"quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres. E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos..." (Caetano Veloso e Gilberto Gil, Haiti) cidade é um espaço de conflitos. A civilização humana, em sua...
more"quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres. E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos..." (Caetano Veloso e Gilberto Gil, Haiti) cidade é um espaço de conflitos. A civilização humana, em sua extraor-dinária capacidade de gerar sociedades desiguais, sempre produziu cida-des igualmente injustas. Sua configuração, seu desenho, sua eficácia co-mo abrigo e espaço de produção, sua capacidade em promover qualidade de vida para uns ou para todos irão depender das dinâmicas sociais e econômicas e das correlações de forças de cada momento histórico. São Paulo, uma das cinco maiores metrópoles do mundo, expressa as disputas e conflitos da cidade capitalista, com o agravante de carregar também as contradições peculiares do subdesenvolvimento. A produção do espaço urbano responde a uma lógica na qual se relacio-nam fundamentalmente o Estado, o mercado e a sociedade civil. A tensão existe no fato de que o mercado procura obter lucro por meio da valorização fundiária e imobiliária, enquanto a sociedade civil interessa-se mais pelo valor de uso da terra urbana. Na cidade capitalista, tal tensão se exacerba, uma vez que a dife-renciação de classes e a possibilidade de cada uma delas apropriar-se de áreas desigualmente valorizadas fazem que a balança penda invariavelmente para o lado dos dominantes, que podem comprar terras nas áreas mais privilegiadas. Caberia ao Estado regulamentar o uso e a ocupação do solo, de tal forma a evitar tal desequilíbrio, restringir a supervalorização especulativa e garantir o acesso democrático à cidade a uma maior parcela da sociedade. Ocorre que quem alavanca a valorização da terra e dos imóveis nas cidades capitalistas é, paradoxalmente, o próprio Estado. O que dá valor à terra urbana é sua localização, definida pela disponibilidade de infraestrutura (Villaça, 2001): um lote é mais caro porque há "mais cidade" em torno dele, ou seja, avenidas e transporte público para acessá-lo, serviço de esgoto, água, luz, coleta de lixo. Porém, quem produz a infraestrutura é o Estado. Aí reside a contradição fundamental da cidade capitalista: um imóvel só tem valor em razão de uma complexa malha de infraestrutura, que é construída com investimentos públicos. Assim, a A São Paulo: cidade da intolerância, ou o urbanismo "à brasileira" João SETTE WHITAKER FERREIRA