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LAJEDOS 6

Set. 2016 LaJedoS revista espeleológica nordestina ISSN 1984-2155 Fundada em 2008 Edição 6 Volume 4 I Número 1 www.espeleonordeste.org III ENE: IRAQUARA 2016 - BIOLOGIA SUBTERRÂNEA POTIGUAR CARBURETEIRAS NA AMÉRICA DO NORTE - CARSTE DE SERGIPE ESPELEOAMIGOS: CAMPO FORMOSO 2016 Lajedos I Set. 2016 I Volume 4 I Número 1 I Edição 6 I www.espeleonordeste.org Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Editorial Antigas Luzes e Novos Caminhos Editorial Pág. 03 III ENE: O Brasil invade Iraquara Por Claudia Sousa Lima Mattedi Pág. 04 Biologia Subterrânea Potiguar Por Jan Pierre Martins de Araújo, Marcelo A. F. Kramer, Gustavo Henrique N. Basílio e Alyne de Oliveira Amorim Pág. 14 Luzes do Carbureto Por Solon R. Almeida Netto Pág. 24 Ambientes Cársticos em Sergipe Por Heleno dos S. Macedo, David C. Cardoso da Silva, Hélio M. Araújo e Rafael M. Sousa. Pág. 42 Espeleoamigos 2016 Por Ericson B. Oliveira e Tereza R. B. R. e Silva Pág. 56 Notas e Referências Pág. 62 LAJEDOS Revista espeleológica nordestina ISSN 1984-2155 contato@espeleonordeste.org O Capa: Lapa Doce, Iraquara/BA - Brasil. Imagem vencedora do Concurso Cultural National Geographic Brasil, publicada na edição de ago./2016, autor Solon Almeida Netto, feita durante o III ENE. No alto da página, os participantes do mesmo evento, em imagem do mesmo autor. Na página seguinte, desenho de uma carbureteira Baldwin, reproduzida a partir de Clemmer, 1987. Lajedos é uma publicação eletrônica, criada em abril de 2008, à divulgação e preservação do patrimônio espeleológico e do carste. É mantida pela ação voluntária de colaboradores. A opinião dos autores não relete as posiComissão Editorial: ções da publicação ou dos parceiros. Proibido Christiane Ramos Donato (Biologia) o uso desta publicação para ins comerciais, Daivisson Batista Santos (Arqueologia) David C. Cardoso da Silva (Prospecção e Topograia) sendo livre a divulgação, desde que de citada a fonte. A violação dos direitos de autor é crime Heleno dos Santos Macedo (Geomorfologia) prevista no artigo 184 do Código Penal BrasiMário André Trindade Dantas (Paleontologia) leiro. Leia, critique, elogie, participe! Solon R. de Almeida Netto (Fotograia) ~2~ caminho de consolidação regional da Espeleologia é tarefa árdua e que só pode ser imaginado em longo prazo, com muita energia e planejamento. O Nordeste brasileiro, mesmo aqui se situando algumas das mais revelevantes cavernas do país, em termos históricos, sempre mostrou indicadores espeleológicos bem abaixo de seu potencial natural. Poucos e dispersos grupos, baixo interesse pelo aprimoramento da técnica, inexpressiva interação intrarregional, ausência de projetos contínuos ou ambiciosos envolvendo as grandes áreas cársticas são alguns – dos tantos – fatores que culminaram numa Espeleologia nordestina sem qualquer relevância ao cenário nacional. Como reverter esse quadro? Àqueles que lutam em defesa do fortalecimento da “Espeleonordeste”, talvez, a resposa seja muito simples: “não desanimar, jamais!” Assim, assumir os erros individuais e coletivos, as omissões, os despreparos e, acima de tudo, arregimentar pessoas e pulverizar germes da Espeleo é um ponto de partida, pois esse é o caminho mais certeiro, quando se sabe que não há avanço sem autocrítica, determinação e pessoas motivadas. Após um longo período de “estiagem editorial”, a revista Lajedos lança uma nova edição. Estávamos hibernando. Pensando. Reletindo. Porém sempre tralhando, mesmo quando reclusos em nossos próprios mundinhos. Porém o mundo de um caverneiro nunca deve ser fechado, nunca deve ser pequeno. Voltamos porque era hora de voltar! Pela Comissão Editorial, Solon R. Almeida Netto ~3~ III Encontro Nordestino de Espeleologia Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org III Encontro Nordestino de Espeleologia: O Brasil invade Iraquara Texto Claudia Sousa Lima Mattedi Sociedade Baiana de Espeleologia Coordenadora geral do III ENE Fotos Solon R. Almeida Netto Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas Sociedade Nordestina de Espeleologia Fernando Andrade Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleologia O grupo folclórico Terno de Reis e Reisados, importante manifestação cultural de Iraquara/BA, foi a atração que abriu o III ENE, com uma apresentação na Câmara de Vereadores, mostrando aspectos da rica tradição popular regional, repleta de histórias, cores e músicas. (Imagem de Fernando Andrade). ~4~ E m termos realistas, a Espeleologia sediada no Nordeste, nunca teve um papel relevante no cenário nacional, mesmo estando nessa região situadas algumas das mais expressivas cavernas brasileiras e, por que não dizer, de todo o Hemisfério Sul. Porém, a atividade dos grupos nordestinos vem demonstrando, nos últimos anos, nítidos sinais de reestruturação, por indicadores objetivos, como o crescimento da quantidade de associações, associados, pesquisadores universitários e, especialmente, eventos voltados a reunir não somente os praticantes da atividade, mas, especialmente, fomentar o debate com a sociedade no plano nacional. Nessa linha, foi realizado na Chapada Diamantina, em um dos polos cavernícolas mais expressivos do Brasil, o município de Iraquara/BA, no período de 20 a 22 de maio de 2016, o III Encontro Nordestino de Espeleologia, que foi prestigiado por 112 inscritos, dentre os quais estavam alguns dos mais importantes atores do cenário espeleológico nacional, havendo forte ~5~ III Encontro Nordestino de Espeleologia Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org O pré-congresso do III ENE foi marcado por visitas a algumas das principais cavernas da região, como Lapa Doce (abaixo), Fumaça, Pratinha e Torrinha. As atividades desenvolvidas procuraram familiarizar os caverneiros com os sistemas da região e discutir perspectivas de trabalhos integrados durante o biênio 2016-2017. (Imagens de S. Almeida Netto). ~6~ representação não somente dos agrupamentos locais, mas, igualmente, de associações tradicionais como o Bambuí, de Minas Gerais, ou o Pierre Martin, de São Paulo, além de participantes individuais de vários outros estados, como Rio de Janeiro e Pará. O Encontro Nordestino é um evento realizado pela Sociedade Brasileira de Espeleologia - SBE, com a organização local de grupos voluntários, modelo que vem sendo fomentado pela SBE em todo o país. Normalmente, esse tipo de reunião é promovida nos anos em que não há Congresso Brasileiro de Espeleologia, como uma forma de congregar a comunidade e manter os vínculos regionais. No caso da edição de Iraquara 2016, destacou-se um evento que superou as expectativas, por haver atraído gente de todo o Brasil, especialmente porque a Chapada Diamantina apresenta alguns dos mais conhecidos sistemas espeleológicos brasileiros e é pesquisada por acadêmicos de todos os cantos do país. A etapa pré-congresso não recebeu muitos participantes, mas, em resumo, foi interessante para ainar o debate entre alguns vetores regionais – especialmente os baianos, sergipanos e potiguares –, e discutir as perspectivas de trabalhos ao biênio 2016-2017, com ações para o fortalecimento da Espeleologia regional. A iniciativa é importante, pois mesmo a Chapada Dia~7~ III Encontro Nordestino de Espeleologia mantina recebendo forte luxo de turistas interessados em suas grutas, a compreensão do valor desses locais pelos moradores ainda se mostra distante da realidade. Por tudo isso, faz-se necessário discutir mais a Espeleologia com a comunidade, sensibilizando a todos acerca das particularidades e fragilidades do ambiente cárstico, além de aumentar o volume dos trabalhos. A programação do III Encontro foi marcada por homenagens e palestras que, resumidamente, detalharam o que vem sendo feito na Chapada Diamantina, nos últimos 30 anos, em termos espeleológicos. A abertura do evento foi feita pela professora Maria Elina Bichuette, da Universidade Federal de São Carlos, que fez uma fala inaugural demonstrando a biodiversidade subterrânea da área. Marcaram, ainda, apresentações com a de Ezio Rubbioli, do Grupo Bambuí, que expôs de forma direta e didática, dados reunidos ao longo de décadas sobre a distribuição de cavernas na Chapada e o modo qual evoluíram os mapeamentos dos condutos. Outros pesquisadores, como Murilo Valle e Fernando Laureano, também contribuíram aos debates. Oriundos de instituições de pesquisa da região, os professores Ricardo Fraga, Christiane Ramos Donato e Carlos Etchevarne também izeram ricas apresentações. ~8~ Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org A programação do III ENE procurou valorizar o conhecimento espeleológico sobre a região da Chapada Diamantina. Na abertura, houve a apresentação de grupos culturais locais (alto, à esquerda), favorecendo a integração dos inscritos praticantes da Espeleologia com a comunidade, através do envolvimento dos voluntários nos trabalhos do evento. Marcou o ENE a divulgação do trabalho do professor Carlos Etchevarne, com a entrega de livros sobre a arqueologia da região (abaixo, à direita). (Imagens de S. Almeida Netto). ~9~ III Encontro Nordestino de Espeleologia Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org A palestra inaugural do III ENE foi feita pela professora Maria Elina Bichuette, que há décadas pesquisa a Biologia Subterrânea da Chapada Diamantina (alto, à esquerda). Na sequência, o professor Carlos Etchevarne fez uma exposição sobre a Arqueologia da região (alto, à direta). Também apresentaram valiosas informações sobre a diversidade espeleológica os acadêmicos Murilo Valle (abaixo, à esquerda) e Christiane Ramos Donato (abaixo, à direita). (Imagens de S. Almeida Netto). ~ 10 ~ A diversidade dos palestrantes contemplou desde acadêmicos com longa história de pesquisa ligada à Chapada Diamantina, como Ricardo Fraga (alto, à esquerda) e Fernando Laureano (abaixo, à esquerda), até a fala de Ezio Rubbioli, que fez uma exposição sobre mais de três décadas de atuação dos grupos espeleológicos na região (alto, à direita). Marcelo Rasteiro, presidente da SBE, destacou a importância das cavernas à conservação ambiental (abaixo, à direita). (Imagens de S. Almeida Netto). ~ 11 ~ III Encontro Nordestino de Espeleologia Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org O encontro de Iraquara, cujo tema foi “Turismo e Paisagens Cársticas” contribuiu de forma inquestionável não somente para reunir a comunidade espeleológica, mas foi de suma importância para agregar instituições e pessoas fundamentais ao aproveitamento sustentável das cavernas, possibilitando parear discussões entre os ambientalistas, o Ministério Público da Bahia, os cientistas nacionais e a classe empresarial, que, há décadas, remodelou a economia da região, alçando o turismo ao forte componente econômico local. Pensado como um evento para celebrar amizades e parcerias, a missão extrapolou as barreiras do Nordeste e catalisou novas possibilidades de trabalhos e de discussões às melhores formas de proveito do grande patrimônio espeleológico que há na Chapada Diamantina. Um dos principais resultados diretos e concretos do encontro, foi a formação de um grupo de trabalho que desenvolverá ações, já a partir do segundo semestre de 2016, na região. São esperadas, dessas atividades, a integração de grupos espeleológicos de várias partes do país, retiicação de bases de dados, prospecção de novas áreas, com o incremento do conhecimento sobre as cavernas da Chapada, além da produção de mais pesquisa cientíica, já que há acadêmicos de vários centros universitários engajados na iniciativa. ~ 12 ~ A última manifestação do evento foi marcante, por ter sido feita pela representante do Ministério Público da Bahia, órgão que, nos últimos anos, vem acompanhando de perto a observância da legislação ambiental, para manutenção do equilíbrio ambiental da Chapada Diamantina. As considerações foram feitas pela Promotora de Justiça Luciana Khoury, que traçou um panorama geral da legislação ambiental e demonstrou como a atuação das autoridades do Ministério Público estão sendo pautadas pela lei. Oportunidades desse tipo são alto valor para alinhar os interesses de vários vetores da sociedade, como ambientalistas, empresários e autoridades. (Imagem de S. Almeida Netto). ~ 13 ~ Biologia Subterrânea Potiguar Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Biologia Subterrânea Potiguar: Uma análise do que se sabe até hoje Texto Jan Pierre Martins de Araújo Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas Sociedade Nordestina de Espeleologia Gustavo Henrique Nunes Basílio Sociedade Nordestina de Espeleologia Marcelo Augusto de Freitas Kramer Sociedade Nordestina de Espeleologia East Tennessee State University Alyne de Oliveira Amorim Sociedade Nordestina de Espeleologia Fotos Solon R. Almeida Netto Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas Sociedade Nordestina de Espeleologia As pesquisas envolvendo a biota do meio cavernícola ainda têm muito a descobrir nas grutas do Rio Grande do Norte. Ao lado, concentrações de raízes servem de abrigo a centenas de seres milimétricos, no interior da gruta dos Crotes, em Felipe Guerra/RN. ~ 14 ~ E m termos quantitativos ou número de registros, o Rio Grande do Norte compreende o quarto maior patrimônio espeleológico do Brasil, icando atrás apenas dos estados de Minas Gerais, do Pará e da Bahia. A descoberta desse vasto patrimônio deve-se, primeiramente, aos grupos de Espeleologia, que desde o século passado vêm investindo tempo e recursos na exploração das cavernas potiguares. Em segundo (e não menos importante), ao Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas - CECAV, que através de sua base de pesquisa avançada, contribuiu signiicativamente para o avanço do conhecimento espeleológico na região. No entanto, se existiu um expressivo volume de trabalhos amparando o conhecimento abiótico do meio, inversamente, muito pouco se fez para compreender as dinâmicas ecológicas desses ambientes, podendo-se dizer que apenas uma pequena fração de todo o esforço voltado à prospecção e topograia foi direcionada à biologia subterrânea. ~ 15 ~ Biologia Subterrânea Potiguar Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Aranhas são alguns dos animais mais comuns nas cavernas, sendo essenciais ao equilíbrio ecológico do meio. A maioria delas não oferece risco ao ser humano, como a espécie vista na imagem, Mesabolivar sp (Araneae: Polcidae), com sua ooteca, a estrutura que abriga os ovos em estado de maturação. ~ 16 ~ Em termos gerais, os estudos sobre a biota cavernícola brasileira só avançaram a partir da década de 1980, com pesquisas na Bahia, em São Paulo, Minas Gerais, Goiás, no Paraná, Mato Grosso e, de modo menos intenso, no Ceará. No Rio Grande do Norte, a temática é muito recente, se comparada a outras regiões, havendo sido inaugurada por um relatório técnico feito pelo CECAV (quando ainda integrava o IBAMA), apresentando o título: “Relatório de levantamento da fauna de invertebrados e caracterização bioespeleológica no carste de Felipe Guerra - RN”, feito por Silva (2006). Posteriormente, Kramer (2008a) fez uma avaliação da biota endocárstica do Lajedo do Rosário, em Felipe Guerra, intitulada “Bioespeleologia no Lajedo do Rosário”, sendo o resultado de uma expedição da Sociedade Espeleológica Potiguar – SEP. No mesmo ano, ainda em expedição com a SEP, abordou, de forma simplória, os aspectos faunísticos da gruta da Caridade, uma das mais importantes feições cársticas do estado (Kramer, 2008b). O autor também realizou uma análise da composição ilogenética de comunidades de “arqueas” no solo da caverna (Kramer, 2009). Dois anos depois, Ferreira et al., (2010) realizaram o, até então, mais abrangente estudo sobre a biota cavernícola do estado, “Fauna subterrânea do estado do Rio Grande do Norte: carac~ 17 ~ Biologia Subterrânea Potiguar Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Espécies de amblipígios são comuns nas cavernas do oeste do Rio Grande do Norte. Destacam-se duas: Trichodamon sp (Amblypygi: Phrynichidae) (acima, à esquerda) e Charinus sp (Amblypygi: Charinidae) (acima, à direita). Também são comuns Opiliones (centro, à esquerda). Eventualmente, podem ser vistos roedores, Monodelphis sp (Didelphirmophia: Didelphidae) (centro, à direita). Dentre as serpentes, é comum a Bothrops sp (Squamata: Viperidae) (abaixo, à esquerda). Em algumas cavernas, pelas particularidades do meio hipógeo, podem ser vistos animais com traços de troglomorismo, (Zygentoma: Nicoletiidae) (abaixo, à direita). ~ 18 ~ ~ 19 ~ Biologia Subterrânea Potiguar Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org terização e impactos”, sendo esse trabalho compreendido por um levantamento das características biológicas, tróicas, físicas e de uso antrópico de 17 cavernas nos municípios de Apodi, Felipe Guerra, Baraúna, Pedra Grande, Jucurutu, Martins, Jandaíra e Governador Dix-Sept Rosado, abrangendo as quatro províncias espeleológicas do estado. Após, Bento (2011), em Dissertação de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas da Universidade Federal do RN, abordou a diversidade de invertebrados em cavernas calcárias do oeste potiguar e determinou áreas prioritárias para a conservação do patrimônio espeleológico do RN e do Bioma Caatinga. A pesquisa inventariou 40 grutas nos municípios de Apodi, Mossoró, Baraúna, Governador Dix-Sept Rosado e Felipe Guerra. Mesmo com tal pequeno volume de pesquisas, vieram as primeiras descobertas: Vasconcelos e colaboradores (2013) identiicaram uma nova espécie ao gênero Charinus, o Charinus potiguara, um Amblypygi da família Charinidae que ocorre em cavernas no oeste do Rio Grande do Norte. Analisando esse conjunto, desde os levantamentos de fauna que objetivam entender as dinâmicas ecológicas dos ambientes subterrâneos, até as publicações sobre os achados de novas espécies, esses estudos possuem o mesmo elo: o conhecimento ~ 20 ~ Normalmente, zonas de entrada e folhiços carreados à penumbra escondem muitos seres como aranhas (Araneae: Nemesiidae) (no alto, à esquerda), Olios sp (Araneae: Sparassidae) (no alto, à direita) e (Araneae: Ctenidae) (abaixo, à direita). Já os escorpiões, podem ser encontrados caçando por múltiplos tipos de ambientes das grutas, como o Tityus sp (Scorpiones: Buthidae) (abaixo, à esquerda). ~ 21 ~ Biologia Subterrânea Potiguar Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org sobre a biota e suas interações com meio cavernícola é incipiente e que, ainda mais, o desconhecido patrimônio espeleológico do Rio Grande do Norte impõe a conservação do ambiente cárstico. Nessa linha, amparados em dados semelhantes, Bento et al. (2015) propuseram em seu trabalho a criação de unidade de conservação denominada “APA Pedra de Abelha”, na maior concentração de cavernas do estado. Ainda há vasto caminho a ser percorrido à conservação do patrimônio potiguar. Se comparado a outros estados brasileiros, o RN está atrasado em conhecimento sobre a vida do meio hipógeo. Na verdade, pode-se dizer que a carência de estudos nas cavernas do Nordeste brasileiro é muito alta e, concomitantemente, o Bioma Caatinga segue sendo um dos menos conhecidos. Hoje, grupos como a Sociedade Espeleológica Potiguar, fomentam a pesquisa e disseminação dos conhecimentos sobre as grutas da região. Além disso, outras instituições, como a Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, Universidade Federal de Lavras – UFLA, Universidade Federal de Sergipe – UFS e o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas – CECAV/ICMBio têm desempenhado importante papel para o conhecimento e a conservação das cavernas do Rio Grande do Norte e de todo o Nordeste. ~ 22 ~ A MICROBIOTA POTIGUAR Nem sempre a biodiversidade dos ambientes cavernícolas é evidente. Vários animais apresentam tamanho tão diminuto, que é preciso paciência e disciplina dos pesquisadores (à esquerda) para visualizá-los, como ocorre com o Pseudoescorpiones, que mede menos de 1,5mm de comprimento (à direita). ~ 23 ~ Trabalhos sobre a micobiota cavernícola são limitados, especialmente no Rio Grande do Norte, o que torna importante a realização de pesquisas sobre microbiologia subterrânea para avaliar como se inserem esses microrganismos na manutenção do ecossistema cavernícola. Taylor et al., 2009 realizaram um trabalho pioneiro relacionado à micobiota cavernícola potiguar, o qual se intitula “ Levantamento e distribuição mínima de fungos ilamentosos em cavernas da caatinga brasileira”, em que onde os gêneros Aspergillus e Penicillium apresentaram melhor distribuição nas cavernas amostradas: gruta da Rainha (Felipe Guerra, RN), Furna Feia (Baraúnas, RN), Labirinto do Angico (Governador Dix-sept Rosado, RN), gruta do Guano (Pedra Grande, RN) e Casa de Pedra (Jucurutu, RN). Dias et al., 2007 objetivaram isolar e caracterizar bactérias em cavernas da caatinga brasileira, conseguindo isolar 10 espécies do gênero Staphylococcus e 1 espécie do gênero Corynebacterium na Gruta Rainha, em Felipe Guerra/RN e 3 espécies Corynebacterium, na Furna Feia, em Baraúnas/RN. Destaca-se que a presença de microrganismos com potencial patogênico nessas grutas demanda atenção e necessidade de estudos, visto que esses ambientes são constantemente visitados por pesquisadores e turistas. Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Luzes do Carbureto: Antigas lanternas da América do Norte Texto e fotos Solon R. Almeida Netto Grupo Bambuí de Pesquisas Espeleológicas Sociedade Nordestina de Espeleologia T Lanterna Wolf, fabricada entre 19201930, nos Estados Unidos, um período em que o gás acetileno era a forma mais viável de produzir luz em pequenas lanternas (ao lado). Acima, desenho da década de 1920 reproduzindo a Wolf (original em Thorpe, 2006). ~ 24 ~ alvez seja difícil a alguém nascido em meio à modernidade do séc. XXI compreender como o homem dependeu do fogo, até bem pouco tempo, para algo tão simples quanto gerar luz. Em um mundo feito de LEDs, imaginar que a chama amarela representou, há apenas cem anos, uma solução soisticada para iluminar, ilustra a dimensão da distância tecnológica percorrida pela humanidade no curto intervalo de tempo das últimas décadas. Na verdade, o ciclo que transformou a sociedade no modelo atual, o período chamado de Revolução Industrial, trouxe inovações, em meados do séc. XVIII, a várias áreas, mas não houve, por muito tempo, uma reposta eiciente para problemas simples, como a iluminação das cidades ou equipamentos capazes de substituir os milenares candeeiros ou velas. Mesmo os avanços com a energia elétrica, não trouxeram, de imediato uma solução, pois fatores como o custo da eletricidade ou a autonomia das baterias demoraram a ser superados. ~ 25 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Tudo isso é muito importante para se compreender que a ideia “lanterna”, concebida como o equipamento atual, é algo relativamente novo. Em termos históricos, a lanterna – ou a lâmpada – representa o instrumento que dava suporte à queima para gerar luminosidade. Mas essa necessidade tão simples, ainda estava, por volta de 1850, intimamente dependente do óleo ou da vela, mesmo em um mundo que precisava de muita luz para trabalhadores ou faróis de máquinas. Para se compreender melhor aquele momento histórico, é muito interessante constatar que, nos Estados Unidos, toda a mineração subterrânea se praticava com um rudimentar tipo de lamparina de pavio, chamado de “oil-wick lamp”, que nada mais era do que pequeno bule, pelo qual a estopa lubriicada gerava uma chama fraca, cheia de fuligem e fumaça preta. Porém, esse mundo estava em transformação. Em 1836, o químico britânico Edmund Davy alardeou a descoberta de um gás chamado acetileno. O acetileno tinha várias utilidades, mas se destacava pela capacidade de produzir uma luz muito brilhosa e de queima bem mais limpa, quando comparada à chama fumacenta do pavio de óleo. O problema estava em como armazenar esse gás. Seguiu-se, então, em 1892, os anúncios independentes do canadense Thomas Willson e do francês Henri Moisan ~ 26 ~ As pequenas lamparinas em formato de bule, conhecidas como “oil-wick lamp”, eram equipamentos muito rudimentares e havia centenas de modelos e fabricantes praticamente artesanais. Quando o carbureto surgiu, por volta de 1900, ainda conviveu durante cerca de 10 anos com esse tipo de lanterna a óleo. Porém, por volta de 1910, os fabricantes mais conhecidos, como a Grier Bros. Co., encerraram sua linha de produção, abandonando as tradicionais pequenas lamparinas de pavio (imagem abaixo). A mineração norte-americana, no início do séc. XX, era um ambiente muito insalubre. Homens, crianças e animais dividiam espaços nas galerias e galpões de beneiciamento. A ausência de regras de proteção ao trabalhador ou que impedissem a contratação de mão-de-obra infantil criava situações desumanas (imagens ao lado). Não existiam equipamentos adequados de iluminação e os acidentes fatais eram comuns. O desenvolvimento de novas tecnologias e normas introduziu grandes mudanças nesse cenário. Oil-wick lamp modelo conhecido como "Star", fabricada em aço, na segunda metade do séc. XIX, pela Grier Bros. Co., uma empresa que iniciou suas atividades em 1839, na cidade de Pittsburgh, e se tornou uma das principais produtoras de lanternas de pavio, nos EUA, por volta de 1880. Fonte: Library of Congress/USA ~ 27 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org de um método economicamente viável de fabricar o carboneto de cálcio, uma substância que, quando em contato com a água, espontaneamente liberava o acetileno. Esse processo industrial para fabricação do carbureto, como icou comercialmente conhecido o carboneto, representou, no inal do séc. XIX, o grande salto tecnológico capaz de dar suporte para que as lamparinas de pavio fossem substituídas, na América do Norte, pelas revolucionárias “carbide lamps”, as lanternas de carbureto. No início do séc. XX, houve, então, uma grande disputa entre muitos inventores, cada um alardeando um proveito melhor ou mais inovador ao carbureto. No começo, eles se voltaram a desenvolver soluções de iluminação para bicicletas, sendo que, tão logo se consolidou um sistema padrão às lanternas, pelo qual um reservatório superior com água abastecia um tanque inferior com carbureto, logo se percebeu que, com pequenas modiicações, esses equipamentos poderiam ser adaptados à mineração. Os trabalhadores da mineração representavam um grande mercado em potencial aos fabricantes das novas lanternas, pois os Estados Unidos dependiam do carvão mineral como principal fonte de energia. Assim, havia milhões de mineiros cavando em galerias escuras e a “oil-wick lamp”, durante a primeira década do séc. XX, foi ~ 28 ~ As pequenas lanternas foram projetadas, especialmente, para uso nos bonés de lona ou capacetes de couro e se tornaram muito populares, entre os mineiros, na primeira metade do séc. XX, nos Estados Unidos, graças à chama luminosa e ao baixo custo de manutenção (imagens ao lado). Havia também modelos maiores, para usar ixados ou apoiados - as "hand lamps" -, como o clássico da década de 1930 do fabricante Dewar Mfg. Co. (página anterior). ~ 29 ~ Fonte: Library of Congress/USA Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org superada pela eiciência da “carbide lamp”. Até a década de 1920, já havia mais de duas dezenas de manufaturas das lâmpadas de carbureto, destacando-se marcas como a Baldwin, Simmons, Guy´s Dropper, Auto-Lite, Dewar ou Justrite, que, basicamente, foram as grandes responsáveis pelo desenvolvimento de soluções para melhorar os mecanismos das lanternas e consolidar comercialmente o acetileno nos EUA. Analisando historicamente essas lanternas, percebe-se que foram feitas centenas de modelos diferentes. Contudo, basicamente, existem três tipos de equipamentos, que podem ser agrupados como: a “cap lamp”, como eram conhecidas as lanternas para ixação por ganchos e presilhas em chapéus ou capacetes; a “hand lamp”, também chamada como lâmpadas de superintendente ou inspetores das minas e que eram carregadas por alças; e, por im, o “acetylene generator”, um tipo peculiar no qual o reator era preso na cintura, atado ao cinto, sendo o gás levado ao queimador, ixado na altura da testa, por uma mangueira de borracha. Esse último tipo de lanterna tinha maior autonomia e era muito usado por caçadores, pescadores ou pessoas que desejavam praticar atividades ao ar livre. A importância de todas essas lanternas à Espeleologia é vital. A evolução dos mecanismos como gotejadores, reletores, ~ 30 ~ As lanternas de carbureto eram robustas e coniáveis. Usualmente, eram feitas de bronze ou latão, havendo também os modelos niquelados. Ao lado, uma Auto-Lite de 1930. Na página anterior, uma clássica Simmons Baldwin de 1910. ~ 31 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org As pequenas lanternas de carbureto podiam ter reletores de vários formatos e tamanhos. As funções eram diversas: impedir o vento, proteger de pingos, além de, evidentemente, concentrar ou abrir o foco. Conforme o uso, os reletores podiam ser soltos, rosqueados e substituídos, tornando as lanternas muito versáteis. Na imagem, duas lanternas Justrite, amplamente usadas na Espeleologia nos EUA no século passado. ~ 32 ~ bicos de gás, iltros de feltro ou mesmo acendedores de fagulha permitiu que equipamentos simples, resistentes, coniáveis, de baixo custo de manutenção e com expressiva autonomia, liberassem as mãos dos exploradores, pois estando a luminosa chama presa ao capacete ou boné, havia plena liberdade de movimentos. Após 1930, as pessoas começaram a testar as lanternas da mineração nas explorações de cavernas. Essa atividade ainda era tímida, na América do Norte, mas, após a Segunda Guerra Mundial, a Espeleologia norte-americana organizou-se e os bonés ou capacetes (de ibra ou alumínio) com as pequenas lanternas passaram a ser o equipamento padrão de um caverneiro nos Estados Unidos. Esse tipo de acessório passou a ser difundido pela National Speleological Society - NSS, a entidade nacional, como o modelo de iluminação a ser usado nas expedições em todo o país. A NSS criou uma seção especíica para reunir informações sobre esse tipo de lanterna e seus associados começaram a buscar equipamentos usados, especialmente quando os últimos fabricantes foram, gradativamente, encerrando a manufatura da “carbide lamp”. Desse modo, mesmo após a consolidação das lanternas elétricas, na segunda metade do séc. XX, a “carbide lamp” não caiu em desuso na América do Norte. Na ~ 33 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org O início da Espeleologia nos Estados Unidos, após os anos 1930, foi basicamente feito com a “carbide cap lamp”. A entidade nacional, a National Speleological Society - NSS, incentivou o uso desse tipo equipamento, por várias décadas. Ao contrário dos europeus, acostumados aos geradores ixados aos cintos, os norte-americanos adaptaram as pequenas lanternas da mineração, usando-as presas à cabeça, como os mineradores, por mais de meio século. Fonte: Clemmer, 1987/NSS. ~ 34 ~ verdade, as funções acessórias da lanterna de carbureto, como produzir calor na grutas frias e marcar bases topográicas com fuligem, ou ainda as características como baixo custo de manutenção e resistência, izeram desse equipamento o mais popular para iluminação em cavernas até a virada do séc. XXI. Uma lanterna de carbureto aguentava pancadas, mergulhos e, quando entupia, podia ser facilmente reparada por um explorador habilidoso (até mesmo no escuro total!). Assim, o frágil bulbo das lâmpadas elétricas não era concorrência. As manufaturas norte-americanas, porém, não resistiram tanto tempo. Com o desenvolvimento dos sistemas elétricos e das baterias, o carbureto começou a ser gradativamente substituído na mineração a partir da década de 1930. Séries de explosões em minas de carvão, pelo contato do fogo com bolsões de gases, incentivaram a edição de uma rígida legislação restritiva. Em 1950, apenas a Wolf, a Universal e a Justrite Mfg. Co., ainda sobreviviam no mercado, sendo que a última Justrite feita em corpo metálico foi fabricada na década de 1970. O legado, desses equipamentos à Espeleologia, porém, é inimaginável. E talvez, exatamente por isso, mesmo ao im da Era do Carbureto, ainda haja tantos entusiastas, em todas as partes do mundo, limpando e polindo suas velhas carbureteiras. ~ 35 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Simmons Baldwin Fabricada entre 1910-1913 O norte-americano Frederic Baldwin é considerado o principal desenvolvedor de lanternas de carbureto do início do séc. XX. Suas invenções dominaram o mercado até 1912. O modelo clássico era um equipamento pequeno, equipado com um gotejador de agulha (“needle valve”), que à época não oferecia uma solução perfeita ao controle do luxo de água que entrava em contato com o carbureto. Simmons Pioneer Fabricada entre 1917-1919 Frederic Baldwin e John Simmons romperam sua sociedade por volta de 1913. Simmons introduziu nas lanternas uma nova marca (o Diamante-S) e os modelos se tornaram mais arredondados, sendo conhecidas como Pioneer. A manufatura encerrou suas atividades por volta 1919 e seu know-how foi incorporado por outro fabricante, a Dewar, que adquiriu os estoques e continuou a evoluir os sistemas dos gotejadores. Lu-Mi-Num Fabricada entre 1922-1933 A lanterna de Fred Belt representou uma quebra do paradigma do design, ao introduzir no mercado uma lâmpada feita de liga de alumínio fundido, com caneluras para irradiar o calor e particularidades, como muitas partes parafusadas e o encaixe do reservatório sem rosca. ~ 36 ~ Grier Reservatório Horizontal Fabricada entre 1918-1919 A Grier Bros. Co. durante o século XIX, representou uma das mais tradicionais fabricantes de luzes para mineração, sendo famosa por sua “oil-wick cap lamp”. Posteriormente, com o advento do carbureto, entrou nesse mercado por volta de 1910. Como a Justrite, comercializou modelos com tanque de água horizontal. Em 1924, a GEM Mfg. Co. adquiriu a empresa. Dewar Sun Ray Fabricada entre 1920-1930 A linha Sun Ray representou um forte apuro estético da manufatura Dewar. O fabricante icou famoso não somente pelas soluções para otimizar a eiciência de seus gotejadores, mas também pelo apelo do design soisticado. Nessa lanterna, destaca-se o reletor de alumínio chamado “Ha-Mer-It”, uma peça única com apoio radial, mas que não fez tanto sucesso nas vendas. Ashmead Buddy III Fabricada entre 1928-1933 O fabricante Ashmead Mfg, Co. produziu as lanternas Elkhorn e Buddy, havendo iniciado sua produção por volta da I Guerra Mundial, especialmente a partir dos projetos incorporados de outros desenvolvedores, como Meyer e Philip Stein. A Buddy III apresentou um exclusivo sistema de controle do luxo de água à válvula de regulagem, patenteado pelo fabricante. ~ 37 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Dewar ITP Fabricada entre 1920-1930 A marca ITP é uma abreviação para “It´s Trouble Prof ” (À Prova de Problemas) e foi desenvolvida pela Dewar Mfg. Co., a partir de um modelo que incorporou a linha de produção da extinta Simmons. Essa lanterna usava um sistema conhecido como “Float Feed”, pelo qual, a expansão do carbureto molhado fechava o luxo da água empurrando um disco (ou mola) na haste de gotejamento, uma grande inovação, naquela época. Auto-Lite Set-Screw Fabricada entre 1917-1920 A Auto-Lite é uma das marcas comercialmente mais bem-sucedidas da história mundial de lanternas de carbureto. Seu modelo mudou pouco ao longo dos anos e o sucesso da manufatura Universal Lamp Co. não é devido a grandes inovações, mas ao tino comercial do seu proprietário, Jacob Sherman. O modelo com o reletor parafusado representa as linhas de produção mais antigas. Auto-Lite hree Lines Fabricada entre 1930-1935 A referência “hree Line” é a forma como esse modelo da Auto-Lite icou conhecido por colecionadores, pelas três linhas de inscrições gravadas no topo. É um equipamento clássico, grande sucesso de vendas e que, muitas décadas após, continuou sendo usado na Espeleologia como uma das melhores lanternas para cavernas nos EUA. ~ 38 ~ Guy´s Dropper Seis Datas Fabricada entre 1926-1932 As inovações da Guy´s Dropper revolucionaram as lanternas de carbureto pelo sistema de gotejamento que impedia obstruções, mantendo a estabilidade da chama. Esse gotejador foi, basicamente, um grande divisor de águas na indústria, tornando a Shanklin Mfg. Co. uma das manufaturas mais populares nos EUA, durante a primeira metade do século XX. Justrite Tanque Horizontal Financista Fabricada entre 1923-1929 A Justrite Mfg. Co. representa uma das mais interessantes indústrias de lanternas de carbureto, pela enorme diversidade de modelos que lançou. O mais famoso, desenvolvido por Augie Hansen, é chamado de “tanque horizontal” e aproveitou a parede côncava do reservatório de água como reletor. O estilo “inancista” é assim chamado pelo tipo que gravou a marca na lateral do tanque. Justrite Streamlined Fabricada entre 1940-1970 Em 1938, a Justrite Mfg. Co. já havia mudado seu clássico projetista para um novo desenvolvedor, chamado Charles Packer, que modiicou a linha de produção para um padrão que icou conhecido como “Streamlined”. Essas lanternas foram produzidas até 1970, quando foram substituídas por modelos de policarbonato. A Streamlined foi um equipamento amplamente usado na Espeleologia norte-americana no período de 1950 a 1980. ~ 39 ~ Luzes do Carbureto Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org LIÇÕES E CONSELHOS DE UM MUNDO DE CARBURETO feitas de plástico, mas que se mostraram problemáticas, e muita gente resolveu voltar aos modelos antigos. A coniabilidade desse novo equipamento, assim, ainda é duvidosa. Atualmente, apenas dois modelos de bronze ainda são feitos: a britânica 'Premier' e a japonesa 'Butterly', também chamada de 'Safesport'. Dessas, a Premier é a melhor, pois a asiática é mais ina e racha facilmente. Entretanto, as melhores lanternas de carbureto são as antigas, que "Muitos formatos e estilos de lanternas de podem ser encontradas em lojas de antiguidades, brechós ou nas ‘garages sales’. Elas carbureto foram feitos desde 1900. Elas foram originariamente usadas pelos minei- podem ser facilmente restauradas e usadas. Se for possível, procure uma lanterna com ros ou nas atividades da mineração, mas, um gancho tipo pá ou lâmina (blade hook). a partir da década de 1940, tornaram-se Elas são mais fortes e se adaptam melhor a primeira opção para iluminação dos aos capacetes”. (Tradução livre de trecho exploradores de cavernas. Várias emprede THOMSON, K. C.; MARTIN, R. L. An sas manufaturaram lanternas de bronze, Introduction to Caving: A guide for Begincomo a Baldwin, Victor, Guy´s Dropper, Autolight e Justrite. De todas essas, a única ners. Quarterly Journal of the Missouri que ainda continua produzindo é a Justrite. Speleological Survey, Inc., Rolla, v. 20, Em 1973, a Justrite mudou para lanternas n.1-2, p. 11, jan. 1980.) No início de 1980, os manuais de Espeleologia nos Estados Unidos ainda referenciavam as "carbide cap lamps" como sendo o equipamento mais coniável e a preferência natural à iluminação na exploração de cavernas. O trecho a seguir foi extraído da publicação do "Missouri Speleology Survey, Inc.", um agrupamento regional que reunia, à época, quase 15 grupos espeleológicos daquela região: Publicações do início da década de 1980 listavam as pequenas carbureteiras criadas no início do séc. XX como o equipamento de iluminação mais coniável e acessível à Espeleologia nos EUA. Nas imagens, alguns exemplos desse tipo de registro. ~ 40 ~ ~ 41 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Ambientes Cársticos em Sergipe: Delimitação e levantamento geoespeleológico Por Heleno dos Santos Macedo Universidade Federal de Sergipe - PPGEO/UFS Sociedade Nordestina de Espelologia David Carvalho Cardoso da Silva Sociedade Nordestina de Espelologia Grupo Pierre Martin de Espeleologia Hélio Mário de Araújo Universidade Federal de Sergipe – DGE/UFS Rafael Moreira Sousa Sociedade Nordestina de Espelologia CENTRO DA TERRA - Grupo Espeleoelógico de SE A Caverna Casa do Caboclo (ao lado) é uma das três cavidades cadastradas no município de Japaratuba, no povoado Marrocos, na área cárstica de Taquari/Penedo. Seu desenvolvimento está associado a processos de abatimento e dissolução ocorridos no argilito arenoso da Formação Barreiras. Essa gruta é apenas um exemplo do diversiicado patrimônio espeleológico de Sergipe. (Imagem de Isaias Santos, 2013). ~ 42 ~ E m Sergipe os estudos sobre paisagens cársticas são recentes. Segundo Donato (2011), o conhecimento sobre a abrangência desse tipo de ambiente na área é desconhecido ou incipiente, quando comparado com outros estados do território nacional. De acordo com Donato, (...) pode-se situar o início do reconhecimento da morfologia cárstica em Sergipe em 1888, com as indicações de cavidades naturais feitas por Branner (1888) nos municípios de Divina Pastora (i.e., Caverna do Urubu) e Laranjeiras (i.e., Caverna da Pedra Furada). Como registros posteriores, podem ser citados a publicação do IBGE (FERREIRA, 1959) e as explorações de José Augusto Garcez na década de 1970 (PROUS, 1992) (DONATO, 2011, p. 02). Mas, segundo Donato (2011) foi a partir da década de 1990 que aumentaram os estudos de caráter paleontológico e biológico sobre esse tipo de paisagem, principalmente no tocante à presença de cavidades naturais subterrâneas. ~ 43 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Santos. D. B. et al. (2002) publicaram o primeiro trabalho sobre o carste de Sergipe, intitulado “O CAIS e a ESPELEO-SE: Registros Preliminares de Cavidades Naturais em Sergipe”, no 2° Workshop Arqueológico de Xingo, realizado na cidade de Canindé de São Francisco (Sergipe) em 2002. Em 2003, no 27° Congresso Brasileiro de Espeleologia, realizado na cidade de Januária, Minas Gerais, Santos et al. (2003) publicam um segundo trabalho sobre o tema, com o título “Aspectos Históricos e Geográicos sobre a ocorrência de Cavernas em Sergipe”. Em 2004, Araújo et al. publicaram um artigo abordando o carste sergipano, no trabalho “As inluências Paleoclimáticas na Morfologia Cárstica em Sergipe” No ano de 2012, Macedo; Araújo; Donato; et al., publicaram, no 9° Simpósio Nacional de Geomorfologia, outro trabalho sobre a temática, intitulado “Considerações sobre o Ambiente Cárstico de Sergipe”. O carste tradicional em Sergipe corresponde a 1.453,37 Km2 da área total do estado, encontrando-se estabelecidos sobre esse tipo de morfologia (totalmente ou parcialmente) 35 municípios: Areia Branca, Campo Brito, Capela, Carmópolis, Cedro de São João, Divina Pastora, Frei Paulo, General Maynard, Itaporanga d’ Ajuda, Japaratuba, Japoatã, Lagarto, Laranjeiras, Macambira, Malhada dos Bois, Malhador, Maruim, Muribeca, Nossa senhora das Dores, Nossa Senhora do Socorro, Pacatuba, Pedra Mole, Pinhão, Poço Verde, Própria, Riachuelo, Rosário do Catete, Santa Rosa de Lima, Santana do São Francisco, Santo Amaro das Brotas, São Cristóvão, São Domingos, São Francisco, Simão Dias e Siriri. Desses, nove vão concentrar a maior parte da paisagem cárstica: Laranjeiras, Maruim, Divina Pastora, Nossa Senhora do Socorro, Simão Dias, São Domingos, Macambira, Lagarto e Poço Verde, o município com o maior número de cavernas. Para a melhor caracterização da área de estudo, adotou-se a divisão proposta por Macedo (2014-2017) na construção da sua tese de doutorado para áreas cársticas de Sergipe, compartimentando o carste sergipano em três setores: setor 01, denominado Área Cárstica Taquari / Penedo; setor 02, nomeado de Área Cárstica Cotinguiba - Sapucari; e setor 03, denominado de Área Cárstica Olhos d’Água / Frei Paulo (imagem da página ao lado). ~ 44 ~ Para facilitar o diagnóstico da distribuição das cavernas em Sergipe, houve a divisão do território em três setores distintos, optando-se em utilizar o nome da unidade(es) geológica(as) predominante(es) no recorte espacial: setor 01 - Taquari/Penedo; o setor 02 - Cotinguiba - Sapucari; e setor 03 - Olhos d’Água/Frei Paulo. (Mapa: Heleno dos Santos Macedo; Hélio Mário de Araújo, 2015). ~ 45 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Setor 01: Área Cárstica Taquari / Penedo Cotinguiba, e no Grupo Piaçabuçu, a Formação Calumbi (CPRM, 1998). CaracteriÁrea que se situa na Bacia Sedimen- za-se pelos Membros Angico, Taquari, Matar Sergipe, no Grupo Igreja Nova (Forma- ruim e Sapucari, constituídos por calcário, ção Aracaré) e Grupo Coruripe (Formações dolomitos, calcarenitos, calcilutitos, calBarra de Itiúba, Muribeca, Penedo, Rio cirruditos, folhelhos e arenitos, em alguns Pitanga e Coqueiro Seco), conforme dados casos, intercamados ou em níveis isolados, da CPRM (1998). Caracteriza-se pela desendo a deposição em plataforma carboposição de calcários intercamados, arenitos nática, por leques aluviais-deltaicos ou em avermelhados, calcilutitos acastanhados, talude (Shaller, 1969 e Feijó, 1994). Esse setor corresponde a maior porção calcário avermelhado, com interlaminações do carste sergipano, com aproximadamente de dolomita e anidrita, sendo deposição 651,65 km2, ixando-se sobre esse recorte, por deltas (lacustres ou acustres) e leques os municípios de Areia Branca, Carmópolis, aluviais associados ao retrabalhamento Divina Pastora, General Maynard, Japaratueólico ou a falhamentos na borda da bacia ba (porção sul/sudoeste), Laranjeiras, Ma(Shaller, 1969 e Feijó, 1994). O setor 01 representa 292,87 km2 do lhador, Maruim, Nossa Senhora das Dores, total dessa morfologia em Sergipe. Sobre Nossa Senhora do Socorro, Riachuelo, Roessa área, encontram-se os municípios de sário do Catete, Santa Rosa de Lima, Santo Capela, Cedro de São João, Japaratuba Amaro das Brotas, São Cristóvão e Siriri. (porção noroeste), Japoatã, Malhada dos Bois, Muribeca, Neópolis, Pacatuba, PróSetor 03: Área Cárstica Olhos d’Água/ pria, Santana do São Francisco e São Fran- Frei Paulo cisco (ver imagem na primeira página). O setor 03 apresenta o carste mais deSetor 02: Área Cárstica Cotinguiba senvolvido de Sergipe, destacando-se feições Sapucari do exocarste e endocarte como lapiás, dolinas de dissolução e abatimento, poljes e caverO setor 02 está assentado sobre a nas. Encontra-se no Domínio Vaza-Barris, Bacia Sedimentar Sergipe, nos Grupos Ser- localizado no centro de Sergipe, limitando-se gipe e Piaçabuçu. Sobre o Grupo Sergipe, com o Domínio Estância através da Falha do encontram-se as Formações Riachuelo e Rio Jacaré, uma zona de cisalhamento rúp~ 46 ~ O setor 03 se caracteriza pelos Membros Angico, Taquari, Maruim e Sapucari, constituídos por calcários, dolomitos, calcarenitos, calcilutitos, calcirruditos, folhelhos e arenitos. A Caverna da Pedra Feia (na imagem), no município de Nossa Senhora das Dores, apresenta na sua constituição litológica calcário com intercalações de calcarenitos e folhelhos, na margem esquerda do rio Morcego. (Imagem de David Cardoso, 2016). ~ 47 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org til-dúctil, prolongando-se para o leste até a Bacia de Sergipe, e a oeste para trechos fora do limite do estado (CPRM, 1998). Esse domínio é constituído pelo Grupo Vaza-Barris (Formações Olhos d’água e Palestina), Grupo Simão Dias (Formações Frei Paulo e Jacaré) e o Grupo Miaba (Formações Jacoca e Ribeirópolis), além da presença dos Domos de Itabaiana e Simão Dias (op. cit., 1998). Caracteriza-se pela deposição de calcários laminados, calcário e dolomitos oolíticos, metacarbonatos (calcário e dolomito), metacarbonatos e metapelitos (com níveis de metachert), metarenitos (micáceos e metassilititos) e quartzitos, sendo a deposição em ambientes de plataforma lamosa ou rasa, com eventuais condições de ambiente de intramaré, planícies de maré com tapetes algais, ambiente marinho raso, além, de cunhas de clástico em ambiente tectônico instável e vulcanismo (Shaller, 1969 e Feijó, 1994). O setor 03, representa 508,85 km2 do total dessa morfologia em Sergipe. Sobre essa área, encontram-se os municípios de Campo do Brito, Frei Paulo, Itaporanga d’Ajuda, Lagarto, Macambira, Pedra Mole, Pinhão, Poço Verde, São Domingos e Simão Dias. O conjunto de cavidades registradas em todos esse ambientes e distribuídas em 27 municípios sergipanos indica a ocorrência de 171 pontos. Dentre outras ~ 48 ~ No mapa acima, a Toca da Raposa, cuja topograia foi elaborada durante os levantamentos realizados nos últimos anos. Os espeleólogos ativos em Sergipe vêm empreendendo esforços para mapear todas as cavernas que foram cadastradas na região através de projetos e pesquisas. (Mapa: Lucas Souza/CENTRO DA TERRA, 2015). ~ 49 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org O setor 03 apresenta o carste mais desenvolvido de Sergipe. Essa área encontra-se no Domínio Vaza-Barris, localizado na porção central do estado. Destacam-se as Formações Olhos d’Água, Frei Paulo e Jacoca. A Furna do Flecheiro (Gruta da Miaba) (na imagem), município de São Domingos, inserida na Formação Jacoca, desenvolve-se em calcários laminados, a partir de processos de dissolução e abatimento, e apresenta a maior variedade de espeleotemas em Sergipe. (Imagem de David Cardoso, 2016). ~ 50 ~ pesquisas e dados relevantes, existem 46 cavernas com mapas topográicos produzidos durante os trabalhos do Projeto PRO-Cavernas Laranjeiras (2012) e do Projeto Expedição CENTRO DA TERRA (2013 a 2015), quando também 42 novas cavidades foram registradas, sob a coordenação do espeleólogo David Cardoso, em projetos pela associação CENTRO DA TERRA - Grupo Espeleológico de Sergipe. Outra contribuição ao levantamento geoespeleológico de Sergipe, nos últimos dois anos, vem dos trabalhos de campo realizados para a construção da tese de doutorado de Heleno dos Santos Macedo, intitulada “Elaboração de Instrumentos para o planejamento e gestão ambiental de paisagens cársticas em Sergipe”. Além da proposta de delimitação do carste tradicional em Sergipe, apresentada no início desse artigo, o cadastro e a caracterização de feições do exocarste e do endocarste vem criando um novo panorama sobre o ambiente cárstico do estado. Os caminhamentos do trabalho de pesquisa foram realizados em 44 dias em campo, somando 7.013,5 quilômetros percorridos, sendo 124,77 quilômetros a pé, entre os meses de março e setembro de 2016, por David Cardoso, Heleno Macedo e Rafael Moreira, além de convidados de várias áreas como Geograia, Biologia, Turismo, Química, Pedagogia, História, Direito, e de colaboradores estudantes de cursos de graduação como Arqueologia, Geologia e Direito, havendo ainda a contribuição de moradores locais com várias indicações, o que resultou no registro de mais 61 novas cavidades. Uma observação de destaque nesse levantamento é a ocorrência de cavernas em litologias distintas do carste tradicional, como ilito, arenito, metarenito, quartzo diorito, quartzito micáceo e tufa calcária. Destacam-se no contexto dos ambientes cársticos em Sergipe, a Furna do Macedo, em Poço Verde; a Toca da Raposa, em Simão Dias (detalhe no mapa das páginas anteriores); a Caverna dos Aventureiros, em Laranjeiras; a Gruta do Rei, em Canindé de São Francisco; a Caverna da Fumaça e a Gruta do Itororó, em Lagarto; a Caverna do Urubu e a Caverna do Urubuzinho, em Divina Pastora; a Caverna da Chuva, em Rosário do Catete; a Caverna de Pedra Branca e a Gruta Pedreira da Baixa, em Maruim; a Furna do Flecheiro (Gruta da Miaba), em São Domingos; e a Caverna Casa de Pedra (Gruta da Ribeira), em Campo do Brito, como as cavidades com maior desenvolvimento horizontal. ~ 51 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org QUADRO DA DISTRIBUIÇÃO DAS CAVERNAS EM SERGIPE Município Quant. Poço Verde 34 Canindé do São Francisco 19 Simão Dias 18 Laranjeiras 17 Lagarto 13 Divina Pastora 10 Macambira 08 Nossa Senhora do Socorro 07 Rosário do Catete 06 Maruim 05 São Domingos 04 Tobias Barreto 04 Gararu 05 Itabaiana 03 Japaratuba 03 Porto da Folha 02 Riachão do Dantas 02 São Cristóvão 02 Campo do Brito 01 Canhoba 01 Capela 01 Frei Paulo 01 Indiaroba 01 Nossa Senhora das Dores 01 Pinhão 01 Ribeirópolis 01 Siriri 01 TOTAL DE CAVERNAS Há cadastradas 171 ocorrências de cavernas (tabela ao lado). O Abismo de Simão Dias (Furna do Dorinha), em Simão Dias, destaca-se pelo desnível (imagem acima). Os dados estão em processo de inserção no CNC/SBE e no CANIE/ICMBio-CECAV, já que as duas bases de dados estão desprovidas dessas informações. (Mapa: Lucas Souza/CENTRO DA TERRA, 2015). 171 ~ 52 ~ ~ 53 ~ Ambientes Cársticos em Sergipe Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org O Município de Poço Verde e o Sistema Cárstico Caraíba No início de 2016 os espeleólogos David Cardoso e Rafael Moreira haviam prospectado cavidades na área do município de Poço Verde e cadastrado 04 cavernas nesse maciço. Com o início dos trabalhos de campo para a pesquisa de doutorado do pesquisador Heleno Macedo (PPGEO/UFS), 30 novas cavernas foram identiicadas no município, sendo 30 no povoado Caraíba e 04 no povoado Saco do Camisa. Essa concentração de cavernas e de feições no povoado Caraíba recebeu o nome de Sistema Cárstico Caraíba (imagem da página seguinte). No tocante à caraterização geológica do Sistema Cárstico Caraíba, o mesmo se assenta no Grupo Vaza-Barris na Formação Olhos D’Água. Essa formação está posicionada concordantemente sobre a Formação Palestina e se caracteriza pela presença de rochas carbonáticas laminadas (calcários e dolomitos), com intercalações de metapelitos formadas em ambiente de plataforma rasa e/ou planícies de maré de idade neoproterozoica, algo entre 700 a 540 milhões de anos. As cavernas possuem tamanhos diferenciados, grande parte delas se desenvolve a partir do plano de fratura da rocha. Dentre as cavidades cadastradas nesse sistema, des- tacam-se pelos seus processos de formação, geomorfologia e espeleometria, o Abismo Poço Verde, a Furna do Macedo, a Furna dos Três Caverneiros, a Gruta do Caçador e a Furna da Gameleira. Além das cavidades, o Sistema Cárstico Caraíba ainda conta com a presença de outras morfologias típicas desse tipo de paisagem, tais como lapiás, dolinas (dissolução e abatimento) e uma planície, denominada de poljes, essa última utilizada no município, principalmente para o cultivo do milho. Portanto, o município de Poço Verde, diante desse novo fato, passa a ter uma importância singular para a proteção das cavernas no Brasil e ações devem ser tomadas no intuito da manutenção desse patrimônio natural, a partir da conscientização e valorização desse bem natural, por meio da criação de projetos educacionais, campanhas de conscientização com agricultores, mineradores que desenvolvem suas atividades nesse ambiente, tudo visando a conservação ambiental, mas especiicamente, do patrimônio espeleológico, garantindo às futuras gerações a possibilidade de conhecer os “mistérios” e o encantamento das cavernas (imagens na página seguinte). ~ 54 ~ O Sistema Cárstico Caraíba se assenta no Grupo Vaza-Barris, Formação Olhos d’Água. Essa formação está posicionada concordantemente sobre a Formação Palestina e caracteriza-se pela presença de rochas carbonáticas laminadas (calcários e dolomitos), com intercalações de metapelitos, formadas em ambiente de plataforma rasa e/ou planícies de maré de idade neoproterozoica, conforme aloramento na imagem superior. Na imagem inferior, a equipe que vem conduzindo pesquisas do levantamento geoespeleológico de Sergipe: David Cardoso (à esquerda), Rafael Moreira (centro) e Heleno Macedo (à direita). (Imagem de Heleno Macedo, 2016). ~ 55 ~ Espeleoamigos 2016 Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Espeleoamigos 2016: De Paripiranga para Campo Formoso Texto Ericson Batista de Oliveira Sociedade Espeleológica Azimute Tereza Rachel Barbosa Ribeiro e Silva Sociedade Espeleológica Azimute Fotos Leonardo Morato Duarte Universidade Federal do Oeste da Bahia Fernando Andrade Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleologia O Espeleoamigos é um evento de natureza esportiva, criado em 2012 pelo GMSE, grupo sediado em Paripiranga/BA, com a inalidade de fortalecer parcerias entre associações espeleológicas e a sociedade. A edição de 2016 foi realizada em Campo Formoso/BA, entre os dias 09 a 11 de setembro. (Imagem de Fernando Andrade). ~ 56 ~ E speleologia é uma área interdisciplinar que intercambia e interliga diversos ramos do conhecimento (Geologia, Biologia, Paleontologia, Arqueologia, etc.), pois contempla desde as pesquisas acadêmicas, até a busca de esportistas por superação de limites físicos. No V Espeleoamigos não foi diferente e essa multiplicidade de áreas e interesses enriqueceu o encontro em benefício a todos. O encontro já era uma tradição no município de Paripiranga/BA, desde 2012. A ideia surgiu da parceria entre o Grupo Mundo Subterrâneo de Espeleologia GMSE e o CENTRO DA TERRA - Grupo Espeleológico de Sergipe e, desde então, vinha sendo organizado e realizado pelo GMSE, com o objetivo principal de buscar o intercâmbio entre grupos espeleológicos. Em 2016, em sua quinta edição, pela primeira vez foi organizado fora de Paripiranga, sendo realizado pela Sociedade Espeleológica Azimute - SEA, em Campo Formoso, centro-norte baiano, região onde estão as duas maiores cavernas do Brasil, a Toca da Boa Vista e Toca da Barriguda (107 e 33 km mapeados, respectivamente), essa última, a maior caverna do Hemisfério Sul. ~ 57 ~ Espeleoamigos 2016 Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org A SEA foi fundada em 31 de março de 2014, no entanto parte do grupo já trabalhava com Espeleologia desde 2010. Atua principalmente na bacia do Rio Salitre, mas concentra as ações em Campo Formoso, devido à importância da área. A SEA tem ajudado a solidiicar a Espeleologia da região e eventos como o Espeleoamigos contribuem para fortalecer esse trabalho, especialmente por reunir gente de diversas cidades do Nordeste (Petrolina, Paripiranga, Ilhéus, Barreiras, Vitória da Conquista, Senhor do Bonim, Pindobaçu, Várzea Nova, etc). A principal atividade do V Espeleoamigos foi a ida ao Fim de Mundo, região distal da Toca da Boa Vista – chamá-la de Fim de Mundo não é mera força de expressão – para mapear de áreas inexploradas. A Toca da Boa Vista possui três entradas. A chamada entrada clássica, horizontal, e duas entradas verticais (abismos do Bode e do Sapo). O grupo adentrou por esse último, que possui um desnível aproximado de 15 metros, por volta do meio-dia do dia 10 de setembro. Pelo percurso, houve muitos tipos de obstáculos, como trechos rebaixados, passagens muito estreitas e escaladas. Além da adversidade do ambiente, o aspecto labiríntico da caverna, associado à extensão, requer atenção redobrada à sinalização. Pela exaustiva caminhada, houve pontos icônicos, como o salão Quadrado, a ~ 58 ~ Durante o Espeleoamigos, os participantes do evento puderam conhecer um pouco mais do potencial da TBV, que se destaca não somente pelos condutos labirínticos, mas também pelos conjuntos de fósseis muito preservados. Foi apresentada a dinâmica de deslocamento pelos caminhos labirínticos da gruta, através do mapa da caverna (abaixo, à esquerda), e realizados levantamentos topográicos (abaixo, à direita). (Imagens de Leonardo Morato Duarte). ~ 59 ~ Espeleoamigos 2016 Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Eventos feitos para integrar grupos de regiões distintas e pesquisadores acadêmicos são fundamentais ao desenvolvimento da atividade espeleológica. Na imagem acima, o grupo principal reunido no Espeleoamigos 2016, na comunidade de Pacuí. No detalhe central esquerdo, exploradores exaustos na saída da TBV. Nas demais imagens menores, a integração entre os participantes em momentos com a comunidade e nas atividades. (Imagens de Fernando Andrade e Leonardo Morato). ~ 60 ~ Fechadura e o salão da Lage (início do "Fim de Mundo”). Alguns, com espirito aventureiro e melhor condicionamento físico, estenderam a expedição até o salão do Morto-Vivo (nome alusivo ao estado físico de quem se aventura até ele). A saída da caverna ocorreu por volta da meia-noite e meia, pouco mais de doze horas após a entrada. Apesar da exaustão, coletivamente, houve a sensação de dever cumprido. No retorno, o grupo foi muito bem acolhido no povoado de Pacuí, onde, no dia seguinte, fez atividades nas grutas Pontes do Sumidouro, no rio Pacuí. Os intervalos entre as pontes calcárias são vestígios de uma caverna maior, hoje parcialmente abatida, por onde o rio Pacuí alargou condutos. Pesquisadores (paleontólogos, arqueólogos e microbiólogos) aproveitaram o evento para dar andamento a suas pesquisas. Na oportunidade, apresentaram-nas aos participantes, que ainda puderam colaborar com a coleta de dados em campo. Além da troca de conhecimentos e de experiências, as interações que o ambiente cavernícola possibilita ajudaram a fortalecer e criar novos laços de amizades, interligando ainda mais os espeleólogos e os aicionados. O efeito positivo em mais um ano de realização demonstra que o Espeleoamigos veio para icar no calendário espeleológico nacional. ~ 61 ~ Notas e Referências Revista Lajedos I Set. 2016 I www.espeleonordeste.org Notas e Notas e Referências Referências Ambientes Cársticos em Sergipe: Delimitação e levantamento geoespeleológico Biologia Potiguar: Uma análise de tudo que se sabe até hoje Os trabalhos indicados no texto, têm as seguintes fontes: Todas as imagens produzidas em ambiente natural, sem interferência nos animais. Animais coletados de acordo com a licença SISBIO nº 47438-2. DONATO, Christiane Ramos. Análise de impacto sobre as cavernas e seu entorno no Município de Laranjeiras, Sergipe. 2011. 198 p. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente). Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2011. MACEDO, H. S.; ARAÚJO, H. M.; DONATO, C. R. et al. Considerações sobre o Ambiente Cárstico em Sergipe. In: Anais - 9° Simpósio Nacional de Geomorfologia – SINAGEO. Rio de Janeiro, 2012. SANTOS. D. B.; OLIVEIRA, Daniela Andrade de; MENEZES, H.J.S. “O CAIS e a ESPELEO-SE: Registros Preliminares de Cavidades Naturais em Sergipe”. In: 2° Workshop Arqueológico de Xingo, 2002, Canindé de São Francisco. Anais do 2° Workshop Arqueológico de Xingo. Aracaju: SERCORE, 2002, p. 117-122. SANTOS. D. B.; MENEZES, H.J.S. “Aspectos Históricos e Geográicos sobre a ocorrência de Cavernas em Sergipe”. In: 27° Congresso Brasileiro de Espeleologia, 2003. Januária – MG. 27° CONGRESSO BRASILEIRO DE ESPELEOLOGIA –SBE, v.1, p. 248-252. SANTOS, Reginaldo Alves dos. Geologia e Recursos Minerais do Estado de Sergipe. 1ª ed.; Brasília: CPRM: Codise, 1997. Os trabalhos indicados no texto, têm as seguintes fontes: BENTO, D.M. Diversidade de invertrebrados em cavernas calcárias do oeste potiguar: subsídio para a determinação de áreas prioritárias para conservação. 2011. 160 p. Dissertação de Mestrado (Mestrado em Ciências Biológicas), Centro de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal. BENTO, D.M.; CRUZ, J.B.; FREITAS, J.I.M.; CAMPOS, U.P.. Área de proteção ambiental Pedra de Abelha: proposta para a conservação da maior concentração de cavernas do Rio Grande do Norte. In: RASTEIRO, M.A.; SALLUN FILHO, W. (Eds.) CONGRESSO BRASILEIRO DE ESPELEOLOGIA, 33, 2015. Eldorado. Anais... Campinas: SBE, 2015. p. 51-63. DIAS, M.; MAGALHÃES, K.T.; CARDOSO, P.M.; TAYLOR, E.; BATISTA, L.B.; FERREIRA, R.L. Isolamento e caracterização de bactérias de cavernas da caatinga brasileira. XVI CONGRESSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UFLA, 16, Lavras: UFLA, 2007. p. 1-5. FERREIRA, R.L.; PROUS, X; BERNARDI, L.F.O; SOUZA-SILVA, M. Fauna Subterrânea do Estado do Rio Grande do Norte: caracterização e impactos. Revista Brasileira de Espeleologia, v. 1, n. 1, 2010. p. 25-51. KRAMER, M. Bioespeleologia no Lajedo do Rosário. Lajedos, Natal, v. 1, n. 1, p. 38-43, 2008a. Luzes do Carbureto: Antigas lanternas da América do Norte Todas as imagens de peças e equipamentos foram produzidas em estúdio, em ago./set. 2016, a partir de objetos da coleção do autor. As imagens históricas de mineiros estão todas disponíveis, para ins não comerciais, no sítio eletrônico da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos da América, havendo a consulta sido feita em ago./set. 2016 (https://www.loc.gov/). Imagens históricas de explorações de cavernas pertencem à NSS e estão disponíveis na obra de CLEMMER, Greg. S. American Miners´: Carbide Lamps. Tucson: Westernlore Press, 1987. 126 p. Ademais, a pesquisa foi amparada em vários documentos adquiridos comercialmente pelo autor e, especialmente, em relatórios e instruções da NSS, além de no trabalho de THORPE, Dave. Carbide Ligth: The Last Flame in American Mines. Washington: Bergamot, 2006. 248 p., bem como no sítio eletrônico mantido pelo pesquisador Hal Post, sobre artefatos da mineração norte-americana, consultado no mesmo período (http://www.halslamppost.com/). Agradecimentos a Marcelo Augusto de Freitas Kramer, pela ajuda com a aquisição de peças históricas nos EUA, e à empresa Natal Cromo, pela restauração do material. ~ 62 ~ KRAMER, M. Biodiversidade nos conins subterrâneos da Serra da Cruz. Lajedos, Natal, v. 1, n. 3, p. 38-43, 2008b. KRAMER, A.F.M.; AGNEZ-LIMA, L.F. Evidence of ammonia oxidizing archaeal community the Gruta da Caridade, Rio Grande do Norte State, Brazil. In: WHITE, W.B (Ed). International Congresso of Speleology, 15, Kerrville. Proceedings. UIS/NSS, 2009. p.362-363. SILVA, F.J. Relatório do levantamento da fauna de invertebrados e caracterização bioespeleológica no carste de Felipe Guerra – RN. Brasília: Relatório Técnico, CECAVIBAMA. Contrato nº 2004/00033, Termo de Referência nº 109178. 2006. 27p. TAYLOR, E.L.S.; FERREIRA, R.L.; CANESTRI, G.B.; BATISTA, L.R. Levantamento e distribuição mínima de fungos ilamentosos em cavernas da caatinga brasileira. CONGRESSO LATINO-AMERICANO DE ECOLOGIA, 3, São Lourenço: SEB, 2007. p. 1-3. VASCONCELOS, A.C.O.; GIUPPONI, A.P.L.; FERREIRA, R.L. A new species of Charinus Simon, 1892 from northeastern Brazil with comments on the potential distribution of the genus in Central and South Americas (Arachnida: Amblypygi: Charinidae). Zootaxa v 3737, n.4, p. 488-500, 2013. ~ 63 ~