Biotemas, 23 (4): 29-36, dezembro de 2010
I SSN 0103 – 1643
doi: 10.5007/2175-7925.2010v23n4p29
Visitantes florais de Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm.
(Bromeliaceae) em um remanescente da Mata Atlântica
do Nordeste Oriental
Petrúcio Alexandre Fonseca Rios1
Juliana Braga da Silva2
Flávia de Barros Prado Moura2*
1
PPG em Agronomia, Centro de Ciências Agrárias
Universidade Federal de Alagoas, Maceió-AL, Brasil
2
PPG em Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos
Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal de Alagoas
CEP 57100-000, Maceió-AL, Brasil
*Autor para correspondência
flavia.moura@pq.cnpq.br
Submetido em 23/ 04/ 2010
Aceito para publicação em 30/ 08/ 2010
Resumo
Este trabalho teve como objetivo principal a determinação dos visitantes florais e potenciais polinizadores
de Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm., uma bromélia endêmica da Mata Atlântica do Nordeste Oriental do
Brasil. Indivíduos reprodutivos foram acompanhados e seus visitantes florais foram registrados e determinados.
Os principais visitantes florais foram: os beija-flores Glaucis hirsutus, Phaethornis ruber e Phaethornis pretrei,
que efetuaram visitas legítimas pela frente das flores tocando suas partes reprodutivas. Além dos beija-flores,
também se registrou visitas das abelhas Plebeia flavocincta (Hymenoptera: Apidae: Meliponini), Plebeia sp.
(Hymenoptera: Apidae), Trigona spinipes (Hymenoptera: Apidae) e Euglossa cordata (Hymenoptera: Apidae:
Euglossina) e das borboletas Talides sergestus (Hesperiidae: Hesperiinae) e Strymon ziba (Lycaenidae, Theclinae,
Eumaeini), além de duas formiga (Hymenoptera, Formicidae), em atividade no escapo floral e nas flores da
bromélia. Sugere-se que A. constantinii seja polinizada por beija-flores, uma vez que estes fazem abordagens
diretas à flor, contatando as estruturas reprodutivas. A retenção de pólen no corpo das abelhas e borboletas e o
contato com o estigma revelaram que estas podem exercer influência na polinização, atuando possivelmente
como polinizadores secundários.
Unitermos: biologia floral, Phaethornis ruber, polinização, Trochilidae
Abstract
Floral visitors of Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm. (Bromeliaceae) in a remnant of the Brazilian
Northeast Atlantic Rainforest. This study aims to determine the floral visitors and potential pollinators of
Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm. (Bromeliaceae), a bromeliad endemic to the Brazilian Northeast Atlantic
Rainforest. Reproductively-active individuals were observed systematically and their visitors were recorded
and determined. The main recorded floral visitors were Glaucis hirsutus, Phaethornis ruber and Phaethornis
pretrei (hummingbirds) which executed frontal functional floral visits in which they touched the reproductive
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parts of the flowers. Visits of Plebeia flavocincta, Plebeia sp., Trigona spinipes and Euglossa cordata (bees)
and Talides sergestu and Strymon ziba (butterflies) were also recorded. In addition, two ants (Hymenoptera,
Insecta, Formicidae) were identified in activity on the floral scapes and flowers of the studied bromeliad. The
suggestion is made in the study that the A. constantinii is pollinated by hummingbirds since these birds executed
direct frontal visits to the flowers, touching reproductive structures. The identification of pollen on the bodies of
bees and butterflies, as well as the contact executed by visitors, with the stigma of the visited flowers, offered an
indication that these species may exert an influence as secondary pollinators of Aechmea constantinii.
Key words: floral biology, Phaethornis ruber, pollination, Trochilidae
Introdução
A Floresta Atlântica brasileira é uma das 34
prioridades mundiais para a conservação (Myers et
al., 2000; Mittermeier et al., 2004). Apesar de sua
importância biológica restam apenas cerca 12% de
sua cobertura original (Ribeiro et al., 2009). A mata
alagoana está situada Região Hidrográfica do Nordeste
Oriental, que abrange a floresta Atlântica situada ao
norte do Rio São Francisco, entre os estados de Alagoas
e Rio Grande do Norte. Este centro de endemismo é um
dos mais importantes da América do Sul (Whitmore e
Prance, 1987).
A Família Bromeliaceae é conhecida pela grande
diversidade de espécies. Na Mata Atlântica do Nordeste
Oriental, Siqueira Filho e Felix (2006) registram a
presença de 87 espécies de ocorrência nos Estados de
Alagoas e Pernambuco. Destas, 21 são endêmicas.
As bromélias possuem grande importância
ecológica, apresentando diferentes interações e relações
de interdependência com espécies da flora e da fauna
(Waser e Price, 1983; Leme e Marigo, 1993; Benzing,
2000; Canela e Sazima, 2003), podendo ser consideradas
fundamentais na manutenção de uma parcela significativa
da diversidade biológica nos ambientes em que vivem
(Martinelli, 2000; Andrade et al., 2009).
Os visitantes florais são todos os animais que
visitam a flor em busca de recursos alimentares tais
como pólen, néctar, ceras e outras substâncias, podendo
ou não efetivar a polinização. De uma forma sucinta,
a polinização efetiva depende, entre outros fatores, da
adequação do formato do corpo ou de determinados
órgãos do visitante floral à morfologia da flor, de como
ele aborda a flor e de seu comportamento durante a sua
visita (Proctor e Yeo, 1979). Diversas características
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morfológicas, fisiológicas e funcionais nas flores estão
relacionadas à atração dos visitantes florais. O período de
floração de uma espécie pode frequentemente representar
uma adaptação a períodos coincidentes com os de seus
visitantes específicos (Faegri e Van Der Pijl, 1979). Em
adição, a cor e a forma das flores parecem contribuir
como sinais visuais para os visitantes sobre o tipo de
recurso que está presente em determinada espécie,
oferecendo-lhe assim a possibilidade de incluí-la ou não
em sua rota de forrageio (Waser e Price, 1983).
Apesar da importância ecológica da família
Bromeliaceae e considerando sua grande diversidade,
ainda há poucas publicações a respeito do sistema
reprodutivo de suas inúmeras espécies (Martinelli, 1997;
Siqueira Filho e Machado, 2001; Nara e Webber, 2002;
Machado e Semir, 2006; Pereira e Quirino, 2008). Este
trabalho visa responder questões relativas à interação
da espécie com a fauna, durante o processo reprodutivo.
Para isso, buscou-se identificar os visitantes florais
e potenciais polinizadores de Aechmea constantinii.
Dados complementares sobre a biologia floral são
comentados, contribuindo para o conhecimento da
biologia reprodutiva desta espécie endêmica da Mata
Atlântica do Nordeste Oriental. As informações poderão
ser usadas para manejar populações isoladas, nestes
ecossistemas altamente fragmentados.
Material e Métodos
As observações de campo foram realizadas em duas
etapas: julho a dezembro 2007, e maio a agosto de 2008,
na mata da Serra da Saudinha (09º22’S e 35º43’O). Este
remanescente se caracteriza fitoecologicamente como
Floresta Ombrófila Aberta e está circundada por canaviais,
na porção mais externa do Município de Maceió, distante
Visitantes florais de Aechmea constantinii
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cerca de 20km da área urbana (Assis, 2000). O material
botânico testemunho foi depositado no Herbário Mac do
Instituto do Meio Ambiente de Alagoas.
e identificados por especialistas dos laboratórios de
Entomologia da UFPE (Himenópteros), USP e UFPR
(Coleópteros e Lepidópteros), onde foram depositados.
Morfologia e biologia floral
Resultados e Discussão
O estudo morfológico das flores de A. constantinii
foi desenvolvido sobre dez indivíduos reprodutivamente
ativos (com escapo floral desenvolvido), etiquetados
e numerados. Foi realizado in situ o registro de
informações sobre as inflorescências e suas flores, tais
como, a localização (ápice, meio ou base do escapo
floral), morfologia externa, cor, emissão de odor, horário
e duração da antese e senescência (Silva e DominguesNeta, 2010). A receptividade do estigma foi testada
a cada hora, deste a pré-antese até o fechamento das
flores, com peróxido de hidrogênio (H2O2) a 3% (Dafni,
1992). A coleta do néctar foi realizada com auxilio de
micro-seringa graduada. Flores totalmente abertas foram
coletadas (n=6) e conservadas em tubos plásticos com
tampa, em álcool 70% para posterior visualização das
suas peças florais com auxilio de lupa, no Laboratório
de Ecologia do Museu de História Natural (MHN) da
Universidade Federal de Alagoas.
Morfologia floral
Aechmea constantinii possui flores inodoras e as
pétalas sublinear-lanceoladas, livres, eretas com exceção
do ápice, subereto na antese, formando uma corola
tubular de cor vibrante, de um amarelo forte (Figura 1a).
A antese iniciou-se por volta das 5:00h, estando às flores
completamente abertas em torno das 5:50h. O fechamento
teve inicio por volta das 16:20h (Figura 1b), estando, as
flores, totalmente fechadas por volta das 17:00h. Suas
flores têm duração de apenas um dia, de acordo com
o que tem sido relatado como padrão na subfamília
Bromelioideae (Siqueira Filho e Machado, 2004).
Visitantes florais
As observações dos visitantes florais foram feitas
de forma direta, sem uso de equipamento óptico, sobre
as flores, desde o início até o final da antese. Durante
os meses de floração, uma vez a cada semana, foram
feitas sessões observações com duração de 12:00h (das
5:00h as 17:00h), totalizando 17 dias de observação.
As sessões diárias foram encerradas somente quando
se completava o fechamento das flores. Em cada
sessão foram registrados os espécimes que visitavam
as flores da bromélia, o horário e o número de visitas
(considerando-se “visita” cada vez que o espécime se
alimentava do néctar ou pólen de uma flor), o local de
deposição de pólen e o comportamento dos visitantes
mais frequentes. A identificação dos beija-flores foi
feita através da análise de filmagens, realizadas em
campo, comparada à literatura especializada (Frisch
e Frisch, 2005). Insetos foram coletados com auxilio
de rede entomológica, e posteriormente preparados
FIGURA 1: Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm. (Bromeliaceae):
a)Flor totalmente aberta com suas pétalas sublinearlanceoladas, livres, eretas com exceção do ápice
subereto durante a antese; b) Fechamento da flor, por
volta das 16:20h; c) Flor, com pétalas acastanhadas
após a antese; d) Escapo floral avermelhado com
brácteas escapais rosa-avermelhado; e) Estigma
conduplicado-espiral, elipsóide e úmido, ligeiramente
excedendo as anteras. (Fotos: Rios, P. A. F.).
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As pétalas adquiriram coloração acastanhada após
a antese (Figura 1c). Seu escapo floral é avermelhado
com brácteas escapais rosa-avermelhado (Figura 1d).
O conjunto de características é próprio de espécies
ornitófilas, porém, verifica-se alguma sobreposição de
características relacionadas à melitofilia e a psicofilia,
como por exemplo, tubo alongado, adaptado a probóscide
comprida de alguns insetos (Machado e Lopes, 1998;
Nara e Webber, 2002; Lenzi et al., 2006).
O estigma, conduplicado-espiral, elipsóide que
ligeiramente excede as anteras (Figura 1e), permaneceu
úmido durante todo período de antese das flores e
tornou-se receptivo por volta das 6:00h, permanecendo
assim durante toda a antese. A deiscência das anteras
ocorreu um pouco antes do estigma tornar-se receptivo,
caracterizando assim uma breve dicogamia protândrica.
Esta estratégia evita o contato do pólen com o estigma
no momento da abertura da antera, diminuindo as
probabilidades de que venha ocorrer a autopolinização.
A dicogamia, segundo Martinelli (1997), é comum à
maioria das espécies de Bromeliaceae.
O néctar é produzido e armazenado na base
do tubo da corola. A maior quantidade de néctar
foi registrada das 5:20h as 7:20h (19,5μl. e 31,7μl.,
respectivamente). A partir de então a produção começa a
cair progressivamente. Após o final da manhã o volume
do néctar não foi suficiente para ser calculado. Todos os
visitantes florais foram registrados durante o período
da manhã, quando havia produção de néctar. Embora
as observações tenham se entendido até as 17:00h e a
receptividade do estigma tenha sido mantida durante
todo período de antese, não foram registrados visitantes
florais após as 12:00h.
Visitantes florais e potenciais polinizadores
Em 204 horas de observação, as flores de Aechmea
constantinii foram visitadas por nove espécies: três beijaflores, quatro abelhas e duas borboletas, forragearam
néctar ou pólen. Os beija-flores foram: Glaucis hirsutus
(Gmelin, 1788) (Trochilidae: Phaethornithinae),
Phaethornis ruber (Linnaeus, 1758) (Trochilidae:
Phaethornithinae) e Phaethornis pretrei (Lesson
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e Delattre, 1839) (Trochilidae: Phaethornithinae).
Segundo Nara e Webber (2002), os Phaethorninae
parecem constituir o principal grupo de beija-flores
polinizadores de Bromeliaceae.
Geralmente, após as visitas dos beija-flores a
abertura da corola aumentou, expondo ainda mais o
estigma. O estilete permaneceu ereto ou foi deslocado
para um dos lados, fenômeno também constatado
por Siqueira Filho e Machado (2001) em Canistrum
aurantiacum (Bromeliaceae).
As abelhas visitantes foram: Plebeia flavocincta
(Cockerell, 1912) (Hymenoptera: Apidae: Meliponini),
Plebeia sp. (Hymenoptera: Apidae), Trigona spinipes
(Fabricius, 1793) (Hymenoptera: Apidae) e Euglossa
cordata (Linnaeus, 1758) (Hymenoptera: Apidae:
Euglossina). As borboletas registradas visitando as flores
da bromélia foram: Talides sergestus (Cramer, 1775)
(Hesperiidae: Hesperiinae) e Strymon ziba (Hewitson,
1868) (Lycaenidae, Theclinae, Eumaeini).
A maioria das espécies de bromélias está relacionada
à ornitofilia em especial aos beija-flores (Siqueira Filho
e Machado, 1998; Canela e Sazima, 2003). Por outro
lado, os insetos são responsáveis pela polinização da
maioria das plantas tropicais (Bawa et al., 1985) e a
entomofilia, apesar de pouco constatada na família
Bromeliaceae, tem sido considerada uma estratégia de
polinização intermediária, e em muitos casos, funcional
(Benzing, 2000).
Comportamento dos visitantes florais
A espécie de beija-flor Glaucis hirsutus foi
observada forrageando e inspecionando as flores de
A. constantinii, com abordagem direta à flor; seu bico
tocou os verticilos reprodutivos das flores, no período
das 6:00h até próximo às 12:00h, efetuando em média,
cinco visitas a cada hora, abordando, em cada uma
de suas visitas, mais de uma flor e vários indivíduos.
Adotou estratégia territorialista, permanecendo
próxima a área onde havia plantas floridas. Apesar
desse comportamento não foi registrada nenhuma
interação agonística interespecífica.
O fato de P. ruber e P. pretrei não terem permanecido
próximo às flores da bromélia, sugere que estas aves
Visitantes florais de Aechmea constantinii
apresentam técnica de forrageamento do tipo “linha
de captura”, ou seja, efetuam um longo roteiro de
visitas, não demarcando território definido. Para estas
duas espécies a frequência de visitas foi menor (2 a 3
visitas a cada hora, no período das 6:00h até próximo
às 12:00h). Segundo Tonhasca Junior (2005), o interior
da floresta é o hábitat desses beija-flores conhecidos
como “limpa-casa” ou “eremita”, não territoriais e
que forrageiam em áreas relativamente extensas. Esta
estratégia de forrageamento é típica das espécies da
subfamília Phaetorninae (Gottsberger, 1986).
Todas as espécies de beija-flores efetuaram visitas
legítimas pela frente tocando as partes reprodutivas
das flores, não tendo sido observadas tentativas de
perfuração da base da flor para pilhagem de néctar.
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Dada à estrutura das flores da bromélia, nas quais
as anteras ocorrem no interior da corola tubulosa, o
bico dos beija-flores tendeu a ser o local mais frequente
de impregnação de pólen. Fato também observado por
Machado e Semir (2006) em 14 espécies de bromélias
visitadas por beija-flores no sudeste do país. A limpeza
do bico e partes do corpo dos beija-flores foi registrada
no momento em que estes animais se encontravam
em descanso em galhos próximos as populações de
bromélias. Isso se deu, principalmente, para o beija
flor que apresentou comportamento territorialista (G.
hirsutus).
As abelhas visitantes, Plebeia flavocincta (Figura
2a), Plebeia sp. (Figura 2b) e Trigona spinipes,
apresentaram comportamento de forrageio semelhante
FIGURA 2: Material coletado em Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm., (Bromeliaceae): a) Espécime de Plebeia flavocincta (Cockerell,
1912) (Hymenoptera: Apidae: Meliponini), notar massa de pólen aderida à pata posterior da abelha; b) Espécime de Plebeia
sp. (Hymenoptera: Apidae); c) Espécime de Plebeia sp. pilhando pólen, na flor de Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm.,
(Bromeliaceae), notar massa de pólen acumulada nas corbículas presentes nas patas posteriores da abelha; d) Espécime de
Euglossa cordata (Linnaeus, 1758) (Hymenoptera: Apidae: Euglossina), notar sua glossa, língua comprida que facilita a
coleta de néctar. (Fotos: Rios, P.A.F.).
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P. A. F. Rios et al.
entre elas, e iniciaram em geral suas atividades por volta
das 5:00 h., permanecendo até por volta das 11:00h,
sobrepondo o horário de visitas dos beija-flores. A
frequência de visitas foi alta, variando em torno de
10 visitas por hora para cada espécie de abelha. Não
foi constatada, em nenhuma das espécies de abelhas,
tentativas de pilhar néctar perfurando a base da corola
pela face externa. Nas flores que apresentaram o escapo
floral em posição horizontal as abelhas chegavam
próximo às flores utilizando as pétalas como “pista de
pouso”, caminhando até os estames para coletarem o
pólen ativamente. Nas flores em posição vertical as
abelhas pousavam inicialmente nas pontas das pétalas
(Figura 2c), posteriormente apoiavam-se sobre o estigma
introduziam a cabeça e o primeiro par de pernas dentro
da corola e começavam a coletar pólen; durante a
transferência deste para as pernas medianas e destas
para a corbícula no último par de pernas, grãos de pólen
podem ficar aderidos ao estigma rico em substâncias
mucilaginosas. Podendo assim, estas abelhas atuarem
como eventuais polinizadores da bromélia.
As abelhas da espécie Euglossa cordata (Figura
2d) começavam suas atividades por volta das 6:00h,
encerrando-se às 10:00h. Estas abelhas aproximavamse frontalmente das flores e antes de pousarem, as
pétalas serviam de pista de pouso, geralmente girava
em volta da flor como em reconhecimento, pousavam
e introduziam sua glossa nas flores tubulares de A.
constantinii, apoiando-se, principalmente, com suas
pernas protóracicas.
Devido ao seu aparato bucal, com glossa, é possível
coletar néctar das flores tubulosas não sendo observada
tentativa de perfuração da corola da flor.
Abelhas são polinizadores de algumas espécies
da subfamília Bromelioideae (Araújo et al., 2004) e
provavelmente de algumas da subfamília Pitcairnioideae
(Varadarajan e Brown, 1988). Durante as observações
realizadas no presente trabalho, as abelhas transferiram
os grãos de pólen pilhado e aderido ao corpo, para
as corbicolas antes de abordarem outro indivíduo
da Bromélia. Desta forma, apesar da alta frequência
de visitas, as abelhas foram classificadas como
polinizadores secundários.
Para as espécies de borboleta foram registradas
apenas visitas eventuais. O espécime de Talides sergestus
(Figura 3a) foi registrado coletando néctar das flores de
A. constantinii por volta das 6:00h. Pousou apoiando-se
na corola tubular da flor; introduziu sua probóscide entre
as pétalas livres, atingindo assim a câmara nectarífera
(com nectários ocultos) localizada na base da flor.
No momento em que sua probóscide é esticada, esta
pode entrar em contado com as anteras, alojadas no
interior da flor, neste momento grãos de pólen podem
aderir à estrutura bucal do visitante. Já o indivíduo de
Strymon ziba (Figura 3b) foi observado em atividade
FIGURA 3: Borboletas visitantes de Aechmea constantinii: a) Espécime de Talides sergestus (Cramer, 1775) (Hesperiidae: Hesperiinae)
na flor, notar probóscide introduzida na corola tubular; b) Strymon ziba (Hewitson, 1868) (Lycaenidae, Theclinae, Eumaeini),
coletado em Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm., (Bromeliaceae), no município de Maceió, Estado de Alagoas. (Fotos:
Rios, P.A.F.).
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nas flores da bromélia por volta das 10:00h, também
foi constatada aderência de grãos de pólen à estrutura
bucal dos espécimes. Além da visitas de cada uma das
borboletas ter sido observada uma única vez, estas não
foram em mais de uma flor, impossibilitando, dessa
forma, a transferência do grão de pólen que por ventura
tenha aderido ao seu corpo.
regiões superiores do escapo, local mais próximo às
flores e talvez de melhor acesso aos vasos condutores de
seiva da planta pelos pulgões (Figura 4b). Associações
com homópteros e formigas da espécie O. haematodus
não é muito comum de acordo com Delabie (2001),
uma vez que a associação entre formigas e hemípteros
é típica de formigas filogeneticamente mais avançadas.
Segundo Benzing (2000), em Bromeliaceae insetos
são polinizadores menos comuns e, quanto ocorre,
a polinização é realizada por abelhas ou borboletas.
As bromélias polinizadas por borboletas apresentam
características semelhantes das polinizadas por abelhas.
A Psicofilia não é muito comum em Bromeliaceae,
mas Siqueira Filho e Machado (1998) relataram a
ocorrência de polinização por borboletas em uma
espécie de Hohenbergia (Bromelioideae) e Varassin e
Sazima (2000) em outras sete espécies de bromélias,
gêneros: Acanthostachys Klotzch, Aechmea, Billbergia
Thunb. (Bromelioideae), Tillandsia L. e Vriesea
(Tillandsioideae).
A segunda espécie de formiga não teve sua
determinação taxonômica (Figura 4c). Seus indivíduos
foram registrados coletando néctar em flores previamente
isoladas, para verificação do volume de néctar produzido
durante a antese. Há registros de fortes relações
mutualistas entre formigas coletoras de néctar extrafloral
e bromélias, mas em A. constantinii a câmara nectarífica
fica situada acima do ovário, dentro da flor. Desta
forma este comportamento pode ser classificado como
oportunista, e explicado talvez pelo fácil acesso ao néctar
que extravasou por entre as pétalas livres da flor.
Interações adicionais
Além dos visitantes florais, indivíduos pertencentes
a duas espécies de formigas (Hymenoptera, Insecta,
Formicidae) foram registradas em atividade no
escapo floral da bromélia. Os indivíduos da espécie
1 – Odontomachus haematodus (Linnaeus, 1758)
(Figura 4a) mantiveram-se ativos, percorrendo toda
extensão do escapo floral durante todo período com luz;
transportando pulgões (Homóptera, Aphididae) para
De acordo com as características florais, A.
constantinii é uma bromélia ornitófila, com características
que também podem ser associadas à psicofilia. A abertura
das anteras, antes de o estigma se tornar receptivo, pode
impedir o contato entre anteras e estigma nos primeiros
momentos de antese, dificultando a autopolinização.
Sugere-se que A. constantinii seja polinizada por beijaflores, uma vez que estes fazem abordagem direta á flor,
contatando as estruturas reprodutivas caracterizando
visita legítima. A retenção de pólen no corpo das abelhas
e borboletas e o contato destas com o estigma indicam
que estes animais podem exercer influência eventual na
polinização.
FIGURA 4: Formigas e Pulgões: a) Odontomachus haematodus Linnaeus, 1758, (Hymenoptera, Formicidae) em atividade no escapo floral
de Aechmea constantinii (Mez) L. B. Sm., 1970, (Bromeliaceae); b) Pulgão (Hemiptera, Aphididae) no escapo floral de A.
constantinii; c) Formiga sp. 2 (Hymenoptera, Formicidae) em comportamento oportunista, coletando néctar, que escorreu por
entre as pétalas da flor de A. constantinii. (Fotos: Rios, P.A.F.).
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P. A. F. Rios et al.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao CNPq e FAPEAL, pela
concessão das duas bolsas PIBIC para o primeiro e
segundo autor, ao MHN-UFAL pelo apoio nos laboratórios
de pesquisa, ao Grupo Carlos Lyra, pelo transporte e
alojamento dos pesquisadores na área de estudo.
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