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ConJur - Opinião: Processos estruturais e o trunfo do ativismo judicial
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OPINIÃO
Processos estruturais e o trunfo do
ativismo judicial no Brasil
4 de junho de 2021, 6h38
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Por Eduarda Peixoto da Cunha França e Matheus Casimiro Gomes Serafim
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Processos estruturais e o trunfo do ativismo judicial
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Em discussões sobre a validade ou a legitimidade de uma decisão judicial, tão
logo um dos debatedores consiga enquadrá-la como ativista, muitos dão a
questão por encerrada como se, na essência da palavra ativismo, estivesse
presente a própria inconstitucionalidade [1]. Nesses casos, o adjetivo "ativista"
funciona como um trunfo argumentativo, superando os demais argumentos que
possam ser utilizados para defendê-la.
Em outra oportunidade, discutimos o
mito do "juiz Hércules" no processo
estrutural [2]. Em que pese o enfoque
do texto ter sido o de desmistificar o
papel quase que impossível de ser
desempenhado por um magistrado
nesse tipo de processo e de ressaltar a
importância dos diálogos
institucionais, pouco debatemos
acerca do "ativismo judicial" em si. Destacamos, entretanto, que usualmente as
críticas nesse sentido são pouco científicas e acabam adentrando no campo da
abstração, por denunciarem, simplesmente, a opinião do observador em relação
a um juiz, a um tribunal ou a uma decisão do qual ele discorda.
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Hércules' no processo estrutural
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Os professores Diego Werneck, Fabiana Luci e Leandro Ribeiro, em 2012, já
apontavam a multiplicidade de definições que o termo assume, mapeando três
sentidos em que, frequentemente, é utilizado na mídia brasileira, quais sejam:
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a) ativismo como engajamento político e social;
b) ativismo como usurpação de poder;
c) ativismo judicial como "ocupação de vácuo de poder" [3].
O primeiro diz respeito a um maior engajamento político e social dos juízes,
em oposição a uma postura mais conservadora e tradicionalista, que seria típica
da função judicante do Estado, de modo que ao juiz caberia tão somente a
aplicação da lei de forma imparcial e neutra, sem levar em consideração fatores
além dos estritamente legais.
O segundo sentido, por sua vez, assume uma conotação negativa e define o
ativismo como uma espécie de falta de legitimidade e respaldo constitucional
do Poder Judiciário para decidir questões que, originariamente, são da
competência de outros poderes, e de invalidar decisões tomadas pelos poderes
eleitos.
Por fim, a terceira hipótese compreende o ativismo judicial como um modo de
preencher um vácuo de poder deixado pelas instâncias majoritárias (sobretudo
pelo Poder Legislativo).
O que esse trabalho demonstra é que não existe um parâmetro ou um
"denominador comum" para categorizar um juiz, um tribunal ou uma decisão
enquanto "ativista"; afinal, de uma perspectiva objetiva, o seu conceito ainda
continua em aberto e em constante (des)construção.
O que é certo é que a expressão, para que seja estudada com seriedade e
cientificidade pelo Direito, precisa ser compreendida em toda a sua
complexidade e multidimensionalidade [4]. É preciso entender que o ativismo
é um fenômeno — acarretado, sobretudo, por fatores políticos, econômicos e
sociais, e não por um novo papel que o Poder Judiciário decidiu assumir "da
noite para o dia" —, e não um argumento de ilegitimidade à disposição do
crítico. Um juiz, por exemplo, não pode ser "ativista" simplesmente por decidir
contra a opinião de um determinado observador.
Dessa forma, parece mais adequado adotar um conceito mais amplo de
ativismo judicial, o qual é defendido por Campos [5]: podem ser assim
adjetivadas as decisões que manifestam uma autoexpansão do papel políticoinstitucional do Judiciário em face dos outros Poderes. Se essa é uma expansão
constitucional ou não, dependererá do contexto no qual a decisão foi proferida.
O autor também afirma que "(...) o ativismo judicial não pode ser considerado
aprioristicamente ilegítimo, pois isso depende dos diferentes fatores
envolvidos e da dimensão decisória manifestada" [6], de maneira que apenas a
dimensão antidialógica, constituída por uma supremacia judicial e uma recusa
a dialogar com os outros Poderes, deve ser tida como manifestação judicial
ilegítima.
E aqui chegamos aos processos estruturais. Para a surpresa de alguns, que
acusam os processos estruturais de instrumento de solipsismo judicial [7],
essas demandas têm sido caracterizadas exatamente pela atuação dialógica do
Judiciário. Dois exemplos recentes ilustram bem o ponto.
No julgamento de medida cautelar na ADPF 709, que trata das omissões da
União na proteção das comunidades indígenas durante a pandemia de Covidhttps://www.conjur.com.br/2021-jun-04/opiniao-processos-estruturais-trunfo-ativismo-judicial
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19, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, fixou algumas medidas para a
proteção dos grupos indígenas: criação de sala de situação para gestão de ações
de combate à pandemia quanto aos povos em isolamento; necessidade de
elaboração e monitoramento de um Plano de Enfrentamento da Covid-19 para
os povos indígenas, com a participação do Conselho Nacional de Direitos
Humanos (CNDH) e de representantes das comunidades indígenas. Além
disso, a Fundação Osvaldo Cruz e o Grupo de Trabalho de Saúde Indígena da
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) deveriam fornecer o apoio
técnico necessário à elaboração do Plano [8]. Tanto o plano de ação como o
seu monitoramento deveriam ser construídos pela União, em parceria com as
entidades competentes e com o grupo afetado. Não seria, portanto, fruto de um
solipsismo do juiz.
Outro exemplo de ação estrutural de caráter dialógico é a ADPF 635 [9],
conhecida como "ADPF das favelas", que questiona o quadro de constante
violência policial nas favelas do Rio de Janeiro. A ação possibilitou uma
audiência pública histórica, nos dias 16 e 19 de abril deste ano, com
participações de representantes de movimentos sociais, organizações e
entidades relacionadas aos direitos humanos e às vítimas de violência do
Estado.
Logo, devem-se afastar eventuais preconceitos e antipatias em relação ao
ativismo judicial dialógico [10], visto que essa postura intenta justamente
mitigar as principais críticas feitas às condutas excessivamente proativas do
Judiciário. As decisões dialógicas definem, assim, as metas e os caminhos para
a implementação de políticas públicas, acompanhando o progresso do
cumprimento das decisões e deixando as escolhas mais importantes para as
agências governamentais [11]. O foco seria construir um diálogo institucional
para que os entes estatais responsáveis atuem conforme as suas atribuições
típicas, construindo soluções adequadas dentro de suas esferas de
competência [12].
Antes de utilizar o adjetivo "ativismo judicial" como trunfo para encerrar um
debate, os críticos dos processos estruturais deveriam se preocupar em
responder algumas questões: Ele foi ativista por quê? Sobre qual dimensão do
ativismo judicial está a se falar? Essa dimensão é, a priori, ilegítima? Como e
por qual via o grupo vulnerável pode, efetivamente, obter a proteção aos
direitos fundamentais violados pelo Executivo e pelo Legislativo? Sem
responder a essas perguntas, a repetição da palavra ativismo será insuficiente
para afastar a necessidade de um processo estrutural.
[1] KLARE, Karl. Criticial perspectives on social and economic rights,
democracy and separation of powers. In: GARCÍA, Helena Alviar; KLARE,
Karl; WILLIAMS, Lucy A. (Ed.). Social and Economic Rights in Theory and
Practice: Critical Inquiries. Nova York: Routledge Research In Human Rights
Law, 2014. p. 3-22, p. 5.
[2] FRANÇA, Eduarda Peixoto da Cunha; SERAFIM, Matheus Casimiro
Gomes. O mito do "juiz Hércules" no processo estrutural. 2021. Disponível
https://www.conjur.com.br/2021-jun-04/opiniao-processos-estruturais-trunfo-ativismo-judicial
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em: https://www.conjur.com.br/2021-mai-25/franca-serafim-mito-juizhercules-processo-estrutural. Acesso em: 25 maio 2021.
[3] Diego Werneck; OLIVEIRA, Fabiana Luci; RIBEIRO, Leandro Molhano.
Ativismo judicial e seus usos na mídia brasileira. Revista Direito, Estado e
Sociedade, nº 40, 2014, p.50.
[4] Alguns juristas brasileiros destacaram, em suas obras, as dimensões do
ativismo judicial. Nesse sentido, ver: CAMPOS, Carlos Alexandre de
Azevedo. Dimensões do Ativismo Judicial do STF. Rio de Janeiro: Forense,
2014; LIMA, Flávia Danielle Santiago Lima. Jurisdição constitucional e
política: ativismo e autocontenção no STF. Curitiba: Juruá, 2014.
[5] CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Dimensões do Ativismo Judicial
do STF. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 347.
[6] CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Estado de Coisas
Inconstitucional. Salvador: Juspodium, 2016, p. 15.
[7] STRECK, Lenio Luiz. Estado de Coisas Inconstitucional é uma nova forma
de ativismo. Revista Consultor Jurídico, v. 24, 2015. Disponível em:
https://www.conjur.com.br/2015-out-24/observatorio-constitucional-estadocoisas-inconstitucional-forma-ativismo. Acesso em: 2/6/2020.
[8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental nº 709. Decisão monocrática sobre os pedidos
cautelares. Relator: Ministro Luís Roberto Barroso. Diário Oficial da União.
Brasília, 2020. p. 33-35. Disponível em:
http://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?
id=15343710124&ext=.pdf. Acesso em: 31/10/2020.
[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de
Preceito Fundamental nº 635. Relator: Ministro Edson Fachinº. Diário Oficial
da União. Brasília, 2019. Disponível em:
https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5816502. Acesso em:
27/5/2021.
[10] LIMA, Flavia Danielle Santiago; FRANÇA, Eduarda Peixoto da Cunha.
Ativismo dialógico x bloqueios institucionais: limites e possibilidades do
controle jurisdicional de políticas públicas a partir da Sentencia T-025/04 da
Corte Colombiana. Argumenta Journal Law, nº 31, p. 209-243, jul./dez., 2019,
p.212.
[11] CHAGAS, Tayná Tavares das et al. Estado de coisas inconstitucional: um
estudo sobre os casos colombiano e brasileiro. Revista Quaestio Iuris, [s.l.], v.
8, nº 4, p.2.596-2.612, p. 2.206, 26 dez. 2015.
[12] SERAFIM, Matheus Casimiro Gomes; ALBUQUERQUE, Felipe Braga.
A desencriptação do poder pelos processos estruturais: uma análise da
experiência sul-africana. Revista da Faculdade Mineira de Direito, v. 23, nº 46,
p. 299-323, p. 314-315, p. 311-313, p. 317-318, 2020.
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Eduarda Peixoto da Cunha França é doutoranda e mestre em Direito pela Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE).
Matheus Casimiro Gomes Serafim é doutorando em Direito pela Universidade Estadual do
Rio de Janeiro (UERJ), mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC)
Revista Consultor Jurídico, 4 de junho de 2021, 6h38
COMENTÁRIOS DE LEITORES
2 comentários
ANDANDO EM CIRCULOS
Ulysses (Professor Universitário)
4 de junho de 2021, 9h56
Os articulistas andam em circulos, perdidos. Deveriam ler obras do prof. Lenio
Streck, Clarissa Tassinari, Georges Abboud, entre outros. Mas, não. Preferem o
simples. Se fizessem a distinção entre ativismo e judicialização, resolveriam o
problema. Por isso o texto nada acrescenta. Profundidade 1 na escala de 1 a 10.
Responder
DRA. EDUARDA E DR. MATHEUS
Rejane G. Amarante (Advogado Autônomo - Criminal)
4 de junho de 2021, 9h34
Que pena que os brilhantes articulistas giraram em torno de decisões do STF, para
mim, um tribunal inválido. Se a pesquisa houvesse analisado decisões de outros
tribunais e mesmo juízos singulares, muito poderia ser trazido à reflexão, pois há
decisões excelentes e profícuas.
Por outro lado, nesse mesmo tema, gostaria de ver uma análise dos articulistas sobre
os seguintes julgados :
1 ) "constitucionalidade" do inquérito 4781
2 ) "constitucionalidade" da vacina obrigatória
3 ) "prorrogação" da vigência da Lei n. 13.979/20
4 ) decretação da anulação da delação de Sérgio Cabral com voto do "delatado",
Min. Toffoli que não se declarou suspeito nem foi "impedido" por seus pares.****A
meu ver, esse julgamento é nulo de pleno direito.
https://www.conjur.com.br/2021-jun-04/opiniao-processos-estruturais-trunfo-ativismo-judicial
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