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indianistas que irrumpieron con fuerza
a ines del siglo xx, principalmente entre
los pueblos originarios andinos y que llegaron a ser un componente importante
de los movimientos antiglobalización y
contra el neoliberalismo de principios de
siglo.2 Uno de sus segmentos, localizado
en el pueblo aymará, formuló las tesis más
radicales del indianismo en lo se reiere a
la ruptura con el mundo moderno, su
cultura, su ciencia, su medicina y aun los
conceptos de democracia y de ciudadanía.
No obstante de los puntos críticos al
trabajo de Juan José Bautista que hemos
señalado con antelación, podemos airmar que su libro es un aporte signiicativo
a una problemática ya clásica en el debate
latinoamericano entre los historiadores de
las ideas sobre la recepción de la modernidad europeo-occidental y su modo de
implantación en América Latina. Su libro
es apasionante porque es un alegato sobre
la dignidad y el valor de las culturas de
nuestros pueblos originarios olvidados y
oprimidos por las élites criollas blancas,
que siempre se sintieron ajenas a la cultura de sus pueblos vernáculos. Este es un
libro denso ilosóicamente, que muestra
un conocimiento profundo y ino de la
tradición europea en sus grandes pensadores de la modernidad, como, Hegel,
Marx, Heidegger, Habermas y muchos
más, un ensayo erudito que se visualiza
a través de las muchas notas y referencias,
densas en contenido.
Hugo Cancino Troncoso
(Aalborg Universitet)
2
Véase al respecto: Fernando Mires (1992): El
discurso de la indignidad. La cuestión indígena
en América Latina. Quito: Abya-Yala.
Magdalena López / Ângela Fernandes /
Isabel Araújo Branco / Margarida Borges
/ Raquel Baltasar / Sonia Miceli (orgs.):
Literaturas e Culturas em Portugal e na
América Hispânica. Novas perspectivas em diálogo. Ribeirão: Húmus 2014
(ACT. 29-Alteridades, Cruzamentos,
Transferências). 296 páginas.
A coletânea de ensaios, Literaturas e Culturas em Portugal e na América Hispânica. Novas perspectivas em diálogo, foi elaborada por membros do projeto DIIA
– Diálogos Ibéricos e Ibero-Americanos,
do Centro de Estudos Comparatistas
(CEC) da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. No âmbito deste
projeto Magdalena López, Ângela Fernandes, Isabel Araújo Branco, Margarida
Borges, Raquel Baltasar e Sonia Miceli
coorganizaram em Abril de 2013 o colóquio internacional ACT 29 (Alteridades,
Cruzamentos, Transferências), juntamente com o Programa Gulbenkian Próximo
Futuro. Trata-se de um evento anual do
CEC, realizado a cada ano por um dos
vários grupos de investigação do centro. A
maior parte das contribuições do volume
remontam-se às comunicações apresentadas no colóquio.
As relações entre as literaturas e culturas portuguesa e hispano-americana são,
de facto, pouco exploradas, razão pela
qual este volume bilingue é muito bemvindo. Trata-se de um trabalho quase pioneiro que analisa um vasto leque de temas relevantes. As organizadoras criaram
cinco secções temáticas com o objetivo
de visibilizar alguns ios condutores nos
21 ensaios. Estas são: (1) Identidades em
questão, (2) Sujeitos à margem e identidades transfronteiriças, (3) Representação
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comparam-se fenómenos culturais parecidos que se desenvolveram em contextos
diferentes e de maneira isolada um do outro, e confrontam-se, de forma exemplar,
as respostas literárias e artísticas a realidades em certo sentido comparáveis, além
de se estudarem fenómenos de receção e
de mercado. As organizadoras do volume não foram rígidas, de maneira que as
várias contribuições se caracterizam por
uma série de abordagens de diferente índole que apresentam interessantes resultados e ao mesmo tempo abrem pautas
prometedoras para futuras investigações.
Encontramos assim leituras comparadas de García Márquez e Gil Vicente
(Isabel Branco), Gonçalo Tavares e Jorge
Luis Borges (Márcia Neves), Rubén Darío e Eugénio de Castro (Miguel Mochila), Fernando Pessoa e José Juan Tablada
(Alejandro Palma), Ana María Shúa e
Ana Hatherly (Cristina Ribeiro), Cristina Rivera Garza e Dulce María Cardoso
(Alicia Ramírez), José Saramago e Miguel
Otero Silva (Raquel Baltazar), António
Lobo Antunes, Enrique Vila-Matas e César Aira (Felipe Cammaert), bem como
confrontações entre o cinema português e
chileno (Silvia Donoso) ou o muralismo
mexicano e a azulejaria portuguesa (Armando Aguilar).
Comentarei de seguida apenas alguns
dos ensaios que me pareceram especialmente interessantes e sinalizarei aspetos
que, numa leitura transversal, permitem
pô-los em diálogo. Abordarei ensaios que
lidam (1) com conceitos de espaço, (2)
com as relações culturais entre Portugal e
o México, e (3) com a receção da literatura hispano-americana em Portugal. Além
disso formularei eventuais desiderata que,
à partida, não pretendem ser uma crítica
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da memória, (4) Metaicção e autoria,
(5) Recepção, releituras e conluências. É
claro que esta proposta não pretende ser
limitadora e que o volume permite uma
leitura transversal que revela outras possibilidades de conexão entre os ensaios.
O conjunto pode ser lido como uma
tentativa de deslocar e desestabilizar os
caminhos mais usuais e tradicionais dos
estudos literários tais como o estudo de
literaturas nacionais ou os diálogos entre
os países latino-americanos com as suas
antigas metrópoles, ou seja, trocas culturais entre a América Hispânica e Espanha, bem como entre o Brasil e Portugal,
além das múltiplas inluências que estes
países receberam de outras metrópoles europeias, nomeadamente a França e a Grã
Bretanha, e mais recentemente de Estados
Unidos. Estes diálogos, certamente essenciais para a compreensão da história, da literatura e da cultura em geral, apresentam
uma longa tradição nos estudos literários,
que não deve, no entanto, impossibilitar a
análise nem de outros diálogos existentes,
nem de diálogos possíveis embora ainda
inexistentes. Assim, esta coletânea visa um
caminho de abertura neste sentido sem
querer ser rigorosamente sistemática nem
conclusiva e muito menos normativa.
A exploração e postulação de um diálogo entre Portugal e a América Hispânica implica, por um lado, revelar situações
de contato direto (tal como o diálogo entre artistas contemporâneos, ou a receção
da obra de um/a autor/a de uma época
distante por um/a autor/a dos nossos
dias) e, por outro lado, criar nexos onde
não os havia, ou seja, pôr em diálogo dois
universos culturais que não costumam
dialogar diretamente. Assim, descobremse intertextualidades diretas e indiretas,
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aos ensaios – que por questões de espaço
são curtos – mas sim um incentivo para
investigações futuras.
Relativamente aos ensaios que trabalham com conceitos de espaço, destaca-se
o de Magdalena López sobre os romances
cubanos Otras plegarias atendidas (2003),
de Mylene Fernández Pintado e Desde los
blancos manicomios (2008), de Margarita
Mateo Palmer. Magdalena López parte de
um texto de Odette Casamayor-Cineros
sobre a incerteza pós-soviética na atual narrativa cubana para estabelecer uma “ética
do desenraizamento” (“ética del desarraigo”, p. 51) que abrange um agenciamento
“utópico” (que mantém a premissa de um
certo progresso social) e um agenciamento “ingrávido” (p. 51), ou seja, sem gravidade, (que abandonou a ideia do telos
histórico). Tema central dos romances é
a deslocação das personagens entre Cuba
y Estados Unidos. López destaca sobretudo o papel do manicómio e do hospital
psiquiátrico – espaços de transitoriedade
em que convivem pacientes de diferentes
países e ideologias – e chega a conclusão
que nestes romances prevalece uma noção
de territorialidades quebradas, viagens interiores, e subversões semióticas espaciais.
Também Silvia Ruzzi trabalha com
conceitos de espaço no seu ensaio sobre o
escritor e teórico mexicano Heriberto Yépez. Yépez tem-se dedicado especialmente
a narrar e teorizar a fronteira do Norte
mexicano. A nível cultural e identitário
não se trata de uma linha demarcatória,
senão de uma área fronteiriça, um espaço
de interação entre culturas – um lugar
transnacional e multiterritorial, em que,
contudo, regem as forças hegemônicas de
uma cultura sobre a outra. Para Heriberto
Yépez, explica Ruzzi, a fronteira México-
Estados Unidos, não constitui um espaço
híbrido de fusão cultural. Trata-se antes
de um espaço heterogéneo em que as assimetrias, desigualdades e a repulsão entre
as culturas se tornam mais visíveis. Para
Yépez, a metáfora da hibridização é ingénua, visto que a mistura cultural é um
processo involuntário destinado a esbater
ou mesmo apagar as contradições entre as
culturas, acabando por ser uma estratégia
conservadora.
Ora, embora os ensaios de López e
Ruzzi não estabeleçam ainda uma ponte entre América Hispânica e Portugal,
pautam já um caminho possível para este
diálogo. Seria interessante explorar em
que medida estes conceitos de espaço e de
fronteira poderiam ajudar a semantizar
as fronteiras culturais entre Portugal e as
suas ex-colónias – sempre tendo em conta as disparidades culturais e históricas.
O conceito da hibridez não foi criticado
apenas por teóricos hispano-americanos,
mas também por escritores e teóricos africanos porque o consideram neocolonialista e inadequado para libertar as culturas
africanas do olhar exógeno hegemônico.
O México é um país abordado em
vários ensaios do volume. O trabalho de
Alicia Ramírez Olivares põe a literatura
mexicana em confronto com a portuguesa ao analisar a voz feminina em dois romances policiais: La muerte me da (2008),
da escritora mexicana Cristina Rivera
Garza, e Campo de sangue (2005), da escritora portuguesa Dulce Maria Cardoso.
Em ambos os romances leva-se a cabo um
ato de castração simbólica (e no primeiro
também física) que se traduz na ressigniicação da linguagem e no empoderamento
da voz feminina, visto que funciona como
uma metáfora de apropriação do espaço
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dos anos 1970 a 90 conhecido como o
boom, que não fazia distinções nítidas
entre as regiões e os países. Esta homogeneização supericial permitiu vender ou
mercantilizar a literatura hispano-americana primeiro com a etiqueta exotizante
do realismo mágico e mais tarde com a
da violência. No entanto, os processos de
receção diferem de acordo com os países,
e a entrada de certas obras literárias em
Portugal, principalmente durante a Ditadura, mas também no período que a ela
se seguiu, aconteceu num ritmo muito
mais lento relativamente a outros países,
como a França ou a Alemanha, por exemplo. Ora, o ensaio de Margarida Borges
contém, por um lado, uma série de dados relevantes em relação às estratégias
das editorias portuguesas até 1990 e, por
outro lado, Ana Bela Morais, reconstrói
pormenorizadamente a censura aos ilmes ibero-americanos na governação
de Marcello Caetano. Ambos os ensaios
poderiam dialogar e enriquecer-se mutuamente numa investigação mais ampla.
Em todo caso, María Fondo acrescenta
um aspeto isolado, o boom de Roberto
Bolaño, e postula um novo paradigma, o
“realismo visceral” (p. 237) que supostamente substitui o do “realismo mágico”.
Na Alemanha pode-se observar um certo
desfasamento em relação a receção dos
novos paradigmas literários hispano-americanos. O “macondismo” (representado
pelo êxito de Isabel Allende e as suas consequências “nocivas”) e o tema da “violência” (p. ex. nas vestes do romance policial) parece ser uma condição sine qua non
para o êxito da literatura hispano-americana no mercado alemão. Mas, nos países
hispano-americanos, há tempo que estes
paradigmas foram substituídos por uma
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feminino. Os romances apresentam uma
série de preocupações em comum que
justiicam a comparação que leva a alguns
resultados interessantes. Contudo, não se
encontram no ensaio referências ao contexto cultural concreto em que se inscrevem, no que diz respeito por exemplo aos
processos de empoderamento da mulher
no México e em Portugal, países que passaram por processos históricos díspares.
Esta questão talvez possa ajudar a diferenciar as abordagens das escritoras.
O ensaio de Armando Trinidad Aguilar de León explora as relações entre os
murais mexicanos pós-revolucionários
(nomeadamente os de Diego Rivera) e a
arte dos azulejos portuguesa do século xvi
até ao Estado Novo no que diz respeito
à representação de icções históricas em
espaços públicos com o objetivo de criar
uma determinada imagem da identidade
nacional. Aguilar de León resume a evolução de ambas as artes, surgidas em contextos diferentes e isoladas uma da outra,
salienta as origens e inluências (a árabe e
a pré-hispânica), para depois concentrarse sobretudo na semelhante função social
de ambas que consiste na representação
(didática) de grandes eventos da história
nacional com destaque para certos heróis
(p. ex. Afonso Henriques ou Emiliano
Zapata). A temática do ensaio parece-me
profundamente enriquecedora e relevante para o volume na medida em que se
centra na pintura enquanto a maioria dos
ensaios se dedica ao estudo da literatura.
O último eixo temático que gostaria
de comentar é a questão da receção da literatura e cultura hispano-americana em
Portugal. A literatura hispano-americana
entrou no mercado europeu como um
todo, através do fenómeno de mercado
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ampla série de novas vertentes que exigem
a pluralidade e não se limitam à América
Latina como espaço identitário, pelo que
seria útil, também, um trabalho de análise
das etiquetas de venda em relação ao mercado português na atualidade.
Este volume traz à luz uma série de
temas pertinentes e pouco explorados,
ao mesmo tempo que levanta questões
para futuros trabalhos. Neste sentido,
considero-o um trabalho de levantamento e análise que se revela essencial no
contexto dos diálogos entre a América
Hispânica e Portugal, quer pela novidade
que traz, quer pelos caminhos que abre
a uma necessária investigação futura de
aprofundamento da análise aqui já bem
começada. Trata-se portanto de um livro
que constitui um incentivo bem-sucedido para chamar a nossa atenção para o
facto de que houve e continua a haver
interligações culturais interessantíssimas
entre Portugal e a América Hispânica e
que estas merecem uma exploração mais
sistemática e mais profunda – tarefa a
que se continua a dedicar, certamente, o
grupo de investigação DIIA.
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Doris Wieser
(Georg-August-Universität Göttingen)
Mariano Siskin: Cosmopolitan desires.
Global Modernity and World Literature in
Latin America. Evanston: Northwestern
University Press 2014. 358 páginas.
A pesar de los historiadores de la globalización que consideran que sus inicios se
remontan al momento en que la especie
humana se instaló en el extremo sur del
continente americano, hacia el 10.000
a.C., y a pesar de los teóricos de la literatura mundial, que conceden (y al mismo
tiempo desatienden) que la literatura latinoamericana ha sido un modelo para
los procesos de independencia expresiva
y de redeinición de las relaciones centro-periferia que tuvieron lugar tras la
Segunda Guerra Mundial, América Latina no ha dejado de ser un convidado de
piedra en el banquete de lo que Pascale
Casanova dio en llamar “república mundial de las letras”. Dejando a un lado
excepciones, como, por ejemplo, Una
modernidad periférica (1988) de Beatriz
Sarlo, artículos como “Lost in Translation: Borges, the Western Tradition and
Fictions of Latin America” (1999) de
Sylvia Molloy o, si se me permite, Literatura posnacional, de Bernat Castany
Prado (Editum, 2007), los estudiosos de
la literatura latinoamericana han sentido
mucho menos “deseo de mundo”, que es
la feliz metáfora que desarrolla Mariano
Siskind en el libro que aquí reseñamos,
Cosmopolitan desires (2014), que los intelectuales cosmopolitas latinoamericanos de los que este habla.
Siskind, profesor de Humanidades en
la Universidad de Harvard, realiza en
este libro un riguroso y documentado estudio sobre las obras y discursos literarios que buscan, no siempre conscientemente, la construcción de un espacio
simbólico mundial (“world-making
discourses”, p. 7). Las diferentes calas
en la historia de la literatura mundial
no están ordenadas siguiendo un orden
cronológico –no se trata, pues, de una
historia de la literatura mundial en Latinoamérica– sino un orden lógico, o sistemático, puesto que las dos partes del
libro se ocupan de dos aspectos teóricos