostaria de saber em qual jornal João está trabalhando. c. * I’ll reread on whatever paper John has worked. Eu relerei em qualquer jornal João tem trabalhado. (5c) é agramatical porque o verbo reread (reler) exige que seu complemento seja um DP, mas a relativa livre é iniciada por uma preposição (selecionada pelo verbo da encaixada). Para os pronomes relativos-wh que têm propriedades distribucionais de PPs, como wherever, whenever, Bresnan & Grimshaw (1978) adotam a seguinte estrutura: (6) a. PP[Loc] P[Loc] Ø b. PP[Temp] P [Temp] NP[Loc] where(ver) Ø NP[Temp] when(ever) 75 O apagamento do núcleo P em (6) é atribuído a regra do P-deletion formulada por Emonds49 (1976 apud BRESNAN & GRIMSHAW, 1978, p. 347) que afirmou que vários outros sintagmas em inglês podem se usados “adverbialmente” com o uso opcional da preposição: (7) a. She wants to move (to) Ela quer b. I’m mudar someplace new. (para) algum+lugar novo. leaving (on) the day after tomorrow. Eu estou partindo (em) o dia depois de+amanhã. Assim, “[a]ssuming that [Loc] and [Temp] are categorial features of prepositions and nouns, we hypothesize that these features are added to phrase nodes whose heads bear the features”50 (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978, p. 347). Ou seja, através do P-deletion, o traço do núcleo P é adicionado ao nó PP, e o traço do pronome-wh é adicionado ao nó NP: (8) a. I would consider [wherever Eu consideraria b. she lives ec a onde+quer+que ela more nice place to live]. um bom lugar para morar. S NP Aux I would VP V consider PP[Loc] NP NP[Loc] NPi [Loc] whereverj a nice place to live IP NP she VP V lives PP[Loc] NPi [Loc] therej (=Pro[Loc]) Em (8b) há claramente uma relação entre o pronome relativo-wh wherever e o pronome there (marcadas pelo índice j). Como essa relação não pode ser estabelecida por movimento-wh, já 49 50 EMONDS, J. A transformational approach to English syntax: root, structure-preserving, and local transformations. New York: Academic Press, 1976. “[a]ssumindo que [Loc] e [Temp] são traços categoriais de preposições e nomes, hipotetizamos que esses traços são adicionados aos nós sintagmáticos cujo núcleo carrega esses traços”. 76 que o pronome relativo-wh é gerado na periferia esquerda da sentença na DS (Deep Structure), Bresnam & Grimshaw (1978) propuseram a regra do Controlled Pro Deletion (apagamento do pro controlado). A relativa livre apresenta uma categoria pronominal nula que é apagada ao ser coindexada com o pronome relativo-wh da sentença matriz (chamado de controlador). Em (8) o pronome-wh locativo there é apagado através do Controlled Pro Deletion e o NP[Loc], que domina a ec, é coindexado com o núcleo NP[Loc] da relativa livre. Além dos pronomes relativos-wh que podem embutir uma preposição, como wherever e whenever, existem relativas livres que são iniciadas por preposições explícitas, como (9a) e relativas livres com preposição órfã, como (9b): (9) a. I will live [in whatever town you live ec]. Eu viveria em qualquer cidade você more. b. I will move to [whatever town Eu mudaria para qualquer you live in]. cidade você viva em. a. b. PP[Loc] PPi[Loc] PP[Dir] S NP NP VP P[Loc] in whatever you town V live P[Dir] to PPi[Loc] NP[Loc] there (=pro[Loc]) NP S NPi whatever town NP you V live VP PP[Loc] P[Loc] in NPi pro Em (9a) a regra do Controlled Pro Deletion apaga o pronome locativo-wh there e coindexa o PP[Loc], que domina esse pronome-wh, com o PP[Loc] [in whatever town] que inicia a relativa livre. O NP whatever town não pode ser o controlador porque ele sozinho não possui traços [+Loc] e não há nenhum NP que domine o pro para concordar com ele. Ou seja, os traços do controlador e da ec têm que concordar para que possa haver apagamento e coindexação51. Em (9b) temos uma preposição direcional e uma locativa, assim, o Controlled Pro Deletion apaga o NP ([-Loc.], [-Dir.]) e coindexa o vestígio que surge desse apagamento com o NP whatever town que 51 Qualquer categoria XP pode ser uma categoria pro: pro-adjetivos, pro-verbos, pro-sentenças. Porém o traço do nó coindexado deve concordar com o traço do núcleo da relativa. 77 também é ([-Loc], [-Dir]). Portanto, a presença ou a ausência da preposição órfã indica qual vai ser a estrutura da relativa livre52. Essa análise apresenta alguns problemas, se considerada à luz da GB (Government & Binding). O primeiro problema é exemplificado pelos exemplos do alemão, extraídos de Groos & Van Riemsdijk (1981 apud LEUNG, 2005, p. 266; VAN RIEMSDIJK 2000, p. 7): (10) a. Der Hans hat [das Geld, O das er gestohlen hat], zurückgegeben. Hans tinha [o dinheiro o qual roubado tinha], devolvido. ‘Hans devolveu o dinheiro que ele tinha roubado.’ b. Der Hans hat O [das Geld ti] Hans tinha [o zurückgegeben, [CP das dinheiro ti] devolvido [CP o qual ele roubado tinha]. c. *Der Hans hat ti zurückgegeben [PP das Geld O (11) Hans tinha ti devolvido a.* Der Hans hat [was] [DP o O das er gestohlen hat]. dinheiro o qual ele roubado tinha]. zurückgegeben, [er gestohlen hat]. O Hans tinha [o que] devolvido, b. Der Hans hat er gestohlen hat]. [ele roubado [e] zurückgegeben, [was Hans tinha [e] devolvido, tinha]. er gestohlen hat]. [o que ele roubado tinha]. A sentença destacada entre colchetes em (10a) é uma relativa com núcleo e por isso pode ser extraposta para o fim da sentença, como mostra (10b). Mas todo o DP não pode ser extraposto, como vemos em (10c). Ou seja, o núcleo NP deve permanecer antes do particípio zurückgegeben (devolvido). A impossibilidade de extrapor o núcleo NP, em uma relativa com núcleo, sugere que o pronome relativo-wh, em uma relativa livre, também não possa ser extraposto. Porém, não é isso que a sentença (11) mostra. (11a) é agramatical se o pronome relativo-wh permanecer antes do particípio e a relativa livre for extraposta. 52 A estrutura proposta por Bresnan &Grimshaw (1978) é aplicada, também, àquelas sentenças em que a ec não é substituída por nada: (i) I drank [whatever there was]. Para a sentença não ser mal formada, já que não temos apagamento de nenhum pronome, as autoras adotam a existência de um pro vazio: (ii) [S I drank [NP [NPi whatever [S there was [NPi pro]]]]]. Também encontramos sentenças desse tipo no português brasileiro: (iii) Eu vou trabalhar com [o que João determinar]. 78 O segundo problema é quanto ao pronome relativo-wh. Se o pronome relativo-wh está na posição do núcleo nominal, temos que supor que o que segue esse núcleo, assim como ocorre com as relativas com núcleo, é um CP, o que não se confirma53: (12) a. I put [the pie] [which / *which that / that / Ø you prepared] in the refrigerator. Eu coloquei o bolo o+qual/o+qual que/que/ Ø você preparou na geladeira. b. I put [what] [*which / *which that / *that / Ø you prepared] in the refrigerator. Eu coloquei o+que o+qual/o+qual que / que Ø você preparou na geladeira. Em (12a) a sentença relativa, entre colchetes, iniciada por which, é um CP. O mesmo não pode ser dito para (12b), já que não permite a inserção de nenhum pronome-wh. Van Riemsdijk (2000, p. 8) diz que Bresnam & Grimshaw estavam cientes desse problema e por isso estipularam que o que segue o pronome relativo-wh, em uma relativa livre, não é um CP, mas, sim, um IP. O terceiro problema que essa hipótese enfrenta foi apresentado em Larson (1987, p. 244-245), que afirma que o MR não se sustenta na medida em que outras categorias podem aparecer onde se esperaria a ocorrência de PPs: (13) a. I worded my letter [AdvP carefully]. (Eu escrevi minha carta cuidadosamente) b. [PP in a careful manner]. c. [NP the way (...a (…. de uma maneira cuidadosa) that you told me to]. maneira que você falou me para) O quarto e, talvez, último problema dessa análise é a tentativa de estabelecer uma diferença estrutural entre as relativas livres (14a) e as relativas com núcleo (14b) (LARSON, 1987, p. 245), já que ambas apresentam diferenças estruturais mínimas: (14) (a) XP XP S [+wh] (onde X = N, P, A, Adv) 53 Sentenças de Van Riemsdijk (2000, p. 8). (b) NP NP S' 79 Assim, com todos esses problemas que a Hipótese do Núcleo enfrenta, essa análise é descartada. Na seção seguinte, vamos verificar outra hipótese de análise para as relativas livres. 3 HIPÓTESE DO COMP Alguns anos mais tarde Groos & Van Riemsdijk (1981 apud LEUNG, 2005) formularam a chamada Hipótese do Comp (Comp Proposal), que, segundo Van Riemsdijk (2000), foi desenvolvida e analisada por Kuroda (1968)54, Quicoli (1972)55, Hirschbühler (1976)56, entre outros. Aqui a relativa livre também apresenta uma estrutura de adjunção; porém, por regra de movimento, o pronome relativo-wh se desloca da posição de complemento para a posição de Comp semelhante ao que ocorre nas interrogativas. Brito (1991) e Vogel (2002) apontam que o pronome-wh de uma relativa livre se move porque o Comp dessas estruturas possui traços-φ não interpretáveis que motivam esse movimento. (15) a. Maria perguntou [S’ [Comp quem estava na casa de sua mãe]]. b. Maria conhece [S’ [Comp quem estava na casa de sua mãe]]. A sentença entre colchetes em (15a) é uma interrogativa que possui traços [+int.] o que motiva o movimento do pronome-wh. Já o Comp de (15b) possui traços [+rel], o que motiva o movimento do pronome relativo-wh da relativa livre. A estrutura das relativas livres é a seguinte57: (16) a. NP[NP[ec]S’[Comp {qui/ el qui}]S[diu això ment]]]. Quem/art. quem diz essas mentiras. Leung (2005, p. 267) aponta uma evidência (usando a GB) que mostra essa igualdade entre as características das relativas livres e das interrogativas. Vejamos: 54 KURODA, Sige-Yuki. English relativization and certain related problems. Language, 44, 2(part 1), p. 244-266, 1968. 55 QUICOLI, Carlos. Aspects of Portuguese Complementation. unpublished Ph.D. Dissertation, MIT, 1972. 56 th HIRSCHBÜHLER, Paul. Two analyses of Free Relatives in English. Proceedings of the 6 Meeting of the North Eastern Linguistic Society, Montréal Working Papers in Linguistics III: 137-152, 1976. 57 Sentença de Hirschbüler & Rivero (1983, p. 508). 80 (17) Movimento-wh: a. [Which pictures of Quais fotos himselfi] is Johni willing to sell? dele mesmo está João desejando vender?’ b. * [Which pictures of Johni] did hei take yesterday? Quais fotos (18) (Princípio A) de João (Princípio C) ele tirou ontem? Relativas Livres a. I will buy [whatever picture of himselfi] Eu comprarei qualquer foto b. *I Johni is willing dele mesmo João está desejando vender. liked [whatever picture of Johni] hei took. Eu gostei qualquer foto to sell. (Princípio A) (Princípio C) de João ele tirou. Dada a semelhança de comportamento das relativas e interrogativas frente aos Princípios A e C, as duas sentenças devem ser derivadas por movimento do pronome-wh. Se a análise da sentença em (18b) fosse uma em que a expressão-wh fosse gerada na periferia esquerda da relativa livre, seria difícil entender por que a sentença (18b) é agramatical: nem John ccomandaria o pronome he nem he c-comandaria John e assim, não haveria motivo para que a sentença fosse agramatical. Se, pelo contrário, a derivação de ambas as sentenças implica movimento, a explicação para a (a)gramaticalidade será a mesma. Assim como a Hipótese do Núcleo, essa hipótese também apresenta alguns problemas. O primeiro problema está relacionado ao MR. Nessa hipótese, o pronome-wh está em Comp. Dessa posição, ele não consegue ser subcategorizado pelo verbo da sentença matriz e por isso o MR não tem como se verificar. Para resolver esse problema, Groos e Van Riemsdijk estipularam o chamado Comp Accessibility Parameter: “The COMP of a free relative is syntactically accessible to matrix rules such as subcategorization and case marking, and furthermore it is the wh-phrase in COMP, not the empty head, which is relevant for the satisfaction or nonsatisfaction of the matrix requirements”.58 (GROOS E VAN RIEMSDIJK, 1981 apud LEUNG, 2005, p. 266-267). Nas palavras de Medeiros Júnior (2005a, p. 43), quando o MR é observado, o núcleo do Comp (onde se encontra o pronome-wh) “passa a ser sintaticamente acessível para a satisfação de exigências da matriz, tais como subcategorização e marcação de caso”. 58 “O COMP de uma relativa livre é sintaticamente acessível às regras da matriz tais como subcategorização e marcação de caso, e além disso é o sintagma-wh em COMP, e não o núcleo vazio, que é relevante para a satisfação ou não dos requerimentos da matriz”. 81 O segundo problema que essa hipótese enfrenta, segundo Van Riemsdijk (2000), é o critério temático: o mesmo pronome-wh recebe papel temático duas vezes: sai de uma posição temática e vai para outra posição que acaba sendo tematicamente marcada pelo verbo matriz, o que é barrado pela Teoria da GB: (19) Maria colocou os livros [CP ondei eu queria pôr as revistas ti]. Van Riemsdijk (2000, p. 10) lembra que tanto a Hipótese do Comp quanto a Hipótese do Núcleo foram propostas antes da GB, e por isso esses problemas surgiram somente agora. Há várias teorias que tentam resolver esse problema postulando que a categoria vazia é um pro (GROOS & VAN RIEMSDIJK, 1981; SUÑER, 1984), ou um PRO (HARBERT, 1983), mas o fato é que o problema envolvendo o Critério Temático continua sem ser resolvido. A partir desses problemas, descartamos essa hipótese e passamos à terceira hipótese: hipótese do complemento de D. 4 ANÁLISE DO COMPLEMENTO DE D Com os estudos de Kayne (1994) uma nova análise para as relativas veio à tona. Esta análise muda a perspectiva de que as relativas com núcleo sejam um adjunto do NP, supondo que elas são o complemento de um determinante. Bianchi (1999), De Vries (2002) e, para o português brasileiro, Áreas (2002), entre outros, estudaram as relativas com núcleo sob essa perspectiva. Caponigro (2002) e Medeiros Júnior (2005) aplicam essa hipótese do complemento de D às relativas livres. Ou seja, da mesma forma que uma relativa com núcleo é selecionada por um determinante, uma relativa livre também o é59. Nas próximas seções apresentamos a hipótese desses dois autores. 59 Para ver evidências que comprovam que a relativa com núcleo é selecionada por um determinante ver Bianchi (1999), De Vries (2002), Áreas (2002), entre outros. 82 4.1 ANÁLISE DE CAPONIGRO (2002) Para Caponigro (2002), as relativas livres, assim como as interrogativas são CPs. Porém, as relativas livres não são somente um CP, mas sim DPs com um D implícito que seleciona um CP como seu complemento: (20) Estrutura sintática das relativas livres (CAPONIGRO, 2002, p. 143): DP whi D’ D e CP ti C’ C IP ti Caponigro aplica essa estrutura somente às relativas com verbos flexionados, que ocorrem na posição de argumento ou adjunto e que apresentem distribuição de DPs, como por exemplo [I appreciate what you did for me] / [He opened the door when I was about to knock]. Ele argumenta que “[s]ince D is covert, it must be licensed by some agreement configuration. [...] covert elements must enter in a Spec-Head relation with overt material in order to be licensed”60 (CAPONIGRO, 2002, p. 143). Ou seja, o pronome relativo-wh se move do SpecCP para o SpecDP para, assim, licenciar o D implícito. Caponigro (2002, p. 146) afirma que todas as relativas livres têm distribuição de DPs, mesmo aquelas em que o pronome relativo-wh é um PP, como where e when61: (21) a. He was born [PP where I Ele nasceu onde eu cresci. b. He was born [PP in my Ele nasceu 60 grew up]. hometown] / *[DP my em minha cidade+natal / hometown]. minha cidade+natal. “[p]elo fato de o D ser implícito, ele deve ser licenciado por alguma configuração de concordância. [...] elementos implícitos devem entrar em uma relação de Spec-Head com material explícito a fim de serem licenciados”. 61 Sentenças de (21) a (24) são de Caponigro (2002, p. 146-147). 83 Em (21a) where ocorre em uma posição prototípica de PPs, como vemos pela sentença em (21b). Mas esses pronomes-wh também podem ocorrer em lugares onde a ocorrência de DPs é prototípica: (22) a. [PP Where I grew up] was a Onde eu cresci b. [DP My really small town. era uma verdadeira pequena cidade. hometown] /*[PP In/To my hometown] was a really small town. Minha cidade+natal/*na/para minha cidade+natal era uma verdadeira pequena cidade. Além disso, ele afirma que as relativas livres iniciadas por where e when têm o mesmo comportamento das expressões there, yesterday, last year, etc. Essas expressões, dependendo do contexto, podem atuar tanto como DPs quanto como PPs: (23) a. He was born [DP there]. Ele nasceu lá. b. He was born [PP in my Ele nasceu (24) hometown]. na minha cidade+natal. a. [DP There] is really small. Lá b. [DP My é realmente pequeno. hometown] is really small. Minha cidade+natal é realmente pequena. A partir desses exemplos, e seguindo Jackobson62 (1995), Caponigro (2002, p. 147) salienta que esses pronomes-wh são DPs que permitem uma interpretação adverbial. As relativas livres “syntactically, [...] are DPs; semantically, they can be interpreted as either DPs or PP”63. A partir da estrutura em (20) Caponigro consegue explicar por que não há extração para fora de uma relativa livre: simplesmente porque uma relativa é um nominal complexo, algo como um DP com um CP dentro dele. O MR é explicado porque somente pronomes relativoswh DPs podem ocorrer em relativas livres: “the syntactic category of the FR and the syntatic 62 JACOBSON, P.. On the quantificational force of English free relatives. In.: BACH, E. et al. (eds.), Quantification in natural language. Kluwer, Dordrecht, 1995, p. 451-486. 63 “sintaticamete, […] são DPs; semanticamente, elas podem ser interpretadas como DPs ou PPs”. 84 category of its wh-phrase have to match”64. (CAPONIGRO, 2002, p.147) – como o D é vazio, apenas um DP pode ser o seu licenciador. 4.2 ANÁLISE DE MEDEIROS JÚNIOR (2005) Medeiros Júnior (2005) analisa dados do português brasileiro e adota a hipótese do complemento de D. Sua análise é parecida com a de Caponigro (2002). Para Caponigro o pronome relativo-wh se move para a posição de SpecDP para licenciar o D implícito. Já na proposta de Medeiros Júnior, que foi desenvolvida a partir de Rocha65 (1990 apud MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 65), além de o pronome relativo-wh se mover para SpecDP para licenciar o D implícito ele “está implicado com um tipo de operação sintática específico da derivação da sentença relativa” (MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 71). Para ele as “palavras-Qu em relativas livres correspondem a um amálgama morfológico entre um elemento pronominal e um morfema relativizador”, como em (25)66: (25) a. [A pessoa que] cala consente. b. [A CV67 que] cala consente. c. [Quem] cala consente. A analogia em (25) evidencia que, quando apagamos o núcleo NP pessoa, o complementizador que se transforma em um pronome relativo-wh que carrega os traços desse núcleo NP que foi apagado (cf. capítulo I). Isso explica a agramaticalidade de (26a): (26) a. * O João conhece a moça quem cometeu o crime. b. O João conhece quem cometeu o crime. Em (26a) o pronome relativo-wh quem bloqueia a presença de qualquer elemento de natureza nominal anterior a ele. Isso demonstra que o pronome relativo-wh quem apresenta traços 64 “a categoria sintática da RL [Relativa Livre] e a categoria sintática do sintagma-wh têm que ser compatíveis”. ROCHA, Mari Lucia D. F.. Sintagmas QU em interrogativas indiretas e relativas livres do português. 1990. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Lingüística) - Universidade Federal de Brasília, Brasília, 1990. 66 Os exemplos de (25) são de Rocha (1990 apud MEDEIROS JÚNIOR, 2005b, p. 13). Os de (26) são de Medeiros Júnior (2005b, p. 13). 67 CV = Categoria Vazia 65 85 [+humano], ou seja, quem “supostamente corresponde à fusão entre o antecedente e o pronome relativo” (MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 68). Porém, Medeiros Júnior não menciona sentenças em que o pronome-wh é antecedido por uma preposição: (27) a. Todos admiram o menino com quem você conversou ontem. b. João não conhece a garota de quem você falou. (28) I saw the girl Eu vi a who(m) you met. garota que(m) você encontrou. Em (27), a preposição quebra a adjacência entre o núcleo nominal e o pronome relativo-wh e, por isso, os dois traços [+humano] podem permanecer na mesma estrutura. Ao contrário, a sentença (28) mostra que no inglês dois traços [+humano] podem ficar adjacentes sem, com isso, tornar a sentença agramatical, ou seja, no inglês essa fusão entre o antecedente e o pronome relativo-wh não ocorre. Voltando a proposta de Medeiros Júnior (2005), observamos que há um amálgama/uma fusão que consiste na incorporação de dois núcleos funcionais Cº+Dº: (29) Estrutura sintática das relativas livres (MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 75): DP DP quem D’ Dº Cº CP Dº quem Cº C’ TP Como o pronome relativo-wh sai de uma posição argumental (dentro de IP) e se desloca para outra posição argumental (SpecDP), ele receberia caso duas vezes – o que é um problema para a teoria da GB. Isso não ocorre se estipularmos que “o sintagma-Qu satisfaz as exigências de Caso do verbo na subordinada e, após a derivação de toda sentença relativa, tem-se uma espécie de DP complexo; o traço de Caso do predicador mais alto é então descarregado no núcleo D do complexo (D+C)” (MEDEIROS JÚNIOR, 2005a, p. 81). 86 O problema com esta análise é que, se a incorporação ocorre na periferia esquerda, não conseguimos explicar como o pronome relativo-wh satisfaz as propriedades de seleção do verbo encaixado. A incorporação é tardia no sentido de que já teria passado o ciclo em que o pronome relativo satisfaz os requerimentos do verbo encaixado68. 5 PROPOSTA PARA O PORTUGUÊS BRASILEIRO Uma proposta de análise das relativas livres do português brasileiro pode ser construída com base em Caponigro (2002). De acordo com esta análise, a estrutura sintática de uma relativa livre é um DP que seleciona um CP como seu complemento. Pelo fato de o D ser nulo ele tem que ser licenciado por alguma configuração de concordância. Dessa forma, os pronomes relativos-wh DPs vão para SpecDP para licenciar o D implícito. Esta análise mantém a intuição tradicional de que as relativas livres desempenham funções de DP e não de CP e evita o problema da incorporação tardia implícito na proposta de Medeiros Júnior (2005). 68 Não podemos deixar de mencionar que existe um trabalho de Kato & Nunes, ainda em andamento. No entanto, como não tivemos acesso ao trabalho final não temos como avaliá-lo. Abaixo está ‘parte’ da proposta desses autores, que foi citada no livro de Hornstein, Nunes e Grohmann (2005): Na proposta desenvolvida por Kato & Nunes para as relativas livres, o pronome relativo-wh é adjunto ao CP. Nessa análise aplicações de Merge e Move são intercaladas para, assim, produzir a derivação correta da sentença relativa. Vejamos a derivação contida em Hornstein, Nunes e Grohmann (2005, p. 56): (i) a. Aplicação de Merge: [CP Cstrong-wh ele concorda com quem]. b. Move com quem: [CP [com quem]i [CP Cstrong-wh ele concorda ti]]. c. Merge conversa: [VP conversa [CP [com quem]i [CP Cstrong-wh ele concorda ti]]. d. Mais uma aplicação de Merge: [ele só conversa [CP [com quem]i [CP Cstrong-wh ele concorda ti]]]. Várias aplicações de merge formam a sentença encaixada, como mostra (i.a). Cº tem um traço forte strong-wh que precisa ser checado, assim o PP complemento se move, explicitamente, e se adjunge a CP para checar esse traço forte de Cº, como mostra (i.b). A estrutura formada em (i.b) é concatenada (merge) com o verbo conversar formando o VP [conversa com quem ele concorda]. Por fim, mais algumas aplicação de merge produzem a sentença desejada [ele só conversa com quem ele concorda]. Para esses autores, o PP adjungido em (i.b) checa o traço forte de Cº permitindo que a derivação convirja em PF. Além disso, a estrutura formada em (i.c) faz com que o verbo conversar e o PP movido estejam em uma configuração mútua de c-comando (PP não é dominado pelo CP). Essa é uma configuração que permite que os requerimentos temáticos e selecionais sejam estabelecidos (o PP [com quem] está em uma posição de adjunção e, por isso, fica ‘flutuando’ entre respeitar os requisitos da matriz e da encaixada). Portanto, a derivação pode convergir em LF porque os requerimentos temáticos e selecionais do verbo da matriz e da encaixada são satisfeitos no curso da derivação. 87 Essa análise dá conta trivialmente de sentenças como (30): (30) Maria comprou [DP o que Dº [CP to que João encomendou to que]]. Em (30) o que checa caso acusativo na relativa livre (mas vamos mudar isso logo abaixo por causa dos MR) e o DP inteiro, que é toda a relativa, checa o caso acusativo na sentença matriz. Os MR revelam que, para que isso aconteça, o pronome relativo não pode ser de categoria diferente daquela capaz de checar caso acusativo, ou seja, DP. Reforçando, o caso não precisa ser o mesmo, mas a categoria do pronome relativo precisa, como observamos em (31): (31) Maria ama [quem D [ tquem gosta de poesia]. A sentença (31) é gramatical e agora a relativa livre checa acusativo e o pronome relativo checa nominativo. Essa forma de derivar uma sentença que contém relativa livre enfrenta uma primeira complicação ao considerarmos sentenças como (32): (32) a. Maria sempre desconfia de quem ele gosta. b. Maria sempre desconfia de [quem D [ele gosta]]. c. Maria sempre desconfia [de quem [ele gosta]]. Temos que decidir se a preposição funcional de é regida pelo verbo matriz (32b) ou pelo verbo encaixado (32c). Embora a derivação de (32a) como (32c) tenha uma explicação direta com de quem sendo movido para a periferia esquerda, alguns fatos nos levam a optar por (32b). O principal deles é que os requerimentos do verbo matriz nunca podem ser desobedecidos, como apontamos no capítulo anterior e como exemplificamos abaixo: (33) a. *João ama [de quem a Maria gosta]. b. João gosta de [quem a Maria ama]. Em (33a), os requerimentos do verbo amar, que c-seleciona DP, não são atendidos pela relativa livre encabeçada por um PP e, por isso, a sentença é agramatical. Como em (33b) temos uma sentença gramatical, concluímos que a preposição deve ser regida pelo verbo matriz. 88 Entretanto, se a preposição regida pelo verbo encaixado fosse preservada, o que teríamos seria (34): (34) *Maria sempre desconfia de [de quem ele gosta]. (34) é agramatical e a agramaticalidade se deve às duas preposições contíguas, seqüência proibida no português brasileiro. Dessa forma, somos levados à segunda complicação: o que acontece com a preposição regida pelo verbo encaixado em (33a)? Vemos duas saídas para resolver essa questão, nenhuma delas isenta de complicações. A primeira é postular um apagamento da preposição de baixo para que a derivação ocorra. Mesmo considerando que a preposição é funcional em (34), é complicado retirar da sentença um item que deve estar contido na numeração. A segunda saída, que vamos adotar, implica que se mude a rota que vem sendo trilhada de forma a impedir que a preposição conste na numeração. Primeiro vamos reformular a suposição de que o que está em questão é o caso do pronome relativo e da relativa livre dizendo que é o caso do pronome relativo que importa. Para que o caso não seja checado duas vezes embaixo e em cima, vamos assumir que ele fica sem ser checado na sentença encaixada. Essa assunção dispensa a preposição na relativa livre de (33a,b) e retarda a checagem de caso do pronome relativo. Quando o pronome relativo sobe para a periferia esquerda da sentença ele checa seu caso, tendo que ser da categoria compatível para tanto: DP. Dessa forma, a relativa livre atende aos MR e dá conta também de sentenças em que as preposições não são idênticas69: (35) a. Maria confia em quem o João desconfia. b. Maria desconfia de quem o João confia. c. Maria sai com quem o João gosta. Por fim, vamos ver qual poderia ser a estrutura das relativas livres “adverbiais”, que são encabeçadas pelos pronomes relativos quando, onde. Em primeiro lugar, retomemos a afirmação de que esses pronomes relativos são ambíguos entre serem DPs (36) ou AdvPs (37): (36) 69 a. Eu caminhei [PP por [DP onde Maria passeava]]. (onde = o lugar em que) Pessoas mais velhas vêem restrições de aceitabilidade nessas sentenças, ainda que achem que elas são melhores que aquelas que violam os MR do verbo matriz. Mary Kato, por exemplo, considera (35a) agramatical, (35b) um pouco melhor, e (35c) boa. 89 b. João a conhece desde [DP quando ela era uma garotinha sardenta]. (quando = o momento em que) c. [DP Onde ela mora] é bonito. (onde = o lugar em que) (37) a. João comprou a casa [AdvP onde ninguém quer morar]. (onde = no lugar em que) b. Ela chegou [AdvP quando a Maria saiu]. (quando = no momento em que) c. Ele fez o trabalho [AdvP como João sugeriu]. (como = do modo que) Em vez de seguir Caponigro (2002) na redução de todas as relativas livres a DPs, mantemos a ambigüidade que fica explicitada entre os parênteses em (36) e (37). Para derivar as relativas livres encabeçadas por DPs, o procedimento é o mesmo elaborado acima: em (36a,b), o caso é checado contra a preposição; em (36c), contra a flexão finita da cópula. Para derivar as adverbiais, entretanto, supomos uma estrutura que contém uma preposição nula, como em (38): (38) PP whi P’ DP e ti D’ D e CP ti C’ C IP ti O pronome relativo, além de passar pelo SpecDP para licenciar o D nulo, deve ir para SpecPP para licenciar a P nula. Dessa forma, podemos manter que o pronome relativo AdvP incorpora uma preposição. Em resumo, quando o pronome relativo-wh é um DP, ele se desloca de dentro do IP para SpecDP para, assim, licenciar o D implícito. Se o pronome relativo-wh for um PP, ele vai ter um movimento a mais: do SpecDP para SpecPP (para, assim, licenciar a preposição). Caso a relativa livre seja selecionada por uma preposição, o pronome relativo-wh não sobe para 90 SpecPP porque a preposição não é nula. Além disso, para que o caso não seja checado duas vezes na sentença matriz e na encaixada, assumimos que o caso do pronome relativo-wh é checado somente na sentença matriz (após se mover para a periferia esquerda da sentença). 6 RESUMO DO CAPÍTULO Neste capítulo analisamos três hipóteses que tratam das relativas livres. A primeira hipótese, elaborada por Bresnan & Grimshaw (1978), é chamada de Hipótese do Núcleo. Nessa análise a relativa livre está em uma estrutura de adjunção e não há movimento do pronome relativo-wh para, assim, diferenciá-las das interrogativas. O pronome relativo-wh é gerado na base para atender as exigências do MR. A segunda hipótese, chamada de Hipótese do Comp, foi desenvolvida por Groos e Van Riemsdijk (1981). Nessa hipótese o pronome relativo-wh também está em uma estrutura de adjunção; porém, por regra de movimento o pronome relativo-wh se desloca da posição de complemento para a posição de Comp, semelhante ao que ocorre nas interrogativas. Na terceira hipótese (análise do complemento de D) a relativa livre não é mais adjunto do NP, mas, sim, complemento de um determinante (essa hipótese se baseia nos estudos de Kayne (1994) para as relativas com núcleo). Essa hipótese é analisada por dois autores: Caponigro (2002) e Medeiros Júnior (2005). Para Caponigro (2002) o pronome relativo-wh é gerado na sentença encaixada e alçado a SpecDP para assim licenciar o D implícito. Já para Medeiros Júnior (2005), além de o pronome relativo-wh se mover para SpecDP para licenciar o D implícito, ele está implicado com um tipo de operação sintática específico: a incorporação de dois núcleos funcionais Cº+Dº. Diante dessas hipóteses elaboramos uma análise para as relativas livres do português brasileiro com base em Caponigro (2002). Dessa forma, os pronomes relativos-wh DPs vão para SpecDP para licenciar o D implícito. Porém, diferentemente de Caponigro, para quem todos os pronomes-wh são DPs, mantemos a afirmação de que alguns pronomes-wh podem ser ambíguos entre ser um DP e um PP. Quando for um PP, o pronome relativo, além de passar pelo SpecDP para licenciar o D nulo, vai para SpecPP para licenciar a P nula (com isso, mantemos a postulação de que o pronome relativo AdvP incorpora uma preposição). Além disso, para que o caso não seja checado duas vezes em baixo e em cima, assumimos que o 91 caso do pronome relativo-wh fica sem ser checado na sentença encaixada. Dessa forma, quando o pronome relativo sobe para a periferia esquerda da sentença ele checa seu caso. 92 CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta dissertação descrevemos e analisamos as relativas livres no português brasileiro, com base na Teoria Gerativa. A partir desse estudo conseguimos definir propriedades sintáticas e semânticas dessas estruturas que as diferenciam de outras sentenças-wh. No capítulo I mostramos que as relativas são sentenças encaixadas e apresentam um constituinte que é compartilhado com a sentença matriz através do SpecCP. Essas relativas são divididas em relativas que apresentam um núcleo nominal (relativas com núcleo) e relativas que não apresentam um núcleo nominal explícito, chamadas de relativas livres. Nas relativas livres, foco do nosso estudo, o pronome relativo-wh incorpora o que seria o núcleo nominal de uma relativa com núcleo. Por isso, essas sentenças só podem ser iniciadas por pronomes relativos-wh que têm essa capacidade de incorporação (o que, quem, onde, como, quando e quanto). Além disso, as relativas livres não permitem extração para fora do CP porque são ilhas fortes; também não permitem o fenômeno chamado Comp duplamente preenchido, podem ser parafraseadas por uma relativa com núcleo e apresentam uma semântica de maximização. As características elencadas acima diferenciam uma relativa livre de uma interrogativa encaixada. Ainda, verificamos que uma relativa livre figura como um DP, e por isso, precisa ser marcada por caso. Dessa forma, o pronome-wh checaria caso duas vezes (na matriz e na encaixada). Além disso, vimos que o pronome relativo tem que respeitar os requerimentos categorias de um núcleo da sentença matriz e encaixada simultaneamente. Essa igualdade categorial/sintática é chamada de Requerimento de Compatibilidade - MR (BRESNAN & GRIMSHAW, 1978). O MR foi amplamente estudado no capítulo II. Pelo MR o pronome relativo-wh deve respeitar os requisitos de caso e/ou de categoria de um núcleo da sentença matriz e encaixada simultaneamente (esse fenômeno não se verifica nas relativas com núcleo, nem nas interrogativas encaixadas). Vimos que há línguas que apresentam MR obrigatório (case e categorial matching), como o inglês e o francês, e há línguas que não apresentam o case matching e/ou o categorial matching. Entretanto, mesmo não apresentando o case matching, essas línguas apresentam uma certa regularidade na marcação de caso: algumas relativas livres apresentam uma estratégia única para a marcação de caso, como o islandês e a variante A do alemão; outras línguas, como o alemão A, gótico e romeno, são sensíveis à hierarquia de caso (nom<acc<dat,gen,PP). O português brasileiro possui poucos casos de relativas livres com incompatibilidade de categoria ficando a incompatibilidade quase que restrita às sentenças em que a relativa livre 93 funciona como adjunto. Fora esses casos, o pronome relativo-wh vai ser sempre da categoria requerida por um núcleo da sentença matriz. Vimos que o sincretismo de caso ocorre quase que categoricamente, porque os pronomes relativos-wh em português não apresentam marcação casual na morfologia. Assim, por exemplo, os pronomes relativos o que, quem e onde apresentam a mesma forma para o acusativo, nominativo e oblíquo, o que nos fez concluir que as relativas livres só estão sujeitas ao case matching em línguas com marcação casual na morfologia. Dedicamos atenção especial, neste capítulo II, às chamadas relativas infinitivas. Observamos que as relativas infinitivas em que o pronome relativo-wh não é selecionado por uma preposição (complemento de um verbo da sentença encaixada) são verdadeiramente relativas livres. Já as relativas livres em que o pronome relativo-wh é selecionado por uma preposição que é argumento de um verbo da sentença encaixada não é uma relativa livre, mas, sim, uma relativa com núcleo. Nesse último caso, o núcleo é omitido porque ele é previsível: essas relativas ocorrem com verbos existenciais que estão sujeitos ao Efeito de Definitude, por isso o núcleo é facilmente recuperável. Por fim, no capítulo III analisamos três hipóteses que tratam das relativas livres. Na primeira hipótese, chamada de Hipótese do Núcleo por Bresnan & Grimshaw (1978), a relativa livre está em uma estrutura de adjunção e não há movimento do pronome relativo-wh para diferenciá-la das interrogativas. O pronome relativo-wh é gerado na base para atender as exigências do MR. Na segunda hipótese, desenvolvida por Groos e Van Riemsdijk (1981) e denominada Hipótese do Comp, o pronome relativo-wh também está em uma estrutura de adjunção; porém, por regra de movimento o pronome relativo-wh se desloca da posição de complemento para a posição de Comp, semelhante ao que ocorre nas interrogativas. Na terceira hipótese, baseada nos estudos de Kayne (1994), a relativa livre não é mais adjunto do NP, mas, sim, complemento de um determinante. Para Caponigro (2002) o pronome relativo-wh é gerado na sentença encaixada e alçado a SpecDP para licenciar o D implícito. Já para Medeiros Júnior (2005), além de o pronome-wh se mover para SpecDP, ele está implicado em um tipo de operação sintática específico: a incorporação de dois núcleos funcionais Cº+Dº. Diante dessas hipóteses, elaboramos uma análise para as relativas livres do português brasileiro com base em Caponigro (2002): os pronomes relativos-wh DPs se deslocam do IP para SpecDP para licenciar o D implícito. Porém, diferentemente de Caponigro, para quem todos os pronomes-wh são DPs, mantemos a afirmação de que alguns pronomes-wh podem ser ambíguos entre ser um DP e um PP. Se for um PP, o pronome relativo, além de passar pelo SpecDP para licenciar o D nulo, vai para SpecPP para licenciar a P nula. Com isso, mantemos 94 a afirmação de que pronomes relativos AdvP incorporam uma preposição. Além disso, para que o caso não seja checado duas vezes em baixo e em cima, assumimos que o caso do pronome relativo-wh fica sem ser checado na sentença encaixada. Dessa forma, quando o pronome relativo sobe para a periferia esquerda da sentença ele checa seu caso. 95 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ÁREAS, Eduardo Kenedy Nunes. Aspectos estruturais da relativização em português: uma análise baseada no modelo raising. 2002. 146 f. Dissertação (Mestrado em Lingüística) Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. BELLETTI, Adriana. The Case of Unaccusatives. 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