Revista Brasileira de Sociologia do Direito
ISSN 2359-5582
AGENTES SOCIAIS, CONSTRUÇÃO
SOCIAL E POLÍTICA URBANA: UMA
ANÁLISE A PARTIR DA PROSTITUIÇÃO
NO CENTRO DE GUANAMBI/BA
Deborah Marques Pereira1
Felipe Teixeira Dias2
SOCIAL AGENTS, SOCIAL CONSTRUCTION AND URBAN
POLICY: AN ANALYSIS FROM PROSTITUTION IN THE
CENTER OF GUANAMBI/BA
RESUMO: O presente texto, fruto de uma análise sobre a
construção social do espaço urbano, reflete sobre as
funcionalidades da prostituição, enquanto agente produtor
do espaço. Em função disso, esta pesquisa foi desenvolvida
a partir de uma construção teórico-metodológica
embasada na tríade: agentes sociais, cidade e direito.
Assim, considerando que o contexto social é revestido de
diversos fenômenos à margem da política urbana, nesta
pesquisa, objetivou-se analisar à prostituição na área
central de Guanambi/Bahia, na dinâmica da construção
social do espaço como correspondência à política urbana.
Nesse prisma, para compreender à tríade contida nesta
pesquisa, tornou-se necessário traçar métodos e diretrizes
de estudos, correlacionando o estudo do espaço geográfico
e das relações sociais, com a política urbana. Para a
construção dos pressupostos teóricos, realizou-se uma
triangulação de dados, definindo: a) Política Urbana e
Direito à Cidade; b) Agentes Produtores do Espaço; e, c) A
Prostituição como função social. Por se tratar de um estudo
de caso, realizou-se pesquisa de campo para compatibilizar
os aspectos teóricos e práticos, e de forma complementar,
o uso de geotecnologias. Os resultados possibilitaram a
construção de um resgate histórico e social da formação do
espaço urbano de Guanambi, e ainda, verificou-se que a
prostituição exerceu e ainda exerce funcionalidades na
configuração social do espaço central de Guanambi/BA.
ABSTRACT: This text, the result of an analysis of the social
construction of urban space, reflects on the functionalities
of prostitution, as an agent that produces space. As a
result, this research was developed from a theoretical and
methodological construction based on the triad: social
agents, city and law. Thus, considering that the social
context is coated with several phenomena on the margins
of urban policy, this research aimed to analyze
prostitution in the central area of Guanambi / Bahia, in
the dynamics of the social construction of space as
correspondence to urban policy. In this light, in order to
understand the triad contained in this research, it became
necessary to outline methods and guidelines for studies,
correlating the study of geographic space and social
relations with urban policy. For the construction of
theoretical assumptions, data triangulation was carried
out, defining: a) Urban Policy and the Right to the City; b)
Space Producing Agents; and, c) Prostitution as a social
function. As it is a case study, field research was carried
out to make the theoretical and practical aspects
compatible, and in a complementary way, the use of
geotechnologies. The results enabled the construction of a
historical and social rescue of the formation of the urban
space of Guanambi, and yet, it was found that prostitution
exercised and still exercises functionalities in the social
configuration of the central space of Guanambi / BA.
Palavras-chave: Espaço Urbano. Funcionalidades Sociais.
Produção Espacial.
Keywords: Urban
Production.
1
Space.
Social
Features.
Spatial
Doutoranda em Direito Civil pela Universidad Buenos Aires (UBA), Mestre em Desenvolvimento Social (UNIMONTES).
Coordenadora de Pesquisa do Centro Universitário FG (UniFG).
2
Graduando no curso de Direito pelo Centro Universitário FG (UniFG).
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■■■
1 INTRODUÇÃO
O presente texto, analisa a construção social do espaço urbano a partir da
configuração dos agentes sociais inseridos neste espaço, correlacionando as ações destes
agentes como implicações da política urbana, isto a partir da funcionalidade dada ao
espaço. Nesse contexto, destaca-se à prática da prostituição, enquanto funcionalidade
presente dentre os fenômenos sociais correlatos à malha urbana.
Nesse contexto, verifica-se à necessidade de analisar como a prostituição interage
com o espaço social em que está inserida, evidenciando ou contrapondo as premissas da
política urbana brasileira. Logo, para realizar uma análise deste fenômeno, torna-se
necessário uma testagem dos aspectos teóricos em um ambiente prático, o que nesta
pesquisa, selecionou-se o espaço central de Guanambi/Bahia.
Para tratar dos fundamentos teóricos que ensejam às bases da pesquisa, utilizou-se
de autores específicos de cada elemento contido na tríade: cidade, sociedade e direito,
destacando como principiais discursos, Corrêa (1989) que define o espaço urbano e
classifica os agentes produtores, Christaller (1966) que revela a importância dos lugares
centrais e seus métodos de estudo, Lefebvre (1968) que cunha à questão do direito à
cidade, e Sousa (1995) que tece considerações especificas para tratar a prostituição como
uma funcionalidade social.
Assim, a presente pesquisa apresenta a questão da prostituição que reflete no
âmbito jurídico, a partir dos elementos sociais da política urbana. Essa questão apresenta
um desafio aos entes públicos, na verificação do produto social deste espaço central,
pensando em promover ainda políticas adequadas para um processo de construção do
espaço que esteja de acordo com as nuances básicas da política urbana.
Diante disso, esta pesquisa revela justificativas tanto por seu embasamento social,
quanto jurídico, a partir de sua relevância em analisar, explicar e explicitar determinados
fenômenos sociais, como o caso da prostituição nos espaços centrais de Guanambi, pelos
quais torna-se possível verificar, testar e apresentar um diagnostico a partir dos anseios
106
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
sociais, jurídicos e espaciais como participação na construção de uma política urbana que
seja compatível com esta realidade.
2 CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA
A metodologia da pesquisa traçada nesta investigação constitui-se a partir de um
estudo de caso, e segue uma abordagem qualitativa sobre a compatibilização entre as
Funções Sociais da Cidade, enquanto diretrizes da Política Urbana, e da ação da
prostituição enquanto agente produtor do Espaço Urbano no processo de (re)produção de
uma área central de Guanambi/BA.
Para a realização deste trabalho, tornou-se relevante definir os aparatos teóricos e
práticos: a) Política Urbana e Direito à Cidade; b) Funções Sociais da Cidade; c) O Espaço
Urbano e os agentes produtores do espaço urbano; e, d) A prostituição como agente
produtor do espaço, posteriormente aplicou-se esses conceitos ao estudo da área Central
de Guanambi.
2.1 Área de estudo
Desse modo, para realização desta pesquisa utilizou-se do(s) recorte(s): teórico e
espacial, delimitando-se como campo de estudo uma área Central da cidade de
Guanambi/BA, que se localiza entre as coordenadas geográficas 42º46’35” O, 14º13’35” S;
e 42º46’45’’ O, 14º13’40” S. A localização da área de Prostituição ocorre a partir da Rua
Tomaz Gonzaga, e poderá ser visualizada de acordo com a Figura 01.
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Figura 01– Mapa do recorte espacial da área Central da cidade de Guanambi/BA
Fonte: IBGE (2015); Observatório UniFG do Semiárido Nordestino (2019)
A escolha do recorte espacial pautou-se nas proposições da Teoria dos lugares
centrais proposta por Christaller (1966) e Lefebvre (1968) como Centralidade Urbana, os
quais destacam que as cidades, possuem uma atração, esta, é chamada de Centralidade
Urbana, ação oriunda de centros comerciais, que atrai as mais diversas classes e
movimentos, em busca por algum tipo de utilização, seja das praças, das ruas, do
comércio, ou mesmo em busca de lazer e prazeres, todos decorrentes do Centro Urbano.
2.2 Etapas e procedimentos
Inicialmente, procedeu-se com a delimitação do tema, definindo-se a área de
estudo e realizou-se concomitantemente um percurso histórico analítico sobre a produção
do espaço de Guanambi, juntamente com o surgimento, afirmação e resiliência da
prostituição no espaço pesquisado.
108
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
Com vistas a analisar o processo de produção e reprodução espacial no contexto
histórico, realizou-se uma análise acerca das modificações espaciais em períodos decanos
relativos ao crescimento da cidade, utilizando-se de instrumentos Geotecnológicos, e
técnicas como o uso do Geoprocessamento e do Sensoriamento Remoto para construção
de um mapeamento que ilustra à área central da cidade em correspondência com o
processo de expansão.
Esta pesquisa constituiu-se de três etapas, a saber: 1) levantamento de dados e
bibliografias; 2) Análise dos aspectos históricos da formação da cidade e da prostituição na
área Central; e 3) Elaboração dos instrumentos de pesquisa e coleta de dados.
Figura 02 – Etapas e procedimentos metodológicos da pesquisa
Etapas e
Procedimentos
Metodológicos
1) Delimitação do
Tema e definição da
área de estudos
2) Utilização das
Geotecnologias
1.1) Seleção das
Correntes teóricas
que subsidiaram à
pesquisa
2.1) Contrução da
evolução histórica
das manchas urbanas
1.1.1) Construção do
aporte teórico da
pesquisa
3) Instrumentos de
Pesquisa e coleta de
dados
3.1) Elaboração dos
instrumentos de
pesquisa
2.1.1) Mapemaneto
da área de estudo na
atualidade
3.1.1) Questionários
de Opinião Pública
3.2) Visita In Loco
3.2.1) Definição da
amostra
3.2.2) Aplicação dos
questionários em
campo
Fonte: Brandão Neto (2004); Gil (2002)
Para delimitar o quantitativo de questionários, procedeu-se com uma vetorização
da quantidade de propriedades contidas na localidade definida como área de estudos,
contendo um total de 70 (setenta) propriedades imóveis, das quais, há um quantitativo de
15 (quinze) em ociosidade, verificou-se em campo também um quantitativo de 11 (onze)
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casas que favorecem à facilitação da prostituição3. Assim, chegou-se a um quantitativo de
44 imóveis em uso, sendo 26 (vinte e seis) residenciais, e 18 (dezoito) comerciais.
Após essa verificação, consequentemente delimitou-se 1 (uma) pessoa por
propriedade para responder ao questionário. Do montante de questionários propostos,
em um quantitativo de casas comerciais: 18 (dezoito) obteve-se êxito com 11 respostas, e
7 (sete) não quiseram participar/não tiveram disponibilidade. Outrossim, de um
quantitativo de imóveis residências familiares somou-se um total de 26 (vinte e seis) dos
quais, há 1 (um) em construção, 16 (dezesseis) participaram da pesquisa, e 9 (nove) não
encontrados, em três tentativas em dias alternados segunda, quarta e quinta-feira do mês
de setembro do ano de 2019.
Figura 03 – Procedimentos para a coleta de dados em campo
Definição da
amostra
Vetorização dos
imóveis situados na
localidade, total: 70
Separação dos
imóveis por
ocupação e uso:
Quantidade de
vazios: 15
Quantidade de
casas que
favorecem à
prostituição: 11
Quantidade total de
questionários que
contemplem à
amostra: 44
Quantidade de
imóveis residências
familiares: 26
Quantidade casas
comerciais: 18
Fonte: Brandão Neto (2004)
3
Elaborado a partir dos apontamentos de pesquisa social aplicada de Brandão Neto (2004) Sobre como se faz
Pesquisa de Opinião Pública no Direito, definindo uma teoria, um recorte espacial e tabulação de dados.
110
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
Após concluir o procedimento técnico e metodológico da presente pesquisa,
cruzou-se as informações teóricas com os dados obtidos. Em seguida, foram tabulados os
dados que referenciam a realidade descrita pela pesquisa de campo, objetivando
descrever detalhadamente os resultados de toda a investigação, para validação da
abordagem teórica sobre a produção do Espaço Urbano da área Central de Guanambi.
3 A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO E A SOCIABILIDADE DO ESPAÇO
O processo de produção e reprodução do Espaço Urbano está atrelado às relações
típicas do sistema capitalista (consumo), logo o Estado, como um dos agentes produtores
tem o dever de administrar esse processo, auxiliando inclusive para que não ocorra uma
produção espacial que esteja incompatível com as funções socioeconômicas da cidade
(CORRÊA, 1989).
Logo, para compreender o dinamismo que envolve a produção do espaço, deve-se
considerar os agentes sociais presentes nele e envolvidos no processo capitalista de
produção e quais as relações que se estabelecem entre tais agentes (os agentes
produtores). Garcias e Bernardi (2008) destacam que o Espaço Urbano, é antes de tudo um
espaço social, o ambiente que abriga aos seres humanos que vivem e possuem suas
necessidades.
Nessa perspectiva, Pereira-Clemente (2013) destaca que o Espaço Urbano é
também social, produto das relações sociais. Logo, essas relações, apesar das
especificidades típicas de cada cidade ou região, tendem a se repetir de forma semelhante,
essas tendências se direcionam à sociedade com a finalidade de atender às demandas
sociais, adquirindo um status, uma função social na cidade (GARCIAS; BERNARDI, 2008).
Todo espaço ao ser produzido, já possui anteriormente uma pretensão, geralmente
atreladas às relações sociais de lazer, ao habitar, ao labor, e, sobretudo, para socializar.
Nesse sentido, Guimarães (2008) destaca que desde a Grécia e Roma antigas, os espaços já
eram produzidos com a intenção de propiciar a realização espetáculos de diversões e
realizações dos desejos das pessoas. Intuindo sociabilizar.
A partir do entendimento sobre os espaços socialização, assevera Guimarães (2008,
p. 49) que: “além de comer e beber, ali se discutiam política, filosofia, recitavam poesias,
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cantavam e flertavam, tudo aquilo que poderia se esperar de um espaço de sociabilidade”.
Dentro das possibilidades oriundas desses espaços existia ainda a participação de
prostitutos e prostitutas, como características funcionais dos espaços sociais (GUIMARÃES,
2008).
Noutra perspectiva, compreende-se com Corrêa (1989) que o espaço é fruto da
ação humana sobre o próprio espaço, a partir da interação com os objetos naturais e
artificiais. Assim, a produção do espaço refere-se às implicações que a atuação dos agentes
produtores do espaço infere no espaço físico. Ou seja, o espaço é marcado pelas relações
sociais estabelecidas pela humanidade.
Corrêa (1989), alerta que devido às mudanças históricas que ocorrem nas relações,
existe também em cada período histórico, transformações no e do espaço. Nesse sentido,
Garcias e Bernardi (2008), relatam que também as Funções Sociais da Cidade, mudam,
acompanhando às necessidades sociais de cada época, podendo agregar novas funções e
assim garantir o bem-estar de seus habitantes.
Diante disso, como o espaço é marcado pelas relações sociais estabelecidas pela
humanidade. Para compreender a produção do Espaço Urbano é necessário considerar o
tempo histórico e os agentes sociais que contribuem para a atual dinâmica urbana.
Levando-se em consideração que essa dinâmica deve atender às funções sócias na e da
cidade. Nessa perspectiva, como o primeiro espaço social de uma cidade inicia-se com o
centro urbano, será necessário tecer uma discussão sobre o centro urbano e a centralidade
urbana, tais discussões serão o cerne do próximo tópico.
4 FUNÇÕES SOCIAIS DA CIDADE: ACEPÇÕES E CONCEPÇÕES
Em estudos realizados por Dias (2019) a partir dos ideários propostos por Garcias e
Bernardi (2008) sobre as Funções Sociais da cidade, evidenciou-se que embora a
Constituição Federal de 1988 não esclareça quantas e quais são as Funções Sociais da
cidade, é preciso construir um entendimento de que estas funções sempre se modificarão
de acordo o tempo, o espaço e os agentes envolvidos na produção do espaço.
A partir das nuances da Política Urbana, entende-se que as Funções Sociais da
Cidade, tornam-se diretrizes que perseguem à eficiência do exercício do Direito à Cidade
112
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
(PEREIRA-CLEMENTE, 2013). Diante disso, não se deve construir um entendimento de que
as cidades per si devem possuir Funções Sociais, sem que haja concomitante correlação
com os agentes produtores do espaço, os quais, também possuem suas funcionalidades
socais no espaço (DIAS, 2019).
Para Bernardi (2011, p. 283) as Funções Sociais da Cidade possui sobretudo um
embasamento na Carte de Atenas4 pelo motivo de neste documento as cidades serem
tratadas como um organismo a ser planejado, pelo qual as necessidades do homem
deveriam estar claramente colocadas e resolvidas. Assim, com a finalidade de criar
“cidades funcionalistas, a Carta de Atenas defende quatro funções: Habitar, Trabalhar,
Recrear e Circular” (BERNARDI, 2011, p. 283).
Tabela 01 – Definições básicas das Funções Sociais da Cidade
Funções Urbanísticas
Habitação
Trabalho
Lazer
Funções de Cidadania
Educação
Saúde
Segurança
Funções de Gestão
Prestação de Serviços
Planejamento
Preservação do Patrimônio
Cultural e Natural
Mobilidade
Proteção
Sustentabilidade Urbana
Fontes: Garcias e Bernardi (2008); Lefebvre (2016); Pereira-Clemente (2013).
Logo, quer seja como regra ou como princípio, as Funções Sociais, enquanto meta
da Política Urbana torna-se a expressão da possibilidade de se alcançar o Direito à Cidade
(PEREIRA-CLEMENTE, 2013). Noutra perspectiva, como já mencionado, as Funções Sociais,
podem variar de acordo com o espaço, o tempo, e as ações dos agentes no espaço.
Assim, as funções listadas na Tabela 01 representam às Funções Sociais, podendo
ser desdobradas novas e alternativas Funções Sociais da Cidade, nas palavras de Garcias e
Bernardi (2008), as Funções Sociais ainda não foram totalmente definidas, e nesse sentido,
poderão vir novas Funções a partir dos anseios da Política Urbana contemporânea, que
emerge das necessidades de cada cidade.
Nessa perspectiva, Sousa (1995) correlaciona a prática da Prostituição como uma
Função Social, em que há uma relação de mão dupla, por um lado é um considerado uma
4
Documento que estabeleceu uma influência para construção do entendimento sobre as funções sociais da cidade, foi
redigido no IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (Ciam), em 1933 (BERNARDI, 2011).
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fonte provedora de renda para os praticantes, considerando-se como trabalho, e por outro
lado propicia lazer às pessoas que buscam pelos praticantes, isto é, pelos serviços.
Diante disso, torna-se necessário tecer considerações sobre as perspectivas que
envolvem as definições das Funções Sociais da Cidade, sobretudo da prostituição enquanto
função da e na cidade, e para isso no próximo subtópico serão abordadas essas
concepções sobre a função social da prostituição.
4.1 A prostituição como função social na cidade
Como já mencionado tanto as cidades quanto os agentes sociais inseridos neste
espaço possuem uma função social a ser cumprida. Coaduna-se com essa questão,
Bernardi (2011) ao referir-se às funções sociais como uma fonte norteadora para que as
cidades sejam “funcionalistas”, isto é, que as cidades possuam uma funcionalidade, ou
múltiplas funcionalidades, daí a ideia de que se cumpram com as funções sociais.
Desse modo, é mister salientar que no bojo de algumas funções sociais há
verdadeiramente “a consolidação dos direitos humanos que, com o passar do tempo,
evolui em seus conceitos e incorpora novos direitos à medida que avança a compreensão
da sociedade, ela também evolui e incorpora novas funções em relação às cidades”
(BERNARDI, 2011, p. 294).
Assim como o espaço é mutável, também as necessidades deste espaço e de quem
o produz pode ser mutável (BERNARDI, 2011). Nesse contexto, tanto o arcabouço legal
quanto as discussões teóricas acerca das Funções Sociais destacam as possibilidades de
essas Funções Sociais terem pontos de vista positivo ou negativo, mas sobretudo manter
um caráter abstrato, neutro e imparcial (DIAS, 2019).
Nas palavras de Corrêa (2018) o espaço é produzido refletindo às necessidades dos
agentes que o produzem. Assim, os agentes produzem o espaço a funcionalidade desse
espaço. Coaduna-se com essa concepção, os ideários propostos por Sousa (1995) que após
realizar um diagnóstico sócio-espacial, construiu cientificamente a ideia de que a
prostituição possui uma função social no espaço. Pode-se inferir com Sousa (1995) que
embora a prostituição seja uma prática não aceita socialmente, isto por conta de um
114
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
trajeto de exclusão social no cenário brasileiro, não significa que esta ação não colabore
com determinado espaço.
Noutro sentido, Corrêa (1989) relata que todos os agentes que estão inseridos no
espaço, que movem a malha urbana de acordo seus anseios são agentes produtores do
espaço, agentes este que possuem agrupamentos sociais. Logo, todos os agentes que
contribuem a partir de determinada função no espaço social, possui uma função social, e
como tal, é um agente produtor do espaço (in)(ex)cludente (SOUSA, 1995).
Nesse contexto, a prostituição torna-se expressão de uma via de mão dupla, por um
lado tem-se a função social da prática em si (SOUSA, 1995). Por outro lado tem-se a prática
da prostituição enquanto característica funcional de determinado espaço.
Assim, como função social da cidade, adentram-se aos preceitos das funções
urbanísticas de trabalho e lazer, sendo que pelo lado do praticante encontra-se o trabalho,
a prestação de serviço, e pelo lado de quem busca pelas praticantes, encontra-se a busca
pelo lazer (SOUSA, 1995).
Logo, as Funções Sociais da Cidade, como já demonstrado anteriormente se
relacionam intrinsecamente com as funções sociais na cidade que são oriundas dos
agentes produtores do espaço, podendo variar de acordo o espaço e o tempo.
5 GUANAMBI: DA PRODUÇÃO DO ESPAÇO À POLÍTICA URBANA
A peculiaridade envolvida na construção e expansão de Guanambi relaciona-se à
prostituição. Embora, a prostituição, seja matéria dualística em tratando-se da concepção
social, a discussão aqui, se pautará em sua função social no espaço, correlacionando esta,
com a produção do Espaço Urbano e Social de Guanambi (SOUSA, 1995).
De acordo com os relatos históricos, em 1870, iniciou-se o processo de povoação do
atual território de Guanambi, isso ocorreu às margens do rio Carnaíba de Dentro 5, quando
o até então proprietário Joaquim Dias Guimarães6 resolve realizar a doação de uma parte
da fazenda Carnaíba, à freguesia criada nesse mesmo ano sob a invocação de Santo
5
Localizado no semiárido baiano, passou por grande parte da atual cidade de Guanambi (TEIXEIRA, 1991).
6
Joaquim Dias Guimarães foi o doador, à Paróquia de Santo Antônio, das terras onde se construiu a Vila de Beija-Flor,
atual cidade de Guanambi, em 08 de maio de 1870 (IBGE, 1959).
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Antônio, e subordinada à paróquia de Monte Alto 7, em cujo local foi erguida a primeira
igreja, tomando o lugar o nome de Beija-Flor (IBGE 1959).
Nessa perspectiva, Teixeira (1991) relata que de acordo a tradição histórica do local,
em 1880 foi criado o distrito de Paz ou distrito Policial, o arraial recebeu o nome de BeijaFlor em homenagem à mulher que fez com que indiretamente havia fundado este arraial.
Em função dessa repercussão e com a movimentação que ocorria neste território, a sede
do arraial de Beija-Flor foi elevada à categoria de vila pela Lei estadual Nº 1364, de 14 de
agosto de 1919, que também criou o município com o nome de Guanambi (IBGE 1959).
Para Pereira (2010) foi a partir desses singelos acontecimentos que formou-se o
arraial de Beija-flor. No entanto esse arraial, que também passou a recebeu o apelido de
“arraial do quebra8” que fora formado por mulheres de vida livre, vindas das vilas e lugares
mais próximos (TEIXEIRA, 1991, p. 51). Infere-se ainda com Teixeira (1991) que embora
alguns que buscavam a farra naquela localidade se arruinassem, outros encontravam
prosperidade.
Com isso, os consumidores, produtores, vendedores e outros passaram a configurar
o lugar como local de comercio, pelo qual, também ali se estabelecia a busca por “cachaça,
viola, e diversões. No entanto, se alguns buscavam esta localidade por esse tipo de
diversão, a maioria iam para o cabaré – ambiente propicio à farra, à desordem, e as brigas”
(TEIXEIRA, 1991, p. 68).
Desse modo, tal era a movimentação local, que em pouco tempo Guanambi passou
a ser detentora de grande movimentação em feira-livre, sendo que esta era fortemente
exercida nas segundas-feiras (TEIXEIRA, 1991). Na perspectiva de Pereira (2013) o
crescimento de Guanambi, ocorreu de forma acelerada em momentos seletos, como a
exemplo, os anos de 1970/1980, que se destacaram por sua produtividade na expansão do
cultivo do algodão.
Ainda que os relatos históricos demonstrem a existência da prostituição em
Guanambi noutras áreas além do Centro, esta pesquisa se restringirá a analisar a área
7
Palmas de Monte Alto é um município vizinho à Guanambi, ambos no estado da Bahia. Localizado na região sudoeste
do estado sendo porta de entrada principal do Parque Estadual da Serra de Montes Altos (IBGE, 2008).
8
Apelido dado ao até então arraial de Guanambi, devido ao fato de que para os que iriam a esta localidade em busca
de diversão em poucos dias se arruinavam financeiramente, pelo qual ficavam “quebrados” (TEIXEIRA, 1991).
116
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
Central de Guanambi (TEIXEIRA, 1991). Tal recorte espacial corresponde à Teoria da
Centralidade Urbana, em outras palavras, a motivação remete à ideia de que é o local que
atrai às pessoas, e exerce domínio e busca por parte das demais áreas da cidade
(LEFEBVRE, 2016).
Nesse contexto, a área que compreende o atual Centro de Guanambi, e que
incialmente possuía uma lagoa nas proximidades, era também o local onde os agentes
produtores do espaço materializavam suas negociações (TEIXEIRA, 1991). Nessa localidade,
à medida em que a comercialização aumentava, também a freguesia buscava por
produtos, e consequentemente também diversões e lazer.
Às margens da lagoa do riacho do Belém, se estabeleceu-se a feira livre, onde a
configuração espacial caracterizou-se como área comercial (TEIXEIRA, 1991). Nesse
sentido, Santos (2017) afirma que os agentes envolvidos no processo de configuração
espacial, tendem a materializar seus anseios no local.
Logo, a atração que uma área comercial tende a exercer à população local, faz com
que cada vez mais outros comércios, negócios e demais meios de produção econômica se
estabeleçam naquela localidade (SANTOS, 2017). Assim, a prostituição que se
implementou às margens da lagoa, encontrava naquela localidade uma funcionalidade
econômica do espaço, e consequentemente retribuía ao espaço propiciando atração aos
comerciantes que transladavam do rural para o urbano (TEIXEIRA, 1991).
Nesse contexto, a Figura 07, objetiva demonstrar os processos de expansão por
períodos decano, nos anos de 1970 a 2017. A Figura 04, objetiva demonstrar ainda, a
Produção do Espaço a partir das margens da lagoa que atravessava a cidade ao meio, e que
na atualidade comporta em grande parte o canal de esgotos da cidade.
117
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Figura 04 – Mapeamento da expansão de Guanambi/BA nos anos de 1970 - 2017
Fontes: IBGE (1974); Landsat 5 e 7; Observatório UniFG do Semiárido Nordestino (2019)
De acordo com Teixeira (1991) na formação inicial desta localidade, não havia um
policiamento efetivo que fosse inclusive, capaz de assegurar a ordem pública. Tal
problemática à época talvez foi aceita, visto que além das legislações que vigoravam à
época serem outras, também a Política Urbana não havia sido incorporado em textos
jurídicos brasileiros, sendo positivado a partir da Constituição Federal de 1988, e efetivada
pelas Funções Sociais da Cidade.
Nesse contexto, seria contrário aos ditames do Direito à Cidade ter um espaço que
não tivesse segurança, que não fosse capaz de propiciar lazer, e que as condições de
mobilidade e de viver do local não fossem dignamente implementadas e respeitadas
(LEFEBVRE, 2016).
118
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO
6.1 Construção social: a ação da prostituição na área central de Guanambi/BA
No contexto de Guanambi, as Funções Sociais da Cidade se veem numa interface
com a ação da prostituição, que colaborou com a configuração espacial e com os períodos
de reestruturação espacial da cidade. Como desdobramento desse breve relato, em
correlação com a teoria de Sousa (1995) a prostituição inicial, exerceu Funções Sociais na
Cidade. Porém, algumas observações devem ser explicitadas, como por exemplo, a
regressão dos serviços disponibilizados pelo ente público com relação a esta área.
Conforme poderá ser visto na Figura 05, um percentual de 77% (setenta e sete por
cento) responderam que residem nesta localidade a mais de 10 (dez) anos. Mister salientar
que esse foi o maior percentual, sendo os 23% (vinte e três por cento) restantes,
fragmentados em 11% (onze por cento) responderam que reside na localidade entre 5
(cinco) e 10 (dez) anos, seguido por um total de 8% (oito por cento) que respondeu residir
nesta área entre 1 (um) e 3 (três) anos, e por conseguinte, um menor percentual sendo de
4% (quatro por cento) residem a 1 (um) ano ou menos nesta localidade.
Figura 05– Representação do questionário sobre o tempo de residência
Fonte: Questionários de Opinião Pública
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Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 8, n. 2, maio/ago. 2021
Outro detalhe é que verificou-se conforme à Figura 07, um percentual de 77%
(setenta e sete por cento) dos entrevistados possuem experiência superior a 10 anos com
esta localidade, o que corroboraram com o entendimento teórico e prático da pesquisa.
Em perspectivas contemporâneas, a seguinte pergunta foi estabelecida como
componente do questionário: Você tem notícias sobre a existência atual de prostituição
nesta localidade? A partir das respostas compreende-se que 100% (cem por cento) dos
entrevistados possuem ciência de que nesta localidade há existência da prostituição.
Verificou-se ainda, por meio da pesquisa bibliográfica, que muitos moradores no
processo histórico de formação da cidade, indignados por conta da existência da
prostituição, solicitava aos responsáveis pela organização espacial das cidades, que
removessem à prostituição da área central, e as marginalizassem (TEIXEIRA, 1991).
Contudo, tal tentativa não surtiu efeito, prova disso é que se entendeu que o jogo e
a prostituição “enquanto recursos e estratégias possíveis de lazer e sobrevivência,
respectivamente, para uma população menos favorecida estivessem predominantemente
relacionados àqueles que se encontravam mais marginalizados na sociedade” (SILVA, 2006,
p. 173).
Outrossim, não significa dizer que sem embargos os participantes da pesquisa
tenham ciência da existência da prática, e entendam que não é juridicamente proibida,
que estes estejam de acordo essa prática. Nesse sentido, a próxima pergunta estará
diretamente interligada com a localidade, e sua correlação com a cidade.
Com relação à prática da prostituição e sua atração para as demais partes da cidade.
A pergunta da Figura 06 é crucial para compreender a percepção dos que vivenciam com o
fenômeno diretamente no dia-a-dia.
Figura 06 - Se há pratica da prostituição nesta localidade, esta, exerce atração às demais
partes da cidade? Por quê?
120
Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
Fonte: Questionários de Opinião Pública
Como pode ser visto na Figura 08, 63% (sessenta e três por cento) dos entrevistados
acreditam a prática dessa prostituição na área de estudo causa atração 9 às demais áreas da
cidade, e 37% (trinta e sete por cento) pensam de forma contrária à esse questionamento.
Contudo, um dado relevante para essa concepção é a variável contida no bojo dessa
pergunta, pois de acordo com as informações obtidas através dos participantes da
pesquisa, teceu-se 4 grupos de respostas complementares são elas:
1) Foi possível compreender que a prática da prostituição na área central de
Guanambi realmente possui atração para às demais camadas da cidade. Essa atração foi
detectada por justificativas diversas, como por exemplo por ocorrer em uma área central,
o que ratifica a teoria dos lugares centrais descrita por Christaller (1966).
2) Ainda nessa perspectiva, de acordo com alguns entrevistados essa prática nesta
localidade exerce uma atração “negativa” para o restante da cidade, isto porque é um local
que se degredou com a ação dessa prática no espaço e no tempo, tornando-o local de
desordem. Essa justificativa evidentemente ratifica relatos da formação da cidade, escrita
por Teixeira (1991)10.
9
Aqui, o termo atração, refere-se ao ato de em alguma forma produzir efeitos de convidar as pessoas a irem a esta
localidade, ou de contra partida não querem ir de nenhuma maneira.
10
Teixeira (1991) relata em sua obra “Respingos históricos” que assim ficou conhecida Guanambi, como localidade de
desordem e de criminalidade, pois para esta região iam diversas classes de pessoas que infligiam às leis.
121
Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 8, n. 2, maio/ago. 2021
3) Outras variáveis para essa questão foram respostas que relataram que na
verdade
essa
localidade
não
exerce
atração
alguma,
mas,
alguma
forma,
invisibilidade/exclusão sócio-espacial das demais camadas sociais.
4) E a quarta variável está presente no que refere-se à movimentação. Nas palavras
de alguns participantes, esta localidade possui atração sobretudo porque está em uma
área central. Isso ratifica duas discussões anteriores, uma com relação à movimentação
inicial nessas localidades o que configurou o centro urbano, a outra com relação
novamente à teoria dos lugares centrais.
Essas variáveis foram construídas a partir das justificativas contida nas questões
objetivas, respondidas pelos participantes da pesquisa. Objetivando, compreender de
forma mais completa sobre a motivação das respostas em sim ou não. Sobretudo porque
em ambas as alternativas “sim e não” há possibilidade negativa em afirmação, e positiva
em negativa.
A próxima pergunta terá como função para esta pesquisa, o dever de concatenar o
aspecto inicial da formação do espaço, com a contemporaneidade, isto é, uma correlação
espaço-temporal da afirmação, resiliência e existência da prostituição nessa área central.
Figura 07- A prostituição existente nesta localidade contribuiu com a formação e/ou
configuração deste espaço?
Fonte: Questionários de Opinião Pública
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Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
A partir da Figura 07, verifica-se que 52% (cinquenta e dois por cento) dos
entrevistados opinaram que a prática da prostituição nessa localidade não contribuiu com
a formação e/ou configuração desse espaço. Em contra partida 48% (quarenta e oito) por
cento dos entrevistados opinaram que sim. Verifica-se que, desses dados, há quase um
choque divergente na opinião pública sobre a contribuição da prostituição com a
funcionalidade desse espaço na área Central. Evidentemente é uma discussão que merece
atenção e embasamento crítico científico, sobretudo porque é uma questão sensível, haja
visto que a prostituição não é uma prática socialmente aceita.
Contudo, como já mencionado nesta pesquisa em capítulos anteriores, ao tratar das
funcionalidades espaciais, corroborados pelos agentes inseridos no processo de
construção, configuração ou reconfiguração do espaço, considera-se que a prostituição é
uma funcionalidade dada a esta localidade em Guanambi, isto é à Rua Tomaz Gonzaga, isto
em função de que desde sua afirmação, perpassou pelas décadas, existindo e resistindo
nessa mesma localidade (TEIXEIRA, 1991).
A Política Urbana Brasileira ratifica os anseios dos direitos sociais contidos no bojo
da Constituição Federal, elencados pelo Estatuto da Cidade como direitos inerentes à
cidade, sendo estes alcançados por meio de serviços básicos como acesso à saúde,
segurança, assistências sociais, mobilidade, dentre outros (BRASIL, 2001). Para verificar a
compatibilidade entre o plano teórico-legal e o fático, uma pergunta foi realizada com o
intuito de obter à opinião sobre o acesso à cidade em suas funcionalidades, a pergunta foi:
Em sua opinião, esta localidade possui acesso a serviços básicos como: saúde, segurança,
assistências sociais, mobilidade e outros?
Com base no exposto, 100% (cem por cento) dos entrevistados, residentes e/ou
comerciantes afirmam não ter acesso a serviços elementares da Política Urbana,
estabelecidos pelas Funções Sociais da Cidade, os quais, no plano jurídico-teórico são
deveres do ente público propiciar à população. Essa problemática evidencia um processo
de carência de serviços públicos no contexto dessa localidade, o que contraria diretamente
os ditames do Direito à Cidade, que é o objetivo da Política Urbana.
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Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 8, n. 2, maio/ago. 2021
Figura 08– Fotografias da localidade de forma temporal (Visita In Loco)
Ano de 2010
Ano de 2019
Fonte: Imagens Street View – Google Eart Pro (2010); Arquivo Pessoal (2019)
Para uma compatibilização entre o aspecto discutido e com vistas às perspectivas da
visita in loco, a Figura 08, é constituída pelo conjunto de fotografias de quase uma década
de diferença no espaço. Selecionou-se essas imagens principalmente pela disponibilidade
do satélite do Google Earth- Pro. A partir dessas imagens verifica-se principalmente a
estrutura externa das edificações locais e em muitos momentos percebe-se que mesmo
após um lapso de 9 (nove anos) muitas dessas propriedades permaneceram iguais.
É válido destacar ainda, que proximamente até os anos de 2010 existia posto
policial nesta localidade, na entrada principal do atual Mercado Municipal de Guanambi,
porém, após visitação in loco, verifica-se que na atualidade não há mais esse serviço de
segurança que antes fora prestado.
A partir dessa discussão, no próximo gráfico serão abordadas outras problemáticas
inerentes a essa localidade, como por exemplo a questão do descumprimento de
instrumentos urbanísticos inerentes às Funções Sociais da Cidade.
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Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
Figura 09 – A prática da prostituição nesta localidade interfere na configuração do espaço
dessa área da cidade?
Fonte: Questionários de Opinião Pública
Com base no gráfico acima, possibilitou-se não só um entendimento objetivo sobre
a questão da configuração espacial oriunda da ação da prostituição, como também
possibilitou a constituição e análise de variáveis para subsidiar a discussão do presente
tópico. As variáveis foram classificadas em 4 (quatro) tipificações, resumidas pelo autor, a
partir da somatória de justificativas e suas peculiaridades conforme a seguir:
1) Interfere na aderência comercial, isto é, os comércios tendem a querer se afastar
dessa localidade por receio de suas clientelas pela imagem pejorativa que há no local.
2) Não interfere, porque em todos lugares há uma prostituição, poderia ser em
qualquer bairro essa prática, a localidade não muda o real sentido da prática.
3) Interfere promovendo exclusão social, isso porque o local aparenta ser uma
parcela esquecida da cidade, mesmo estando em meio ao “coração da área Central, e ter
sido um dos primeiros locais da cidade” essa área está como abandonada por grande parte
da cidade”.
4)Interfere com a melhoria do espaço, em função da desordem que é promovida
nesta localidade, havendo inclusive receio dos circulantes e dos moradores.
De acordo com as respostas complementares acima, corroborados com os gráficos
de respostas anteriores, verificou-se que embora todos os moradores relatem a existência
atual da prostituição nesta localidade, existem variáveis que permeiam desde a aceitação,
indiferença e negação.
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Revista Brasileira de Sociologia do Direito, v. 8, n. 2, maio/ago. 2021
A partir do percentual descrito na questão proposta pelo gráfico da Figura 09,
compreendeu-se que a prostituição é um dos responsáveis pela configuração dessa área
central. Contudo essa responsabilidade se limita ao plano fático, e não ao plano jurídico,
isto é, essa prática cumpre uma funcionalidade no espaço, porém não dita diretamente
como esse espaço deve funcionar, e muito menos quais os elementos que devem equipar
essa localidade da cidade.
Essa questão é de extrema relevância e merece atenção redobrada sob o risco de
esta área da cidade cair em um plano asseverado por Rolnik (2004) como a cidade ilegal,
pois quando uma cidade possui áreas que estão em processo de exclusão são chamadas de
cidade ilegal que faz parte de uma cidade legal, por ser esta, um ente regulamentado.
Em função do exposto, é possível compreender que, o local inicialmente na
configuração da cidade e em dados momentos históricos mostrou ser um local possível de
sociabilidade o que ratifica às proposições de Guimarães (2008). Contudo, a ausência do
ente público no sentido de promover segurança, acessibilidade, saúde, dentre outros
serviços elementares e de infraestrutura para essa localidade, transformou esta área em
um ambiente segregado, e considerado como excluído pelos moradores dessa localidade.
Nesse prisma, é válido tecer alguns comentários sobre as Funções Sociais da Cidade,
que embora não estejam descritas pela Carta Magna de 1988 de forma explicita, encontra
respaldos no bojo dos direitos e garantias fundamentais e sociais de aplicabilidade nas
cidades. E, nesse sentido, ao tentar compatibilizar os resultados da pesquisa com às
Funções Sociais da Cidade, verificou-se que, embora a prostituição tenha uma Função
Social na cidade11, a localidade não apresenta recíproca em possuir efetivamente Funções
Sociais da Cidade.
Assim, verificou-se que a prática da prostituição enquanto fenômeno social que
coexistiu na malha urbana guanambiense exerceu um papel histórico com a ressignificação
dos preceitos envolvidos na Política Urbana em Guanambi.
11
O termo Função Social, está voltado não aos sentidos “positivo” ou “negativo” mas, sobre a atuação social de
determinada classe social, sobretudo o que interessa nesta pesquisa, isto é, os agentes produtores do espaço.
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Deborah Marques Pereira e Felipe Teixeira Dias
5 REFLEXÕES FINAIS
À título de reflexões finais, primeiramente asseverar que esta pesquisa não se
esgota com a finalização deste texto. Isto em função de que a temática tratada nesta
pesquisa é ampla, podendo ser objeto de diversos estudos jurídicos e sociais. Destaca-se
nesta pesquisa, a relevância da construção metodológica no concernente ao cruzamento
de dados teóricos e práticos, que tiveram papel crucial para alcançar os resultados
correlatos aos objetivos propostos.
O referencial teórico aplicado à área de estudo, objetivou compreender à
integração entre os agentes produtores do espaço e suas funcionalidades no espaço, e
além disso, possibilitou a construção de um resgate histórico e social da formação do
espaço urbano de Guanambi, apontando suas características sociais e espaciais desde sua
formação inicial.
Como resultados práticos, verificou-se que a prostituição exerceu e ainda exerce
funcionalidades na reconfiguração social do espaço central de Guanambi/BA, modelando-o
aos anseios e características pertencentes à sua identidade e funcionalidade.
Nesse condão, diante dos resultados obtidos pelo processo de verificação dos dados
da pesquisa de campo, compreendeu-se que a área de estudo perpassa por um processo
de invisibilidade social, destacado pelos moradores e circuncidados.
Diante disso, torna-se necessário a reflexão e condução de ações por parte do ente
público como principal ator para executar políticas públicas que tenham por desígnios inibir
às disparidades socioespaciais, como a invisibilidade, exclusão social, e a ausência de
equipamentos públicos essenciais e indispensáveis com as funcionalidades sociais da cidade.
■■■
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