Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Arte Clássica
Professor Doutor Nuno Simões Rodrigues
“LAOCOONTE”
Trabalho realizado por: Tânia Patrícia Faria Gonçalves Dias da Silva
Introdução
Laocoonte é uma personagem da Eneida escrita por Virgílio datada do c. Séc. I a. C.
Filho de Antenor, é sacerdote de Apolo Tímbrio, em Troia, estava encarregue do culto
deste deus e tinha feito um voto de celibato. Mas Laocoonte, ignorando os seus votos,
casou com Antíope e esta deu-lhe dois filhos: Etrón e Melanto ou, segundo outra
versão, Antifante e Timbreu. Com isto Laocoonte atraiu sobre si a cólera do seu deus ao
unir-se à mulher diante da estátua consagrada, o que constituía um sacrilégio.
Os gregos estavam na costa de Tróia e não conseguiam destruir as muralhas da cidade e
então, maliciosamente, por ideia de Ulisses, decidiram construir um cavalo de madeira
gigantesco para oferecer aos Troianos. Só que iriam simular a sua partida, supostamente
vencidos, deixando os melhores guerreiros dentro do cavalo.
Quando os gregos simularam o reembarque, deixando o cavalo de madeira na costa, os
Troianos encarregaram Laocoonte de oferecer um sacrifício a Posídon, pedindo-lhe que
multiplicasse as tempestades na viagem de regresso da armada inimiga.
“Alguns pasmam com a letal dádiva da Virgem Minerva e admiram a imponente massa
do cavalo. Tinetes é o primeiro a exortar a que se leve para dentro das muralhas e se
coloque na cidadela, fosse traição ou sina já de Tróia.” Mas Laocoonte não estava
convencido das boas intenções dos gregos, nem mesmo que fosse dádiva da deusa
Minerva, e lançou um dardo contra o cavalo, assim, demonstrando aos concidadãos, que
este produzia um som de cavidade, oco, onde se entrechocavam armas.
Segundo um excerto da Eneida de Virgílio, Laocoonte surge desta forma: “À frente de
uma grande caterva, a acode ao local o enérgico Laocoonte, vindo do alto da cidadela, e
de longe brada: - Ó desgraçados concidadãos, que loucura tão grande é esta? Acreditam
que se foram os inimigos? Julgais que há alguma dádiva dos Gregos exempta de
insídias? É assim que conheceis Ulisses? Ou neste madeiro se ocultam Aqueus ou se
trata de uma máquina construída contra as nossas muralhas, para expiar as nossas casas
e para vir cimeira por sobre a cidade, ou há aqui alguma tramóia. Não vos fieis no
cavalo, ó Teucros. Seja isto o que for, receio os Dánaos, mesmo quando trazem
presentes.
Tendo assim falado, brandiu com grande vigor uma enorme lança contra o flanco do
monstro e o ventre da armação arqueada. Ela cravou-se vibrando e no bojo sacudido
retumbaram e gemeram as cavidades. Se os desígnios dos deuses, se o nosso espírito
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não fosse adverso, ter-nos-ia convencido a devassar com ferro os esconderijos argólicos.
Tróia ainda estaria de pé, subsistirias, ó alta cidadela de Príamo.”
Sendo ignorado pelos seus concidadãos, voltou aos seus trabalhos de sacerdote, e
quando se preparava para imolar um enorme touro em honra de Posídon, duas grandes
serpentes saíram do mar e envolveram os seus dois filhos, Laocoonte foi em seu
socorro, mas os três pereceram, asfixiados pelos animais, que, em seguida, se foram
enrolar no pedestal da estátua de Atena, no templo da cidadela:
“ […] Eis senão quando duas serpentes vindas de Ténedo por sobre as tranquilas
profundezas, se alongam sobre o mar com os seus imensos anéis, dirigindo-se a par para
a costa. Os seus peitos erguem-se por entre as ondas e as suas cristas cor de sangue
elevam-se acima das vagas; atrás a parte restante corta o mar e encurva o dorso imenso
em circunvalações. Ouve-se um marulhar nas águas cheias de espuma. Já tinham
alcançado os campos, com os olhos faiscantes raiados de sangue e fogo, e lambiam com
as línguas vibrantes as bocas que silvavam. Elas dirigem-se a Laocoonte sem hesitar na
direcção. A primeira das duas serpentes, tendo envolvido os pequenos corpos dos seus
filhos, enrosca-se em volta de ambos, devora-lhes os desgraçados membros à dentada,
depois apanham-no a ele próprio, acorria a socorrê-los de armas na mão e enleiam-nos
com as suas enormes espiras. E tendo-lhe envolvido por duas vezes a garganta com os
seus dorsos escamosos, ficam ainda com os pescoços sobranceiros. Ele esforça-se por
desfazer os nós com as mãos, com as faixas rituais manchadas pela baba e pelo negro
veneno, erguemos aos astros horrendos clamores, semelhantes ao mugido que solta o
touro ferido quando se escapa do altar e sacode o cerviz, o machado mal atestado. Mas
as duas serpentes fogem deslizando para a parte mais alta do templo, dirigem-se para a
cidadela da cruel Tritónia e ocultam-se sob os pés da deusa e sob o disco do escudo.”
Os troianos ignoravam o sacrilégio que Laocoonte cometera, rompendo os votos
celibatários, pensando que a recusa de fazer penetrar o cavalo de madeira na cidade
tinha sido a única causa da cólera dos deuses. Abriram, então, todas as enormes portas
das muralhas e precipitaram, com este gesto infeliz, a ruína de Tróia
O trabalho, numa primeira fase, irá consistir num entendimento da história de
Laocoonte em paralelo com a escultura helenística, numa segunda fase, num confronto
com uma obra anterior, o friso do Altar de Pérgamo
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A Escultura
Segundo alguns autores, a escultura Laocoonte enquadra-se na Arte Helenística. O
termo Arte Helenística aplica-se sobretudo na escultura e na arquitectura grega.
Algumas das obras da escultura clássica que desfrutaram de maior sucesso em épocas
posteriores foram criadas durante o período denominado de Helenístico. O Grupo
Laocoonte foi descoberto em 1506. O seu impacto causou emoção nos artistas e
amantes da arte. Esta escultura narra a terrível cena da morte de Laocoonte e dos seus
dois e únicos filhos - história narrada por Virgílio na Eneida - porque cometeu um
sacrilégio ao ter rompido os votos de celibato que tinha feito a Apolo, como sacerdote,
ao seu deus.
A escultura demonstra o sofrimento, a raiva e o desespero de Laocoonte para salvar os
seus filhos. Os seus músculos do corpo e dos braços transmitem a ideia de esforço na
luta com as duas serpentes marinhas, a expressão de dor reflecte-se no seu rosto e no
espanto assombrado nos rostos dos filhos, inocentes, expiando o ultraje que seu pai
cometera.
O grupo Laocoonte, assim denominado, foi descoberto, como acima referi, em 1506,
mas já tinha sido antes descrita na obra de Plínio O Velho, no volume XXXVI,
Naturalis Historia. A escultura, nesta altura, encontrava-se no palácio de Tito. A autoria
da obra é atribuída por Plínio a Hagesander, Athenodiorus e Plydorus, três escultores da
ilha de Rodes. Desaparece por 1400 anos e reaparece desfeita em vários pedaços, por
um romano durante um trabalho de campo, para cultivo. Desde aí suscitou grande
curiosidade entre os artistas mais conceituados do sec. XVI, tais como Miguel Ângelo.
O grupo de Laocoonte foi uma das influências principais na obra de Miguel Ângelo,
depois da sua descoberta.
Após intensa investigação, descobriram a descrição da escultura na obra de Plínio O
Velho. A estátua estava incompleta, pois faltava o braço direito de Laocoonte, entre
outros elementos do grupo. Miguel Ângelo, num aceso debate, sugeriu que o braço
estivesse dobrado sobre o ombro do personagem, enquanto que a maioria dos estudiosos
defendia que estivesse distendido numa posição mais heróica. Após grande discussão
procedeu-se ao restauro da escultura, colocando braço numa posição heróica. Em 1597,
o verdadeiro braço perdido de Laooconte foi descoberto num antiquário italiano, e, de
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facto, tal como Miguel Ângelo previra, o braço estava distendido sobre o ombro de
Laocoonte.
Segundo Jonh Boardman, o grupo Laocoonte enquadra-se no Barroco Helenista:
movimento exagerado, expressionismo, dramatismo, realizado c. de 200 a.C.. Como
afirma este autor, os escultores Hagesander, Athenodiorus e Plydorus eram especialistas
em copiar e reproduzir esculturas gregas para romanos da classe alta da sociedade
romana do sec. I a.C., e, ainda, tem ligações directas com o Altar de Pérgamo, em tema
e estilo.
O Altar de Pérgamo é uma estrutura dedicada a Zeus, provavelmente construída no sec.
II a.C., na cidade de Pérgamo (hoje Bakir, Turquia). A temática é barroquizante:
expressiva e dotada de um movimento acentuado.
O altar tem um enorme friso em baixo-relevo com 113 metros de comprimento
mostrando a gigantomaquia, ou melhor, a luta entre os deuses e gigantes da mitologia.
O grupo Laocoonte transformou-se numa celebridade na Europa. Na história da obra, há
muitas mudanças de locais e de donos, passando por vários países.
O Papa Leão X, sec. XV, era um amante da arte clássica e encomendou uma cópia ao
escultor Baccio Bandinelli, que, posteriormente, veio a ser o modelo de muitas outras
versões menores em bronze.
Em 1799, Napoleão Bonaparte conquistou a Itália e levou, como espólio de guerra, o
grupo de Laocoonte para o Louvre, em Paris. A escultura acabou por ser devolvida ao
Vaticano, por iniciativa da Inglaterra, após a queda de Bonaparte em 1816.
Actualmente, esta grandiosa obra de arte encontra-se nos museos do Vaticano, em
Roma.
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Bibliografia
GOMBRICH, E. H., História da Arte, Público Editora, Lisboa
GRIMAL, Pierre, Dicionário de Mitologia Grega e Romana, Difel, Lisboa
JANSON, História da Arte, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa
SCHMIDT, Joel, Dicionário de Mitologia Grega e Romana, Edições 70
VIRGÍLIO, Eneida, Edições 70
Sites da Internet
www.wikipedia.org
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