History

O objetivo deste trabalho é examinar o lugar-social de Caio Prado Jr. no campo intelectual
de São Paulo na década de 1950. Nesta época, era com orgulho que muitos paulistanos afirmavam
ser sua cidade a que mais crescia no mundo. O ambiente urbano se transformava intensa e
rapidamente, com consequências radicais para todos os seus habitantes. Os intelectuais, nesse
contexto, encontraram, pela primeira vez no Brasil, uma instituição que lhes sustentava um ponto de
vista próprio e relativamente autônomo: a universidade. Mas, de fato, essa autonomia não era
nacional – apenas em São Paulo e de maneira incipiente é que se podia falar de uma perspectiva
propriamente intelectual, fundamentalmente por conta da Universidade de São Paulo.
Caio Prado Jr. era neste momento um historiador importante e respeitado, embora não
tivesse se integrado à universidade. Sua presença, contudo, era inegável: o principal de seus livros –
Formação do Brasil Contemporâneo –, publicado originalmente em 1942, havia se tornado
bibliografia fundamental dos cursos de História e Ciências Sociais. Mesmo assim, ele não
conseguiu espaço para atuar na universidade diretamente.
Prado Jr. é considerado o primeiro intelectual brasileiro a fazer uma análise marxista
“inteligente” da história do país (em oposição ao “marxismo vulgar” de seus antecessores). Essa
opção teórica somada aos posicionamentos políticos consequentes (ele era militante do Partido
Comunista desde 1931) são explicações tradicionais para o insucesso do historiador na sua primeira
tentativa de se tornar professor universitário. Isso se deu em 1954, quando Prado Jr. disputou a
cadeira de Economia Política do curso de Direito da Universidade de São Paulo. Por conta do
conservadorismo da Faculdade de Direito seria inconcebível que um comunista fosse admitido entre
seus professores. O setor “liberal” da universidade era outro: a Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras. O historiador também conta com uma tentativa de integrar esta faculdade, mas é uma
tentativa tardia, que acontece somente em 1968. Na ocasião, Prado Jr. se increveu para o concurso
da cátedra de História do Brasil. O concurso não chegou a se realizar – foi cancelado pelos militares
no poder.
Apesar de não se integrar à universidade, Caio Prado Jr. atuou intensamente no ambiente
intelectual paulistano desde o início da década de 1930. Neste artigo, o foco recai sobre a década de
1950, quando os principais veículos da atuação deste historiador foram a Revista Brasiliense e a
editora de sua propriedade, também chamada Brasiliense. O objetivo é tentar entender o relativo
isolamento político e intelectual a que Prado Jr. se viu submetido, ainda que fosse ampla sua
atividade publicista, e que lugar-social ele conformava com sua atuação.

Neste artigo, pretendo analisar as representações de futuro da cidade de São Paulo
produzidas por Florestan Fernandes na década de 1950. Este decênio foi para São Paulo um período
de intensas e marcantes transformações. Dizia-se na época que São Paulo era a cidade que mais
crescia no mundo. Não era a cidade mais importante do país, porque o Rio de Janeiro ainda figurava
em primeiro lugar. Mas os paulistanos de então já vislumbravam no horizonte o futuro “glorioso” de
sua metrópole. São Paulo completou 400 anos em 1954 – vários intelectuais escreveram naquele
momento sobre o assunto, no qual o futuro da cidade era uma questão recorrente. Embora esses
intelectuais se mostrassem preocupados com uma miríade de problemas urbanos, a tendência geral
era avaliar com otimismo o que estava por vir. Portanto, ao escrever também sobre isso, Fernandes
não se aventurava em um tema novo – de fato, mostrava-se em sintonia com as preocupações de
seus pares. Entendo e proponho que o conjunto dessas preocupações sobre o futuro de São Paulo,
manifestadas nos escritos dos intelectuais, conformava um discurso. E este discurso, que
configurava em parte o horizonte de expectativa dos habitantes da cidade, é a entrada através da
qual procuro analisar o campo intelectual daquele momento. A investigação das falas sobre o futuro
de São Paulo permite perceber algumas das apostas de capital simbólico mais ousadas dos
intelectuais – pois, como dizia Milton Santos, “falar sobre o futuro da urbanização e das cidades é
coisa temerária”, era uma espécie de “investimento de risco”. Além disso, essa investigação
colabora com o mapeamento das “presentificações de futuros” de São Paulo, ou seja, ajuda a
identificar como e por que determinadas representações de futuro se tornavam o “futuro de fato”,
mesmo se ele não acontecesse. A análise das representações de futuro produzidas por Fernandes é
uma primeira aproximação desses problemas mais gerais. Não se pretende, portanto, explicar o
futuro de São Paulo a partir deste único caso. O objetivo aqui é entender o que Fernandes projetava
para São Paulo e esboçar seu lugar em relação a outras representações do futuro da metrópole.

O objetivo desta comunicação é comparar as atuações de Paulo Duarte e de Caio Prado Jr. no campo intelectual paulistano durante a década de 1950. Neste período, cada um capitaneava uma importante revista cultural: Prado Jr. estava à frente da Revista Brasiliense, enquanto Duarte dirigia a Revista Anhembi. Ambas as publicações ocupavam uma posição intermediária entre os jornais de ampla circulação e os periódicos especializados. Seu público era a elite cultivada local. Os dois editores ocupavam posições em falso na configuração do campo intelectual. Prado Jr. gozava de significativo reconhecimento, sobretudo por conta de sua produção como historiador. Contudo, vivia um momento de relativo isolamento político, em função de sua relação tumultuada com o PCB, e intelectual, por investir seus principais esforços em áreas (como a Filosofia e a Economia) nas quais seu lugar era menos unânime do que na História. Já Paulo Duarte era um escritor bissexto, lembrado principalmente por suas polêmicas jornalísticas. Ele não contava com o mesmo reconhecimento de Prado Jr., mas sua rede de contatos lhe garantia uma posição mais arejada do que a do primeiro. Além disso, nenhum deles estava vinculado à instituição que se tornava a principal instância de consagração intelectual daquele momento: a Universidade de São Paulo. No entanto, a consolidação da USP como o centro da vida intelectual local ainda estava em processo. Não havia um monopólio da consagração legítima e as revistas dirigidas por ambos faziam parte do universo de veículos para a divulgação das ideias dos intelectuais.

A proposta deste artigo é analisar, a partir de um ponto de vista histórico e sociológico, um elemento filosófico da obra histórica de Caio Prado Jr.: suas concepções de sujeito do conhecimento. Há uma epistemologia geral que sustenta a obra do historiador, contudo, ao longo dos anos em que produziu, Prado Jr. foi modificando sensivelmente a ênfase com que destacava determinadas características tanto do sujeito como do objeto do conhecimento. Os acentos sutis em uma ou outra qualidade dos elementos fundamentais do processo de conhecimento é o foco do artigo que ora se apresenta.

O famoso lema ademarista, forjado como slogan para o estado de São Paulo, foi, e continua sendo, retomado como mote da capital. A cidade de São Paulo começou a crescer aceleradamente no final do século XIX e, desde então, não parou mais. Por conta disso, o poder público se vê cotidianamente às voltas com o problema do crescimento da metrópole. Inclusive, é parte central da retórica política apresentar soluções grandiosas para os problemas derivados desse crescimento. A proposta deste trabalho é analisar duas dessas soluções: o Plano de Avenidas, de Prestes Maia; e o Programa de Melhoramentos Públicos, de Robert Moses. Ambas as propostas condizem com o lema "São Paulo não pode parar" (e ambas foram implementadas sob governos de Ademar de Barros). O objetivo, no entanto, não é avaliar essas políticas urbanas. Em vez disso, o que se quer aqui é analisar a produção das representações hegemônicas da metrópole e de seu futuro, encarnadas nas propostas de Prestes Maia e Moses. Para tanto, esses dois personagens são encarados como intelectuais, e seus discursos enquanto peças retóricas e argumentativas. A pretensão do artigo é oferecer uma análise das estratégias textuais usadas por ambos para sedimentar seus pontos de vista. Além disso, pretende-­se comparar como essas estratégias contrastavam com as de representações alternativas, que também estavam presentes nos debates sobre São Paulo, mas que não conseguiram se impor com uma força equivalente a das perspectivas hegemônicas.

Durante os anos 1950, a representação hegemônica do futuro de São Paulo foi disputada por três discursos diferentes. Um primeiro, pragmático e progressista, encarnado em figuras como Prestes Maia e Robert Moses, que apostava em uma cidade cada vez maior e mais complexa, cujo horizonte seria dominado por arranha-céus e chaminés de fábricas. Um segundo, esteticamente modernista e crítico ao modelo de cidade capitalista e industrial, cujo representante por excelência era Anhaia Mello, que propunha intervenções radicais para interromper o crescimento de São Paulo e transformá-la em um complexo de cidades-jardim. E um terceiro, irônico e pessimista, nascido da crítica dos discursos anteriores e da contribuição das ciências humanas para o debate sobre cidades, cuja característica fundamental era não enxergar nenhuma possibilidade otimista de futuro para São Paulo, e que tinha como arauto Florestan Fernandes. Nesta comunicação, pretendo discutir as condições sociais de produção desses discursos para poder analisar circunstanciadamente as estratégias retóricas que lhes são características. A proposta é entender como tanto o futuro da cidade era produzido por esses discursos quanto os próprios discursos eram produto das dinâmicas e transformações específicas pelas quais a cidade de São Paulo vinha passando.

From a perspective that combines History, Sociology and Anthropology, this paper proposal is to examine how pessimistic representations of the future of São Paulo, the main Brazilian metropolis, have played in the production of the city itself, in a context of hegemonic optimism.
There was a moment, in the mid-twentieth century, in which São Paulo, the main Brazilian metropolis, was considered the fastest growing city in the world. In the 1950s, for example, it was estimated that, on average, a house was built every 20 minutes in São Paulo. The astonishing growth of the city was celebrated by the newspapers, by the public power and by much of the population. São Paulo was seen as the spearhead of the Brazilian development and as an indicative that finally Brazil was fulfilling its " destiny " to become a potency of the future.

Ao se acompanhar as representações de futuro da cidade de São Paulo produzidas ao longo da década de 1950, percebe-se uma importante mudança no sentimento hegemônico em relação a ele. No início da década, o futuro da cidade era visto com otimismo e dominantemente representado como o de um crescimento contínuo e ilimitado. No final da década, em contraste, continuava-se imaginando que o destino da metrópole seria crescer indefinidamente, mas isso passara a ser motivo de preocupação e pessimismo. A passagem de um sentimento ao outro é marcada, em um primeiro momento, pelo acirramento das discussões entre urbanistas que ocupavam posições importantes no campo político. No entanto, foi a partir da entrada vigorosadas ciências humanas nos debates sobre a cidade, que o pessimismo se consolidou como sentimento dominante. Como se procura argumentar ao longo do artigo, amudança dos ânimos não foi fruto exclusivo da argumentação dos cientistas sociais e veio acompanhada de transformações na di...

A partir da análise da imprensa, de projetos urbanísticos e de textos de intelectuais, este artigo discute algumas transformações nas representações do futuro da cidade de São Paulo nas décadas de 1950 e 1960. Na primeira metade do século XX, o crescimento urbano foi hegemonicamente representado nos jornais, no mundo intelectual e entre os urbanistas como um elemento positivo para o progresso e modernização de São Paulo. Contudo, depois que a metrópole se tornou a cidade mais importante do Brasil, as expectativas sobre seu destino se alteraram. Uma série de problemas ganhou espaço nessas representações, figurando lado a lado com as esperanças de uma cidade melhor. O futuro de São Paulo se tornava assim esgarçado entre perspectivas redentoras e apocalípticas, cada qual ancorada em pontos específicos do espaço social e cultivadas por setores distintos das elites locais.