UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUEOLOGIA
PADRÃO DE ASSENTAMENTO EM SÍTIOS
ARQUEOLÓGICOS NA ZONA DA MATA NORTE DE
ALAGOAS E SUL DE PERNAMBUCO
CARLOS FABIANO MARQUES DE LIMA
Recife, fevereiro de 2006
CARLOS FABIANO MARQUES DE LIMA
PADRÃO DE ASSENTAMENTO EM SÍTIOS
ARQUEOLÓGICOS NA ZONA DA MATA NORTE DE
ALAGOAS E SUL DE PERNAMBUCO
Dissertação apresentada como
requisito parcial, e último, para
obtenção do título de MESTRE EM
ARQUEOLOGIA pelo Programa
de Pós-Graduação em Arqueologia
da Universidade Federal de
Pernambuco, Área de Concentração
em Arqueologia e Conservação do
Patrimônio Cultural no Norte e
Nordeste.
Orientadora: Profª. Drª. Suely Cristina
Albuquerque de Luna.
Recife, fevereiro de 2006
A Alba Fernanda e
Pedro Medeiros de
Lima.
AGRADECIMENTOS
Várias barreiras foram superadas durante minha formação acadêmica, os amigos,
fundamentais nos momentos em que pensei em desistir de meus objetivos e trilhar
outros caminhos. Em especial, gostaria de agradecer a minha orientadora Profa. Dra.
Suely Luna pelo apoio necessário para que conseguisse completar o mestrado. Meus
sinceros agradecimentos pelo chamado de volta aos estudos arqueológicos.
Gostaria de agradecer a uma amiga inestimável, Luciane, você não sabe o quanto
seu apoio foi importante nessa jornada. MUITO OBRIGADO.
Meus sinceros agradecimentos aos professores do Programa de Pós-Graduação
em Arqueologia, em especial, a Profa. Dra. Gabriela Martin e Profa. Dra. Anne-Marie
Pessis. Minhas sinceras desculpas pela demora na finalização desta dissertação.
Grato aos colegas da turma de mestrado. Um grande abraço ao amigo Leandro
um jovem de princípios sólidos.
Abraços, a todos os colegas do Núcleo de Estudos Arqueológicos – NEA, em
especial aos companheiros da “Equipe Cão”, Plínio, Mauro, Geyza, Daniela, Fabinho,
Manoel, Raoni, Marcos Figueiroa, Cristiano, Ricardo, mesmo estando todos espalhados
pelo Brasil o espírito desta equipe sempre manterá viva nossa amizade.
Gostaria de agradecer ao amigo Celito Kestering, por me contaminar com sua
alegria de viver. Um verdadeiro bálsamo nos momentos de incertezas.
Meus agradecimentos à aluna do curso de Arqueologia Emília Maria Almeida
Arnaldo, por sua ajuda inestimável nas analises do material cerâmico do GASALP.
Um abraço e muito obrigado ao amigo Severino Vicente da Silva pelo apoio nos
momentos difíceis e alegres de minha vida. Desculpe por não trilhar os caminhos da
História Recente.
Um beijo em meus pais Carlos Marques de Lima (em memória), SAUDADES, e
Vera Lúcia Melquiades de Lima, pelo prazer de viver.
Meu amor a minha esposa Alba que foi o lastro principal de meu retorno à
arqueologia e meu eterno norte. E por ter iluminado minha vida com Pedro Medeiros de
Lima, meu filho. Meu Eterno Amor a vocês.
RESUMO
Várias populações indígenas ocuparam a região da Zona da Mata Norte de Alagoas
e Sul de Pernambuco por séculos. As primeiras informações acerca destas populações irão
surgir com a publicação dos textos dos cronistas e religiosos do período colonial brasileiro.
Posteriormente documentos do Estado brasileiro imperial e republicano descreveram a
existência dos últimos aldeamentos naquela região destinados aos remanescentes indígenas
que ainda insistiam em preservar alguns de seus traços culturais na região.
As primeiras informações arqueológicas referentes à região de nossa pesquisa
surgiram na década de 1930, com a descrição de estruturas de sambaquis nas proximidades
das lagoas no litoral Norte de Alagoas, ocorrendo posteriormente atividades de campo
realizadas na década de 1980 nestes locais. Em 1998 foram desenvolvidas atividades de
salvamento arqueológico na área entre os municípios de Pilar – AL e Cabo de Santo
Agostinho – PE, decorrente das atividades realizadas no Projeto GASALP, resultando num
arcabouço de dados arqueológicos sobre aquela região e quê levantou a hipótese sobre o
posicionamento dos sítios arqueológicos pré-históricos como uma escolha intencional do
grupo ou grupos que ocuparam a área.
Assim, foram identificadas 53 ocorrências de vestígios arqueológicos com a
predominância de vestígios pré-históricos (cerâmica) inseridos em sítios a céu aberto e
posicionados nas áreas de topo e vertentes dos Tabuleiros Costeiros. As analises
preliminares indicam que a escolha especifica por estes locais nos Tabuleiros foi
condicionada por elementos geomorfológicos da região e por traços culturais dos grupos
indígenas que ocuparam o litoral do Nordeste do Brasil.
Observações preliminares quanto às características gerais da geomorfologia e a área
de registro das diversas ocorrências arqueológicas somada aos dados etnográficos
suscitaram-nos a elaboração de algumas hipóteses para configurar a escolha da área para o
assentamento: 1 – houve por parte dos grupos preferência pela unidade estrutural
especifica; 2 – e, a peculiaridade dos assentamentos pode levá-los a ser considerados como
aldeias de grupos agricultores ceramistas.
Palavras Chaves: Salvamento Arqueológico, Padrão de Assentamento, Sítios a céu aberto,
Arqueologia da Paisagem, Grupos Ceramistas, Pré-História do Nordeste.
ABSTRACT
Several Indian populations occupied, per centurie, North Forest of Alagoas States
and South of Pernambuco State. The first information concerning these populations
appears with the publication of the columnists’ texts and religious persons of the Brazilian
colonial period. Later documents of the imperial and republican Brazilian State described
the existence of the last Indian villages in that area destined to the Indian remainders that
still insisted on preserving some of their cultural traces in the area.
The first archeological information regarding the area of our research appeared in
the decade of 1930, with the description of sambaquis structures in the proximities of the
ponds in the North coast of Alagoas States, happening field activities later accomplished in
the decade of 1980 in these places. In 1998 activities of archeological rescue were
developed in the area among the municipal district of Pilar - AL and Cabo de Santo
Agostinho - PE, due to the activities accomplished in the Projeto GASALP, resulting in an
outline of archeological data on that area and something lifted the hypothesis on the
positioning of the prehistoric archeological ranches as an intentional choice of the group or
groups that occupied the area.
In this way, they were identified 53 occurrences of archeological tracks with the
predominance of prehistoric tracks (ceramic) inserted at ranches to open sky and
positioned in the top areas and slopes of the Coastal Boards. Preliminarie analyzes indicate
that the specifies choice for these places in the Boards was conditioned by geomorfological
elements of the area and for cultural traces of the Indian groups that occupied the coast of
the Northeast of Brazil.
Preliminary observations about the general characteristics of the geomorphology
and the area of registration of the several archeological occurrences added to the data
ethnographics raised us the elaboration of some hypotheses to configure the choice of the
area for the establishment: 1 - there was on the part of the groups preference for the
structural unit specifies; 2 - and, the peculiarity of the establishments can take them to be
considered as villages of groups farming ceramists.
Key words: Archeological rescue, Pattern of Establishment, Ranches to open sky,
Archeology of the Landscape, Groups Ceramistas, Prehistory of the Northeast.
SUMÁRIO
Pág.
Resumo
Abstract
Sumário
Lista da Introdução
Listas do Capítulo 2
Listas do Capítulo3
Listas do capítulo 4
Anexo
I
II
III
IV
IV
IV
V
VII
INTRODUÇÃO
O Projeto GASALP
01
01
CAPÍTULO 1 – FUNDAMENTOS TEÓRICOS
1.1 Introdução
1.2 História do homem e o meio ambiente
1.3 A Arqueologia e a paisagem
08
08
17
19
CAPÍTULO 2 – CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
2.1 Localização e delimitação
2.2 Aspectos geológicos e geomorfológicos
2.2.1 Aspecto do relevo
2.2.2 Rede de drenagem
2.2.3 Aspectos do clima atual
2.2.4 Aspectos da vegetação e fauna
28
28
30
34
39
41
43
CAPÍTULO 3 – OS TRABALHOS DE CAMPO
3.1 Balanço metodológico
3.2 As prospecções
3.3 Método empregado e resultados
54
54
58
61
CAPÍTULO 4 – OS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS
4.1 Etnografia indígena e história colonial
4.2 Critérios empregados na caracterização dos sítios
4.3 Condições de conservação
4.4 Aspectos morfológicos do relevo
4.5 Implantação dos sítios no relevo
4.6 A ocorrência 34
4.6.1 Análise dos fragmentos cerâmicos
4.6.1.1 Unidades cerâmicas
67
68
75
84
89
94
110
115
118
CONSIDER AÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANEXOS
129
132
141
LISTAS POR CAPÍTULOS
Introdução
Mapa:
Mapa
01:
Localização do gasoduto Alagoas – Pernambuco, Projeto
GASALP.
02
Capítulo 2
Tabela:
Tabela 01:
Estrutura do relevo.
34
Dinâmica geomorfológica da região pesquisada.
37
Formações vegetais.
45
Condições climáticas para a Zona da Mata Norte de
Alagoas.
42
Floresta Latifoliada Tropical Úmida.
Floresta Latifoliada Tropical Úmida.
Floresta Latifoliada Tropical Úmida.
Área de prospecção do Projeto GASALP, Zona da Mata
Norte de Alagoas.
46
47
48
50
Diagrama:
Diagrama 01:
Mapa:
Mapa 01:
Gráfico:
Gráfico 01:
Fotos:
Foto 01:
Foto 02:
Foto 03:
Foto 04:
Capítulo 3
Desenho:
Desenho 01:
Esboço de sambaqui.
57
Fotografia aérea dos Tabuleiros Costeiros.
60
Ocorrências.
64
Foto:
Foto 01:
Tabela:
Tabela 01:
IV
Tabela 02:
Vestígios históricos.
66
Percentuais dos tipos de sítios arqueológicos encontrados
na região.
Quantidade de vestígios arqueológicos registrados nos
sítios pré-históricos.
65
Grupos indígenas do Estado de Alagoas.
Aldeias indígenas.
Ocorrências arqueológicas que sofreram Salvamento.
Ocorrências Arqueológicas que não sofreram
Salvamento.
Categorias morfológicas do relevo da Zona da Mata
Alagoas/Pernambuco.
Porcentagem de Ocorrências em relação à morfologia do
relevo.
Posicionamento das ocorrências em metros.
Delimitação das ocorrências por Estados.
Ocorrências e a distância dos principais rios da região.
Ocorrências e a distância dos principais rios da região.
Sondagens realizadas na ocorrência 34.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e com os
residuais.
72
73
79
82
Gráfico:
Gráfico 01:
Gráfico 02:
65
Capítulo 4
Tabelas:
Tabela 01:
Tabela 02:
Tabela 03:
Tabela 04:
Tabela 05:
Tabela 06:
Tabela 07:
Tabela 08:
Tabela 09:
Tabela 10:
Tabela 11:
Tabela 12:
Tabela 13:
Tabela 14:
Tabela 15:
Tabela 16:
Tabela 17:
Tabela 18:
Tabela 19:
Tabela 20:
Tabela 21:
93
95
96
98
106
106
112
118
119
120
120
121
122
123
124
125
126
Mapas:
V
Mapa 01:
Detalhe da rede hidrográfica na área de mata atlântica, em 105
verde, nos Estados de Alagoas e Pernambuco.
Gráficos:
Gráfico 01:
Gráfico 02:
Gráfico 03:
Gráfico 04:
Gráfico 05:
Gráfico 06:
Gráfico 07:
Gráfico 08:
Gráfico 09:
Gráfico 10:
Gráfico 11:
Gráfico 12:
Gráfico 13:
Gráfico 14:
Gráfico 15:
Gráfico 16:
Gráfico 17:
Gráfico 18:
Gráfico 19:
Gráfico 20:
Dimensões das ocorrências arqueológicas do Grupo 1.
Dimensões das ocorrências arqueológicas do Grupo 2.
Freqüência das ocorrências nas unidades morfológicas do
relevo.
Porcentagem das ocorrências no relevo alagoano.
Porcentagem das ocorrências localizadas em Pernambuco
em relação a sua posição topográfica.
Porcentagem das categorias de análise dos fragmentos
cerâmicos.
Quantificação das morfologias dos fragmentos cerâmicos.
Porcentagem das morfologias do Sítio Ocorrência 34.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Quantidade de fragmentos analisados e residuais.
Porcentagem dos aditivos no Sítio Ocorrência 34.
Quantificação dos Aditivos no Sítio Ocorrência 34.
80
83
95
99
101
116
117
117
118
119
120
121
121
122
123
124
125
126
127
127
Fotos:
Foto 01:
Foto 02:
Foto 03:
Foto 04:
Foto 05:
Foto 06:
Foto 07:
Foto 08:
Foto 09:
Foto 10:
Foto 11:
Planície de inundação no quilômetro 40 do gasoduto.
Fragmento cerâmico da ocorrência 04.
Fragmento cerâmico da ocorrência 28.
Abertura de vala. Detalhe das camadas de argila da
Formação Barreiras.
Fragmentos isolados de florestas entre as plantações de
cana-de-açúcar.
Visão parcial do topo extenso dos Tabuleiros Costeiros
alagoanos. Ocorrência 12.
Formações colinares dos morros pernambucanos.
Ocorrência 51.
Terras Alagadas próximo ao Rio Jitituba – Alagoas.
km 48 do gasoduto – Município de Messias – Alagoas.
Terras elevadas dos topos e vertentes dos tabuleiros
alagoanos.
Registro de ocorrências arqueológicas nos morros
76
85
86
87
88
90
91
92
97
99
101
VI
Foto 12:
Foto 13:
Foto 14:
Foto 15:
Foto 16:
pernambucanos.
Detalhe da vala da tubulação de gás cortando a área da
ocorrência 34.
Fornilho de Cachimbo – ocorrência 34.
Fornilho de Cachimbo – ocorrência 34.
Fragmento de Tembetá – ocorrência 34.
Fragmento de Fuso – ocorrência 34.
111
113
113
114
114
Figura:
Figura 01:
Anexos
Anexo 1:
Anexo 2:
Anexo 3:
Anexo 4:
Anexo 5:
Anexo 6:
Anexo 7:
Anexo 08:
Anexo 09:
Foto 01:
Foto 02:
Foto 03:
Foto 04:
Foto 05:
Foto 06:
Anexo 10:
Anexo 11:
Fluxograma de interação entre recursos naturais e
organização social.
108
Mapa de configuração do relevo. Fonte IBGE.
Imagens de satélite do Estado de Alagoas. Detalhe em
vermelho, área da Formação Barreiras. Na imagem
ampliada, parcela da área de registro dos sítios
arqueológicos em azul. Fonte EMBRAPA.
Imagens de Satélite do Estado de Pernambuco. Detalhe
em vermelho, áreas da Formação Barreiras. Na imagem
ampliada, parcela da área de registro dos Sítios
Arqueológicos. Fonte EMBRAPA.
Mapa com as Principais Bacias Hidrográficas da Região.
Mapa com as diferenças climáticas da região da pesquisa.
Fonte IBGE.
Mapa com os diferentes biomas existentes no Brasil.
Fonte IBGE.
Mapa com a localização das aldeias indígenas no Século
XIX-139.
Mapa de distribuição das ocorrências na faixa do
gasoduto GASALP.
141
142
Realização de sondagem na ocorrência 1.
Área de implantação da ocorrência 11.
Área de implantação da ocorrência 12.
Área de implantação da ocorrência 21.
Área de implantação da ocorrência 34.
Área de implantação da ocorrência 40.
Plantas de cadastro e perfil das ocorrências 1, 11, 12, 21,
34, 40.
Planta de distribuição dos vestígios arqueológicos na
ocorrência 34.
143
144
145
146
146
148
149
150
151
152
153
154
155
156
VII
INTRODUÇÃO
O Projeto GASALP
Durante os meses de abril a dezembro de 1998, foi desenvolvido na Zona da Mata
Norte do Estado de Alagoas e Zona da Mata Sul do Estado de Pernambuco, atividades de
campo referentes a salvamento arqueológico denominado pela sigla GASALP, em
decorrência da implantação de uma linha de gasoduto projetado pela empresa estatal
Petrobrás. Com uma extensão de 204 km, o percurso de implantação da linha de gás
percorreu áreas rurais de 22 municípios dos estados acima citados. Estas áreas rurais são
exploradas de forma predominante pela atividade agrícola da monocultura da cana-deaçúcar, atividade econômica que acompanha todo o processo histórico de ocupação e
exploração da Zona da Mata nordestina por parte dos colonos europeus até nossa
contemporaneidade, apenas em áreas espaçadas observa-se exemplos da antiga
configuração da paisagem composta pela floresta tropical úmida que hoje esta restrita as
chamadas ilhas de matas ombrófilas densas ou matas secundárias.
No Estado alagoano a implantação do gasoduto se estendeu pelos municípios de
Pilar, Satuba, Rio Largo, São Luiz do Quitunde, Matriz de Camaragibe, Porto Calvo,
Messias, Flexeiras, Joaquim Gomes, Novo Lino, Jundiá e Jacuípe. Em Pernambuco, os
municípios de Água Preta, Xexéu, Barreiros, Gameleira, Rio Formoso, Serinhaém,
Ribeirão, Escada, Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho. Procuramos denominar, um a um,
os diversos municípios com o intuito de termos uma orientação prévia da localização do
gasoduto, que corresponde à parte da Zona da Mata dos dois Estados nordestinos
envolvidos no projeto.
1
2
Mapa: 01: Localização do gasoduto Alagoas - Pernambuco, Projeto GASALP.
Os trabalhos de salvamento arqueológico se tornaram efetivos, em cumprimento à
Lei 3.924/61, destinada a proteger os sítios arqueológicos, onde atividades de impacto
ambiental ponham em risco a integridade física das referidas estruturas, sendo as mesmas,
segundo texto da Constituição Federal, patrimônio da União. Em resposta a
responsabilidade da Lei, foi firmado um contrato entre a Fundação Seridó e a Petrobrás,
com o intuito de se realizar um levantamento de impacto arqueológico na área de
implantação do gasoduto, e conseqüente registro documental e de salvamento dos vestígios
culturais dos locais detectados como sítios arqueológicos. Como forma de responder a tais
objetivos foi desenvolvido o Projeto de Salvamento Arqueológico GASALP, que
durante o decorrer do ano de 1998 desenvolveu-se em três etapas: a prospecção, o
salvamento e o levantamento estratigráfico da vala.
Contudo, sendo desenvolvido como atividade de salvamento arqueológico, e
desenvolvido em circunstâncias atípicas, o cumprimento desejável de uma pesquisa em
longo prazo, dentro dessa categoria de atividade acadêmica, não foi possível. Assim, fez-se
necessário à aplicação de um ritmo especial, no tocante à metodologia aplicada em campo,
que resultou numa rápida recuperação dos vestígios arqueológicos, tendo em vista o
avanço das obras estruturais do gasoduto sobre os mesmos.
O projeto desenvolveu-se em três etapas, que já foram mencionadas de forma breve
anteriormente, conforme metodologia aplicada pela equipe de arqueólogos da Fundação
Seridó: a prospecção, com a finalidade de localizar as ocorrências arqueológicas no trecho
em questão, o salvamento das ocorrências, objetivando o resgate dos vestígios e das
informações sobre as áreas ocupadas e, o levantamento estratigráfico da vala, com o fim
de registrar a existência de vestígios em estratigrafia ao longo do gasoduto e de controlar a
coleta de material durante as obras de abertura da vala. A metodologia aplicada nos
referidos procedimentos foi implantada pelo corpo de arqueólogos da Fundação Seridó, e
está descrita no Relatório Técnico Final, apresentado à Petrobrás quando da conclusão
das atividades de salvamento arqueológico.
O procedimento de prospecção estendeu-se por 40m de largura seguindo a faixa do
duto, quando a vegetação permitia extrapolar os 20m demarcados pelo contrato firmado
entres as partes. Pois, em quase todos os locais de registro da ocorrência de vestígios,
predominando como característica maior os topos aplainados de diversas colinas, as áreas
3
de distribuição espaciais dos vestígios extrapolavam e muito o limite físico predeterminado
pela passagem da tubulação de gás. Como se pode observar da descrição do relatório:
“Os procedimentos para a realização da prospecção foram determinados
pelas condições do relevo e da cobertura vegetal. O trecho
correspondente aos primeiros 100 km, no Estado de Alagoas, é mais
acidentado. O trecho correspondente ao Estado de Pernambuco encontrase totalmente inserido no planalto rebaixado litorâneo e nas pequenas
ilhas da planície litorânea com morros pouco elevados e esporádicos. A
prospecção estendeu-se por 40m de largura seguindo a faixa do duto,
quando a vegetação permitia extrapolar os 20m demarcados. Nos trechos
de canavial alto o trabalho de prospecção foi restrito devido às
dificuldades de penetração no interior das plantações. Quando localizada
uma ocorrência, estendia-se o exame do terreno aos limites máximos de
visibilidade dos vestígios”. 1
Nas áreas planas dos trechos de mata, e onde, a plantação de cana-de-açúcar não
impunha grandes obstáculos, procedeu-se à limpeza do terreno e a abertura de quadrículas
de 1X1m abertas de 10 em 10 metros longitudinal e transversalmente à faixa do duto, até
uma profundidade de 20 cm.
2
Todas as atividades realizadas, nesse primeiro momento,
buscavam avaliar a intensidade de vestígios na área e a possível ocorrência de algum outro
tipo de estrutura. A profundidade de 20 cm atribuída às sondagens foi fruto de uma
observação recorrente, realizada pela equipe de arqueólogos, de que depois de ultrapassada
a camada antrópica da Formação Barreira, o sedimento se apresentava totalmente estéreo
em relação à possibilidade de existência de material arqueológico. Essa característica foi
registrada no topo dos Tabuleiros Costeiros, onde a equipe coordenada pelas arqueólogas
Suely Luna e Ana Nascimento enfocou as atividades de campo.
Numa segunda etapa, foram realizadas escavações e coletas superficiais, onde,
procurou-se sempre respaldar as observações levantadas durante os trabalhos de
prospecção, sendo aplicando os seguintes procedimentos para o salvamento arqueológico:
1
2
Relatório Técnico Final; Fundação Seridó, Recife, pág. 10 1999.
Idem.
4
a) procurou-se estabelecer e demarcar as áreas destinadas às sondagens e trincheiras; b)
todos os posicionamentos dos vestígios superficiais foram inseridos num desenho
topográfico de toda área das ocorrências; c) Levantamento topográfico e coleta de todos os
vestígios provenientes das escavações, finalizando com o registro fotográfico de todas as
etapas do salvamento.
Através dos pontos apresentados, propomos como objetivo específico: delinear as
características do padrão de assentamento, dentro dos limites de tempo e espaço impostos
pelo tipo de salvamento arqueológico. Criando um quadro do contexto arqueológico e
geomoforlógico, a fim de trazer uma contribuição preliminar para a compreensão da
ocupação humana no restante da área em foco.
Entretanto, o substrato de nossa analise está fundamentado especificadamente nas
ocorrências arqueológicas pré-históricas, devido à elevada incidência desses vestígios no
conjunto dos registros identificados e por fundamentarmos nossas hipóteses sobre os sítios
a céu aberto de agricultores ceramistas.
Observações preliminares quanto às características gerais da geomorfologia e a área
de registro das diversas ocorrências arqueológicas somado aos dados etnográficos
suscitaram-nos a elaboração de algumas hipóteses para configurar a escolha da área para o
assentamento: 1 – houve por parte dos grupos preferência pela unidade estrutural
específica; 2 – e, a peculiaridade dos assentamentos pode levá-los a ser considerados como
aldeias de grupos agricultores ceramistas.
Como conseguir, mesmo que, de forma macro, informações acerca de quais
categorias foram utilizadas para priorização, estas ou aquelas, configurações físicas das
zonas ocupadas. A inserção das ocorrências arqueológicas no contexto ambiental faz parte
de nosso problema de estudo. Caminho necessário, pois as características emergenciais da
atividade de campo não proporcionaram uma coleta mais detalhada e prolongada de dados,
que nos permitisse um estudo mais pormenorizado de ocorrências específicas. A
insuficiência de informações devido o caráter de salvamento é um dos principais
obstáculos da pesquisa. Sendo o tempo e o espaço físico os principais problemas de
qualquer ação de salvamento em área de implantação de extensas tubulações de gás. Tal
caráter não invalida o trabalho que pode ser o ponto de partida para novas pesquisas de
identificação de ocupações humanas na área estudada.
5
A especificidade do salvamento arqueológico realizado durante o desenvolvimento
do Projeto GASALP, é que o faz profundamente divergente dos trabalhos realizados em
áreas de surgimento de lagos de hidrelétricas a amplitude das áreas de ocupação das águas
que permite a realização de estudos arqueológicos enfocando elementos de interpretação
territorial referentes à inserção de sítio ou sítios arqueológicos, sejam eles, pré-históricos
ou históricos.
Quando buscamos conhecer as publicações que apresentam os resultados de
salvamentos arqueológicos realizados nas demais regiões do Brasil, fica claro que em sua
maioria os estudos com abordagem territorial ficaram restritos a áreas de construção de
Usinas Hidroelétricas, ou a continuação de pesquisas nas bordas dos lagos que em muitos
casos se estendem por vários quilômetros.
A possibilidade de um enfoque territorial na pesquisa aqui desenvolvida fica
prejudicada pelos limites físicos impostos em áreas de implantação de gasodutos. Quando
da contratação da Fundação Seridó para realização do salvamento arqueológico ficou
estipulado que a área de ação das equipes de arqueólogos seria restrita apenas a faixa linear
de implantação da tubulação que foi de 40 metros de largura e 209 km de extensão. A
única exceção que encontramos no relatório final quanto à extensão da área explorada foi a
informação de que quando a quantidade de vestígios arqueológicos dava inferências a uma
grande potencialidade do local, e a vegetação permitia visualização, fora ampliada em mais
20 metros o raio de prospecção e salvamento.
Assim, os sítios arqueológicos registrados estão dispostos de forma linear cortando
a zona da mata dos estados de Alagoas e Pernambuco, como referido acima, sendo restritos
a uma pequena fração da unidade geomorfológica da área que é identificada pelos
Tabuleiros Costeiros da Formação Barreiras e pelas Chãs do Planalto Litorâneo Rebaixado
(Piemontes). Veremos que as limitações físicas impostas à pesquisa deixaram de fora do
projeto áreas de extrema relevância para exploração arqueológica, como a faixa costeira
com suas lagoas e estuários flúvio-marinhos, bem como, a região de cabeceiras dos
principais rios e riachos da zona da mata norte alagoana que se encontram
predominantemente nos limites ocidentais dos Tabuleiros Costeiros.
Em função das limitações de área imposta ao trabalho procuramos enfocar nossas
observações e analises na área dos tabuleiros onde está localizada a ocorrência 34, com as
coordenadas de latitude S 8º 51’44’’ e longitude W 35º 26’40’’, nas proximidades do rio
6
Una. Procuramos com esta abordagem mais local levantar um conjunto de dados que nos
permita cria uma contextualização da área de inserção dos sítios na paisagem e a dinâmica
dessa relação que possa servir de parâmetro para estudos seqüenciais na região.
7
Capítulo 1
FUNDAMENTOS TEÓRICOS
1.1
Introdução
A preocupação em entender a organização social, cultura material e imaterial, das
populações de agricultores ceramistas americanas provocou a elaboração de diferentes
abordagens, históricas, antropológicas e arqueológicas, que tinham como objetivo
primordial, e com base em seus métodos e hipóteses, explicar a dinâmica social dessas
populações em várias esferas, nas atividades econômicas, religiosas, lúdicas, políticas, etc.
O propósito da pesquisa não ficou restrito ao período chamado científico que se
inicia no final do século XIX, mas se faz representar por diversos exploradores e
observadores fossem militares, cléricos, colonos e cientistas, tentaram contribuir com sua
visão para a melhor forma de se compreender a história, costumes e origem das populações
autóctones que habitavam o continente americano quando do novo processo de conquista
deste território a partir do século XVI.
Procuramos identificar esse processo de reconhecimento em níveis distintos, onde
as influências dos elementos ideológicos, muitas vezes inerente ao observador, foi
preponderante na construção de quatro períodos distintos que se fizeram presentes nos
diferentes olhares aplicados no momento de se tentar justificar ações de assimilação e
repressão sobre os agrupamentos humanos autóctones de forma distinta.
No primeiro momento, foram considerados descendentes do Paraíso Divino, e ditos
pela Igreja Católica como seres humanos infantis, belos e sem nenhum pecado. O segundo
momento foi marcado por influências de fatores políticos e econômicos, onde a imagem do
belo foi substituída pela idéia de elementos nocivos à prosperidade e o pleno
desenvolvimento da colônia portuguesa. Período em que se intensificaram os movimentos
de apropriação da terra e expulsão dos grupos autóctones das áreas de interesse dos
colonizadores europeus.
Os decênios finais do século XIX são marcados por um contexto de início das
pesquisas com um maior propósito científico, onde hipóteses e objetivos sofrem profundas
influências, primeiro através do período clássico da historiografia brasileira que vislumbra
nos vestígios materiais dos grupos autóctones, não mais existentes, descendências com
8
culturas clássicas do Ocidente, como os Fenícios. Neste mesmo período, os primeiros
estudos arqueológicos são iniciados no Brasil, através de botânicos, geólogos,
paleontólogos estrangeiros, mesmo que o objetivo final das pesquisas seja em sua maioria,
destinar o material coletado para o crescimento quantitativo das inúmeras coleções
museológicas.
Entretanto, mesmo nesse ambiente de simples coletas e catalogação de dados,
foram dados no inicio do século XX, os passos inicias para o desenvolvimento de novos
elementos teóricos científicos, somados ao aparato geral dos estudos pré-históricos do
Brasil. Poderíamos até nos perguntar: como um trabalho de coleta estilística pôde
favorecer ao desenvolvimento posterior de um trabalho científico? Diríamos que tal ação
levou os agentes que nela participavam ativamente, neste caso diversos pesquisadores
europeus, a entrarem em contato com artefatos materiais e orgânicos que até aquele
momento não faziam parte do conhecimento histórico brasileiro e que precisavam ser
explicados. O caráter meramente contemplativo dos vestígios e estruturas arqueológicas
cedeu espaço a questionamentos sobre origem, função e desenvolvimento técnico dos
elementos arqueológicos estudados pelos diversos pesquisadores.
No quarto estágio das pesquisas sobre a origem das populações nativas, a
compreensão sobre tais grupos no Brasil, passa pôr encara-los como homens, no sentido
universal da palavra, que em seu tempo histórico desenvolveram tecnologia e costumes
sociais próprios, que lhes permitiram estabelecer-se em toda extensão do continente
americano e nos mais diversos ambientes ecológicos existentes, desde as terras mais áridas
de países como Estados Unidos, México e Brasil, as ocupações litorâneas representadas em
parte pelos sambaquis registrados em diversos locais da costa brasileira. Não iremos
debater aqui a grande discrepância na ocorrência destas estruturas arqueológicas no
Sul/Sudeste em relação ao Nordeste/Norte, os problemas de conservação, questões
paleoclimáticas, etc. Também, não podemos deixar de mencionar o registro de vestígios
arqueológicos em dunas litorâneas do Rio Grande do Norte e a grande incidência de
material lítico no litoral do Ceará.
9
Nos casos específicos mencionados acima para o litoral nordestino algumas
pesquisas3 já foram preliminarmente realizadas e outras estão em andamento, a exemplo do
estudo das dunas em Natal realizado pelos arqueólogos da UFRN.
Outras áreas de possíveis ocupações pretéritas foram identificados na zona da mata
dos Estados de Pernambuco e Alagoas, no litoral alagoano foi identificado na primeira
metade do século XX uma estrutura sambaquieira localizada no litoral norte, próximo à
divisa com o estado de Pernambuco, na área do município de Porto Calvo, as observações
realizadas na época e o estado da estrutura arqueológica serão mais aprofundado no
terceiro capitulo.
O arqueólogo Marcos Albuquerque4 no final da década de 1980, após realizar
prospecções nas áreas de lagoas argumentou que possíveis áreas de ocupações estariam
presentes nas regiões mais elevadas dos tabuleiros. Previamente tais hipóteses foram
comprovadas com a identificação e catalogação de aproximadamente 50 ocorrência de
vestígios arqueológicos (cerâmica como elemento predominante), nas vertentes e topos dos
tabuleiros costeiros. A identificação dos tipos de ocupação, localização, inserção dos sítios
no contexto ambiental da área, os aspectos econômicos e de preservação são os objetivos
deste trabalho e serão abordados de forma mais intensiva nos capítulos seguintes.
No desenvolvimento científico percebido no quarto momento dos estudos préhistóricos dos grupos humanos habitantes do território brasileiro, as pesquisas
arqueológicas tornaram-se mais sistemáticas e com um grau maior de fundamentação
teórica, a partir da segunda metade do século XX, introduzindo novos aportes
metodológicos (ciências da terra) na busca de se compreender a vida dos primeiros
americanos.
Na região Sul e Sudeste, o ponto de convergência era buscar explicações para a
formação dos sambaquis, e de que forma os grupos ligados a tais construções dispunham
de organização social e tecnologia para efetivar seu processo adaptativo nas áreas
litorâneas.
3
SANTOS, Onésimo Jerônimo (2000). Arqueologia de Resgate no Nordeste do Brasil: o caso do GASFOR.
D i s s e r t a ç ã o d e M e s t r a d o , P r o g r a ma d e P ó s - G r a d u a ç ã o e m H i s t ó r i a , U F P E , R e c i f e .
4
ALBUQUERQUE, Marcos; LUCENA, Veleda; NASCIMENTO, Ana (1988). Levantamento exploratório
da ocupação humana pré-história da lagoa do Jequia – Alagoas. Boletim do Laboratório de Arqueologia
(separata), ano I, vol. 2, Recife, UFPE, pg. 5-14.
10
Num segundo núcleo, na região Amazônica, se delineou como foco de pesquisa o
estudo dos agrupamentos populacionais que basearam suas aptidões tecnológicas para o
desenvolvimento de uma agricultura incipiente, através da horticultura da mandioca
principalmente. Porém, nas primeiras décadas de seu desenvolvimento os objetivos da
pesquisa na região norte do Brasil, foram os de tentar estabelecer a origem e dispersão da
cerâmica produzida pelos grupos das localidades estudadas, e sua expansão para as demais
regiões do país. (Cláudia Alves, 1991)
As pesquisas desenvolvidas na região norte do Brasil buscavam corroborar a teoria
predominantemente aceita no período para o povoamento da América, onde tal
povoamento teria se processado no sentido do norte para o sul, ocorrida em períodos
sucessivos, e que as populações humanas não teriam chegado às latitudes mais ao sul do
continente americano anteriormente há 12.000 anos BP5. Associada à referida teoria estava
à idéia de um desenvolvimento cultural progressivo e linear das populações americanas,
centradas em áreas nucleares, e, quando os dados não contribuíam para a elaboração de
uma argumentação consistente e que corroborasse as hipóteses propostas imputava-se
como elemento explicativo para as diferenças ou ausência de estruturas e vestígios
arqueológicos as impossibilidades da configuração ambiental que não era propicia para um
pleno desenvolvimento “normal” dos padrões de organização social previamente
estabelecidos para as sociedades ditas mais complexas das Américas. Assim, o que não
correspondia aos padrões estabelecidos, segundo as teorias e hipóteses utilizadas, era
incluído como área de retrocesso e ou declínio.
A referida abordagem é alicerçada nas hipóteses propostas através do arcabouço
teórico do projeto PRONAPA, que pouco a pouco foi disseminando a abordagem
explicativa da difusão cultural, através de áreas nucleares e que se irradiou por toda
extensão do continente sul-americano. Tal abordagem está bem exposta na obra de Betty
Meggers: “América pré-histórica, 1979”, onde seu objetivo principal foi o de mapear as
culturas pré-históricas americanas e traçar as possíveis rotas de migração dos grupos
humanos e a difusão dos traços culturais através do material arqueológico exclusivamente
cerâmico.
Os trabalhos desenvolvidos pelo PRONAPA se desenvolveram sobre uma intensa
preocupação nas questões tocantes aos aspectos estilísticos e culturais das áreas abordadas
5
Abreveatura que significa Antes do Presente (do inglês Before Presente – BP), o referencial cronológico
corresponde o ano de 1950 paras as datações radiocarbônicas, ano que obteve a primeira.
11
pelo projeto. Os elementos que compunham os vestígios materiais, observáveis em padrões
repetitivos, tanto no caráter de disposição espacial superficial e estratigráfica, geraram a
construção de um modelo de ocupação onde se subvalorizou as interpretações culturais e
naturais, principalmente na Amazônia, onde a imagem pasteurizada de uma imensa floresta
impossibilitou aos pesquisadores perceber a existência de outros ambientes ecológicos com
outras possibilidades de exploração e adaptação. O modelo de ocupação criado pelo
PRONAPA, foi generalizado para toda a região amazônica vindo a fomentar um cenário
arqueológico debilitada e insuficiente sobre os grupos pré-históricos da área região.
O modelo de áreas culturais aplicado no PRONAPA, fora baseado nas propostas
metodológicas de Steward, a qual trataremos numa abordagem mais adiante, mas, podemos
antecipar que seu modelo de estudo ressaltava um enfoque mais pormenorizado, um estudo
de âmbito mais local ao invés de regional, dos processos de troca entre as sociedades e o
meio ambiente ao qual se adaptava.
Steward aplicara em suas pesquisas um enfoque ambientalista, onde o ponto
relevante na obtenção dos dados para as pesquisas foi tentar identificar as questões
ambientais determinantes no processo adaptativo das populações humanas como forma de
se estabelecer um modelo em que os estudos ecológicos fossem apresentados de forma à
valorização dos elementos naturais positivos e negativos. Tal enfoque ambientalista
aplicado por Steward e Willey, e levado a cabo nas pesquisas do PRONAPA por Meggers
e Evans, distingue-se do que atualmente se vem aplicando nos estudos arqueológicos como
uma abordagem ecológica na observância das relações homem e ambiente, onde temos
diversas contribuições como às de Trigger e Sanders.
A tese do “Determinismo Ecológico” é percebida nos aspectos de homogeneidade e
pobreza nutricionais de recursos ambientais, não só da Amazônia como da Faixa Costeira,
fatores apresentados como elementos limitantes para o pleno desenvolvimento de
civilizações nessas áreas florestadas. Não foi cogitado qualquer tipo de adaptação
econômica e energética a ambientes de florestas, apresentando como único argumento o
baixo índice de nutrientes dos solos dessas regiões. Foi sistematizado um quadro
monolítico, com perca das especificidades locais, para uma predominância cultural em
tecnologia cerâmica, locais de habitação, etc., para quase todo o território brasileiro
representada pela cultura do tipo marginal ou tipo floresta tropical, principalmente no que
12
se refere à floresta tropical, área foco do programa de pesquisa colocado em prática pelo
PRONAPA.
O que se processou foi uma supervalorização de uma característica contextual que
levou a uma simplificação dos elementos ecológicos (orgânicos) e humanos (inorgânicos),
provocando assim uma visão simplista das características das ocupações humanas que ali
se instalaram ditas como de pequenas aldeias, cerâmica simples, praticante de uma
agricultura incipiente estabelecida na base da derrubada e queima da floresta, com
deslocamentos periódicos e praticantes da caça e pesca. Todos esses elementos
explicativos tem como lastro justificador unicamente as impossibilidades nutricionais do
solo amplamente defendida pelos coordenadores do PRONAPA.
Para os coordenadores da pesquisa o dado coletado das áreas de terra seca (não
inundáveis) que era o foco de sua área de estudo foi usado como parâmetros para uma
generalização dos quadros ambientais de toda a Amazônia. A capacidade de pleno
desenvolvimento das populações da região estaria comprometida pela pouca rentabilidade
do solo, quando este fosse necessário, no decorrer do aumento da produção e consumo de
energia impulsionado pelo aumento da escala demográfica. É claro que as pesquisas
implantadas procuravam responder a questões anteriormente formuladas e nesse caso
procurava-se corroborar a idéia de que a região amazônica fora palco de um declínio
cultural estando fora das regiões culturalmente nucleares, e por isso, os dados satisfatórios
para a manutenção dessas hipóteses eram generalizados ao conjunto. A idéia de um
surgimento e crescimento regional não fazia parte das questões colocadas como pontos
chaves da pesquisa, por isso não se trabalhou com dados que não poderiam ser inseridos no
modelo utilizado como referencial explicativo para as ocupações pré-históricas.
Porém, Emilio Morán em trabalho publicado em 1990, com o titulo de “A ecologia
humana das populações da Amazônia”, expõe dados que irão contradizer as observações
feitas por Meggers e Evans. Para Morán as configurações do solo amazônico existente sob
a floresta são mais diversificadas do que se pensa. Através de um levantamento
documental significativo que inclui publicações na área de botânica, geomorfologia,
geologia e biologia, o quadro apresentado pelo autor pode ser visto da seguinte forma:
áreas de terras inundáveis, de terra firme e mesmo cerrado. Podemos considerar que as
áreas que sofrem inundações esporádicas mantêm um maior grau de realimentação ou
fertilização de sais minerais e orgânicos necessários à sua manutenção. Na seqüência das
13
pesquisas levadas a cabo na região por Ana Roosevelt foram identificadas nas áreas de
terras inundáveis ocupações que segundo os dados coletados serviram como base para o
estabelecimento de grandes populações agrícolas.
A utilização de um “modelo monolítico” para o processo de ocupação da Amazônia
e Faixa Costeira fomentou a criação de uma “Cultura Tupiguarani”, caracterizada por certo
padrão de ocupação e aspectos técnicos particulares da cerâmica provenientes dois sítios
identificados como Tupis.
As características recorrentes utilizadas no reconhecimento dessas tradições estão
amplamente atreladas à tecnologia cerâmica utilizada para a produção dos vasilhames
identificados em cada grupo estudado (Brochado 1991). Porém, outro dado importante
levantado pelos pesquisadores é que os grupos ligados às tradições mencionadas, já
detinham condições técnicas para o desenvolvimento de uma agricultura incipiente, através
da exploração da mandioca e de outros tipos de alimentos em níveis bem maiores do que se
cogitava. Mas, mesmo diante desses dados, que poderiam servir de informações sobre os
processos adaptativos ocorridos em cada nicho ecológico específico, o mesmo, foi
preterido no período em favor da valorização dos processos técnico-decorativos dos
artefatos cerâmicos.
Como exemplo podemos observar os parâmetros utilizados pelo PRONAPA, e já
mencionados, que procuravam identificar a Tradição Cultural Tupiguarani, através da
elaboração técnica dos artefatos cerâmicos e das decorações externas aplicadas aos
vasilhames. Utilizando tais referencias como características predominantes na hora de
estabelecer o perfil cultural do grupo ou grupos que habitaram uma referida área, os
pesquisadores trabalhavam exclusivamente a cerâmica, por ela mesma, em seus traços
decorativos e de formas.
Assim, foram estabelecidas extensas áreas que foram descritas como território de
influência dos grupos Tupiguarani, pois a cerâmica encontrada apresentava características
como: vasilhames alisados e pintadas em toda sua superfície com tinta vermelha ou preta;
com desenhos geométricos em preto, branco, vermelho e cinza; com decorações do tipo
pintada, corrugada e escovada e sendo utilizado como aditivo ou antiplástico caco moído,
areia fina ou grossa. Tais características se alteram em sub-tradições, mas que não vamos
aprofundar por não fazer parte dos objetivos desta pesquisa. Para uma compreensão mais
aprofundada referente às tradições cerâmicas no Nordeste brasileiro indicamos os trabalhos
14
de Brochado, Gabriela Martin, Suely Luna, Ana Nascimento, Cláudia Alves, Marcos
Albuquerque,
Viviane
Castro,
Mauro
Alexandre,
que
melhor
discutem
tais
particularidades, e que estão descritos na referência bibliografia deste trabalho.
A aplicação de novos dados e estudos regionais mais sistemáticos suscitaram o
aparecimento de traços cerâmicos desvinculados dos elementos de grande dispersão.
Cerâmicas regionais como a Papeba foram identificadas no Rio Grande do Norte, segundo
Martin (1997) a cerâmica “foi identificada nas camadas inferiores de uma aldeia
Tupiguarani (...) representativa de um assentamento anterior e que ocupou todo um sítio
(...)”, bem como, as cerâmicas de Xingó e do sudoeste do Piauí. Esses novos grupos
cerâmicos trazem, consigo novas configurações dos assentamentos e dos nichos ecológicos
que não podem se depreciados pela máxima valorização dos traços decorativos dos
fragmentos cerâmicos.
Entretanto, ao longo dos anos, principalmente nas últimas décadas, a arqueologia
brasileira produziu várias descobertas importantes. Os arqueólogos puderam contar com o
auxílio de teorias, metodologias e tecnologias mais avançadas. Os avanços que ocorreram
nas atividades de campo e laboratório, principalmente nos Estados Unidos, foram sendo
inseridas pouco a pouco nas pesquisas arqueológicas brasileiras. Não é salutar ignorar a
capacidade ímpar de obter informações, com as ciências naturais e demais ciências do
homem, no auxílio ao estudo dos sítios pré-históricos e históricos: das evidências
geomorfológicas, dos dados paleoclimáticos, das informações documentais escritas e
iconográficas, dos estudos etno-históricos, etc. Não podemos negar que, esses progressos
metodológicos, ao serem aplicados, procuram responder velhos questionamentos
suscitados através de inúmeras teorias homem/natureza do mundo ocidental: o caráter
enfático do papel determinante do ambiente sobre o desenvolvimento das sociedades e, do
outro lado, valorizar o papel dominante da cultura sobre a definição do ambiente físico
(Morán 1990).
Os caminhos traçados pelas pesquisas arqueológicas no Brasil, em busca de um
arcabouço conceitual próprio que possibilitasse a construção de um modelo explicativo
puramente arqueológico, perpassou por vários estágios teóricos, especificamente, na
abordagem dada aos estudos das populações autóctones. Desde a valorização de elementos
climáticos ou de elementos culturais. Assim, os estudos arqueológicos no Brasil estão
15
sendo realizados com maior influência por duas abordagens de estudos de sítios
arqueológicos e suas relações intra e extra sítios com o ambiente circundante.
As formas de estudos espaciais estão divididas entre as abordagens espaciais anglosaxão e francesa. No primeiro caso, os estudos de organização espacial e padrão de
assentamento estão direcionados para o foco intra-sítio com a abordagem dentro de
sistemas fechados, enquanto, no segundo caso, os estudos de espacialidade influenciados
pela abordagem francesa seguem mais atrelados às temáticas geográficas. Uma
denominação mais especifica para essas duas abordagens é a chamada “Arqueologia
Espacial” com influência antropológica e ligada à New Archaeology e a “Arqueologia da
Paisagem” como descrito acima, influenciada pela escola geográfica francesa. 6
Com base nessas informações preliminares é primordial destacar que o eixo
principal de nossa pesquisa arqueológica está centrado nas pesquisas influenciadas pela
Arqueologia da Paisagem, onde o estudo das sociedades humanas e dos possíveis locais de
ocupação corresponde ao levantamento dos dados geomorfológicos, paleoclimáticos, dos
aspectos econômicos (exploração do território), o que Fernandez Martinez e Ruiz
Zapatero7 denominam de “Arqueologia Exterior” (off-site). Nesse momento não nos
propomos a realizar pesquisas mais detalhadas em relação aos estudos intra-sítio ou
“Arqueologia Interior” (on-site), proposta metodológica dos autores citados acima. A não
incorporação dos estudos internos ao sítio será apresentada e justificada quando tratarmos
das condições de preservação dos sítios e vestígios arqueológicos trabalhados nesta
pesquisa e que fazem parte do quarto capitulo desta dissertação.
6
BARCELOS, Artur H. F. (2000). Espaço e Arqueologia nas Missões Jesuíticas: o caso de São João
Batista. Porto Alegra: EDIPUCRS, Coleção Arqueologia 7, capitulo 1: Arqueologia nas Missões Jesuíticas,
pg. 25-57.
7
Apud BARCELOS (2000). Idem.
16
1.2
História do Homem e o meio ambiente.
As mais antigas teorias sobre as influências do meio ambiente sobre o homem
foram aplicadas pelos gregos e romanos, onde está implícito o caráter de dominação
política desses povos sobre outras regiões. A teoria dos humores estabelecida por
Empédocles (504-443 a.C.), foi uma das primeiras considerações sobre a influência de
elementos naturais: fogo, terra, água e ar, sobre as funções biológicas do homem.
Hipócrates desenvolveu muitas idéias acerca do pensamento biológico, seu tratado
Sobre os Ares, Águas e Lugares, lança as primeiras idéias na tentativa de justificar as
diferenças de etnias a partir das diferenças climáticas. Povos de climas quentes e secos
tinham reduzida sua vitalidade, populações de climas mais brandos tinham uma natureza
apaixonada, e povos de climas frios possuíam fortaleza física (Morán 1990). Tal idéia irá
influenciar o pensamento científico até o século XX.
As idéias geoclimáticas também fizeram parte das teorias e hipóteses dos autores
romanos, quando procuravam justificar o domínio político do império. Para Vitruvio o
sucesso de Roma estava em sua localização ideal, devido à sua latitude especial. Para ele,
os povos nórdicos eram fortes, mas lhes faltava inteligência. Enquanto os povos de clima
quente eram resistentes à dor, mas de pouca coragem. Plínio, não discordou de seu
compatriota ao valorizar as qualidades romanas: “a maneira do romano é gentil, sua
inteligência clara, seu gênio fértil e capaz de compreender toda a natureza. Eles criaram
império, o que não foi feito por nenhum outro povo”. As explicações sobre o
desenvolvimento cultural de uma área em critério geográficos e climatológicos perduram
até os dias atuais. Esse dualismo ambiental foi marcante em todo pensamento grecoromano, os aspectos de qualidade climática, a abordagem dos extremos, frio e quente
esteve sempre associado à cultura e desenvolvimento técnico-científico dos povos vistos
como outros.
O último núcleo de perfeitas condições geoclimáticas para o bom desenvolvimento
cultural dentro da região do mediterrâneo foi o império árabe. Al–Mas’udi esboçou
explicações favoráveis à civilização mulçumana através das boas condições da vegetação,
do relevo, etc., em contraponto às boas condições defendidas pelos outros autores
mencionados acima e os climas favoráveis defendidos por estes. Para ele, as boas
17
qualidades do povo árabe procediam da pureza do ambiente. As influências das idéias
greco-romanas, na teoria dos humores, estão presentes em todos os estudos desenvolvidos
pelos povos árabes, vistos como de pouca inteligência. Porém, pode até ser irônico, mas os
aspectos climáticos ideais, equilíbrio, deixaram de ser daquelas perfeitas áreas do
mediterrâneo e passaram para as antigas regiões frias e negativas da Europa, em resposta a
mudança do centro político ocidental. O caráter ideológico é a base primordial da teoria
dos humores, haja vista, que o clima primordial para o pleno desenvolvimento cultural
deixa de ser a região mediterrânica, já mencionada, e foi transplantada para as antigas
regiões de povos bárbaros desprovidos de qualquer perfil civilizatório.
Na Europa do século XVIII, o desenvolvimento do pensamento científico,
cartesiano, proporcionou avanços metodológicos importantes na física, na química e na
biologia. Prova disso, são os trabalhos desenvolvidos por Lineo, Cuvier e Buffon no campo
da biologia. Várias contribuições foram dadas no estudo das diferenças e semelhanças
entre plantas e animais, que passaram a ser associadas ao ambiente. Mesmo com um
caráter predominante sobre o desenvolvimento das populações animais ou vegetais, o
determinismo ambiental estabelecido, no período, propiciou avanços científicos profundos
nos estudos de diferentes espécies, que não podem ser desconsiderados.
Não se pode negar as influências de John Locke nas gerações seguintes, com seu
enfoque predominante dado ao ambiente e seu papel de extrema influência sobre as
diferenças individuais e nacionais. O homem passou a ser visto não só como criação
divina, mas também como produto da natureza.
A procura por um quadro de classificações e tipologias que explicasse o surgimento
e as diferenças das várias populações humanas pelo planeta, é um dos fundamentos do
estudo das interações entre homem/meio ambiente, que levaram diversos autores a
elaboração de tipologias para dividir os grupos humanos através de aspectos econômicos,
tecnológicos e climáticos. Em sua obra intitulada História Universal, Turgot (data),
fundamentou-se em bases ecológicas para tratar da dispersão dos grupos de caçadores pelo
planeta em sua procura por alimento. Para Turgot, bastava uma oferta natural de reservas
alimentares para favorecer o desenvolvimento cultural. Outra tipologia com bases
geoclimáticas havia sido proposta anteriormente por Ibu Khaldum, criando sete zonas
climáticas, nas quais dividiu o mundo e onde tentou analisar a contribuição do clima sobre
aspectos sócio-culturais.
18
Contrário às idéias de Turgot, Justus von Liebig, estabeleceu na década de 1840 a
“lei do mínimo”, explicando-se da seguinte forma: o crescimento dos organismos é
limitado por aqueles elementos que são presentes em menores quantidades para a
manutenção dos processos biológicos, denominados de “fatores limitantes”. A lei pode ser
aplicada ao crescimento biológico de vegetais e animais, quanto menos for disponível
elementos indispensáveis aos organismos ou populações, menor será sua capacidade de
desenvolvimento. A “lei do mínimo” seria futuramente um dos elementos preponderantes
para a construção do modelo do determinismo ambiental aplicado na arqueologia mundial.
No final do século XIX, os pesquisadores começaram a agrupar os artefatos e
costumes por localidades geográficas no estudo das variabilidades das populações
humanas, método denominado de antropogeografia, e seu mais influente estudioso foi
Friedrich Ratzel, para ele, o ambiente e não o indivíduo era a causa principal da
diversidade e distribuição das culturas – a sociedade responde à natureza do mesmo modo
que um animal a seu meio (Helm, 1962 apud Morán, 1990). Houve uma ressalva no
desenvolvimento cultural para Ratzel, a difusão representaria o papel fundamental para a
evolução das civilizações. Idéia que não foi desatrelada de um determinismo ecológico que
revigorava no inicio do século XX. Foram estabelecidas áreas nucleares, principalmente
das civilizações clássicas, de onde se copiou ou distorceu a cultura material, formada pela
Escola Difusionista Inglesa.
1.3
A Arqueologia e a paisagem
O começo do século XX foi marcado por um determinismo geográfico e uma
difusão cultural clássica. As atividades efetivadas por Franz Boas e seus seguidores
introduziram novos padrões de pesquisas etnográficas no estudo das interações
homem/ambiente. Em sua obra The Central Eskimo (1888), Boas passou a enfatizar o
papel da herança histórico-cultural dos esquimós sobre o ambiente. Para ele, ambientes
semelhantes necessariamente não resultariam em semelhanças culturais. Os seguidores de
Boas entenderam que o homem criava seu ambiente e não era determinado por ele.
Argumento utilizado contra as limitações ambientais ao desenvolvimento cultural aplicada
por Betty Meggers (1972).
19
Mas, o movimento que se seguiu após as atividades de Boas, foi compreender a
cultura nas suas várias manifestações históricas, de dentro para fora em sua dinâmica
própria. Na sua obra Cultural and Natural Areas of native North America, Kroeber
trabalhou com a dominância de fatores geográficos na caracterização dos traços culturais.
Porém, ele passou a trabalhar com a idéia de “clímax cultural”, à cultura como entidade
superior no processo adaptativo.
Dentro desse contexto de se enfatizar o predomínio da cultura ou do ambiente, o
estudo da arqueologia encontra-se em efervescente construção, não apenas no Brasil, com
as questões de ordem teóricas e metodológicas das ciências humanas, em especial a
Antropologia e a História. Buscando uma nova visão de conjunto, as analises não se
limitaram à cultura material dos sítios pré-históricos como sambaquis, acampamentos e
abrigos. Começaram a ser abordadas novas arqueologias: da paisagem, a etnoarqueologia,
a zooarqueologia, etc. Juntamente com as informações já mencionadas anteriormente:
evidências geomorfológicas, dados etno-históricos, etc.
Nas últimas quatro décadas do século XX, várias discussões tomaram conta dos
debates teóricos dentro da arqueologia científica, no que se refere às transformações na
orientação intelectual e nos métodos empregados por diversos arqueólogos, a partir da
década de 1960. Todo esse novo arcabouço teórico chegou até nós, sendo denominado de
“Nova Arqueologia”. A partir desta década a arqueologia procura definir-se como uma
nova ciência, sendo esta discussão irrompida nos Estados Unidos, os arqueólogos
americanos mais interessados pelas discussões acerca da adaptação e da relação
homem/ambiente dentro dos estudos antropológicos, em vez de limitar-se a determinar a
cronologia de diferentes culturas, num determinado lugar, se concentram em apurar as
causas da evolução de certas culturas e como funcionavam seus utensílios dentro de um
ecossistema abrangente.
Mas, as constantes críticas reiteradas contra a nova arqueologia não conseguiram
por em descrédito as inovações metodológicas e as idéias defendidas por Walter W. Taylor
(Study of Archaeology 1948) 8, inovações que abririam caminho para os trabalhos de
Binford, principalmente no seu artigo “Arqueologia como Antropologia (Binford, 1962)”.
As principais questões implantadas e discutidas inicialmente por Binford, foram as
possibilidades da construção de “leis hempelianas” pelos arqueólogos, seguindo uma
8
Idem, Rice, et. ali.
20
metodologia de aplicação de um modelo hipotético-dedutivo de estilo hempeliano com a
utilização da teoria geral dos sistemas.
Como Glyn Daniel, outros autores teceram duros comentário à postura dos “novos
arqueólogos.” Entre estes autores citamos Flannery, Schiffer, Courbin, que criticavam o
novo grupo, devido o seu incontrolado desejo pela formulações de leis, denominadas “Leis
de Mickey Mouse”, extremamente óbvias e triviais. Porém, as criticas mais duras surgiram
das publicações de Morgan “Archaeology and Explanation 1973”, para o qual, os novos
arqueólogos simplificaram a utilização das leis cobertoras, e “que el formato hempeliano
no es capaz de discernir explicaciones legítimas de explicaciones ilegítimas que pueden
construir-se como contra-ejemplos al modelo” (Franch, 1989) 9.
Outro ponto de discussão entre os próprios arqueólogos e teóricos da ciência, se
refere à utilização da Teoria Geral dos Sistemas, como referencial teórico. Sua utilização
seria fundamentada pelo objetivo de se possibilitar a construção de modelos de simulação
matemática como forma de se evitar a utilização de hipóteses simplistas. Todavia, para
Gándara “la Teoría General de Sistemas, o cualquier outra teoría sistémica, aplicadas a la
Arqueología, no pasan de constituir maneras útiles de organizar datos, o fuentes de
posibles hipóteses generales (..) mecanismos heurísticos”.(Franch, 1989:118)
Seguiu-se a utilização da Teoria Geral dos Sistemas na aplicação de estudos
ambientais ou sistemas ecológicos. Dentro desse caráter ambiental um dos primeiros a
utilizar de tal abordagem foi Gordon Willey, que passou a realizar estudos em
comunidades desaparecidas e estabelecer possíveis correlações com suas pesquisas no Vale
de Virú, focando suas pesquisas “no estudo de sítios pré-históricos, para identificar de que
maneira o homem se distribuía na paisagem”. Desta maneira procurando identificar
padrões de moradias, cemitério, pastagens, depósitos, etc.
Julian Steward (Rice 1986), do qual já realizamos um primeiro comentário acima,
estimulado pela arqueologia em comunidades foi o primeiro a mostrar interesse pelos
estudos ecológicos. Os arqueólogos na procura de entender as influências provocadas e
sofridas pelo ambiente sobre o homem, passaram a trabalhar com “ecofatos”, estudo de
clima, geologia, topografia e da fauna e microflora e outros aspectos dos ecossistemas.
As pesquisas de Steward representam uma das importantes contribuições da
antropologia ecológica nas pesquisas arqueológicas, principalmente na aplicação por parte
9
Franch, José Alcina. Arqueología Antropologíca. Madrid: Ediciones Akal, 1989, p. 115.
21
da antropologia do estudo das relações entre dinâmica populacional, organização social e
cultural das sociedades humanas no meio ambiente ao qual estão inseridos. A referia
abordagem antropológica foi o substrato utilizado pela New Archaeology para a realização
das analogias entre as populações indígenas da América do Norte e os dados obtidos das
populações pretéritas desta região.
A diferença básica entre Steward e a New Archaeology é em relação à extrapolação
das argumentações elaboradas como explicação dos estudos populacionais e adaptativos.
No primeiro caso já nos referirmos ao alcance local das pesquisas de Steward, sua máxima
preocupação do entendimento de questões localizadas de alcance restrito sem partir para
nenhum tipo de generalização com questões mais regionais, o que não ocorre com o
segundo grupo, onde as argumentações gerais são o objetivo focal das pesquisas,
estendidas a níveis regionais com base em amplas generalizações dos dados coletados.
David Clarke em sua obra Analytical Archaeology (1968) (Rice 1986), ao ver no
sistema cultural a soma de subsistemas distintos de natureza social, política, econômica e
ambiental, afirmou ser possível aos arqueólogos um estudo das influências do meioambiente sobre as decisões culturais. Tais subsistemas distintos não acarreta nenhuma
perca de valor explicativo quando se faz uma abordagem dissociada de níveis sociais ou
ambientais.
Em outra obra fundamental intitulada “Spatial Archaeology” Clarke irá apresentar
de forma mais detalhada os estudos realizados por subsistemas sem que seja necessário
uma vinculação obrigatória entre ambos. O autor irá propor a possibilidade da acumulação
de dados através de 3 níveis de abordagens: micro, semi-micro e macro, assim descritos
por Clarke:
“Micro – diz respeito ao interior ou centro do sítio, às estruturas
interiores, abrigos, casas, cemitérios, templos, etc.”. Neste são
importantes os aspectos individuais e os modelos sócio-culturais
são mais relevantes que os estudos econômicos.
Semi-micro – é aquele que compõe o conjunto das estruturas do
interior do sítio e das suas relações com os arredores imediatos.
Os modelos arquitetônicos e urbanísticos devem ser levados em
conta, e os aspectos culturais e sociais assumem preponderância
22
sobre os econômicos, tal como ocorre nas analises de nível
micro.
Macro – diz respeito às relações do sítio com a geografia, as
paisagens, os relevos, o clima e às adaptações econômicas e
culturais das sociedades com estes. Esta escala envolve as
questões de tempo, distância e energia despendida para
exploração do meio ambiente. “Assim, os fatores econômicos
predominam sobre os demais nos estudos deste nível.” 10
A abordagem ambiental apresentada por Clarke, em seu nível macro, e Fernandez
Martinez e Ruiz Zapatero, arqueologia exterior, também é discutida em suas possibilidades
por Butzer (1989), em “Arqueología – una ecología del hombre: método y
teoría para um enfoque contextual”, apresentando sua proposta através de uma
abordagem teórica e metodológica com base na arqueologia contextual, denominada pelo
autor como uma abordagem direcionada para o estudo dos sítios arqueológicos
relacionando-os com os elementos orgânicos e inorgânicos do ambiente circundante. O
estudo dos artefatos arqueológicos deixa de ser o objetivo exclusivo da pesquisa
arqueológica, o artefato pelo artefato, na abordagem contextual o artefato isolado apenas
irá fornecer informações dispersas ou fragmentadas acerca do local de ocupação, seja ele
habitacional, oficina ou cerimonial (cemitério).
A arqueologia contextual tem como objetivo realizar um estudo individual de um
sítio arqueológico ou de um conjunto de sítios arqueológicos que, segundo Butzer, devem
ser observados como elementos resultantes de um ecossistema humano11. Dentro deste
ecossistema humano as comunidades do passado desenvolveram uma interação espacial,
econômica e social com o ambiente, ao qual estava entrelaçado adaptativamente.
10BARCELOS, Idem, pg. 37.
11
ODUM, E. P.(1971): definio ecossistema humano como uma comunidade de organismos em uma área em
interação com o meio ambiente físico...a diversidade e o intercâmbio de materiais entre as partes viventes e
as não viventes. Nas populações humanas o intercâmbio com o meio não cultural se converti em distância ou
espaço, topografia ou acidentes topográficos e em recursos bióticos, minerais e atmosféricos. Apud., Butzer,
1989.
23
Dentro dessa linha de abordagem da dimensão geográfica das populações
estudadas, temos a contribuição dos pesquisadores Ian Hodder e Clive Ortor: “Análise
espacial en arqueología, 1990”, segundo os autores:
“as possibilidades do estudo mais detalhado e sistemático da
estruturação espacial tanto dos sítios, bem como, dos artefatos
amplia a dimensão dos estudos pré-históricos, quanto ao
processo de escolha das áreas ocupadas, tanto num caráter
macro (área) ou micro (sítio) dos grupos estudados. Segundo os
autores, tal enfoque, possibilita ao pré-historiador compreender
dentro da distribuição espacial do sítio se ocorreu uma
regularidade para a ocupação, ou, se a mesma, se deu de forma
aleatória.” (tradução própria)
Na perspectiva de realizar uma abordagem que nos permita identificar, ordenar e
acompanhar a dinâmica das diferentes atividades de uma sociedade, seja no âmbito dos
traços culturais, neste trabalho representados pelos vestígios cerâmicos, seja através da
relação das comunidades humanas com seu entorno ambiental, utilizaremos como
substrato para nossa pesquisa as relações do enfoque sistêmico que vem sendo aplicado a
algum tempo nos estudos das relações contextuais de grupos de agricultores ceramistas.
Os elementos dessa dinâmica contextual que procuramos ordenar e identificar estão
relacionados com o subsistema tecnologia dos vestígios cerâmicos, as possibilidades de
identificar sua localização espacial e o subsistema ambiental, através da dinâmica existente
entre as escolhas de ocupação do grupo ou grupos em relação ao perfil geomorfológico
dominante na área de nossa pesquisa.
Informações indicam que entre 10.000 e 6.000 anos BP, ocorreu na região que
compreende a zona da mata de Alagoas e Pernambuco, um processo geomorfológico de
reumidificação com total adaptação da vegetação, perda de solo e preenchimento dos vales
e várzeas fluviais12. Esse processo adaptativo que processou intensas transformações no
relevo e vegetação é primordial quando pode fornecer uma possível barreira temporal para
12
Fonte: CORREA, Antonio Carlos de Barros. Comunicação pessoal.
24
a presença das ocupações dos grupos ceramistas não mais antigas que 10.000 anos BP,
quando a partir dessa cronologia os processos erosivos e de transporte provocaram o
deslocamento de uma grande quantidade de sedimento para as áreas dissecadas e fundo dos
rios e riachos. A dinâmica do intemperismo químico, sobre um solo intensamente
intemperizado, da força de transporte do coluvionamento e da drenagem provavelmente
impossibilitaria a permanência de quaisquer tipos de vestígios de ocupações no período
mais seco anterior ao período de reumidificação e de surgimento da floresta.
Com base nas informações oriundas das analises em macro escala do caráter
contextual de inserção do conjunto dos sítios arqueológicos, teremos uma configuração dos
espaços definidos para ocupações. A delimitação do ecossistema da área se faz necessária
para podermos compreender as características ecológicas que resultaram no tipo de escolha
tomada. De posse desses dados arqueológicos e ecológicos podemos estabelecer novos
parâmetros para pesquisas arqueológicas na área dos tabuleiros costeiros do litoral
nordestino. Esta área apresenta-se como uma grande lacuna em relação a informações préhistóricas para o Nordeste brasileiro. Os indicativos de ocupações indígenas na região
foram dados pela primeira vez pelo cronista Gabriel Soares de Sousa, onde estão
informações importantes sobre a exploração da floresta pelo grupo indígena caetés,
ocupante da região, e das lagoas fluviais e fluvio-marinhas. Outros achados foram descritos
na década de 1930 por Abelardo Duarte, referente a vestígios de possíveis aldeias
indígenas no município de Pilar, região metropolitana de Maceió.
Através dos pontos apresentados, propomos definir dois elementos norteadores no
estudo da área: a) identificar de maneira preliminar os aspectos técnicos da produção
cerâmica; b) delinear as características do padrão de assentamento, através dos dados
coletados dentro dos limites de tempo, espaço e financeiros impostos pelo salvamento
arqueológico, do qual essa pesquisa é resultante. Pensamos que os padrões das ocupações
identificadas são decorrentes de natureza social, mas que as circunstâncias ambientais e
fatores econômicos foram primordiais no perfil das ocupações.
Porém, o problema central que norteia nosso trabalho é saber quais foram os
elementos que direcionaram as escolhas das populações que ocuparam os Tabuleiros
Costeiros e as Chãs na região da Formação Barreira, os elementos que favoreceram as
escolhida predominantes das áreas de topos e vertentes dos tabuleiros em detrimento das
áreas de vale com solos mais férteis propícias para populações agrícolas.
25
Como já nos referimos, a potencialidade arqueológica da área é de fundamental
importância para os estudos que procuram esclarecer o processo de ocupação dos grupos
humanos no continente americano. Como bem discute Gabriela Martin “A antiguidade do
homem na América tem, além do interesse científico dos princípios do povoamento, a
mística das origens (...) de onde e por onde os primeiros americanos ocuparam o
continente”. (Martin; 2002)
Faz-se primordial o estudo dos sítios localizados e que apresentam características
de aldeias a céu aberto. Através dessa pesquisa, poderemos iniciar a acumulação de dados
necessários ao conhecimento do processo de ocupação (exploração/adaptação) pelos
grupos humanos que habitaram a região sob a, não mais existente, cobertura florestal.
O interessante é que as informações sobre a cerâmica pré-histórica na zona da mata
nordestina estão bem restritas, acarretando a existência de extensas lacunas geográficas na
região. Mesmo com o desenvolvimento do PRONAPA, as áreas de pesquisas enfocadas no
Nordeste ficaram restritas aos estados da Bahia e do Rio Grande do Norte. O
desconhecimento arqueológico de algumas áreas nordestinas só vem corroborar a
dificuldade de se estabelecer a sistemática da ocupação das diversas áreas fisiográficas
pelos grupos pré-históricos e sua caracterização cultural.
As Zonas da Mata Sul e Norte dos estados de Pernambuco e Alagoas,
respectivamente, se encontram inseridos nesse contexto de inexistência de uma pesquisa
arqueológica mais sistemática e prolongada. Assim, as tentativas de explicação histórica
em relação aos locais escolhidos para as ocupações por parte das populações indígenas
ficaram sempre restritas a hipóteses gerais de que o caráter belicoso desses grupos resultou
em ocupações mais elevadas perfeitas para a defesa. Percebemos que existe nessa hipótese
a exacerbação de aspectos culturais, a guerra, em detrimento de outros elementos como a
base econômica, ambiental e a aquisição de energia necessária à manutenção e reprodução
da comunidade.
Estudando os elementos econômicos, ambientais e de produção e perda de energia
por parte da comunidade estaremos associando novos parâmetros ao arcabouço dos dados
já coletados e analisados em relação aos artefatos arqueológicos, principalmente a
cerâmica, em outros sítios pesquisados na zona da mata do estado de Pernambuco e de
outras regiões do Nordeste Brasileiro.
26
O último estágio apresentado por Clarke, o macro, não esta tão dissociado da
abordagem ambiental defendida pela escola geográfica francesa. Mencionamos
anteriormente que o eixo focal de nossa pesquisa é um estudo de arqueologia da paisagem,
podendo também utilizar-se das propostas teóricas e metodológicas dos subsistemas de
Clarke, especificadamente em seu nível macro, além do que as atividades realizadas
durante os trabalhos de campo do qual esta pesquisa é decorrente foi principalmente o
levantamento, registro e salvamento de sítios arqueológicos profusamente destruídos por
décadas de atividades econômicas contemporâneas. Aqui a aplicabilidade do nível macro
de Clarke e da arqueologia da paisagem é fundamental no levantamento de sítios
arqueológicos, principalmente naqueles onde a intervenção através de escavação já não é
mais possível por motivos específicos, no caso dos sítios apresentados nesta pesquisa o
grau de alteração e perturbação das camadas arqueológicas foi quase total. O que iremos
perceber quando da apresentação do estágio de perturbação dos sítios e de fragmentação e
dispersão dos vestígios arqueológicos in loco.
27
Capítulo 2
LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE AÇÃO
2.1
Localização e delimitação
A área de implantação da tubulação do gasoduto perpassa como já foi mencionado
os estado de Alagoas e Pernambuco, percorrendo a região fitogeográfica da floresta pluvial
perenifólia. Outro elemento caracterizador da área de influência do Projeto GASALP está
representado pelo perfil geomorfológico dos Tabuleiros Costeiros que na formação
geológica da região tem em suas bordas o contato com o Planalto da Borborema, a oeste, e
com a Planície Costeira, a leste.
Dentro do espaço geográfico mencionado acima procuramos redimensionar os
limites espaciais, foco, da área da pesquisa entre as latitudes de 9º 0’16’’ e 8º 51’44’’S e
longitude de 36º 36’27’’ e 35º 26’40’’W. As coordenadas apresentadas restringem apenas
à região dos tabuleiros costeiros e áreas periféricas. De maneira objetiva a escolha desse
espaço foi condicionada pelos aspectos morfológicos dos pediplanos que após o trabalho
de dissecação por agentes físicos e químicos serviu como elemento guia não só para este
trabalho, mas de referencia predominante como possíveis locais da presença dos vestígios
arqueológicos registrados no desenvolvimento do projeto de salvamento evidenciado pelas
pesquisas de campo na região.
Porém, a descrição dos fragmentos de planícies costeiras nos limites norte do
estado de Alagoas é fundamental quando nos permite conhecer a energia de transporte,
descarga e afogamento dos vales fluviais dos rios e riachos que compõem as bacias
hidrográficas da região.
A planície quaternária alagoana se estende aproximadamente por cerca de 220 km,
entre as latitudes de 8º 53´ e 10º 30´S e as longitudes de 35º 09´e 40º 24´W.
Compreendida por uma faixa sedimentar estreita com largura variável de poucos
metros a 4 km, a planície, de maneira geral, é composta por acúmulos de sedimentos
28
praiais e flúvio-lagunares, onde apresentam diversas feições como campos de dunas e
restingas, que favorecem a proliferação dos manguezais. Também são identificadas na
planície feições decorrentes de processos erosivos como as falésias vivas e subatuais.
Muitas dessas falésias são extensões dos Tabuleiros Costeiros em direção ao mar
(BARBOSA, 1985).
Uma característica muito importante na geomorfologia da planície costeira
alagoana e de relevância para os projetos arqueológicos são os inúmeros registros de
lagoas, originadas por influências marinha ou fluvial, que marcam o litoral de Alagoas.
Trabalhos arqueológicos desenvolvidos na área com o objetivo de identificar possíveis
locais com registros de ocupação humana foram realizados na Lagoa Jequia, pelo
arqueólogo Marcos Albuquerque coordenador do Laboratório de Arqueológica da UFPE,
no ano de 1988.
Dados historiográficos dão conta de alguns aspectos alimentares de grupos
indígenas que habitaram o litoral de Alagoas e Pernambuco, dando ênfase ao aspecto da
pesca e coleta de moluscos por estes grupos (Gabriel Soares de Souza).
Outro elemento geomorfológico importante da planície costeira são os terraços
marinhos pleistocênicos e holocênicos que são reconhecidos em toda costa alagoana, como
testemunhos dos episódios de transgressão marinha ocorridos na costa leste brasileira. Os
terraços apresentam uma perfeita continuidade deste o litoral da Bahia até Alagoas,
sofrendo pequenas interrupções das desembocaduras dos rios.
Os terraços pleistocênicos mostram topo aplainado os sedimentos são arenosos,
marrom-claro acinzentados, de granulação média a grosseira. Apresentam elevações de 8 a
10m acima do nível do mar e vestígios de antigos alinhamentos de cordões litorâneos. Os
terraços holocênicos formam uma alongada planície, mas não constituem um corpo
contínuo, sendo por vezes interrompido por falésias e cursos de água. Os depósitos são
constituídos de areias bem selecionadas de cor marrom clara, granulação fina a média,
formando acumulações cujos topos não excedem 5m acima do nível médio do mar
(BARBOSA, 1985).
Diferente das lagoas os terraços marinhos, e mesmo os fluviais, existentes na região
não foram objetos de pesquisas arqueológicas. Contudo dados geológicos já registram a
29
localização dos terraços pleistocênicos e holocênicos, o que traz importante contribuição
na preparação de propostas de pesquisas arqueológicas direcionadas para tal objetivo.
2.2
Aspectos geológicos e geomorfológicos
A geologia regional da área de estudo é marcada pela unidade estrutural da bacia
sedimentar de Sergipe-Alagoas, segundo Feijó (1994)
13
esta unidade estrutural pode ser
classificada em duas sub-bacias, respectivamente, sub-bacia de Sergipe e de Alagoas. Mas,
em geral a extensão continental emersa total da bacia é de 13.000 Km², tendo a porção
submersa a extensão de 20.000 Km².
Não trataremos neste trabalho da descrição das unidades litoestratigráficas e
processos deposicionais da sub-bacia Sergipe, devido à área foco de nosso estudo se
concentrar na sub-bacia Alagoas. Nesta área a unidade estrutural está localizada sobre as
rochas graníticas proterozóicas do Batólito Alagoas-Pernambuco. O limite ao norte da subbacia Alagoas esta em contato com a Bacia Sedimentar Pernambucana, enquanto ao sul a
sub-bacia Sergipe faz limite com o Cráton do São Francisco, no sistema de falhas Vaza
Barris (Ferreira, 1999).
A denominação do embasamento sob a bacia Sergipe-Alagoas é em termos
geológicos a Província Borborema onde se apresentam o sistema de dobramentos
Brasilianos, mas presente em Sergipe, e o Maciço Brasiliano que forma o substrato de
nossa área de estudo. No estado de Alagoas o Maciço Brasiliano é recoberto por uma
camada muito mais espessa de sedimentação do que a região ao sul da cidade do Recife.
Provavelmente esse caráter da sedimentação e exposição do embasamento diferencie as
morfoesculturas da região.
O contexto geológico da região que compreende o litoral norte alagoano apresenta
as seqüências das fases pré-cambriana, mesozóica, terciária e quaternária, cujas descrições
realizadas por alguns autores apresentam o processo de alteração das diversas fases
13
FEIJÓ, F. J. Bacias de Sergipe e Alagoas. Boletim de Geociências da Petrobrás, Rio de Janeiro, vol 8,
n.1, p. 149-161, jan./mar., 1994. In: Rogério Valença Ferreira. Geomorfologia da Região de Japaratinga –
AL. Dissertação de Mestrado, Pós-Graduação em Geociências da UFPE, Recife, 1999.
30
geológicas e geomorfológicas da área e que estão apresentadas em algumas publicações, a
exemplo do Projeto RADAM, 198314 e Ojeda & Fujita, 197415.
Para o caso especifico de nossa área de estudo salientamos os elementos geológicos
originários de formações e transformações ocorridas no Cenozóico, Formação Muribeca,
no Terciário, Formação Barreiras e no Quaternário com o intenso processo de
retrabalhamento da Formação Barreira e de posição de sedimentos praiais e aluviais.
Não foi identificado registro arqueológico em nossa área de estudo na Formação
Muribeca, mas em algumas áreas do litoral norte de Alagoas existem afloramentos desta
formação, a exemplo do município de Japaratinga, como também existem afloramentos
com freqüência nas vertentes dos vales, recobertos pela Formação Barreiras (Ferreira,
1999).
Mesmo não apresentando vestígios arqueológicos a Formação Muribeca,
provavelmente é originária de deposição fluvial, é referência para prováveis processos
deposicionais posteriores na área como a Formação Barreiras, e se sobrepõe ao
embasamento de forma diagonal (estratificação discordante16), apresentando clásticos
grossos, evaporitos e carbonatos de baixa energia presentes no bloco alto da linha de
charneira Alagoas da Bacia Sergipe.
Como frisado acima, nos propomos a delinear as características que surgiram com
as mudanças paleogeográficas do litoral alagoano. Sabendo que, segundo a abordagem
geomorfológica, “a tendência dos processos de erosão é de degradar as partes altas e
agradar as partes baixas, tendendo para um nivelamento de equilíbrio”. (GUERRA, 1978)
No Período Terciário os sedimentos formaram uma planície elevada, variando de
30 a 150m acima do nível do mar, apresentando um perfil aproximado ao de um extenso
lençol tabular, com uma declividade de aproximadamente 3m/km. Segundo Lana (1990)
“o preenchimento sedimentar das bacias de Sergipe e Alagoas apresenta vários ciclos de
14
PROJETO RADAM (1983). Folhas SC 24/25 Aracaju/Recife-Geologia, geomorfologia, pedologia,
vegetação e uso potencial da terra. Ministério das Minas e Energia, Rio de Janeiro, 856 p.
15
OJEDA, H. A.; FUGITA, A. M. (1974). Bacia Sergipe-Alagoas – Geologia Regional e Perspectivas
Petrolíferas. Anais do XXVIII Congresso Brasileiro de Geologia, SBG, Porto Alegre, p. 137-158.
16
Estratificação cujas camadas aparecem inclinadas em relação ao seu plano basal de sedimentação. Este tipo
de sedimentação é também chamado diagonal. Verifica-se nos depósitos eólicos – dunas, nos depósitos
fluviais como os deltaicos, etc.
31
deposição continental e marinho, sendo sua estratigrafia conseqüência direta da sua
evolução estrutural”.
A sedimentação “Barreiras”, designada Grupo Barreiras por Bigarella & Andrade, é
descrita como um corpo de sedimentação inconsolidados arenoso, com matriz argilosa e
com intercalações subordinadas de siltitos e argilitos, de origem continental.
Esta sedimentação terciária é a principal unidade geológica de nossa área de estudo
e recebeu essa denominação pela predominância de “camadas variegadas17 que afloram
nas diversas barreiras ao longo da costa” (Ferreira, 1999).
Existe nas publicações geológicas um intenso debate sobre a denominação de
Formação ou Grupo Barreiras para essa unidade geológica. Moraes em 1928, Oliveira e
Leonardo em 1943, Kegel em 1957, primeira utilização formal para o termo Formação
Barreiras, Bigarella e Andrade em 1964, aplicação da denominação Grupo Barreiras. A
partir deste momento e até a década de 1980 as discussões ficaram restritas a formulação
das possíveis subdivisões existentes na unidade principal.
Ferreira (1999) apresenta argumentações de Alheiros e Mabesoone referente à
denominação utilizada a partir do ano de 1987, “retomam a denominação original de
Formação Barreiras para os sedimentos Terciário/Quaternário que ocorrem nos estados
de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, em virtude de sua litologia dominante
arenosa associada a processos fluviais, entre Natal e Recife”.
No caso especifico da nossa área de estudo não ocorre profundas alterações na
unidade geológica terciária, a Formação Barreiras foi estudada em Alagoas por Ponte
(1969) e Feijó (1994)
18
. O processo de sedimentação foi constituído por clásticos
continentais, não litificados, regularmente compactados em acamamentos mal definidos. A
estrutura litológica é de matriz argilosa e intercalações subordinadas de siltitos e argilas,
com cores variando de amarelo-ocre ao vermelho-acastanahado.
Pesquisadores como Ab´Saber, são do entendimento de que os sedimentos
continentais apresentam origem deposicional de leques aluviais coalescentes no sopé das
encostas, ocasionados no Plioceno, numa época de intensas mudanças climáticas ocorridas
17
O mesmo que Abigarrada (rocha) – que apresenta cores variadas. O mesmo que variegada. Podemos citar
argilas variegadas da série Barreiras. (Guerra, 1980)
18
In: Rogério Valença Ferreira. Idem.
32
na região e que tornou o clima muito mais seco que o atual e submetido a tempestades
esporádicas e bastantes violentas, tendo como resultado um intenso processo de erosão e
transporte em um solo bastante intemperizado, e com o nível do mar em posição mais
baixo que o atual, a energia de transporte dos rios na época realizou a sedimentação desse
material continental na planície costeira recobrindo a litologia pré-cambriana representada
por rochas graníticas, migmatitos e gnaisses. Visualizar no mapa no anexo 1, pg. 133.
A principal litologia pré-cambriana que predomina na região dos tabuleiros é
caracterizada pela Suíte Granitóide, que apresenta datações do Pré-Cambriano Superior, a
composição litológica desta unidade geológica está formada por granitos de granulação
fina e média contento lentes de metacarbonato e calco-hornfels.
No trecho de interesse, encontram-se manchas da Província da Borborema, do PréCambriano Inferior. A composição litológica é formada de migmatitos petrograficamente
semelhantes ao granitóide, com a presença de rochas básicas como anfibolitos e
quartzodioritos, rochas metabásicas e metacarbonatas.
Estimativas geológicas retiradas do Relatório de Sondagem Geológica e de
Exploração – Petrobras, que apresenta informações referentes às áreas de afloramento de
rochas destaca a existência de 45.910,20m² de afloramentos, ou 2.295,51 m ao longo do
percurso de implantação do gasoduto, sendo formados pelas rochas cristalinas que
predominam no embasamento sob a Formação Barreiras.
O posicionamento geográfico ao longo da costa submete á região às influências dos
ventos alísios do sudeste apresentando assim, um perfil climático mais úmido, com
maiores amplitudes de precipitação no limites mais ao norte de Alagoas nas proximidades
com a divisa do estado de Pernambuco.
Tal perfil climático irá influenciar na manutenção de uma vegetação de Floresta
Ombrófila Densa e Aberta, ou Floresta Perenifólia Higrófila Costeira, restrita na atualidade
devido à pressão comercial que fomentou um profundo desmatamento comandado pela
agroindústria e pecuária nas áreas mais elevadas das colinas da região. Sendo representante
máximo desse processo continuo de desmatamento a exploração agrícola da cana de açúcar
iniciada na zona da mata nordestina a partir do século XVI.
33
2.2.1
Aspecto do relevo
Segundo uma classificação estabelecida por Ab´Saber quando procurou classificar
os “domínios morfoclimáticos brasileiros” em 1970, a região do litoral norte de Alagoas,
na qual está localizada a área de estudo desta pesquisa é descrita como “domínio dos mares
de morros” 19, decorrente da decomposição profunda e de mamelonização intensa em áreas
cristalinas. A nomenclatura utilizada de tabuleiros litorâneos ou costeiros foi o resultado de
revisão e nova proposta apresentada por Ross (1990).
A tabela a seguir apresenta a compartimentação da geomorfologia regional.
Domínios
R e g i õ e s G e o mo r f o l ó g i c a s
Morfoestruturais
Depósitos sedimentares
Unidades
G e o mo r f o l ó g i c a s
Planícies litorâneas
Planícies
deltaicas,
estuarinas e praiais.
Maciços remobilizados
Piemontes inumados
Tabuleiros costeiros
Planalto
Piemonte
litorâneo
rebaixado
oriental
da
Borborema
T a b e l a 0 1 : R e t i r a d o d a d i s s e r t a ç ã o “ G e o mo r f o l o g i a d a r e g i ã o d e J a p a r a t i n g a ” .
A inserção da pesquisa ficou restrita a área de influência dos Tabuleiros Costeiros,
área pela qual foi traçado a implementação do gasoduto. As demais regiões
geomorfológicas planícies e planaltos litorâneos na devem ficar de fora do
desenvolvimento de pesquisas arqueológicas a serem aplicadas no litoral norte de Alagoas.
Porém, para o caso da nossa área de estudo procuramos abordar especificamente a
unidade geomorfológica dos Tabuleiros Costeiros. Alguns topos tabulares que estão
presentes nos sedimentos da Formação Barreiras e suas áreas de vertentes expõem as
rochas do embasamento cristalino. A composição litológica desta unidade geomorfológica
é composta por argilas, areias e seixos.
19
Paisagem de formas colinosas esculpidas à custa de processos de decomposição química e escoamento
superficial das precipitações.
34
Segundo os estudos geomorfológicos da área o modelo de dissecação identificado
dos depósitos terciários foi dividido em tabuleiros, colinas individualizadas e as encostas
com rampas de colúvio.
Os Tabuleiros Costeiros estão limitados ao norte com o Planalto rebaixado
litorâneo da Borborema, do qual, recebeu grande parte dos sedimentos que recobrem as
colinas dissecadas. De forma mais especifica os limites entre as duas regiões
geomorfológicas é classificada como a área do Piemonte Oriental da Borborema que ocupa
uma superfície da ordem de 5.130 km², e que esta distribuído de forma irregular no sentido
norte-sul da costa dos estados de Alagoas e Pernambuco. Imagens de satélite no anexos 2 e
3, pg. 134 e 135.
Em seu aspecto estrutural apresenta uma forma alongada na direção NW-SE,
mergulhando de maneira suave em direção ao mar, seguindo a disposição estrutural
exemplificada pela rede de drenagem que percorre a mesma direção.
Estima-se que no final do Pleistoceno e inicio do Holoceno ocorrera no litoral
nordestino um processo contínuo de reumidificação que provocou uma alteração do
contexto ambiental da região, agora com a predominância de uma vegetação com perfil
florestal e a fauna a ela associada. A alteração no clima provocou alterações na dinâmica
da modelagem do relevo e o conseqüente entulhamento das várzeas (várzeas colmatadas).
20
Os vales em “v”, existentes na região, resultantes de processos erosivos lineares21
ocorridos nos sedimentos argilosos terciários dos Tabuleiros Costeiros foram formados em
períodos anteriores e posteriores ao processo de colmatação.
A mudança no quadro climático provoca o aumento do intemperismo químico
dando origem a solos profundos e ácidos. Com o aumento da umidade e a maior
regularidade das chuvas por um período mais longo o processo de dissecação realizado
sobre o solo profusamente lixiviado elabora uma feição de relevo bastante modelado.
Porém, diferente das características do solo das várzeas toda a superfície dos topos planos
será marcada pela presença abundante de solos pobres em minerais e que apenas através da
20
O Dicionário Geológico-Geomorfologico de Antônio Teixeira Guerra, assim apresenta o processo de
colmatagem – “trabalho de atulhamento ou de enchimento realizado pelos agentes naturais ou pelo homem,
em zonas deprimidas”. Pg. 99.
21
GUERRA, Antonio T. O mesmo que erosão fluvial: “Trabalho contínuo das águas correntes na superfície
do globo terrestre (...) a dissecação feita pela erosão fluvial está em função do nível de base, do comprimento
do perfil longitudinal, da natureza das rochas, do clima etc. Uma variação no nível de base ou uma mudança
climática pode originar um tipo de paisagem completamente diferente”.
35
deposição orgânica da floresta que recobria toda região, em decomposição sobre o solo, o
fluxo de minerais inseridos no solo era renovado.
As alterações climáticas foram estudadas com base nas variações do nível relativo
do mar proposto por Suguio em pesquisas realizadas no litoral do estado da Bahia e
apresentadas em seu trabalho.
A intensa alteração climática com o conseqüente aumento da umidade e os
processos de dissecação a ela associados provocaram o surgimento de colinas
individualizadas, unidades geomoforlógicas de um estágio avançado de dissecação, que se
localizam na área de contato dos tabuleiros com as planícies marinhas e fluviais.
A existência das colinas individualizadas demonstra o profundo desgaste erosivo
das vertentes22 dos tabuleiros principalmente após a retirada da cobertura florestal da
região. Essa dinâmica geomorfológica nas vertentes é um elemento importante nas
possibilidades de localização de possíveis de vestígios arqueológicos nestes locais.
Os processos erosivos, principalmente, são tão relevantes quanto às escolhas na
configuração da ocupação espacial humana e no caso de nosso estudo na manutenção dos
vestígios das ocupações humanas pretéritas. Por isso, o estudo das vertentes é primordial.
Como já mencionamos, a estrutura dos tabuleiros costeiros segue em declive leve,
porém acentuado em direção a planície marinha. Nesta área de contato as vertentes ou
encostas apresentam rampas de colúvio resultado dos processos erosivos sobre as antigas
vertentes abruptas.
O mesmo ocorre nos vales próximos aos principais rios da região onde os vales são
mais abertos e de fundo chato. No vale do rio Manguaba as rampas de colúvio chegam, em
alguns locais, até a margem do rio. Nas unidades de relevo dos tabuleiros as rampas de
colúvio têm maior declividade, o que aumenta a energia de erosão e transporte do solo. São
as áreas dos vales em forma de V e que atuam como cabeceiras de drenagem, agindo como
agente de transporte dos sedimentos da porção superior das vertentes em direção as
planícies aluviais (Ferreira, 1999).
22
Vertentes – planos de declives variados que divergem das cristas ou dos interflúvios, enquadrando o vale.
Nas zonas de planícies muitas vezes, as vertentes são mal esboçadas e o rio divaga amplamente. Nas zonas
montanhosas as vertentes podem ser abruptas e formam gargantas. Ai as vertente3s estão mais próximas do
leito do rio, enquanto nas planícies estão mais afastadas. Dicionário geológico-geomorfológico de Antonio
Teixeira Guerra, Rio de Janeiro, 6 ed., Secretaria de Planejamento da Presidência da República, IBGE, 1980,
pg. 434.
36
A dinâmica estrutural da área de estudo está em constante modificação.
Processos
Erosivos
Processos
Transporte
Deposicionais
Fluvial
Dissecação
dos Depósitos
Afogamento
dos Rios
Deposição
Formação
Barreiras
Sedimentares
Construção
de Terraços
Surgimento
de Lagunas e
Lagoas
Exposição da
Formação
Exposição
do Cristalino
Muribeca
Diagrama 01: Dinâmica geomorfológica da região pesquisada.
Com a retirada da cobertura vegetal sobre o depósito sedimentar, já mencionado
anteriormente, a dinâmica de dissecação das vertentes e o surgimento de rampas de colúvio
irá influenciar na energia de escoamento superficial na região tornando-a mais intenso.
Outro fator de mudança com a alteração climática é o aumento da rede de drenagem
que será marcada por um acréscimo no número de rios e riachos de médio e pequeno porte,
que terão importante influência no perfil das várzeas e vales da região. Essas características
geomorfológicas da área são de extrema importância na pesquisa e serão abordados com
maiores detalhes mais adiante.
37
Os aspectos do relevo da região, como já frisamos, foram delineados pelo
retrabalhamentos dos depósitos sedimentares que ocorrem efetivamente no final do
Pleistoceno. Com um perfil bastante modelado os tabuleiros apresentam um conjunto
rebaixado com altitudes máximas pouco acima dos 100m, com seus topos
predominantemente inclinados para o mar, onde acabam em falésias, variando sua direção
ora para leste ora para nordeste.
O alinhamento das estruturas do relevo, influenciado pelos reflexos do tectonismo
regional, submetem a região a influencias profundas de clima úmido e subúmido. Nesse
contexto os processos de intemperismo que alteram as rochas, mesmo a do embasamento,
provocam o deslocamento de massa que é auxiliado pelo declive acentuado do modelado.
A manutenção do solo nas zonas de declive das encostas sofre das ações gravitacionais de
escorregamento do terreno o que é o elemento provocador do processo de colmatagem das
várzeas.
Em relação às formas das colinas percebemos dois tipos que irão ser predominantes
em Alagoas e Pernambuco. Na área do litoral norte alagoano onde o embasamento
cristalino quase não está presente próximo à superfície, sendo a área profusamente
recoberta pelos sedimentos cenozóicos da Formação Barreiras, o processo de dissecação
estabeleceu um aspecto mais tabular às colinas resultantes do processo erosivo. A
existência destas colinas de topo tabular, que emprestou seu nome aos Tabuleiros
Costeiros, sem a presença marcante do cristalino é fundamental no repasse de água para os
vales. As precipitações pluviais que caem sobre os tabuleiros penetram no solo argiloso
com maior facilidade pela estrutura da colina e vão alimentar os vales através da base do
relevo pela zona de exudação.
Esse ciclo de certa maneira preserva a estrutura dos tabuleiros, que em Alagoas são
bastante extensos chegando a 40.000m²
23
, não deixando com que os processos
gravitacionais de erosão afetem de forma intensa as colinas. A permeabilidade dos
tabuleiros também se apresenta importante para a rede hidrográfica na alimentação dos rios
e riachos.
23
GASALP – Relatório Final. As dimensões correspondem à área registrada da ocorrência de número 34,
localizada no quilômetro 109,200 do gasoduto.
38
Nas formas das colinas localmente registradas em Pernambuco, predomina as
colinas de formas convexas de topos concordantes, formando uma topografia ondulada. O
processo de dissecação se desenvolveu através dos sedimentos cenozóicos da Formação
Barreiras, atingindo as rochas do embasamento cristalino da Bacia Sergipe-Alagoas.
2.2.2
Rede de drenagem
A drenagem da área de estudo é formada por rios e riachos que drenam para o
atlântico, todos perenes, apresentando vales e várzeas que sofrem inundações periódicas no
período de inverno.
As principais bacias hidrográficas contidas na região podem ser delimitadas em sete
unidades principais correspondentes a bacia do rio Mundaú, Messias, Meirim, Santo
Antônio, Camaragibe, Manguaba, Salgado, Maragogi, Uma, Serinhaém, Ipojuca. A
distribuição das bacias hidrográficas pode ser visualizada no mapa no anexo 4, pg. 136.
Compõe ainda o quadro hidrográfico da região um conjunto de quatro grupos de
bacias de pequenos rios litorâneos. Apresentado em mapa hidrográfico fornecido pela
Petrobrás com base no Projeto RADAMBRASIL. A localização dessas pequenas bacias,
estabelecida devido à pequena extensão dos rios a exemplo do rio Tapera, estão
distribuídas entre a divisa estadual de Alagoas e Pernambuco até as proximidades da
cidade de Jaboatão dos Guararapes ao sul do Recife.
O mapa hidrográfico da região ainda fornece a descriminação de três bacias de
riachos que mantém ligação direta com o atlântico estando localizados próximos à cidade
de Maceió, fazendo parte do sistema de alimentação das lagoas fluvio-marinhas. A
presença de pequenos riachos nos vales cortados pelo gasoduto é uma constante
principalmente na região norte do estado de Alagoas.
O padrão da rede de drenagem da região é subparalela com direção NW-SE
acompanhando a direção da estrutura da bacia sedimentar Sergipe-Alagoas. A
profundidade de calha dos principais canais fornece o limite do nível de base local e o
nível do oceano estabelece os limites de base geral para a região. O nível de base local dos
39
canais da região é de pouca profundidade, pois os rios que compõem a rede hidrográfica
são de pouco declive e fraca corrente, que divagam em meandros nas planícies de
inundação. Percebe-se tal dinâmica em meandros de acumulação e pequenos arcos de
vegetação de aguapé.
As instalações da Usina Santo Antônio24 localizada em meandro de inundação, no
rio de mesmo nome, ocupa uma várzea ou terraço de aproximadamente 3m em relação ao
rio. As poucas áreas enxutas da região foram selecionadas para a implantação da maioria
das unidades fabris da economia açucareira o que prejudicou a pesquisa de possíveis
registros de ocupação pretérita quando próximo a estes locais passou a tubulação do
gasoduto.
Dentre as bacias relacionadas anteriormente a que apresenta maior extensão é a
bacia do rio Camaragibe, sendo alimentado na região dos tabuleiros pelo riacho Galho do
Meio. Os canais dos rios e riachos da região, como ocorre em toda a rede de drenagem
atlântica, é de pouca hierarquização devido à ausência de drenagem lateral pela colmatação
excedente das várzeas.
Dois elementos são fundamentais na alteração da energia e transporte das correntes
fluviais na região. O primeiro ligado a perfis geomorfológicos e o segundo as questões
climáticas. No primeiro caso a energia é acelerada quando no percurso dos rios e riachos é
registrada a presença de soleiras25. No segundo caso, o nível de energia hidrográfica da
região alcança maior velocidade nos meses de abril a julho, quando a região encontra-se no
inverno, com precipitações em torno de 1800 e 2000 mm, associadas à queda na
temperatura que passa dos 25ºC em abril para 23ºC em julho e com a redução da
evaporação de uma média mensal de 120 a 80 mm.
Com o advento do contexto climático descrito acima, o processo de dissecação dos
tabuleiros através dos canais fluviais é intensificado, temos o inicio do período de
inundação das várzeas e das áreas de água-pé, deixando grande parte dos vales da região
24
Rachel Caldas Lins. Situação socioeconômica em áreas da zona canavieira de Pernambuco e Alagoas.
Recife: Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais. Capítulo II – Espaço geográfico da zona da Mata de
Pernambuco e Alagoas, pg. 21-51.
25
Soleira – barra de rocha dura que funciona como nível de base num ciclo de erosão. As soleiras são muito
importantes nos leitos fluviais, pois são elas que, servindo de nível de base, comandam a erosão. In: Guerra,
Idem.
40
com a característica de solos encharcados devido à falta de aeração e com pH variando de
4,5 a 5,5.
Outra característica desse ambiente climático e geomorfológico é o aumento do
deslocamento de sedimentos através das rampas de colúvio ao longo das vertentes expostas
a energia das precipitações sobre os solos areno-argilosos.
O mecanismo existente durante o inverno apenas é alterado durante os meses de
dezembro a fevereiro quando a uma inversão dos valores climáticos apresentados
anteriormente. Sendo este período de três meses o único momento em que a vazante é
superior ao aumento do fluxo fluvial.
A descrição da rede de drenagem da região dos tabuleiros corrobora a idéia de que
sua formação é posterior ao processo deposicional da Formação Barreiras, indicado através
da compartimentação dos canais fluviais que seguem a direção da estrutura da bacia
sedimentar Sergipe-Alagoas. Outro perfil da hidrografia da região é o padrão dendrítico26
de grande parte dos rios e riachos. Segundo Ferreira 1999, o aprofundamento da drenagem
indica um grau de dissecação elevado para a área.
2.2.3 Clima atual
Na área de estudo o clima predominante está inserido na classificação de Köppen
como Ams´ (clima tropical com curta estação seca e com chuvas de outono e inverno) e
como já foi mencionado as precipitações oscilam entre 1.800 e 2000 mm. Visualização no
anexo 5, pg. 137.
Os meses de maior intensidade de insolação e evaporação estão compreendidos
entre novembro e fevereiro, com maior pico em dezembro e janeiro, com uma conseqüente
queda nas taxas pluviométricas, mas sem causar maiores problemas a perenidade dos rios
da região (Ferreira, 1999).
26
Dendrítico (rede) – ramificações da hidrografia à semelhança de galhos de árvores, muito comum nos
terrenos de rochas cristalinas – como os granitos, ou em regiões sedimentares – argila. In: Guerra, Idem.
41
Gráfico 01: Condições climáticas para a Zona da Mata Norte de Alagoas.
42
Através dos gráficos de temperatura e precipitação, gráfico 1, e evaporação,
umidade e insolação, gráfico 2, elaborados pelo INMET para o litoral alagoano com base
em dados recolhidos entre os anos de 1961-1990, percebemos que a região apresenta um
longo período de chuvas que não fica restrito ao período de inverno se estendendo ao
outono, como fica claro na descrição do tipo de clima.
Mesmo com uma temperatura média em torno dos 25°C, na época de chuvas a
umidade registrada ficou próxima dos 80%, provavelmente influenciada pelas correntes
oceânicas que atingem a costa nordestina e associadas aos ventos alísios que dominam a
região de estudo. Esse perfil climático mantém algum sustentabilidade sobre as unidades
residuais de floresta que existem na superfície tabular e nas vertentes próximas aos rios.
Quando realizamos acima a abordagem sobre a rede de drenagem da região de
estudo destacamos a característica das várzeas inundáveis e dos meandros. Através do
gráfico as informações são corroboradas com a média de precipitação que para o mês de
maio que ficou próximo aos 350 mm, umidade acima dos 82 %, evaporação abaixo dos
70% e temperatura abaixo dos 25°C. A presença de água, tanto no solo como no ar, é
marcante na região dando-lhe o perfil de região tropical úmida, mesmo que o perfil da
paisagem cultural não seja mais tão correspondente com o contexto fitogeográfico
anteriormente existente como em outras regiões de mesmo contexto.
Segundo Ferreira (1999), os ventos que predominam no nordeste brasileiro são de
alta pressão e subtropicais, ventos anticiclone do Atlântico Sul, representados pela massa
tépida Kalaariana, do sul da África.
2.2.4 Aspectos da vegetação e fauna
A Floresta Latifoliada Tropical Úmida, outrora, já esteve presente numa quantidade
bem maior, do que a atual, dentro da biosfera terrestre, ocupando espaços geográficos que
para nós seriam incompatíveis, na atualidade, com as características geomorfológicas
existentes, a exemplo, do interior do nordeste brasileiro.
43
As transformações que ocorreram na biosfera concernente à temperatura,
precipitação, relevo e hidrologia, só para especificar alguns pontos da complexa estrutura
geológica e geomorfológica, ditaram uma reorganização das inúmeras unidades ecológicas
existentes, não sendo de nosso objetivo uma discussão pormenorizada das áreas de
desertos, de tundras, de savana, de cerrado ou caatinga, etc. Mapa com os diferentes
biomas no anexo 6, pg. 138.
As diversas oscilações climáticas, sendo sua maior expressão as diversas faces
glaciais, alteraram enormemente as configurações ecológicas existentes, se não de forma
direta com a total cobertura das áreas pela extensa camada de gelo, se fez indiretamente
com a alteração da temperatura e conseqüentemente dos ciclos de chuvas. Atualmente a
Floresta Latifoliada Tropical Úmida está presente em três núcleos principais em torno do
planeta, cobrindo uma área de 1.500 milhões de hectares, equivalente a 10% da superfície
do globo terrestres e distribuídos pelos continentes africano, asiático e americano.
Essas florestas são marcantes do trópico úmido, o que não quer dizer que são
predominantes, informações levam a crer que grandes extensões do trópico úmido são
compostas de savanas tropicais caracterizadas por cobertura vegetal de gramíneas, que
apresentam um período seco de quatro a seis meses e solos altamente ácidos (Morán
1990:126).
As áreas de maiores concentrações dos espaços ecológicos de florestas úmidas
existentes na biosfera correspondem: a sul-americana, a africana e a indo-malasiana, sendo
a maior delas a floresta sul-americana. No continente americano a floresta se faz presente
nas bacias do Orinoco e do Amazonas e na faixa costeira atlântica do continente sulamericano.
Os principais ciclos naturais da floresta pluvial estão intimamente relacionados com
as mudanças climáticas, as médias anuais de temperatura, umidade e precipitação, as
variações de temperatura do trópico úmido não alcançam índices elevados de oscilação
durante o ano, ficando em torno de 24 e 26 graus centígrados. Existe a predominância de
duas estações climáticas durante o ano na região, uma seca e uma chuvosa, meses com
menos de 100 mm de precipitação são considerados secos. O que confere às referidas
florestas um grau de umidade extremamente elevado. Ainda hoje, mesmo não contando
com as características costeiras florestais de cinco séculos atrás, presentes no Nordeste do
44
Brasil, as condições climáticas, temperatura, umidade, precipitação, etc., ainda apresenta
níveis pouco alterados, para as médias das áreas outrora ocupadas pela floresta.
Mapa 01. Formações Vegetais. In: ROMARIZ, Dora de Amarante (1996). Aspectos da
vegetação do Brasil. São Paulo: Edição da Autora.
45
Respaldando a nomenclatura de tropical úmida, as taxas anuais de umidade relativa
do ar giram em torno de 75 e 100%. Somando-se os três elementos climáticos,
anteriormente citados, esses fatores são suficientes para gerar uma extrema atividade de
reprodução orgânica de pragas, fungos e insetos. Essa atividade orgânica tem um caráter
importante na manutenção da massa florestal. Coube ao sistema florestal operar uma
reorganização de seus espécimes vegetais para evitar uma incidência maior de fungos por
espécie especifica.
Entretanto, sobre um solo fraco e de pouca produtividade a manutenção de uma
floresta tropical só é capaz através da intensa reciclagem de massa orgânica oriunda da
copa florestal, oriunda da intensiva participação dos insetos e fungos na ciclagem do
material orgânico representado principalmente pela folhagem.
Foto 01: Floresta latifoliada tropical úmida. Foto – Esso Standard do Brasil, in: ROMARIZ, 1996, idem.
Em condições normais a média de biomassa vegetal da floresta pluvial é de cerca
de 450 toneladas por hectare, sendo a quantidade de biomassa produzida um pouco
46
superior a que se decompõe diariamente, conseguindo dessa forma manter um equilíbrio de
reciclagem eficaz (Farnworth and Golley 1974)
27
. O que permitia mesmo em áreas que
não eram alimentadas por nutrientes minerais, por exemplo, através de inundações, o
equilíbrio necessário à sua manutenção.
Segundo Stark e Jordan (Morán 1990) a capacidade de absolvição de nutrientes,
como o cálcio e o fósforo, pelo solo chega à cerca de 99,9%, porém essa eficiência não
pode se generalizada para o trópico úmido como um todo, restringindo-se as bacias de
água preta. No restante das áreas de floresta a retirada indiscriminada, da mesma, gera um
profundo desequilíbrio físico no grau de sustentabilidade do solo, atacado por processos
erosivos físicos, químicos e gravitacionais através da ação dos agentes climáticos, etc.
Foto 02: Floresta latifoliada tropical úmida. Foto – IBGE, n° 2525 (T. Jablonsky), in: ROMARIZ, 1996,
idem.
27
FARNWORTH, Edward and Frank Golley (org.) Fragile ecosystems: evaluation of research and
applications in the neotropics. New York: Springer-Verlag, 1974. In: ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de
Janeiro: Ed. Guanabara Koogan S. A., 1988.
47
Observamos que, são dois os principais pontos de equilíbrio da floresta tropical: a
copa florestal e a regularidade e volume das precipitações. Mesmo percebendo que, o
segundo elemento, tem um caráter mais preponderante que o primeiro. Contudo, a própria
floresta por sua vez exerce uma proteção fundamental ao fornecer nutrientes orgânicos, ao
solo, e respondendo também como um bloqueador importantíssimo na absolvição de parte
do impacto de energia provocado pela descarga pluviométrica no período das chuvas.
Segundo Ferri 1980, às árvores são os elementos que formam o principal
componente das florestas. Elas se dispõem em diversos andares: as mais esguias, menos
ramificadas, são mais altas, chegando de 20 ou 30 metros; seguidas de outras mais baixas,
mais ramificadas e por fim as herbáceas terrestres. O solo é revestido, principalmente as
vertentes e planícies muito úmidas, por musgos que ocupam as áreas encharcadas. Nas
áreas menos encharcadas ocorrem muitos fungos.
Foto 03: Floresta latifoliada tropical úmida. Foto – IBGE, n° 2987 (T. Jablonsky), in: ROMARIZ, 1996,
idem.
Tendo realizado uma abordagem geral das características principais da biomassa da
floresta tropical úmida, procuremos especificar a abordagem para nossa área de estudo,
onde tratamos dos domínios específicos da floresta perenifólia latifoliada higrófila
48
costeira28, ou melhor, os núcleos remanescentes espalhados na faixa costeira, dando ênfase
a dois ambientes geomorfológicos de importante abordagem em nosso trabalho: os
tabuleiros costeiros, as vertentes e os vales fluviais.
Segundo Ferri 1980, várias denominações são permitidas para fazer referencia a
expressão que Andrade-Lima utilizou para a floresta tropical, podendo ser chamada de
floresta latifoliada tropical úmida de encosta (Romariz, 1968)
(Coutinho, 1962)
30
29
, mata pluvial tropical
, e de mata atlântica por sua proximidade com o Oceano Atlântico.
Adotaremos a partir deste momento a denominação de floresta latifoliada tropical úmida,
termo mais próximo da característica apresentada por Andrade-Lima.
Outrora, está floresta latifoliada tropical úmida estendera-se por todo o litoral
atlântico da América do Sul, comumente denominada de Mata Atlântica brasileira ou, mais
precisamente, um complexo de tipos de florestas, em geral latifoliadas, pluviais e de
tropicais a subtropicais, que até pouco tempo fora mascarado por uma falsa
homogeneidade de seu bioma31. No total, a floresta chegou a cobrir cerca de 1 milhão de
quilômetros quadrados, sendo mantenedora de uma diversidade ecológica extraordinária.
As maiores distâncias desta floresta, rumo ao interior do continente, se davam ao
sul da costa brasileira onde se alargava a mais de quinhentos quilômetros, aspecto bem
diverso, quando passamos a observar seus limites em direção ao norte do litoral brasileiro,
aonde sua extensão territorial não vai além dos cem quilômetros da costa em direção ao
interior da região (Dean, 1996) 32.
Uma queda tão acentuada nas dimensões da floresta ao norte só poderia ser
explicada por influências climáticas, como verdadeiramente ocorre, em dados efetivamente
observados através da redução brusca da taxa de precipitação anual no sentido sul/norte.
Em dois exemplos específicos do Nordeste, temos na região da cidade de Maceió,
28
Floresta sempre verde, cujos componentes em geral possuem folhas largas, indica, também, que é
vegetação de lugares onde há bastante umidade todo o ano, e, finalmente, que é vizinha da costa ou
acompanha a costa. Andrade-Lima, in: Mário Guimarães Ferri (1980). Vegetação brasileira. Belo
Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. Da Universidade de São Paulo, pg. 72-73.
29
Romariz, in Ferri, 1980, idem, pg. 72.
30
Coutinho, in Ferri, 1980, idem, pg. 72-73.
31
BIOMA: “Comunidade biótica caracterizada pela uniformidade fisionômica da flora e da fauna. Possui
um conjunto biótico característico”. In: MORÁN, Emilio F. A ecologia humana das populações da
Amazônia. Petrópolis, RJ: Vozes, 1990.
32
DEAN, Warren. A Ferro e Fogo: a história e a devastação da mata atlântica brasileira. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
49
adentrando 90 km em direção ao interior, as variações anuais de precipitação são quase as
mesmas (1.604 a 1.650), enquanto que no caso da região do Recife, percorrendo apenas 50
km na mesma direção, a perda de precipitação chega à cerca de 260 mm.
Todavia, a presença da floresta latifoliada tropical úmida na região Nordeste,
resumi-se há bolsões de vida natural dispersos por todo o litoral entre os limites estaduais
de Alagoas e Paraíba, bolsões cercados por extensas plantações de cana-de-açúcar,
representantes secundários do que restou desse extenso manto florestal que em outras
épocas mantivera contato com o ecossistema33 amazônico.
F o t o 0 4 : Á r e a d e p r o s p e c ç ã o d o P r o j e t o G A S A L P , z o n a d a ma t a n o r t e d e A l a g o a s
No litoral do Nordeste, a floresta latifoliada tropical úmida alcança sua maior
extensão em Alagoas, e declinando em direção norte até o limite sul do Estado do Rio
Grande do Norte. A partir desse ponto temos uma alteração do quadro geomorfológico
através de pressões climáticas desfavoráveis à manutenção do ambiente florestal, como o
33
ECOSSISTEMA: “Qualquer unidade que abranja todos os organismos que funcionam em conjunto (a
comunidade biótica) numa dada área, interagindo com o ambiente físico... produzindo uma ciclagem de
materiais entre as partes vivas e não vivas”.In: ODUM, Eugene P. Ecologia. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara
Koogan S. A., 1988.
50
surgimento de ambientes de dunas e de uma vegetação de características mais agreste
próximo ao litoral.
No Estado alagoano temos outros dois elementos estruturais delimitadores da
expansão do ambiente florestal, ou melhor, de um ambiente atualmente pincelado por
zonas residuais de floresta, que são os correspondentes a faixa atlântica da Borborema e os
Tabuleiros Costeiros, que apresentam em seu topo um grande número desses bolsões
residuais da floresta (Andrade & Lins, 1963).34
As informações sobre a fauna aqui assinaladas têm como ponto referencial os
estudos preliminares realizados na Amazônia por Fittkau e Klinge35. Não negligenciamos
que tais informações possam ser consideradas de caráter discrepantes em relação à floresta
costeira. Porém, os dois núcleos florestais em períodos alternados de suas evoluções
ambientais mantiveram momentos de contato, onde ocorreram doações de espécies
vegetais e animais, entre ambos os núcleos.
A presença da floresta latifoliada tropical úmida está intimamente ligada com a
constituição e manutenção do solo e do relevo. Na área de estudo onde a ação do homem
provocou quase que a totalidade do desmatamento da floresta, os processos
morfodinâmicos tem se acelerado, o que provoca uma maior intensidade dos processos
erosivos na área.
A presença da cobertura florística, por outro lado, está relacionada à presença e
manutenção de uma fauna associada a esse tipo de floresta, bem como as espécies
endêmicas existentes. Além de ter contribuído com a oferta de inúmeros frutos, devido a
abundancia de árvores frutíferas, para a dieta alimentar das populações indígenas da região.
Em seu livro Gabriel Soares de Sousa faz uma descrição de algumas dessas árvores e seus
frutos, como o “macugê”:
“É uma árvore comprida, delgada e muito quebradiça, e
dá-se em areias junto dos rios, perto do salgado, e pela
terra dentro dez ou doze léguas (...) a qual dá umas
frutas do mesmo nome, redondas, com os pés comprid os
34
ANDRADE, Gilberto Osório; LINS, Rachel Caldas. Diferentes combinações do meio natural na zona da
mata nordestina. Cadernos, no 9, série VI-6, Faculdade de Filosofia de Pernambuco, 1963.
35
FITTKAU, E. J.; KLINGE, H. On biomass and trophic structure of the central amazonian rain forest
ecosystem. Biotropica 5 (1): p. 2-14. In: MORÁN, Emilio F. Idem.
51
e cor verdoengra, e são tamanhas como maçãs pequenas
(...) colhem-se inchadas para amadurecerem em casa
(...)”. 36
A fauna representa uma pequena fração da biomassa total dentro do espaço
ecológico da floresta latifoliada tropical úmida. No conjunto de invertebrados e
vertebrados, os primeiros compõem a maior parte da fauna terrestre, enquanto dentro da
porção dos vertebrados (50-70%) são predominantemente de habitantes de nichos
arbóreos, onde as condições de sobrevivência são melhores. Devido a suas necessidades
alimentares (frugívoros), os referidos animais, necessitam de um território 25 vezes maior,
em função de sua dieta, fator que leva alguns animais arbóreos a distribuírem-se pela
floresta em pequenos grupos com uma organização social estabelecida (mamíferos
arbóreos). A ação desses animais na copa da floresta e dos animais que se alimentam de
folhas (folívoros) é de suma importância para o processo de decomposição e reciclagem de
nutrientes.
Um dos maiores animais presente na floresta latifoliada tropical úmida, é a anta,
que fora denominada pelos indígenas de tapiruçu, apresentando uma pelagem parda.
Animal herbívoro se alimenta de plantas silvestres e ervas. Foram descritas no período
colonial brasileiro a existência de onças nas florestas do litoral nordestino (Sousa, 2000).
Foram descritos a existência também de vários cervídeos nas florestas do litoral
nordestino, e que eram denominados pelos índios de suaçu. Segundo Sousa 2000, “nas
terras dos tabajaras, se criam uns veados ruivaços, cuja carne é muito boa, os quais
matam em armadilhas, em que os tomam, às flechadas”. A quantidade de biomassa vegetal
era superior às necessidades dos animais herbívoros, e estes eram à base de
sustentabilidade para os demais animais carnívoros como vários felinos de médio e
pequeno porte.
O suprimento de proteína animal para as populações indígenas que ocuparam a
região de estudo, quando da existência da floresta possivelmente não impunha muitas
36
SOUSA, Gabriel Soares de (2000). Tratado descritivo do Brasil em 1587. Recife: Ed. Massangana,
pg.153.
52
dificuldades. Outros animais que eram caçados pelos grupos indígenas era o tamanduá,
porco-do-mato, capivaras, pacas, cutias, cágados ou jabuti,
A caracterização geral do conjunto da fauna no espaço ecológico da floresta
latifoliada tropical úmida não diverge profundamente do exemplo amazônico. A carga de
animais terrestres e arbóreos, e sua inserção no contexto ecológico, como agentes
recicladores da floresta, são similares aos grupos citados acima. Podem-se incluir nesse
contexto grandes parcelas de espécies endêmicas, com destaque para os primatas, espécie
mais ameaçada de extinção, devido o desmatamento extensivo e intensivo ocorrido na
floresta37.
A descrição da fauna da região durante o período colonial do Brasil, nos permite ter
uma pequena amostragem do quadro faunístico existente na floresta latifoliada tropical
úmida que outrora recobria a área de estudo de nossa pesquisa.
37
CAMPO, Eduardo; PAIVA, Melquíades Pinto. Fauna do Nordeste do Brasil: conhecimento científico e
popular. Fortaleza: BNDES, 1995, p. 274.
53
Capítulo 3
OS TRABALHOS DE CAMPO
3.1
Balanço Metodológico
A organização da pesquisa de salvamento arqueológico na área de estudo foi
iniciada com o levantamento e organização de publicações relativas à ocupação humana na
área litorânea dos Estados de Alagoas e Pernambuco, buscando identificar previamente um
indicativo que remetesse a possíveis escolhas realizadas pelos grupos na ocupação dos
espaços da área de influência da mata atlântica contígua a faixa costeira.
A etapa seguinte foi o cadastro de informações referentes à área de mata atlântica
alagoana e pernambucana, áreas de implantação do gasoduto, encontrados em mapas
hidrológicos, mapas geológicos, mapas fitológicos e mapas de recursos minerais. Neste
aspecto foi de vital importância o material fornecido pela Petrobrás, composto por todo o
levantamento da área pesquisada em Carta Imagem na escala de 1: 2.000, juntamente com
mapas de detalhamento das cartas imagem com as curvas de nível. A utilização desse
referencial de mapas e imagens foi primordial na etapa de desenvolvimento da prospecção
arqueológica onde foi possível realizar a identificação de áreas com maior possibilidade de
apresentar vestígios arqueológicos. È claro que a tomada de tais decisões foi endossada
com base na avaliação dos dados provenientes das publicações referentes à história da
ocupação da área.
As pesquisas referentes às ocupações pré-históricas para a Zona da Mata do Estado
de Alagoas e Pernambuco, limitam-se a descrições pontuais concernentes principalmente a
caracterização das populações “Tupis” do litoral nordestino realizadas pelos primeiros
europeus que aqui chegaram. Exemplo deste perfil de abordagem é o importante trabalho
de Gabriel Soares de Souza em sua obra “Tratado Descritivo do Brasil”, onde o autor traça
um perfil das populações indígenas do litoral brasileiro, estabelecendo a denominação das
etnias e sua correspondente área geográfica.
Quando faz menção a ocupação indígena do litoral alagoano e pernambucano, o
referido autor esclarece que a área correspondente entre o rio de São Francisco e a ilha de
54
Itamaracá é área de atuação do grupo indígena Caetés. Mesmo que apresente um caráter
bastante geral às informações existentes no livro de Souza são de fundamental valor, no
momento em que relata alguns elementos culturais, principalmente do cotidiano do grupo
indígena, e de escolhas culturais quanto às localidades selecionadas para o estabelecimento
das ocupações habitacionais do grupo étnico.
Entre as informações fornecidas por Souza e que caracterizam as práticas dos
Caetés na região recortada por lagoas, rios, riachos é que os índios eram habilidosos
pescadores de linha e bons nadadores e que ao prepararem o peixe não realizavam nenhum
tipo de tratamento prévio para o consumo, nas palavras de Souza “o peixe não escamam,
cozendo diretamente com as tripas”.
A menção referente às opções e escolhas para o estabelecimento das unidades
habitacionais que iriam compor as aldeias também é descrita por Souza:
“Quando este principal assenta a sua aldeia, busca sempre
um sítio alto e desabafado dos ventos, para que lhe lave as
casas, e que tenha a água muito perto, e que a terra tenha
disposição para de redor da aldeia fazerem suas roças e
granjeiros (...) as casas da aldeia se fazem também muito
compridas e arrumadas, de maneira que lhes fica no meio
um terreiro quadrado (...) e não vivem mais nesta aldeia,
que enquanto lhes não aprodece a palma das casas, que
lhes dura três, quatro anos”.
Os dados fornecidos por Souza são relevantes, pois levam a um indicativo prévio
sobre as reais possibilidades de se localizar ocupações pré-históricas na superfície dos
Tabuleiros Costeiros, principalmente devido ao quadro de intensa dissecação por parte dos
cursos d´água, e do elevado número de áreas encharcadas.
Novos dados etnográficos e arqueológicos serão registrados após 1930, com as
contribuições de Curt Nimuendaju (1987), e pelas publicações produzidas em Maceió pelo
55
Instituto Histórico de Alagoas, artigo de autoria de Abelardo Duarte38, onde o autor irá
identificar através de uma incursão a campo restos de um sambaqui localizado no litoral
norte de Alagoas.
A produção bibliográfica da década de 1930, referente às hipóteses sobre a préhistória brasileira e a origem dos sítios arqueológicos é tomada por uma fascinação quase
que predominante direcionada aos sambaquis. Fossem através de acadêmicos ou meros
curiosos esses vestígios das populações pretéritas foi alvo de intensos debates e acirradas
disputas entre pesquisadores nacionais e internacionais, a exemplo de Hermann von
Ihering que argumentava a possibilidade da origem natural para as estruturas dos
sambaquis.
O resulto das pesquisas de Abelardo Duarte foi o registro de uma estrutura
sambaquieira na região de Porto de Pedras, remetemos ao texto do autor “O sambaqui de
Porto das Ostras, em Porto de Pedras, de origem não muito remota (...) de cascas de
ostras, de tamanhos diversos, em camadas superpostas (...)”. Parcialmente destruído a
estrutura do sítio arqueológica fora apresentada em croqui em seu artigo com a
representação das condições de conservação, in loco, e a projeção da provável dimensão
estrutural da época anterior à depredação.
Durante várias décadas as informações sobre as ocupações pré-históricas na Zona
da Mata de Alagoas ficaram restritas as poucas pesquisas e informes publicados na Revista
do IHA.
38
DUARTE, Abelardo (1968). Tribos Aldeias e Missões de índios nas Alagoas. Revista do Instituto
Histórico de Alagoas, vol. XXVIII, pg. 83-153.
56
Desenho 1: Esboço de sambaqui. Adaptação com base na publicação de Abelardo Duarte.
Novas contribuições são fornecidas pelo artigo de Abelardo Duarte, agora
direcionadas para a geomorfologia da área de estudo do salvamento arqueológico, são as
denominadas pelo autor de “chãs de cacos39”, localizadas na área de dissecação da
superfície dos Tabuleiros Costeiros e que apresentaram grande incidência de vestígios
cerâmicos como urnas funerárias (igaçabas).
A pesquisa de campo realizada pelo arqueólogo Marcos Albuquerque em artigo
intitulado “Levantamento exploratório da ocupação humana pré-histórica da lagoa do
Jequiá – Alagoas40”, onde ao não constatar a ocorrência de vestígios de ocupação nas
bordas da lagoa, argumentando com propriedade as impossibilidades de tal ocupação,
passa a tecer considerações dos prováveis locais mais propícios a presença de ocupações
humanas na região, argumentando que “a área dos Tabuleiros periféricos a lagoa, oferece
condições favoráveis a fixação de grupos horticultores pré-históricos de acordo com
modelos até então identificados” (ALBUQUERQUE, 1988), associadas às informações de
39
Denominação estabelecida por Alfredo Brandão para os montes cuja chapada tem tal designação e que
apresenta uma “cerâmica rudimentar não se notando o menor adorno”, fazendo ainda referência a outras
“chãs” nos municípios de Atalaia, Capela, Paulo Afonso e Palmeira dos Índios. Informações presentes na
obra “Vestígios de raças prehistóricas em Viçosa”. Revista do I. A. G. A. vol. IV, pg. 28, 1930.
40
ALBUQUERQUE, Marcos (1988). Levantamento exploratório da ocupação humana pré-histórica da lagoa
Jequia – Alagoas. Boletim do Laboratório de Arqueologia (separata), Recife, UFPE, ano I, vol. 2.
57
descobertas de urnas funerárias localizada no Jazigo de Taquara (DUARTE, 1968),
município de Anadia, e de vestígios cerâmicos nos municípios de Pilar e São Miguel dos
Campos nas denominadas “chãs” ou superfície dos Tabuleiros Costeiros, são indicativos de
um possível padrão nas escolhas de unidades de ocupação espacial por parte das
populações indígenas na região pesquisada.
A exploração realizada na lagoa do Jequiá mesmo não apresentando qualquer tipo
de vestígio arqueológico possibilitou a elaboração de hipóteses que levem a pensar que as
possíveis
ocupações
humanas
poderiam
estar
inseridas
em
outras
unidades
geomorfológicas e que a partir desses locais se realizariam a exploração dos rios, riachos e
das lagoas piscosas.
3.2
As prospecções
O desenvolvimento de uma pesquisa de salvamento arqueológico, mesmo
mantendo suas características específicas, concernente ao tempo e limites espaciais, não
deve apresentar profundas distinções quanto às condições operacionais de uma pesquisa
arqueológica mais sistemática. No caso desta pesquisa de salvamento os elementos
distintivos são percebidos no aspecto do tempo, com poucos meses e muitas vezes
acelerado pelo ritmo de trabalho das máquinas, pela área, com 40 metros de largura como
limite a ser prospectado na zona de passagem da tubulação, e orçamento para o
desenvolvimento das atividades de campo.
Nas atividades padrões, aplicadas nos trabalhos arqueológicos, a prospecção vem
dia após dia recebendo melhor atenção por parte dos profissionais devido à importância
crucial do levantamento de áreas a procura de sítios arqueológicos, e mesmo, o próprio
levantamento intra-sítio. A atividade de prospecção perdeu aquele caráter de momento de
treinamento para jovens arqueólogos e adquiriu tanta importância quanto à etapa de
escavação de um sítio arqueológico (HESTER, 1988).
Os cuidados no levantamento dos dados bibliográficos e topográficos que melhor
prepare as atividades de campo foram auxiliados pelo desenvolvimento tecnológico dos
58
registros topográficos de várias áreas geográficas do Brasil, seja realizado diretamente
pelos órgãos estatais, ou por empresas especializadas contratadas com o intuito de realizar
levantamento geomorfológicos que servem de subsídios para obras públicas ou privadas.
Quando realizamos uma análise das pesquisas de salvamento arqueológico já
desenvolvidas no Brasil, percebemos que em sua maioria estão associadas a obras que
alteraram extensas áreas geográficas como é o caso da construção de Usinas Hidroelétricas
e o conseqüente surgimento dos lagos dessas usinas, bem como, as obras de instalação de
gasodutos. Não queremos aqui retirar a importância de pesquisas de salvamento
arqueológicos desenvolvidas em perímetros de amplitude mais local, em áreas destinadas a
construção de edifícios, casas, cemitérios, loteamentos imobiliários, fazendas, etc. A
preocupação em tratar das pesquisas em áreas de grande impacto geográfico é pela
convergência que tais pesquisas mantêm com o tipo de atividade e o perfil dos trabalhos
desenvolvidos durante o projeto de salvamento arqueológico GASALP.
Repensar os projetos de salvamento arqueológicos no Brasil é de fundamental
relevância quando os cronogramas disponibilizados aos arqueólogos não permitem
margens de manobras para reavaliação das pesquisas com um maior cuidado sistêmico.
Como já nos referirmos, a um elevado grau de dificuldade nas pesquisas realizadas em
áreas de implantação de gasodutos onde o ritmo dos trabalhos é muito mais acelerado do
que a construção de uma hidroelétrica que apresenta um cronograma de obras mais
extenso. Em muitos casos chega-se a ter atividades de prospecção e escavação
arqueológica em áreas de gasoduto restrita a três messes, enquanto os prazos para projetos
desenvolvidos em áreas de construção de Usinas Hidroelétricas se estendem
aproximadamente por 1 ou 2 anos.
Por este caráter singular a prospecção arqueológica em áreas de salvamento deve
procurar seguir o mesmo rigor sistêmico aplicado em atividades arqueológicas, realizadas
sem limites estabelecidos de tempo. O cuidado com a formação da equipe, os componentes
necessários (equipamentos operacionais), as melhores rotas a serem traçadas e veículos
apropriados devem ser rigorosamente discutidos e avaliados.
Os dados que constam das publicações referentes aos locais em que foram
localizados achados cerâmicos na região descrito nas publicações do IHA, foram
associados às informações contidas no material cartográfico, mapa geológico e
59
hidrográfico, imagens de satélite e carta imagem, que permitiram estabelecer os limites da
atividade de prospecção, sendo direcionada para as vertentes e áreas de topo das colinas.
A análise detalhada da configuração topográfica da área de passagem do gasoduto
permitiu identificar os locais com possibilidade de fornecer a maior ocorrência de vestígios
arqueológicos que não foram totalmente destruídos pela ação dos processos erosivos e
antrópicos.
Foto 01:Área dos Tabuleiros Costeiros no Estado de Alagoas, selecionada de carta imagem. Escala 1:1000
(ENGEFOTO)
No universo das unidades geomorfológicas foram identificados três locais distintos
dentro da configuração topográfica, distribuídas em áreas afogadas, inundáveis e de terra
seca. Porém, seguindo os elementos de relevo e a dinâmica na relação precipitação e
drenagem, abordada no capítulo 1, os trabalhos de prospecção foram direcionados a
superfície dos Tabuleiros Costeiros e suas vertentes, mesmo apresentando elevado grau de
declividade e erosão devido à ausência da antiga cobertura vegetal que diminuía a energia
de descarga dos períodos pluviométricos mais rigorosos durante o inverno.
Os procedimentos para a realização da prospecção foram determinados pelas
condições do relevo e da cobertura vegetal que apresentava quatro elementos distintos: as
lavouras de cana-de-açúcar com cobertura de cerca de 66,5% da área, os pastos e as áreas
de cultivo de agricultura de subsistência (mandioca, milho e o feijão) com cerca de 15,5%
e, as manchas de mata atlântica secundária que representam cerca de 10%, com 8% para as
áreas de aguapé41.
41
Designação comum a várias plantas aquáticas flutuantes, de flores violáceas e ornamentais, e das quais a
Eichhornia crassipes, da família das pontederiáceas, é a mais comum; mururé, orelha-de-veado, pavoá,
rainha-do-lago, uapé, uapê.
60
O trecho correspondente do gasoduto em território alagoano é mais acidentado,
estabelecido através do processo de dissecação que formou vários canais fluviais em
conjunto com as formas das colinas tabulares. Já o trecho correspondente ao Estado de
Pernambuco apresenta uma distribuição mais esparsa de colinas com formas mais
convexas com altitudes mais baixas. Esse relevo extremamente acidentado acarretou num
ritmo diário menor de prospecção do trecho do gasoduto que foi coberto em sua quase
totalidade a pé, sendo os veículos utilizados apenas para a transposição de áreas de pastos,
usinas e vales encharcados.
3.3
Método empregado e resultados
Para o registro das ocorrências42 arqueológicas durante os trabalhos de prospecção
foi utilizado como equipamento básico um GPS HP 40, uma bússola manual, mapas de
detalhe da faixa do gasoduto na escala 1: 1.000, carta imagens de toda área de passagem da
tubulação na escala 1: 2.000, máquina fotográfica mecânica Pentax e fichas de cadastro de
ocorrências onde foram considerados: a) dados de localização geográfica; b) considerações
sobre o terreno/relevo; c) considerações sobre as ocorrências (potencialidade de vestígios)
e, d) sugestões para o salvamento.
Sendo dividido em duas etapas – prospecção e escavação - o trabalho de campo no
primeiro momento se propôs a delimitar e identificar os principais locais de existência de
vestígios arqueológicos (prospecção). Utilizando-se das imagens aéreas e mapas de
detalhes, foi feita uma seleção da unidade geomorfológica que correspondia às
possibilidades de registro de material e seguindo-se a catalogação das áreas. E para auxiliar
a localização geográfica das ocorrências na área de estudo fora utilizada, também, como
marco de registro os pontos de localização da própria tubulação que constava
georeferenciado nos mapas de detalhe fornecidos pela Petrobrás.
42
“O termo ocorrência se refere a qualquer achado arqueológico localizado no trecho de interesse. Somente
após a análise das ocorrências podemos segregar as unidades que representam sítios arqueológicos
propriamente ditos dos achados isolados”. Relatório Final GASALP, 1998.
61
Uma varredura preliminar do local que apresentava vestígios arqueológicos era
realizada sem se efetivar a coleta do material de superfície, o que deveria ser realizado pela
equipe de escavação melhor aparelhada, mas se estabelecia os prováveis limites da
ocorrência registrando-se as recomendações sobre como efetuar o salvamento do material.
FICHA DE REGISTRO DE OCORRÊNCIA
Ocorrência: 01
Localidade: Fazenda Utinga Leão
km: 3,625
Município: Rio Largo
UF: AL
Coordenadas geográficas: Lat. S 9º 0´ 16´´ / Long. W 36º 36´27´´
Marcos topográfico de referência: PI 73 / Est. 73+771
Superfície preliminar da ocorrência em M²: 25m
Condições do terreno: conturbado
Relevo: plano
Situação topográfica: plano à margem de declive acentuado
Vegetação: limite entre canavial e mancha de mata secundária
Solo: silto-arenoso com manchas de húmus na faixa da mata
Bacia hidrográfica: riacho Reginaldo e rio Mundaú
Tipo de ocorrência: pré-histórica – histórica: cerâmica, lítico e louça.
Material coletado: três fragmentos cerâmicos e duas peças líticas.
Sugestões para salvamento: sondagens e coleta sistemática.
Nas áreas planas dos trechos de mata, procedeu-se à limpeza da camada de folhas
secas que cobre a superfície desses terrenos. Quadrículas de 1X1m foram abertas de 10 em
10 metros longitudinal e transversalmente à faixa do duto, até uma profundidade de 20cm.
Nos trechos de plantio de cana, era suficiente a observação da distribuição de vestígios em
superfície e a observação da cor do solo em diferentes pontos do terreno. Nos trechos de
canavial alto o trabalho de prospecção foi restrito devido às dificuldades de penetração no
interior das plantações (Relatório Final GASALP).
Simultaneamente as atividades de registro das ocorrências, foi realizada, a segunda
etapa das atividades de campo que consistiu em escavações de locais pré-estabelecidos nas
prospecções. As equipes paras as duas etapas consistiam em 3 pessoas no trabalho de
prospecção e 10 pessoas na escavação dos vestígios arqueológicos. As atividades
desempenhadas no campo foram coordenadas pelos arqueólogos Suely Luna, Ana
62
Nascimento, Cláudia Alves, Patrícia Pinheiro e Plínio Victor em conjunto com um grupo
de bolsistas de iniciação científica do Núcleo de Estudos Arqueológicos – NEA.
Nos 204 km de extensão do gasoduto foram registradas 53 ocorrências
arqueológicas, sendo 35 registradas no Estado de Alagoas entre os municípios de Rio
Largo e Jacuípe e as 18 restantes no Estado de Pernambuco entre os municípios de
Palmares e Cabo de Santo Agostinho.
O perfil predominante no posicionamento das ocorrências foi à localização de 43
delas em áreas de topo dos morros dos Tabuleiros Costeiros. Claro que foram registradas
algumas exceções como a ocorrência de número 10 que se estendia até uma área de pasto,
consequentemente registrada em área de vale. No caso das ocorrências 18 e 49 foram
localizadas dentro de plantações de subsistência atuais (mandioca, feijão e milho) é
importante ressaltar que as plantações agrícolas atuais não são realizadas nas áreas
superiores dos tabuleiros. Enquanto as ocorrências 50, 51, 52 e 53 foram localizadas no
perímetro urbano da cidade do Cabo de Santo Agostinho, e numa região de Pernambuco
em que a geomorfologia tabular deixa de ser predominante e cede espaço a colinas de
formas mais convexas.
Os critérios utilizados para a realização da escavação e coleta (salvamento
arqueológico) seguiram os seguintes parâmetro: 1. densidade dos vestígios; 2. localização
topográfica dos achados; 3. os recursos hídricos disponíveis; 4. as manchas indicativas de
atividade antrópica; 5. as fontes de matéria-prima disponíveis. Abaixo apresentamos um
quadro das ocorrências que foram efetivamente realizadas atividades de salvamento:
KM DO DUTO
3,625
4,820
15,800
18,300
21,550
25
37,080
38,670
39,650
39,829
41,546
42,200
48,444
48,935
49,020
50,050
OCORRÊNCIA
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
TIPO DE OCORRÊNCIA
Pré-histórica e Histórica
Histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Histórica
Histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
SALVAMENTO
SIM
NÃO
SIM
SIM
SIM
NÃO
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
63
50,915
68,340
70,075
74,045
75,409
78,272
79,980
80,908
81,337
87,840
93,485
96,100
101,042
102,631
105, 305
105,805
108
109,200
109,960
111
118
119
128
129,250
131,650
136,300
155,950
165,350
184,035
184,80
185,075
186,030
186,500
192,550
193,250
196
199,500
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica e Histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica e Histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Pré-histórica
Histórica
NÃO
NÃO
NÃO
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
NÃO
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
NÃO
SIM
NÃO
NÃO
SIM
SIM
NÃO
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
SIM
NÃO
NÃO
NÃO
SIM
SIM
SIM
NÃO
NÃO
Tabela 01: Ocorrências. Retirada do Relatório Final do Projeto GASALP, pg. 42, 1998.
Segundo o relatório do projeto os procedimentos sistemáticos de salvamentos
seguiram a seguinte organização e realização:
-
Delimitação da área de cada ocorrência selecionada para o salvamento;
-
Divisão das áreas das ocorrências em setores: norte, sul, leste e oeste;
-
Demarcação das sondagens e trincheiras;
-
Levantamento topográfico das áreas demarcadas: limites das ocorrências,
limites dos setores, limites das sondagens e trincheiras;
-
Levantamento topográfico dos vestígios de superfície;
-
Coleta sistemática dos vestígios de superfície;
64
-
Levantamento topográfico dos vestígios provenientes das escavações;
-
Coleta dos vestígios das escavações;
-
Levantamento fotográfico de todas as etapas do salvamento.
O resultado dos procedimentos de prospecção realizados durante o Projeto
GASALP evidenciaram dentro do universo de sítios registrados que uma elevada parcela
destes é compostas por evidências de ocupações pré-históricos, possivelmente de grupos
agricultores, devido aos aspectos tecnológicos dos vestígios catalogados e pela
configuração ambiental da área.
Tipos de sítios arqueológicos
6%
9%
85%
Pré-histórico
Pré-histórico e Histórico
Histórico
Gráfico 01: Percentuais dos tipos de sítios arqueológicos encontrados.
148
Cerâmica
Lítico
29.685
Gráfico 02: Quantidade de vestígios arqueológicos registrados nos sítios pré-históricos.
65
As estruturas arquitetônicas do período colonial foram encontradas em sete
ocorrências, como se pode observar na tabela abaixo:
Ocorrência
01
02
09
10
13
34
Vestígios de estruturas
-
Vestígios móveis
Louça do período colonial: pintada e carimbada (tipo
mata-borrão)
Brocha de ferro (tipo de prego utilizado nas estruturas de
madeira dos edifícios coloniais)
Restos das fundações de um edifício Tijolos e lajotas de barro, fragmentos de louça, de
colonial: tijolos e lajotas de barro garrafas de gin e de azeite.
estruturados in situ
Restos das fundações de um edifício Tijolos e lajotas de barro, fragmentos de louça, de
colonial: tijolos e lajotas de barro garrafas de gin e de azeite, brochas, fragmentos de
estruturados in situ
tachos de ferro, aros de ferro (cinturas de barril ou de
pães de açúcar de madeira), fragmentos de louça e de
cerâmica.
Tijolo e brocha coloniais.
Fragmentos de louça
Cocheira do século XIX
-
53
Tabela 02: Vestígios históricos registrados. Fonte: Relatório Final do GASALP.
66
Capítulo 4
OS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS
O objetivo deste capítulo é realizar, com base nos dados provenientes dos trabalhos
desenvolvidos pelo Projeto GASALP, um quadro onde seja possível perceber um padrão
ou padrões que nos possa auxiliar no estabelecimento do tipo de assentamento
predominante na área englobada pela pesquisa.
Como propomos no primeiro capítulo o substrato para realização de nossa pesquisa
sobre os assentamentos está vinculada a percepção do contexto ambiental e a inserção dos
sítios arqueológicos no perfil geomorfológico e sua recorrência.
A proposta de Alcina Franch (1989) que de melhor maneira apresenta vínculo com
nossa pesquisa é o estudo dos padrões de assentamento percebido através dos parâmetros
da Ecologia Cultural já discutida por nós anteriormente.
Para Beber (2004) o padrão de um assentamento é percebível através de uma
sucessão de ocupações em um determinado espaço quer por sociedades diferentes quer
pelas modificações que uma sociedade pode apresentar em seu padrão de assentamento,
fruto das alterações em seu modo de vida.
Em nossa pesquisa a aplicação da idéia de Beber de sucessão de ocupações ou
alterações de uma mesmo grupo fica um pouco restrito pela configuração alteração dos
sítios arqueológicos trabalhados.
A definição de padrão de assentamento mais próxima de nossa realidade é
apresentada por Forsberg, onde:
“Em outras palavras, pelo menos três dimensões podem ser
utilizadas para visualizar a variação e os tipos de um sistema de
assentamento. O sistema pode ser visto como pontos em um espaço
tridimensional, espaço definido pelos eixos sazonalizados, função e
agregação social. Cada sítio forma um ponto neste espaço, e toda a
configuração de pontos forma as distintas estruturas desse
sistema.” (FORSBERG, 1985, P. 9)
67
Por isso buscamos entender as relações que os sítios arqueológicos mantiveram
com o contexto ambiental assim definindo um padrão, ou melhor, recorrência de padrão de
assentamento para a região da Zona da Mata dos Estados de Alagoas e Pernambuco.
Entretanto não podemos deixar de realizar uma abordagem etnográfica preliminar
dos indígenas que ocuparam a área de estudo, bem como, realizar uma abordagem
contextual sobre a história colonial da região, visto que o conjunto de vestígios
arqueológicos registrados nas prospecções nos dá conta da existência de sítios
arqueológicos pré-históricos e históricos (colonial e de contato) presentes na área.
Quando nos propomos a realizar uma abordagem das relações entre os sítios
arqueológicos e seu contexto ambiental, não podemos negligenciar a história dos
indivíduos que selecionaram os espaços e que ao ocuparem esses locais deixaram
evidências de sua passagem transformando-os em espaços culturais, em sítios
arqueológicos.
4.1
Etnografia indígena e História Colonial
O litoral nordestino foi palco dos primeiros contatos entre as populações
autóctones da região sul do continente americano e os europeus provenientes da Península
Ibérica. Precisamente por esse fato e pela rápida ocupação das terras litorâneas pelos
colonizadores, a destruição das aldeias indígenas e o recuo para o interior dos seus
habitantes inicia-se já no século XVI. Paulatinamente o início da destruição da Mata
Atlântica e a implantação de engenhos de açúcar tornaram-se elementos delimitadores do
“habitat” indígena e sua territorialidade foi completamente modificada. Todavia, através
dos relatos dos missionários e viajantes, da produção bibliográfica, dos vestígios
arqueológicos, assim como da documentação oficial do Estado, conhece-se um pouco das
populações indígenas que habitaram o litoral e a Zona da Mata de Alagoas e Pernambuco,
denominados por grande parte dos etnógrafos e historiadores como pertencentes,
principalmente, ao tronco lingüístico-cultural Tupi apresentado como um grupo que
mantinha entre si grande “homogeneidade” cultural e lingüística.
Quando nos remetemos as populações indígenas de Alagoas, principalmente do
litoral, estamos trabalhando com toda a região sul da Capitania de Pernambuco que
68
compreendia entre o século XVI e XIX, a região costeira entre a desembocadura do rio
São Francisco até a ilha de Itamaracá, incorporando o atual Estado de Alagoas e a comarca
do São Francisco, hoje pertencente à Bahia. Estando ocupada por numerosas tribos, como
os Caetés, Tabajaras, Potiguares entre outros. Nenhum desses grupos restou do processo
colonizador, em parte pela intensa ocupação extrativista e açucareira que percebia nas
populações indígenas um grande entrave a seus objetivos econômicos.
Existe bibliografia variada, a partir do século XVI, que se refere aos povos que
ocupavam o litoral, tais como as obras de Gabriel Soares de Sousa, Pe. Fernão Cardim, Pe.
Manuel da Nóbrega e Pe. José de Anchieta. Soares de Sousa assim se refere aos Caetés
“localizam-se entre o rio São Francisco até o rio Paraíba (...) grandes pescadores de
linha e nadadores”.
Gabriel S. de Sousa não relata maiores detalhes sobre os Caetés, buscando
amenizar tal lacuna com a descrição do gentio Tupinambá que para o autor apresenta as
mesmas características culturais e tecnológicas do negligenciado Caetés. As referências às
técnicas de plantio, de habitação, de pesca que possivelmente poderiam apresentar os
Caetés são todas realizadas através da analogia com os Tupinambás.
A descrição realizado por Nóbrega em relação aos Tupinambás não irá destoar dos
padrões apresentados para os índios do litoral nordestino. Os Tupinambás eram “muito
belicosos, luxuriosos, grandes caçadores e pescadores e amigos da lavoura”.
Em relação à técnica de habitação Soares de Sousa faz uma breve descrição dos
passos realizados na implementação de uma aldeia pelo gentio Tupinambá, não
esquecendo que para o autor essa descrição serve para o Caetés morador das terras
alagoanas e pernambucanas.
O indígena no litoral do Nordeste, antes da colonização européia, estava inserido
dentro do estágio cultural denominado como de grupos agricultores. Sua habitação não era
permanente, não trabalhou a pedra para a construção de moradias nem conheceu o tijolo
ou o adobe. Não conheceu os metais, a roda, nem o torno de oleiro e não domesticou
nenhum animal economicamente rentável. Sua organização social não estava dividida em
classes. Sempre andou nu ou seminu. Seu estágio cultural, na época do primeiro contato
com o europeu era, possivelmente, estável há mil anos como populações agrícolas do
litoral e, provavelmente, a mesma de três mil anos passados.
69
Em geral, as aldeias Tupiguarani estavam situadas sobre colinas e tabuleiros. No
interior do Nordeste, essa característica está bem assinalada, além de preferir áreas
localizadas nas cabeceiras dos rios. No litoral, os povos Tupis procuraram situar suas
aldeias nas elevações e no topo dos morros, buscando em algumas regiões uma visão
panorâmica da planura. A proximidade dos rios também foi fator determinante.
Pode-se dizer que, do ponto de vista arqueológico, toda a área da Zona da Mata
norte de Alagoas e sul de Pernambuco encontram-se afetadas pelos desmatamentos e por
décadas de plantio da cana-de-açúcar, que destruíram quase todas as evidências dos
assentamentos e estruturas de habitação indígena. Estas, ao serem construídas de madeira e
de palha, deixam apenas, depois do abandono, manchas húmicas escuras, nas quais afloram
fragmentos de cerâmica e material lítico, e onde são localizadas as covas utilizadas para o
estabelecimento da estrutura de madeira que sustentava a cobertura vegetal da moradia. A
cerâmica indígena é o vestígio arqueológico mais representativo da presença indígena na
região e fora localizada em grande quantidade nas áreas elevadas que estavam entre as
maiores bacias hidrográficas da região. Com a repetida aragem da terra, principalmente
com o arado mecânico, essas manchas indicadoras da presença de malocas, desapareceram
e os achados arqueológicos limitam-se a cacos rolados e espalhados pelos campos. Porém,
apesar dessa perturbação, a maioria do material fica disposto mais ou menos no seu lugar
de origem visto que o sistema do arado é de revolvimento da terra e não de
arrasto.Contudo, foi possível perceber diferenças em alguns tipos de fragmentos cerâmicos
coletados em Pilar e Porto Calvo, ambos os municípios de Alagoas, o que favorece a idéia
de uma heterogeneidade cultural maior por trás da cortina da homogeneidade cultural Tupi.
Existem também outros vestígios arqueológicos que corroboram as descrições
realizadas pelos cronistas a respeito do trabalho com fibras vegetais e a conservação de
alguns frutos em folhas de fumo. Tais vestígios estão representados por cachimbos e fusos
que indicam uma técnica de tecelagem.
A imagem uniforme sobre o gentio que ocupava e explorava o litoral nordestino
pode ser um pouco desmistificada com o trabalho de Adriano Augusto de Araújo Jorge43
“Notícias sobre os povos indígenas que estacionaram no território do actual Estado das
Alagoas ou costumavam trazer a suas plagas repetidas correrias” no qual o autor faz uma
43
In. Abelardo Duarte. Tribos, aldeias & missões de índios nas alagoas: considerações sobre o contingente
indígena e sistematização dos seus grupos históricos e sobreviventes. Revista do Instituto Histórico de
Alagoas, vol. XXVIII, 1968, pág. 83-153.
70
descrição das tribos que percorriam o atual Estado de Alagoas, que eram as seguintes: os
Potiguaras, os Tabajaras, os Caetés, os Abacatiaras, os Aconans, os Cariris, os Coropatis,
os Moriquitos, os Chucurus, os Umans, os Vouvés, os Chocos, os Pipians, os Coropotós,
etc.
A descrição abrange grupos além do litoral pelo fato que no século XIX, as
populações indígenas restantes no território alagoano foi toda reduzida a missões
principalmente no litoral norte, onde após o colapso dessas os grupos se dispersaram pela
área da floresta atlântica.
Essa propensão de grupos quebra um pouco a imagem estereotipada do gentio
brasileiro, onde os elementos da cultura material e imaterial são transplantados para
qualquer grupo indígena esteja ele no Alto Amazonas ou nos pampas gaúchos. Uma
fórmula pronta criada pelos portugueses em sua necessidade de entender, explicar e
controlar as diversas comunidades e suas especificidades.
Como bem argumentou John Monteiro44, no século XVI, generalizar o
conhecimento sobre as populações americanas era a melhor forma de racionalizar os
esforços de apresamento e catequese desses indivíduos, mecanismos fundamentais ao
Estado, o colono e a Igreja nesse período de expansão da Fé, do Rei e do comércio
representados pelo assimilado como natural pelos portugueses que era o de civilizar os
povos bárbaros.
O pesquisador Abelardo Duarte traz em sua obra uma pequena descrição dos
grupos indígenas de Alagoas, a qual procuramos reproduzir neste espaço como referência
à diversidade étnica:
GRUPO
LOCALIZAÇÃO (Provável)
Aconãs
Porto Real do Colégio
Abacatiara
Ilhas do Médio São Francisco
Arua
Aldeia Gameleira – Palmar
Caetés
Toda costa alagoana
Cariris
Sete léguas acima de Penedo (nação)
Carapotiós
Serra Cumunati – PE. Aldeia da Alagoa Comprida – AL.
Ceococe
Baixo São Francisco
44
MONTEIRO, John Manuel (1992). As populações indígenas do litoral brasileiro no século XVI:
transformação e resistência. In: Brasil nas vésperas do mundo moderno. Portugal: Comissão Organizadora
para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses.
71
Moriquitos
Zona sanfranciscana
Natu
Baixo São Francisco
Prakio
Porto Real do Colégio
Pipipãs
Região mais ocidental das Alagoas
Prarto ou Pratto
Embocadura do São Francisco
Romaris
Baixo São Francisco
Progê
Baixo São Francisco
Shocó
Pão de Açúcar
Shucurus ou Chucurus
Pernambuco
Vouvés ou Voubrés
Região mais ocidental das Alagoas
Umas ou Uma ou Uman
Confluência dos rios Ipanema e São Francisco
Tabela 01: Grupos Indígenas do Estado de Alagoas.
Segundo Duarte muitos destes grupos já estavam aldeados no século XVIII, como
os Aruá, os Carapotióse e os Progés. No caso dos Aconãs foram localizados
remanescentes deste grupo em 1938, em Porto Real do Colégio e os Chucurus aldeados e
com remanescentes em Palmeira dos Índios.
O processo de aldeamento levado a cabo pelo Estado e pelas ordens missionárias
foi um dos elementos de solidificação da idéia de uma grande nação indígena muito bem
padronizada e aceita pelos brancos e pelos próprios índios.
As bases dessa relação estão bem documentadas na correspondência entre o Rei de
Portugal e o Governador da capitania de Pernambuco ordenando que se destinem terras e
ferramentas para a lavoura aos índios nas missões, ameaçando com castigos e perda das
terras os donatários e sesmeiros que se recusassem a cumprir as ordens reais. Um alvará de
23 de novembro de 1700, reveste-se de particular interesse, por transformar em lei o que
antes eram apenas recomendações repetidas na correspondência real. Esse alvará,
confirmado pela lei de 1703, ordena que se destine aos índios uma légua quadrada para o
estabelecimento das suas aldeias, além de determinar espaço para a igreja, o adro e um
terreno em torno para a horta do vigário, ordenanças que nem sempre foram cumpridas.
Para se ter uma idéia do processo de aldeamento dos diversos grupos étnicos em
1857, o Diretor Geral dos índios publicou mapa das aldeias da província das Alagoas e sua
situação demográfica:
72
ALDEIAS
MUNICÍPIO
H
M
TOTAL
EXTENSÃO DAS
ALDEIAS
Jacuipe
Porto Calvo
195
211
406
Quatro léguas em quadrado
Cocal
Passo de camaragibe
201
194
395
Idem
Urucú
Imperatriz
310
321
631
Idem
Limoeiro
Assembléia
59
50
109
Uma légua em quadrado
Atalaia
Atalaia
420
510
930
Duas léguas em quadrado
Sto. Amaro
Pilar
251
300
551
Uma légua em quadrado
Palmeira
Palmeira dos índios
158
81
239
Idem
Collegio
Penedo
120
115
235
Tem mais de uma légua
Tabela 02:Aldeias indígenas. Livro de Clóvis Antunes. Mapa de distribuição no anexo 7, pg. 139.
Entre 1595 e 1755 os aldeamentos indígenas estiveram sob a administração dos
missionários, passando posteriormente aos representantes civis, ocorrendo o colapso dos
aldeamentos e seus moradores se dispersando pelo litoral e pelo interior. O interessante é
que durante o século XIX, todos os grupos indígenas foram transferidos para a Zona da
Mata Norte, e os governos se vangloriavam de não mais existir índios bravios. Cidades
hoje existentes, especialmente as que têm nome de vilas portuguesas, foram originalmente
antigos aldeamentos indígenas missionários.
O Estado de Alagoas fazia parte da Capitania de Pernambuco, sendo denominada
Pernambuco Meridional e passando a ser Província das Alagoas no século XIX. A antiga
Província das Alagoas pode ser dividida em três zonas agrícolas, no período colonial:
1. A zona banhada pelos rios Manguaba, Camaragibe e Santo Antonio Grande,
essencialmente canavieira. Os maiores engenhos de açúcar aí estavam localizados
e abrangiam os município de Passo de Camaragibe e Porto Calvo;
2. A zona que compreende os municípios de Atalaia, Santa Luzia do Norte, Pilar,
Assembléia (Viçosa), Imperatriz (União dos Palmares). Os 3 primeiros municípios
produtores de açúcar e os 2 últimos de algodão. Esta zona é banhada pelos rios
Mundaú e Paraíba;
3. É uma zona onde a produção de açúcar é menor que a de algodão. Os rios da região
são o São Miguel, Coruripe e São Francisco e os municípios engloba Coruripe, São
Miguel dos Campos (produtor de cana), Palmeira dos Índios e Penedo, produtores
de algodão.
73
Os rios e as matas dessa região, ricas em madeira de lei, foram fatores importantes para
o desenvolvimento dos engenhos. De início, segundo Frei Manuel Calado foram fundados
sete engenhos de açúcar entre o Cabo de Santo Agostinho e Porto Calvo. Isto dá a idéia da
extensão dessas unidades de açúcar. A sesmaria de Cristóvão Lins abrangia os atuais
municípios de Porto calvo, Porto de Pedras, Camaragibe, Maragogi, Colônia Leopoldina e
parte de São Luis de Quitunde.
Informa-nos Gilberto Osório de Andrade e Raquel Caldas Lins que “uma primeira
evidência que ressalta é o fato de que o interesse pela ocupação territorial acentuou-se
primeiro em relação ao setor mais setentrional da bacia do Pirapama, na zona drenada
pelo rio Gurjaú”. Também Ambrósio Fernandes Brandão, segundo Capistrano de Abreu,
conseguiu terras de sesmarias na ribeira do Gurjaú. A ocupação do Cabo foi se espraiando
para o norte no limite com Jaboatão e outras sesmarias foram doadas e engenhos foram
sendo fundados. O sargento-mor Bento Gonçalves Vieira levantou os engenhos Javunda e
Gameleira.
Entretanto, a ocupação vai avançar mais na direção do rio Ipojuca e rapidamente,
ou devido a concessão de sesmarias ou através da alegação de terem encontrado terras
devolutas, a região na direção sul vai ser povoada predominantemente por engenhos de
açúcar.
A partir desses eventos, o aumento no número de engenhos, a pressão sobre os
aldeamentos ainda existentes em Alagoas irá se arrefecer e durante o século XIX ocorrerá
a fragmentação de todos os aldeamentos existentes na Província de Alagoas. E na região
limite entre os Estados de Alagoas e Pernambuco as populações indígenas irão se dispersar
pela região.
Portanto temos a presença indígena na área desde a organização autóctone até as
configurações impostas pelas instituições do Estado português e brasileiro.
74
4.2
Critérios empregados na caracterização das ocorrências
A dinâmica da pesquisa aqui desenvolvida sempre esteve associada ao tempo
exíguo para a realização da identificação, do registro e do salvamento dos locais que
apresentaram vestígios arqueológicos. Assim a definição de parâmetros que propiciassem a
racionalização do tempo despendido para a realização destas atividades foi primordial para
o pleno desenvolvimento das diferentes atividades.
Irmhild Wüst (1983), aplicou 2 critérios para a identificação de unidades de
ocupação na pesquisa realizada em Mato Grosso, sendo: 1. arranjos espaciais em áreas
pilotos; 2. aspectos morfológicos. Os critérios abordados por Wüst foram orientados pela
publicação de Chang “Settlement Patterns in Archaeology Reading. Addison Wesley
Módulos in Antropology, n. 24, 1983”, onde o autor estabelece os seguintes parâmetros
para o estudo de sítios arqueológicos: 1.continuidade espacial horizontal; 2. congruência
funcional; e 3. Contemporaneidade.
O eixo de referência estabelecido para os sítios arqueológicos em nossa pesquisa foi
determinado por dois pontos: a) congruência funcional; b) aspectos morfológicos e c)
continuidade espacial. O ponto “b” foi estabelecido com base na configuração
geomorfológica da região, reflexo dos processos de dissecação ocorridos nos últimos
10.000 anos.
Esses parâmetros estão primordialmente vinculados ao embasamento teórico
apresentado pela arqueologia da paisagem ou arqueologia contextual, referenciais que
foram apresentados e abordados no capítulo 1 e que se estabeleceram como substrato de
nossa pesquisa e modelo a ser aplicado.
As ocorrências aqui apresentadas encontram-se predominantemente no topo e
vertentes dos morros da Formação Barreiras que apresenta em sua composição litológica a
predominância de solos silto-arenosos marrom, com espessura média de 0,20 cm, e argila
silto-arenosa amarelada com espessura média de 1,30m.
É relevante deixarmos claro que passaremos a trabalhar efetivamente com duas
categorias de ocorrências: Grupo 1. ocorrências que sofreram a intervenção de salvamento
por parte da equipe que realizou os trabalhos de campo; e Grupo 2. ocorrências registradas,
mas que não foram foco de salvamento arqueológico. As ocorrências em que foi aplicada a
75
ação de salvamento, coleta sistemática e sondagens, e que se distinguem das demais, foram
selecionadas com base nos parâmetros expostos no capítulo 3, no tópico 3.2 – métodos
empregados e resultados.
E o porquê de tais critérios? Percebemos que toda as ocorrências de vestígios
arqueológicos remeteram ao perfil de sítios cerâmicos, possivelmente aldeias indígenas
distribuídas por toda a extensão da área prospectada. O dado cronológico que se apresenta
como um dos elementos fundamentais da pesquisa arqueológica, é neste caso abordado de
forma bem indireta. Primeiro temos as datações para as mudanças climáticas ocorridas na
área por volta dos 10.000 a 6.000 anos atrás, segundo, artefatos cerâmicos coletados e
analisados in situ e no laboratório os remete a técnicas de confecção tupiguarani, e
sabemos que o grupo cultural tupi-guarani estava em franca expansão no período de 1.000
até 500 anos antes da chegada dos conquistadores europeus.
É interessante ressaltar que os locais em que as ocorrências arqueológicas foram
localizadas se enquadram possivelmente no perfil de aldeia a céu aberto, com grande
concentração de artefatos cerâmicos e em menor numero foi coletado cachimbos, fusos e
material lítico (lascas e fragmentos de machados).
A análise da compartimentação do relevo da área de estudo nos fez pensar na
possibilidade de que os locais para possíveis ocupações humanas, aldeias agrícolas,
estariam localizados nas planícies fluviais e várzeas, áreas com solos mais ricos em
minerais e com acesso mais rápido a água sem ser necessário um desgaste maior de energia
para a aquisição deste elemento. Contudo, após alguns quilômetros ficou claro que as áreas
mais baixas, sujeitas a inundações, não foram escolhidas como locais para a implantação
de, aldeias, sendo essa escolha direcionada para as zonas mais elevadas e secas dos topos e
vertentes dos morros que constituem a Formação Barreira, em que realizamos as
prospecções arqueológicas. Para a totalidade da região é necessária uma análise sistêmica e
quantitativa que venha a corroborar está hipótese inicial.
76
Foto 01: Planície de inundação no quilômetro 40 do gasoduto, com tabuleiros ao fundo.
Com base nesses dados percebemos que qualquer outra atividade de prospecção
que venha a ser realizada na área deva seguir os parâmetros propostos acima, pois, será
pouco provável que sejam registrados naquela região a ocorrência de sítios arqueológicos
que não apresente o perfil de sítio a céu aberto. E corroborando as observações realizadas
pelo arqueólogo Marcos Albuquerque, todas as referências a ocupações humanas nesta
região ficaram restritas aos tabuleiros costeiros alagoanos e aos morros com relativa
extensão de topo registrados em Pernambuco. As condições geológicas para tal
diferenciação do perfil de relevo para a Zona da Mata de ambos os Estados foram
apresentadas no capítulo 2 desta pesquisa.
A nomenclatura para os sítios localizados durante o projeto GASALP irá seguir a
mesma denominação e numeração presente nas fichas de registros utilizadas pelas equipes
de campo que realizaram os trabalhos de prospecção e salvamento. Não pretendemos
alterar a denominação de “Ocorrência” ao nos referimos aos locais de vestígios
arqueológico identificados. A pretensão de se estabelecer nomes próprios, de propriedades
privadas, de características geográficas ou numéricos poderia causar problemas de
nomenclatura e registros de outros sítios pesquisados e já registrados tanto em Alagoas
como Pernambuco.
Já que se apresenta bastante problemático a questão da nomenclatura na
arqueologia brasileira, onde reuniões já foram propostos no intuito de se tentar convergir
para uma padronização das terminologias para os diferentes tipos de sítios arqueológicos,
77
tradições cerâmicas, tradições líticas, tradições e estilos em pintura rupestre, e mesmo
períodos culturais para as Américas.
Portanto, a preocupação com manutenção com a nomenclatura já empregada visa
estabelecer um padrão para as possíveis atividades de campo a serem novamente realizadas
na área, evitando-se problemas de numeração duplicada ou reiniciada, nomes homônimos
ou estranhos. Segue, também, a orientação dos trabalhos desenvolvidos no Núcleo de
Estudos Arqueológicos – NEA.
A seguir apresentamos a tabela com os sítios arqueológicos dos grupos 1:
TABELA / GRUPO 1
OCORRÊNCIAS ARQUEOLÓGICAS QUE SOFRERAM SALVAMENTO
Ocorrência
COORDENADAS
ÁREA PRELIMINAR M²
ÁREA PÓSSALVAMENTO M²
01
Lat. S 9º0´16´´
25
20.000
0,50
500
120
1000
0,50
0,50
900
2.210
3.900
2.556
2.000
2.000
11.000
11.000
27.000
27.000
29.600
29.600
2
2
68.000
68.000
10
10
6.000
6.000
160
160
Long. W 36º 36´27´´
03
Lat. S 9º 0´14´´
Long. W 36º 34´19´´
04
Lat. S 9º 0´13´´
Long. W 36º 33´24´´
05
Lat. S 9º 0´11´´
Long. W 36º 32´22´´
07
Lat. S 9º 20´53´´
Long. W 35º 45´38.5´´
08
Lat. S 9º 19´57.7´´
Long. W 35º 44´58.01´´
09
Lat. S 9º 19´53.5´´
Long. W 35º 44´46.3´´
10
Lat. S 9º 19´47´´
Long. W 35º 44´42.7´´
11
Lat. S 9º 07´7´´
Long. W 35º 44´09.5´´
12
Lat. S 9º 18´47.8´´
Long. W 35º 44´06´´
20
Lat. S 9º 06´00.4´´
Long. W 35º 35´16.6´´
21
Lat. S 9º 06´00.8´´
Long. W 35º 34´28.1´´
22
Lat. S 9º 02´00.3´´
Long. W 35º 34´07.1´´
23
Lat. S 9º 02´00´´
Long. W 35º 34´06´´
24
Lat. S 9º 03´39´´
78
Long. W 35º 33´31´´
25
Lat. S 9º 03´29
2.500
2.500
9.000
9.000
12.800
12.800
600
600
40.000
83.973
300
300
228
228
10.000
40.000
13.000
13.000
2
2
2
2
14.000
14.000
17.600
17.600
500
500
-----
-----
-----
-----
Long. W 35º 33´27´´
26
Lat. S 9º 00´36´´
Long. W 35º 32´00´´
28
Lat. S 8º 16´23´´
Long. W 35º 02´23.3´´
29
Lat. S 8º 55´00´´
Long. W 35º 28´41´´
34
Lat. S 8º 51´44´´
Long. W 35º 26´40´´
37
Lat. S 8º 47´55´´
Long. W 35º 23´32´´
38
Lat. S 8º 47´44´´
Long. W 35º 23´19´´
40
Lat. S 8º 43´33´´
Long. W 35º 20´59´´
41
Lat. S 8º 42´38´´
Long. W 35º 20´03´´
42
Lat. S 8º 40´45´´
Long. W 35º 18´48´´
43
Lat. S 8º 34´22´´
Long. W 35º 11´29´´
44
Lat. S 8º 30´42´´
Long. W 35º 08´39´´
45
Lat. S 8º 22´58´´
Long. W 35º 03´28´´
49
Lat. S 8º 22´58´´
Long. W 35º 03´28´´
50
Lat. S 8º 19´35´´
Long. W 35º 02´26´´
51
Lat. S 8º 19´31´´
Long. W 35º 02´39´´
Tabela 03 : sítios arqueológicos que sofreram salvamento.Obs. (-----) não existe registro no
Relatório do GASALP. Mapa de distribuição dos sítios ocorrências no anexo 8,pg 140.
Com base na tabela do grupo 1, é percebível que poucas foram às ocorrências que
apresentaram alterações nas dimensões dos locais de registro após a ação de salvamento.
As maiores alterações foram registradas nas 5 primeiras ocorrências localizadas na faixa do
duto, o que é corroborado pela feição do relevo, pois nessas áreas ainda é predominante
topografias planas com grandes extensões. Não temos ainda a presença intensa do
modelado dos Tabuleiros Costeiros, onde as topografias de topo estão delimitadas pelas
vertentes.
79
Dimensões em m2
21%
38%
0-1000
1000-20000
20000 -
41%
Gráfico 01:Dimensões dos sítios arqueológicos do Grupo 1.
Em apenas 31% dos sítios do grupo 1 a densidade de fragmentos cerâmicos é
inferior a 30 fragmentos. Nos outros 69% das ocorrências a densidade de fragmentos
cerâmicos é superior a 50 fragmentos, chegando ao máximo de 7.502 fragmentos coletados
no sítio ocorrência 34. Além do sítio 34 com 83.973m², as seguintes ocorrências
apresentam dimensões superiores 1000 m², as ocorrências 1, 4, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 21, 23,
25, 26, 28, 34, 40, 41, 44, 45.
Os outros 21% que apresentam dimensões superiores a 20.000m² estão localizados
da seguinte forma: o sítio ocorrência 1 esta localizado entre a lagoa Manguaba e o rio
Satuba, as ocorrências 11 e 12 estão localizados entre o rio Meirim e o rio Jitituba, o sítio
ocorrência 21 esta localizado nas cabeceiras do rio do Meio, o sítio ocorrência 34 esta
localizado entre os rios Jacuípe e o rio Uma, o sítio ocorrência 40 está localizado próximo
ao rio Serinhaém.
Assim, essas ocorrências estão distribuídas por toda a extensão da região entre os
municípios de Pilar e Cabo de Santo Agostinho. Identificamos esses sítios arqueológicos
como 5 grandes aldeias a céu aberto. Percebemos as ocorrências 11 e 12 como uma única
aldeia pois a distância entre os locais de implantação das ocupações é de apenas 654m.
Locais destinados as ocorrências podem ser visualizados no anexo 9, pg. 141.
A conjunção entre locais de ampla extensão com a incidência de um elevado índice
de fragmentos cerâmicos leva-nos a cogitar a possibilidade de que esses locais foram
80
selecionados para a implantação de sítios de habitação. Os vestígios cerâmicos registrados
nas ocorrências de alta densidade de material apresenta uma variedade na espessura,
tamanho e aditivo dos fragmentos cerâmicos. Foram coletados fragmentos com dimensões
de 5cm e que não apresentavam nenhum aditivo na composição da argila e fragmentos com
dimensões de aproximadamente 40cm e com grande quantidade de areia, de partículas de
2mm, misturado a pasta.
A diversificação dos fragmentos pode ser um elemento para pensarmos numa
diversificação de objetos variados com funções variadas. Além do que foram coletados
nesses locais de elevada incidência de fragmentos cerâmicos não só fragmentos de
vasilhas, mas também fragmentos de fusos e cachimbos. Através dos dados etnográficos e
históricos, sabemos que, muitos dos objetos de cerâmica, principalmente as grandes
vasilhas, não eram transportados quando da mudança de uma aldeia antiga para uma nova,
sendo deixados na antiga área de ocupação e com a conseqüente fabricação de novos
objetos na nova aldeia.
Provavelmente o elevado número de fragmentos nesses locais seja um indicativo de
prováveis aldeias indígenas e que aquelas áreas foram escolhidas como locais que
apresentavam alguns dos requisitos necessários ao estabelecimento de aldeias a céu aberto.
Requisitos que estão ligados a melhor forma de explorar e usufruir do contexto ambiental,
sendo eles: a) terras secas, fora das zonas de inundação, extensas e planas; b) proximidade
com os grandes rios da região, c) outros locais propícios ao implemento de roças no
percurso que pode variar de poucos metros a algumas centenas de metros, sendo esta
distância compatível com o gasto de energia necessário para o fornecimento de
mantimentos, pois quando essa distância torna-se demasiadamente grande as vezes é
melhor deslocar a aldeia, e d) possibilidade de usufruir da caça e da pesca.
Os locais destinados a áreas de acampamento ou roça são compostos pelo conjunto
de ocorrências do grupo 2 registrados na região.
TABELA / GRUPO 2
OCORRÊNCIAS ARQUEOLÓGICAS QUE NÃO SOFRERAM SALVAMENTO
Ocorrência
COORDENADAS
ÁREA EM M²
02
Lat. S 9º 0´15´´
0,50
Long. W 36º 35´24´´
06
Lat. S 9º 25´49.7´´
20
81
Long. W 35º 49´25.9´´
13
Lat. S 9 16´27.6´´
7
Long. W 35º 41´57.5´´
14
Lat. S 9º 16´13.9´´
9
Long. W 35º 41´50.1´´
15
Lat. S 9º 16´11.6´´
6
Long. W 35º 41´48´´
16
Lat. S 9º 16´47.6´´
3
Long. W 35º 41´29.6´´
17
Lat. S 9º 15´27.1´´
22
Long. W 35º 41´13´´
18
Lat. S 9º 8´11.7´´
168
Long. W 35º 36´43.7´´
19
Lat. S 8º 7´28´´
18
Long. W 35º 36´07.2´´
27
Lat. S 8º 57´50´´
20
Long. W 35º 31´05´´
30
Lat. S 8º 54´22´´
9.000
Long. W 35º 28´21´´
31
Lat. S 8º 53´19´´
2.500
Long. W 35º 27´35´´
32
Lat. S 8º 53´10´´
2.900
Long. W 35º 27´23´´
33
Lat. S 8º 52´14´´
100
Long. W 35º 26´44´´
35
Lat. S 8º 51´16´´
6.000
Long. W 35º 26´17´´
36
Lat. S 8º 50´59´´
950
Long. W 35º 25´54´´
39
Lat. S 8º 47´00´´
340
Long. W 35º 21´18´´
46
Lat. S 8º 22´45´´
3
Long. W 35º 03´06´´
47
Lat. S 8º 22´44´´
-----
Long. W 35º 02´51´´
48
Lat. S 8º 22´32´´
-----
Long. W 35º 02´40´´
52
Lat. S 8º 18´07´´
-----
Long. W 35º 02´44´´
53
Lat. S 8º 16´23´´
-----
Long. W 35º 02´23´´
Tabela 04 : sítios arqueológicos que não sofreram salvamento Obs. (-----) não existe registro no
Relatório do GASALP. Mapa de distribuição das ocorrências no anexo 8, pg.140
82
O perfil das ocorrências do grupo 2 é o de locais com pouca extensão, com a
exceção de 4 ocorrências que apresentam dimensões superiores a 1000 m²: o sítio
ocorrência 30 com 9.000m², o sítio ocorrência 31 com 2.500m², o sítio ocorrência 32
com2.900 m² e o sítio ocorrência 35 com 6.000 m².
Esses sítios arqueológicos poderiam ser classificados como prováveis locais de
estabelecimento de aldeias, mas a freqüência de uma baixa densidade de fragmentos
cerâmicos registrados nesses locais e sua proximidade com o sítio ocorrência 34, faz com
que pensemos esses locais como zonas de influência do sítio 34 para possíveis atividades
temporárias.
Dimensões em M2
18%
0-1000
1000-10000
82%
Gráfico 02: Dimensões das ocorrências do grupo 2.
Em 64% das ocorrências do grupo 2 a densidade de fragmentos cerâmicos não
ultrapassa a quantidade de 10 fragmentos. Mesmo as 4 ocorrências que apresentam
dimensões superiores a 1000 m² a relação dimensão x fragmentos cerâmicos não é superior
a 1 unidade.
A situação que encontramos nas ocorrências do grupo 2 é completamente contrária
das ocorrências do grupo 1. Por esse motivo descartamos a possibilidade de que esses
locais tenham sido utilizados para a implantação de aldeias a céu aberto, sendo
possivelmente áreas destinadas exclusivamente para a produção agrícola. Esta hipótese
pode ser plausível através das dimensões desses locais que não ultrapassavam na maioria
dos casos 20 m², área insuficiente ao estabelecimento de uma aldeia indígena.
83
Uma característica importante dos dois grupos é que para os prováveis sítios
habitação as distâncias entre eles é bastante elevada e estão implantados nas áreas extensas
mais próximas dos grandes rios da região, enquanto para os sítios acampamento ou de roça
percebemos através do mapa de distribuição das ocorrências, nos anexo, que estão
localizados em grupos próximos aos grande sítios de habitação. Mapa de distribuição das
ocorrências no anexo 8, pg 140.
O grau extremamente elevado de distribuição dos vestígios arqueológicos que
muitas vezes se apresentavam recobrindo toda a extensão do topo dos tabuleiros e em
alguns casos transportados pelas vertentes, além de servir de referencial para identificar os
locais de ocupação indica as condições de conservação e possibilitam obter uma
delimitação espacial dos vestígios através da extensão máxima destes, numa região em que
a incidência de alteração das ocorrências é de 100% nos registros realizados.
4.3
Condições de conservação
A localização das ocorrências numa área que atualmente a exploração agrícola da
cana-de-açúcar é a atividade econômica predominante provocou profundas alterações na
feição da vegetação nativa, bem como, na deposição das camadas sedimentares. Não
devemos esquecer que o tempo de exploração agrícola da cana-de-açúcar na Zona da Mata
de Alagoas e Pernambuco remonta aproximadamente ao século XVII, época em que a
intensidade do plantio obteve um aumento significativo.
As técnicas aplicadas para a preparação das áreas para o plantio da cana-de-açúcar
perpassam pelas atividades desenvolvidas a base de enxada até a utilização de máquinas
pesadas, tratores, associadas a técnicas antigas de preparação do solo para um novo plantio
representado pelas queimadas dos remanescentes da colheita. Nesse caso como as camadas
de registro dos vestígios arqueológicos não ultrapassa a profundidade de 30cm, a
incidência por décadas do fogo sobre o solo e vestígios, principalmente a cerâmica,
possivelmente veio a acarretar alterações físicas na argila e minerais presentes na pasta.
Muitos dos fragmentos coletados durante o salvamento arqueológico apresentaram
alterações de coloração, e mesmo, manchas negras provenientes de exposição ao calor que
não foi o da preparação dos antigos vasilhames em fornos utilizados para secagem dos
84
recipientes de argila. Outro elemento de degradação do material cerâmico é visualizado
através da destruição do tratamento de superfície que existia nas paredes externa e interna
dos fragmentos, sendo provavelmente pinturas, pois foram coletados fragmentos com esse
tipo de decoração externa.
Foto 02: Fragmento de cerâmica da ocorrência 04.
A alteração provocada nas ocorrências por enxadas é de menor impacto do que os
arados puxados pelos tratores e que já conseguem subir as vertentes dos morros, assim
provocando o retrabalhamento das camadas de deposição e conseqüentemente dos
vestígios ali depositados.
Essa característica de alteração das ocorrências é perfeitamente visível na intensa
distribuição dos vestígios arqueológicos. A cerâmica é o elemento principal dentro dos
achados arqueológicos, entretanto em nenhum sítio ocorrência foi encontrado vasilhas
preservadas de qualquer tamanho, tal o grau de destruição dos objetos que são perceptíveis
em fragmentos que oscilam entre dimensões de cerca de 3cm a 30cm. A própria disposição
dos fragmentos depositados em solo é um exemplo claro da heterogeneidade da deposição
e disposição dos inúmeros fragmentos provocada pelo contínuo processo de revolvimento
do solo pela ação humana manual e mecânica.
85
Todavia, sabemos que existe um intenso trabalho de máquinas com arado nessas
vertentes realizando a preparação para o plantio da cana.
Anteriormente, essa atividade era realizada, primordialmente, por força humana,
com enxada, o que infligia um nível de alteração dos depósitos arqueológicos de menor
intensidade. Realizamos essa observação tendo como base os trabalhos desenvolvidos pelo
Núcleo de Estudos Arqueológicos, que manteve diversos contatos com agricultores que
localizaram em suas propriedades vestígios arqueológicos quando realizavam em suas
plantações atividades com ferramentas manuais. A ação desses equipamentos sobre os
depósitos arqueológicos possivelmente não iria provocar uma fragmentação tão elevada
dos vestígios cerâmicos
Foto 03: Ocorrência 28. Fragmentação de cerâmica arqueológica.
A condição de conservação, de disposição e deposição dos fragmentos cerâmicos
semelhantes pode ser atribuída a todos as ocorrências registrados pelo Projeto GASALP,
haja vista que a ação antrópica, através da utilização do arado, vem provocando profundas
alterações nas feições ambientais e geomorfológicas em toda a região da Zona da Mata dos
Estados de Alagoas e Pernambuco há várias décadas.
86
Outro o elemento complicador para a conservação dos depósitos arqueológicos
nesta região é a profundidade com que as lâminas dos arados mecânicos alcançam o solo.
As lâminas revolvem o solo numa profundidade de mais de 50cm, atingindo o horizonte
pedológico eluvial e o sedimento argiloso45 dos depósitos sedimentares da Formação
Barreiras. Em todas as ocorrências detectados pelo Projeto GASALP os fragmentos de
cerâmica arqueológica estavam presentes apenas na camada 1 da Formação Barreiras.
A fotografia abaixo revela a composição diferenciada das camadas de argila bem
delimitada pela coloração dos sedimentos. Este tipo de composição litológica esta presente
em todos as ocorrências detectados na zona da mata, e em todos eles essa camada vem
sendo revolvida pela ação humana e pelos processos erosivos.
Foto 04: Abertura de vala. Detalhe das camadas de argila da Formação Barreiras.
45
Horizonte eluvial: 0,0 a 0,30cm Depósito Sedimentar – sedimento argiloso 2: 0,30 a 1,20cm. Relatório
Final GASALP.
87
Com relação aos processos erosivos, que tratamos no capítulo concernente a
configuração ambiental da área de estudo, os problemas relacionados à relação
qualidade/estabilidade do solo vinculado a cobertura vegetal na região de mata atlântica, é
primordial, assim a manutenção do solo nesta região é devida à existência desta cobertura
florestal que funciona como fornecedora de minerais e de elemento de coesão das camadas
de argila.
Com a retirada da cobertura vegetal para a exploração econômica da cana-deaçúcar o solo passou a ser mais exposto aos efeitos das chuvas e ventos. No período de
inverno, que nessa região dura cerca de 3 a 4 meses, o movimento de massa dos topos dos
morros em direção das vertentes e destas para as áreas dos vales e várzeas provoca
alterações dos depósitos arqueológicos existentes. A intensidade do transporte de partículas
dos morros em direção aos riachos e rios toma uma energia maior. O processo de
dissecação deste ambiente geomorfológico apresenta um incremento a partir de 10.000
anos atrás, se tornou mais intenso com a ausência da principal barreira de proteção do solo
que era a floresta.
Foto 05: Fragmentos isolados de floresta entre as plantações de cana-de-açúcar – Alagoas.
88
Em poucas setores da área de estudo existem alguns locais em que ainda permanece
uma concentração de floresta, mas não apresentando o perfil primário, sendo assim uma
cobertura florestal secundária, e nos locais de existência dessas concentrações,
denominadas ilhas, a exceção do sítio ocorrência 1, não foi registrado a incidência de
vestígios arqueológicos in situ. Assim, possivelmente tais locais em períodos anteriores
sofreram processos de degradação identificados nos demais locais de registro de sítios
arqueológicos. Cabe para esses locais de concentração de floresta secundária uma outra
abordagem metodológica que permita a elaboração de hipóteses e não conjecturas.
4.4
Aspectos morfológicos do relevo
Sendo a relação sítios/ambiente uma das variáveis de nossa pesquisa, identificar a
morfologia do relevo da região é importantíssimo quando nos propusemos a identificar
preliminarmente um padrão no tipo e local de ocupação dos sítios arqueológicos.
A presença mais superficial do Embasamento Cristalino, com vários locais de
afloramento, na Zona da Mata de Pernambuco, ao contrario do que ocorre na Zona da Mata
de Alagoas onde os depósitos sedimentares da Formação Barreira apresenta maior
espessura influencia na configuração do relevo da região. Em Alagoas, como já foi
apresentado, o embasamento cristalino não se apresenta tão superficialmente o que acarreta
a formação de um relevo mais tabular, daí a denominação de Tabuleiros Costeiros para a
morfologia dos morros existentes naquela região. Em alguns casos a extensão dos topos
chega a 1000 metros, em muitos casos os tabuleiros apresenta-se maior comprimento do
que a largura.
89
Foto 06: Visão parcial de topo extenso dos Tabuleiros Costeiros alagoanos. Ocorrência 12.
A morfologia dos morros em Pernambuco apresenta-se mais diferenciada, com a
ocorrência do embasamento cristalino mais próximo a superfície. Este perfil faz com que
não seja possível um maior acúmulo do manto de intemperismo nos morros existentes,
acarretando assim, colinas mais restritas em relação à extensão das áreas elevadas. Com a
presença do cristalino, muitas vezes exposto em vários pontos da Zona da Mata
pernambucana, os poucos depósitos sedimentares foram mais rapidamente transportados
para a região de vale e várzeas inundáveis da região.
90
Foto 07: Formações colinares dos morros pernambucanos. Ocorrência 51.
Temos, portanto dois tipos de morfologia para o relevo na Zona da Mata de ambos
os Estados, o perfil tabular (Alagoas) e colinas convexas (Pernambuco). O interessante é
que o maior número de registros de sítios arqueológicos se concentrou na zona dos
tabuleiros, possivelmente por apresentarem topos mais extensos e que permitiam o
estabelecimento de aldeias indígenas. Mesmo assim, essas áreas de topo extensos não são
tão numerosas se fizermos uma comparação com as áreas de vales e várzeas do litoral
norte de Alagoas. Para as colinas em Pernambuco, a incidência de poucos registros de
sítios arqueológicos pré-históricos está ligado possivelmente a ação do creeping que
removeu os vestígios arqueológicos ou devido a superfície de cimeira não ter comportado
grandes assentamentos. 46
Essas áreas baixas e planas, que hoje , são intensamente ocupadas pelas populações
de pequenos agricultores e por unidades industriais (usinas de açúcar), áreas com maior
oferta de água e de sais minerais são também uma variável em nosso estudo, pois mesmo
sendo áreas extensas e com abundância de água, sem que seja necessário despender muita
46
Fonte: CORREA, Antonio Carlos de Barros. Comunicação pessoal.
91
energia para sua aquisição, bem como, de peixes e crustáceos, não apresentou nenhum
registro de sítio arqueológico quando da realização do Projeto GASALP.
Uma característica importante na morfologia dos vales da área de estudo é o
formato em “V”, decorrente da formação dos vales da região encaixados entre os morros
dissecados. Mesmo que em alguns locais se apresentem vales extensos, áreas atualmente
ocupados por construções contemporâneas ou como área destinada a pasto de eqüinos e
bovinos, mas a incidência de vales com poucos metros de extensão é predominante por
toda a região. Em alguns desses vales estreitos encontra-se remanescentes de floresta
secundária.
Ainda na categoria de terras baixas temos a existência das várzeas e terraços
fluviais. O conjunto das várzeas e terraços, devido a estrutura hidrográfica, apresentam-se,
quase que o ano todo, inundadas pelas águas dos rios e riachos da região. Em muitos locais
essas zonas inundadas formam verdadeiros charcos recobertos por uma vegetação aquática.
Foto 08: Terras alagadas próxima ao rio Jitituba – Alagoas.
Assim, procuramos propor o estabelecimento de alguns conceitos (A, B, C, D e E)
como categorias de análise indicativo das diferentes formas do relevo para a região da
Zona da Mata de Alagoas e Pernambuco, com o intuito de auxiliar nas análises dos
92
possíveis locais de existência de sítios arqueológicos de qual a recorrência mais presente
em relação a forma. Apresentamos na tabela abaixo essas categorias:
Tabela com as categorias morfológicas do relevo da zona da mata Alagoas/Pernambuco.
CATEGORIA
FORMA DE RELEVO
CARACTERÍSTICA
A
Morro I
Topo plano e extenso
B
Morro II
Topo convexo
C
Vertentes
Amplas com desnível entre 20 e 40m
D
Vale
Encaixados em “V”
E
Várzea
Terras inundáveis
Tabela 05: Categorias morfológicas do relevo da zona da mata Alagoas/Pernambuco.
Mesmo que a denominação de forma de relevo das categorias A e B sejam descritas
como “morro”, elas divergem em suas características, tabular e colinar, como também na
distribuição geográfica que nos referimos anteriormente. Para a categoria de relevo A sua
localização é restrita as bacias hidrográficas da Zona da Mata alagoana, além de apresentar
áreas amplas em seu topo, enquanto a categoria de relevo B que se localiza
geograficamente nas bacias hidrográficas da Zona da Mata sul pernambucana são formadas
por morros mais baixos com áreas de topo menos extensas. É relevante esclarecer que a
categoria de relevo para os morros ao Sul da cidade do Recife, não apresenta a mesma
característica de relevo dos morros ao Norte da capital pernambucana. Possivelmente essas
diferenciações, com base em dados geológicos, são decorrentes da presença do
embasamento cristalino alterado.
Outros elementos importantes na análise dos morros da região são as vertentes que
em alguns locais chegam a se estender por cerca de 1000 metros e com incisão de 50 a 60
metros. O histórico das pesquisas arqueológicas realizadas em aldeias, em várias regiões
do país, demonstra que as vertentes tem um papel importante como local de registro de
sítios arqueológicos. Em algumas regiões a escolha pelas vertentes está ligada a morfologia
específica da região, ao campo de visão do entorno, a localização em relação á fonte de
água, ou mesmo, a decisão de se evitar o acúmulo de água nas unidades habitacionais, por
ser as vertentes um local de transporte e não de acúmulo de água e sedimentos.
93
Percebemos que é relevante nos trabalhos desenvolvidos na área da pesquisa
diferenciar o posicionamento dos vestígios arqueológicos posicionados em vertentes,
assim, procuramos elaborar um esquema de classificação das vertentes da área de estudo
percebendo os diferentes locais de posicionamento dos vestígios arqueológicos. Com base
nessa proposta as vertentes são divididas em três unidades: Unidade 1 – Alta Vertente;
Unidade 2 – Média Vertente; Unidade 3 – Baixa Vertente.47
Os parâmetros estabelecidos aqui serviram de substrato para o reconhecimento dos
locais em que predominaram o posicionamento das ocorrências, a localização específica
destes na morfologia do relevo e as relações estabelecidas com o contexto ambiental
através da produção de energia para a manutenção da ocupação humana.
4.5
Implantação das ocorrências arqueológicas no relevo
Percebemos que a localização dos sítios arqueológicos é mais numerosa na região
dos tabuleiros alagoanos, onde estão 34 ocorrências do total dos 53 sítios arqueológicos
cadastrados. Dentro do contexto geomorfológico as ocorrências estão numa região de
antiga presença da floresta tropical úmida, atualmente substituída pela plantação de canade-açúcar e estão inseridos numa rede de drenagem de rios paralelos que convergem em
direção ao oceano Atlântico.
Dentro do grupo 1, ocorrências que sofreram salvamento arqueológico, o local
específico destes no relevo está dividido entre a localização no topo dos morros e nas
vertentes dos mesmos, em suas três unidades, poucos são as ocorrências que estão
localizadas no sopé das elevações ou nos vales.
A tabela a seguir apresenta as ocorrências registradas em relação a implantação
morfologia do relevo da área:
IMPLANTAÇÃO NO RELEVO
OCORRÊNCIAS REGISTRADAS
MORRO (A e B) – TOPO
26
50,00%
ALTA VERTENTE
15
28,00%
47
A divisão da vertente em unidades segue a seguinte classificação: a alta vertente está ligada ao limite entre
a vertente e o topo do morro. A média vertente faz referência a meia encosta do morro, enquanto a baixa
vertente faz referência ao sopé do morro ou a área de contato da vertente com o vale.
94
MÉDIA VERTENTE
06
11,00
BAIXA VERTENTE
06
11,00
VALE
0
0,00%
VÁRZEA
0
0,00%
Tabela 06: Porcentagem das ocorrências em relação a morfologia do relevo.
MORRO (A e B)
– TOPO
0%
11%
11%
ALTA VERTENTE
0%
50%
28%
MÉDIA
VERTENTE
BAIXA
VERTENTE
VALE
VÁRZEA
Gráfico 03: Freqüência das ocorrências nas unidades morfológicas do relevo.
O conjunto de sítios arqueológicos que foram foco do Projeto GASALP de
salvamento arqueológico, 53 ocorrências, e que estão distribuídos entre os Estados de
Alagoas e Pernambuco, comprovam através dos dados que a hipótese de que os prováveis
locais de ocupação são as áreas mais elevadas dos morros da região. Porém, diferente do
que foi pensado, a relação de exclusividade dos topos dos morros como locais elevados
mais propícios a ocupação não é tão consistente como foi atribuído em análises
preliminares.
As primeiras observações realizadas sobre os dados de campo indicam que 45% das
ocorrências estão implantados nas zonas de vertentes assim divididas: 28% na Alta
Vertente; 11,4% na Média Vertente e outros 11,4% na Baixa Vertente. Nos vales e várzeas
inundáveis não foi registrada a presença de vestígios arqueológicos.
Outro dado interessante em relação às informações de posicionamento das
ocorrênciasestá ligado a altimetria dos mesmos na morfologia do relevo.
95
POSICIONAMENTO/TOPO
POSICIONAMETO/VERTENTES
Ocorrências
Altimetria-metros
Ocorrências
Altimetria-metros
02
100
01
110
03
145
06
135
04
105
09
97
05
104
10
93
07
147
13
117
08
150
14
134
11
132
16
71
12
140
17
132
15
130
18
155
19
160
23
133
20
139
24
147
21
119
29
143
22
144
31
140
25
148
32
140
26
138
33
152
27
152
38
150
28
142
39
128
30
150
45
94
34
148
47
70
35
122
48
68
36
137
49
10
37
108
50
98
40
160
51
110
41
152
52
57
42
143
53
08
43
68
----
----
44
70
----
----
46
95
----
----
Tabela 07: Posicionamento das ocorrências em metros.
60% das ocorrências arqueológicas estão inseridas em altimetria superior a 100
metros, enquanto que este índice é de 90% para os registros de ocorrências em áreas de
topo dos tabuleiros. A ocorrência de vestígios em altimetria superior a 100 metros para as
96
vertentes, inclui esses registros na categoria de alta vertente, limites com a área de topo,
que estabelecemos como subdivisão para as vertentes da região.
Percebesse, também, um decréscimo altimetrico das ocorrências em vertentes
quando nos dirigimos em direção as colinas convexas da Zona da Mata Sul de
Pernambuco, identificado na tabela acima através dos registros de altimetria das
ocorrências 45, 47, 48, 49, 50, 52 e 53.
A questão do posicionamento dos vestígios arqueológicos nas unidades das
vertentes em uma área que a ação antrópica, provocou e provoca profundas alterações nos
depósitos arqueológicos, demanda uma atenção maior em relação as áreas mais elevadas
próximas dessas vertentes através da observância de possíveis sinais de transporte de
vestígios deslocados pela ação do arado mecânico, por processos erosivos. Isso não anula a
possibilidade da ocupação ter ocorrido primordialmente na vertente.
Foto 09: Km 48 do gasoduto. Município de Messias – Alagoas.
Uma feição importante na formação das vertentes é que elas convergem para os
vales e várzeas mais estreitas que apresentam os terrenos encharcados,bem como, a
presença de pequenos riachos. Na imagem acima podemos visualizar a ocupação,
contemporânea, da parte baixa de uma vertente com a presença de um riacho na cota mais
inferior. Na seqüência da imagem podemos acompanhar o percurso do riacho e a
97
convergência de outras vertentes em direção a passagem da água encravada entre os
morros.
Entretanto, constatamos que para a região da Formação Barreiras entre os Estados
de Alagoas e Pernambuco, os dados de altimetria corroboram as hipóteses de que os locais
preferenciais para ocupação, nesta zona, são as terras mais elevadas principalmente as
cotas acima dos 100m. 90,5% das ocorrências registradas estão concentrados entre os 50 e
160m.
No universo de ocorrências registradas nas áreas mais elevadas (topo dos morros,
altas e médias vertentes), 71% destes estão localizados na fração alagoana da Formação
Barreiras, enquanto apenas 29% estão localizados na fração correspondente a Pernambuco.
Consta do relatório elaborado pela equipe da Fundação Seridó a seguinte distribuição:
Ocorrências registradas em Alagoas
Ocorrências registradas em Pernambuco
01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 11, 12, 13, 14,
37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50,
15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28,
51, 52, 53.
29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36.
Tabela 08: Delimitação das ocorrências por Estados.
Os dados propõem que as estratégias de ocupação da área da pesquisa foram: num
território intensamente dissecado, caracterizado por vales encravados e encharcados entre
os morros, com várzeas e terraços inundáveis durante aproximadamente 6 meses, com as
terras baixas formadas em grande parte por uma vegetação de água-pé, os sítios
arqueológicos foram implantados nas terras elevadas e secas, locais selecionados para o
estabelecimento das ocupações que estavam fora do alcance das águas.
98
Foto 10: Terras elevadas dos topos e vertentes dos tabuleiros alagoanos. Ao fundo, em verde, baixada em
direção ao vale.
Dentro do conjunto de sítios arqueológicos implantados nas terras mais elevadas
dos tabuleiros costeiros alagoanos com seus topos mais extensos e vertentes mais amplas
com desníveis de 20 a 40m, temos o registro dos sítios ocorrências 1, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,
11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35,
36, que apresentam as mesmas características quanto a feição pós-deposicional dos
vestígios arqueológicos.
Registros de sítios
Vertentes
50%
50%
Topos
Gráfico 04: Porcentagem das ocorrências no relevo alagoano.
99
Procuramos salientar como o aspecto morfológico do relevo foi peça fundamental
no posicionamento das ocorrências e registros arqueológicos. A descrição do perfil dos
vales e várzeas fornece um dado primordial para o entendimento do processo de ocupação
e exploração do território. Em Alagoas a formação geológica da região favorecendo a
constituição de solos com elevado grau de permeabilidade fazendo com que as águas de
inverno que se prolongam entre os meses de abril até outubro, tenham a facilidade de
percorrer os sedimentos areno-argilosos entre o topo dos tabuleiros e a base dos morros,
nos vales e várzeas que irão apresentar-se profusamente encharcados por um período de
aproximadamente 7 meses do ano.
Os resultados para a relação relevo e sítios arqueológicos em Pernambuco é
bastante divergente em relação ao contexto existente em Alagoas, a começar pelo número
de registro de sítios que em Pernambuco é reduzido a 15 ocorrências. É salutar lembrarmos
que nos referimos aos registros de ocorrências feitos nas terras altas que correspondem aos
topos dos morros, altas vertentes e médias vertentes.
As variáveis da configuração dos morros em Pernambuco são bastante diferentes e
importantes em relação ao caso alagoano. Além da redução acentuada de ocorrências
arqueológicas, há uma diminuição drástica da presença de vestígios arqueológicos nas
vertentes dos morros em território pernambucano. Não podemos negligenciar a
consideração que realizamos referente à influência da presença do embasamento cristalino,
de forma superficial, sob os depósitos sedimentares em Pernambuco, o que acarretou na
forma colinar, ou convexa, dos morros daquele setor da zona da mata. A feição destes
morros é de estarem formados por topos nas mesmas cotas registradas em Alagoas, mas
não apresentam as mesmas medidas de extensão dos topos, em muitos casos bastante
estreitos e com desníveis em suas vertentes que são superiores a 40m. Além de que a
presença do cristalino muitas vezes é constatada através de afloramentos graníticos que em
Pernambuco são mais acentuados.
100
Foto 11: Registro de ocorrência arqueológica nos morros pernambucanos.
As ocorrências que foram registradas na Zona da Mata Sul de Pernambuco nas
denominadas terras altas foram às ocorrências 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48,
50, 51, 52. Nesse conjunto de ocorrências que englobam os grupos 1 e 2 das ocorrências,
para as ocorrências de Alagoas foram utilizados também os dois grupos, a relação de
porcentagem ficou da seguinte maneira: 67% dos foram registrados nos topos dos morros
enquanto 33% destes foram registrados nas vertentes.
Registros de sítios
10
8
6
4
2
0
Vertentes
Topos
Gráfico 05: Porcentagem das ocorrências localizadas em Pernambuco em relação a sua posição topográfica.
101
A configuração dos vales tanto em Pernambuco quanto em Alagoas não fornece a
extensão de terras necessárias para o tipo de técnicas de habitação e de agricultura
conhecida pelas populações indígenas moradoras de ambientes de florestas úmidas.
Para Pernambuco as terras altas apresentam outra característica decorrente da
formação geológica e dos processos erosivos. Como o embasamento cristalino no Sul de
Pernambuco está mais superficial o processo de dissecação e de transporte de materiais na
região fez com que a morfologia do relevo tivesse outro perfil. Os dados de registro das
ocorrências em relação à morfologia do relevo comprovam essa alteração. A presença de
vestígios arqueológicos nas vertentes dos morros pernambucanos apresenta uma redução
acentuada com a presença de apenas 05 ocorrências arqueológicos posicionados nas
vertentes da área de estudo.
Os 67% das ocorrências restantes estão posicionados no topo dos morros da região.
Mesmo não apresentando uma extensão ampla, como é o caso da configuração em
Alagoas, os topos elevados da área foram preteridos em razão da elevada incisão fluvial
entre as vertentes, em muitos casos superior a 30m, e com ângulo bastante acentuado. Ver
anexo 10, pg. 143, planta Km 129,0 ao Km 130,0.
As informações sobre as ocupações de sítios arqueológicos a céu aberto dão conta
de que os locais preferencialmente escolhidos para o estabelecimento das ocupações estão
ligados predominantemente as vertentes. Esses locais são naturalmente mais propícios ao
não acúmulo de água no período das chuvas. Na área alagoana as vertentes foram
utilizadas como áreas de ocupação por 28% das ocorrências, enquanto 50% das
ocorrências foram implantadas nos topos. Como já mencionamos as formações superficiais
da região apresentam um nível de permeabilidade acentuado, devido a ausência do
cristalino, evitando o acúmulo de água na superfície ou o carreamento do sedimento.
No caso do relevo Pernambucano o cristalino evita esse acúmulo de água nos topos,
mas provoca um processo de erosão e transporte dos sedimentos com maior energia, assim
o perfil do relevo é alterado apresentado colinas estreitas e com exposição do cristalino e
vertentes curtas e bastante inclinadas.
Percebesse que um dos fatores de escolha dos locais de assentamento na região está
ligado a morfologia dos morros. Ocorreu uma preferência pelas áreas mais elevadas dos
tabuleiros costeiros na Zona da Mata de Alagoas. A configuração específica do relevo na
102
Zona da Mata Sul de Pernambuco apresenta uma incidência menor de ocorrências
arqueológicas. Ver anexo 10, pg. 143, plantas das ocorrências 1, 11, 12, 21 e 34.
Mencionamos anteriormente os efeitos na região do aspecto pluviométrico e da
permeabilidade do solo que favorece a existência de solos encharcados e por vários meses
do anos sob as águas dos rios e riachos. Por esse motivo a rede de drenagem da área é mais
um elementos de análise a ser levado em consideração, o que será realizado em outro
momento deste trabalho.
Não podemos negligenciar outros dois ingredientes que influenciaram as possíveis
escolhas de locais mais propícios aos assentamentos humanos. A cobertura vegetal
existente sobre a mata atlântica e a configuração climática da região associada ao perfil do
relevo valorizaram as terras mais elevadas como mais adequadas tanto a implementação da
produção agrícola e ao estabelecimento de unidades habitacionais, já que as ocorrências
apresentam o perfil de sítios a céu aberto.
A cobertura vegetal da Zona da Mata de Alagoas e Pernambuco é apresentada nos
mapas como de Floresta Ombrófila Densa e Aberta, ou Floresta Perenifólia Higrófila
Costeira, popularmente chamada de mata atlântica. Não é mais desconhecido como essa
cobertura vegetal é fundamental para a manutenção dos níveis de sais minerais necessários
a fertilização do solo sob a biomassa da floresta. A retomada da cobertura vegetal na região
não é inferior a 500 anos, e provavelmente está ligada ao processo de umidificação da
região a partir de 10.000 anos atrás.
Apenas no último século é que o processo de desmatamento alcançou níveis
elevados ao ponto de retirar quase que completamente a antiga cobertura de floresta
ombrófila densa. Relatos de instituições oficiais da Província de Pernambuco e dos
representantes das terras de Alagoas, atestam que é no século XIX que se intensifica a
derrubada das matas para a implantação dos engenhos e usinas de açúcar (final do século)
e comercialização das madeiras.
Em épocas pretéritas a extensão da floresta ombrófila densa chegava aos limites
com a floresta amazônica pelo interior do Nordeste brasileiro e no litoral estava presente
por toda faixa costeira do Brasil. As condições de habitação neste ambiente de floresta com
umidade em torno dos 80% associado a existência elevada de insetos hematófagos faz com
que as áreas mais baixas próximas as águas sejam profundamente insalubres. A própria
tecnologia de habitação dos índios brasileiros atesta essa hipótese. A rotatividade das
103
construções das casas procurava evitar a elevada presença de insetos dentro das unidades
habitacionais, além de renovar a estrutura das moradias expostas ao apodrecimento dos
materiais utilizados nas construções, palha, que nas zonas de mata densa e úmida tinham
seu processo de degeneração mais acelerado. O tempo de uso de uma habitação indígena
na zona de floresta era de aproximadamente 3 a 4 anos.
Já apresentamos a descrição que Gabriel Soares de Sousa em seu livro “Tratado
descritivo do Brasil...” faz sobre a preferência dos índios do litoral nordestino pelas terras
altas com boa ventilação, insolação e amplas o suficiente para o implantação da lavoura
necessária a sustentabilidade do grupo.
As condições de insalubridade a qual nos referimos acima é composta de 5
elementos climáticos: 1. temperatura; 2. precipitação; 3.evaporação; 4. umidade; 5.
insolação, que tornavam desfavoráveis a ocupação das terras mais baixas (vales e várzeas)
na área de estudo quando da presença da cobertura vegetal. Entre os meses de março a
setembro a média da precipitação se eleva de 150 a 350mm, acompanhada de uma queda
de temperatura que decresce dos 25°C para 23°C. Essa queda da temperatura provoca
alterações no índice de insolação que também apresenta uma redução acentuada o que faz
com que os níveis de evaporação passem dos 330mm para aproximadamente 170mm, a
relação dos níveis de precipitação e evaporação configuram um ambiente extremamente
úmido com a presença de água em suspensão, cerca de 80%, e elevação do volume de água
nas calhas dos rios e riachos da região. Nesse contexto climático 7 meses do ano na região
são de intensa presença de água em solo. Nesse ambiente os solos da região irão apresentar
um índice de PH entre 4,5 e 5,5, que irá exercer uma pressão muito grande sobre o tipo de
cultura agrícola aplicada na área, principalmente quando temos a informação de que a
mandioca, fonte alimentar das populações indígenas, não suportar solos com taxas de PH
inferior a 5,0.
A relação de distância entre as ocorrências arqueológicas e as fontes de água,
riachos e rios principais, não apresenta grandes distâncias. O perfil ambiental da região
favorece a oferta em abundância de água em vários níveis com a presença de lagoas,
pequenos e médios riachos e rios de médio porte como o rio Meirim no município de
Messias, a rios de maior volume como o rio Camaragibe, rio Mundaú, rio Una e rio
Ipojuca, esses rios formam as principais bacias hidrográficas da região.
104
A composição hidrográfica na região foi importantíssima à sustentabilidade das
ocupações pré-históricas como também das ocupações históricas no que se refere ao acesso
água para o consumo humano e oferta de alimentos. Em quase sua totalidade os cursos de
água da área apresentam suas nascentes inseridas na própria zona da mata de ambos os
Estados e a rede de drenagem é bastante numerosa. Essa configuração favoreceu para que a
média das distâncias entre as ocorrências arqueológicas e os cursos de água apresentasse
em alguns casos 70m e não ultrapassasse 15 km entre algumas ocorrências e os rios mais
volumosos e piscosos.
Mapa 01: Detalhe da rede hidrográfica na área de mata atlântica, em verde, nos Estados de Alagoas e
Pernambuco. 48
48
http://mapas.ibge.gov.br.
105
As tabelas abaixo apresentam as ocorrências e a relação de distância com alguns
dos principais rios da região. 49
As ocorrências correspondem a prováveis locais de aldeias indígenas.
Sítio Ocorrência
Rios
Distância
Direção
01
Rio Satuba
4 km
Norte
11
Rio Jitituba
5 km
Norte
12
Rio Jitituba
5 km
Norte
21
Rio Camaragibe
3,5
Sul
34
Rio Uma
3,5km
Norte
40
Rio Serinhaém
4 km
Norte
Tabela 09: Ocorrência e a distância dos principais rios da região. Anexo 4, pg.136.
Fonte: Realizado com base nas informações do Relatório do GASALP (1998).
As ocorrências correspondem a prováveis locais destinados a roças.
Sítio Ocorrência
Rios
Distância
Direção
14
Rio Bandeira
145m
Norte
15
Rio Bandeira
70m
Norte
16
Rio Bandeira
1,5km
Sul
17
Rio Bandeira
2,0km
Sul
19
Rio Camaragibe
2,0km
Norte
20
Rio Camaragibe
2,0km
Sul
35
Rio Una
3,0km
Norte
36
Rio Una
1,5km
Norte
44
Rio Taperoçu
5 km
Sul
Tabela 10: Ocorrência e a distância dos principais rios da região. Anexo 4, pg.136.
Fonte: Realizado com base nas informações do Relatório do GASALP (1998).
Identificamos que para as áreas possivelmente destinadas exclusivamente a
produção agrícola ou acampamentos temporários a distância média em relação aos
principais rios não é superior a 3 km. Enquanto que para as ocorrências identificadas como
49
Os sítios ocorrências acima foram segregados com base no Relatório Final do Projeto GASALP, onde
consta na planilha de registro de ocorrências o nome do rio, condição de maior proximidade e a distância
média entre os sítios e os cursos de água não fora superior a 5Km.
106
prováveis locais de estabelecimento de aldeias indígenas, com base nas dimensões
espaciais do terreno e no registro elevado de vestígios cerâmicos, a distância média em
relação aos principais rios da região é superior a 3 km, mas não ultrapassando 5 km.
A utilização dos rios pelas populações indígenas da região fora descrita por Soares
de Sousa quando se referindo aos Caetés enfatiza que uma de suas maiores qualidades é
serem exímios pescadores tanto em rios como no mar. Outro dado arqueológico frente a
utilização das lagoas e rios são as referências a sambaquis descritas por Abelardo Duarte
nos anos de 1930.
Percebemos que o fator abastecimento de água não foi tão primordial para o
estabelecimento das ocupações quanto o foi a questão das terras livres de inundações,
encharcamentos, umidade elevada e falta de aeração.
A dinâmica dos rios infringe dois aspectos divergentes no processo de ocupação da
área pelas populações indígenas. Num primeiro momento a diversificação da rede de
drenagem com elevada concentração de riachos e rios não tornou a aquisição de água para
abastecimento e consumo um fator que condicionasse os locais mais propícios para essa
ação quando do estabelecimentos dos sítios arqueológicos. Porém, essa mesma rede de
drenagem diversificada restringiu a oferta de terras com condições de recebe as moradias e
a produção agrícola desses grupos que era lastreada pela mandioca.
Assim, a capitação de recursos alimentares e sua relação com a tecnologia
identificada nas ocorrências é um referencial analítico para percebermos as áreas que
melhor responderiam as necessidades dos indivíduos ali presentes. As ferramentas
desenvolvidas e técnicas aplicadas na caça, pesca e agricultura podem indicar as práticas
desenvolvidas na produção cultural do grupo ou grupos.
Os recursos alimentares provenientes dos rios possivelmente não foram um fator
relevante quanto imposição sobre os locais de melhor disposição das ocupações e que a
partir destes o percurso e tempo necessário para a aquisição de alimentos sem que fossem
necessárias muitas horas para tal atividade, o que achamos também ser válido, como já nos
referirmos, em relação ao consumo de água, já que a rede de drenagem da área é bem
ramificada em rios e riachos abundantes.
107
Modelo sistêmico de interação sociedade-meio ambiente.
Figura 01: Fluxograma de interação entre recursos naturais e organização social.
Marcel Mazoyer e Laurence Roudart50 irão denominar “sistema de cultura em
terrenos de florestas abatidas-queimadas”, as práticas agrícolas desenvolvidas com base
no arroteamento de parcelas de florestas tropicais, onde os recursos minerais, de flora e
hídricos são primordiais na produção das espécies exploradas. Os autores assim se
remetem a preparação da área para o plantio:
“Para instalar culturas num meio arborizado, por pouco denso que seja,
é necessário proporcionar-lhes previamente um lugar no solo e ao sol,
destruindo toda ou parte da vegetação espontânea. Para proceder desse
modo, (...) os cultivadores florestais munidos de machados e de sabres
para abate limitam-se geralmente a fazer uma clareira parcial: cortam
apenas a vegetação que cresce por debaixo das árvores e as árvores
fácies de abater”.
50
MAZOYER, Marcel, ROUDART, Laurence (2001). História das agriculturas do mundo: do neolítico à
crise contemporânea. Lisboa: Instituto Piaget, pg. 520.
108
Essa descrição referente às práticas de preparação do solo são originárias do
período neolítico e estão presentes em vários locais do mundo e ainda na América do Sul.
Alguns remanescentes indígenas localizados em áreas da Amazônia ainda se utilizam
dessa prática na exploração da agricultura. A descrição dessa técnica agrícola foi descrita
pela primeira vez no Brasil através dos contatos dos exploradores europeus e as
comunidades indígenas do litoral, ainda no século XVI.
As populações indígenas do litoral nordestino detinham o aparato técnico
necessário à exploração agrícola da mandioca com base no conhecimento adquirido sobre
as áreas específicas que ocupavam e nessas áreas onde melhor implementar a plantação.
Porém, as técnicas de plantio não incluíam uma produção intensiva da mandioca
que fosse necessária na manutenção e reprodução do grupo, além do que, a própria
rentabilidade que o solo oferecia, com base nos sais minerais, decrescia a cada ano. Pelo
motivo de que a renovação dos sais minerais provia da decomposição do material orgânico
oriundo da cobertura vegetal.
Para a exploração agrícola da mandioca os solos indicados são aqueles de
topografia plana, com boa profundidade efetiva, sem camadas de impedimento físico ou
químico ao desenvolvimento de raízes, com a textura variando de franco arenosa a argiloarenosa e com pH entre 5,0 e 6,0. São totalmente desaconselháveis solos sujeitos a
encharcamento, devido a dificuldade de aeração que ocasiona podridão nas raízes, e
também os excessivamente argilosos, pois impedem o desenvolvimento adequado das
raízes tuberosas.51
Além dessas informações o cultivo da mandioca, diferente de outras culturas como
o milho, necessita de um tempo maior entre o plantio e a colheita com uma duração de
aproximadamente 6 meses.
E o contexto geomorfólogico da região não favorecia a plantação da mandioca nas
terras baixas, vales e várzeas, que apresentam um impedimento químico com solos muito
ácidos, um prolongado período de encharcamento por conta do período das chuvas que se
estendem por aproximadamente 7 meses, problemas com a aeração e com características
litológicas apresentando uma composição muito argilosa.
51
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (www.embrapa.gov.br).
109
Os solos com maior potencialidade agrícola e que não apresentam as características
negativas ao desenvolvimento da mandioca na região da Formação Barreiras são os locais
que denominamos de terras secas, ou as áreas das vertentes e topos dos Tabuleiros
Costeiros.
A necessidade de novos locais para o plantio, devido a redução da produção em
solos cansados, e possivelmente a associação de aspectos culturais como o crescimento das
aldeias e sua fragmentação em novas ocupações, numa região em que os solos propícios a
ocupação, terras secas e extensas não são tão abundantes, percebemos que foi estabelecida,
com base nos dados da área de passagem do gasoduto, quatro locais de implantação de
prováveis aldeias com suas células de plantação nas proximidades.
4.6
A Ocorrência 34
Escolhemos como referencial das prováveis aldeias indígenas a ocorrência 34 por
estar localizado nos limites estaduais entre Alagoas e Pernambuco, além de estar situado na
região em que as feições do relevo começam a se modificar das formações tabulares
alagoanas para as formas mais colinares no território pernambucano. É a ocorrência que
apresenta as maiores dimensões em área de ocupação e o local em que foi registrado a
maior densidade de fragmentos cerâmicos de vasilhas, cachimbo e fusos. A ocorrência
também está a apenas 3,5km de um dos maiores rios da região, o rio Una, além de
apresentar possíveis locais de sítios destinados às plantações tanto no sentido sul como
norte de sua posição. Ver mapa de distribuição das ocorrências no anexo 10, pg. 141,
planta Km 109,0 ao Km 110,0. Outro dado proveniente do sítio é a presença de alguns
fragmentos de cerâmicas confeccionadas em torno, o que denota vestígios históricos para o
sítio arqueológico.
A ocorrência 34, provavelmente uma aldeia a céu-aberto, está situado a 8° 51´44´´
de Latitude Sul e 35° 26´40´´ de Longitude Oeste. O acesso a ele se faz através da PE 060,
ao chegar ao município de Jacuípe – AL, o acesso se faz por uma entrada próximo a
Destilaria Porto Calvo. A área do sítio esta inserido na localidade do Engenho Dois Irmãos.
Os marcos topográficos de referência da rede do gasoduto registram o sítio no PI (Pontos
110
de Inflexão) 637 e na Estação 2184+25.322, quilômetro 109,200 da tubulação do duto. A
localização do sítio em mapa de distribuição das ocorrências no anexo 8, pg 140.
O sítio foi implantado em todo o topo de um tabuleiro com dimensão de 40.000m²,
com a presença de vestígios cerâmicos por toda a sua extensão, como também na vertente
superior localizada na face leste desta unidade de relevo. Com uma extensa área plana o
sítio ocorrência 34 é cercado por vales encaixados entre as elevações tabulares e com
vertentes presentes em todas as direções da área. A cota altimétrica do sítio é de cerca de
155metros em relação ao nível do mar.
Foto 12: Detalhe da vala da tubulação de gás cortando a área da ocorrência 34.
Em parte do sítio o canavial alto apresentou vestígios mais conservados e
fragmentos maiores do que os que aparecem nas demais ocorrências. As atividades de
salvamento nesse sítio incluíram a coleta sistemática dos vestígios e a realização de sete
sondagens nas áreas que apresentaram uma elevada concentração de fragmentos
cerâmicos. O vestígio com maior representatividade dentro do conjunto de materiais
coletados foram fragmentos de vasilhas cerâmicas que totalizaram cerca de 7.502
unidades.
111
A matéria-prima utilizada na elaboração dos vasilhames cerâmicos, provavelmente
é originária da área em torno. As camadas sedimentares da região são formadas por duas
camadas de argila, a primeira de composição arenosa marrom e a segunda, também, de
composição arenosa, porém amarelada. As partículas de areia apresenta dimensões de areia
fina a areia muito grossa, acima de 1mm. Em alguns locais das áreas baixas a composição
da argila apresenta partículas com dimensões superiores a 2mm, sendo identificada como
uma argila co presença de cascalho.
No sítio ocorrência 34 foram identificadas 3 áreas de concentração de fragmentos
cerâmicos na superfície e que esta distribuída no sentido leste/oeste no topo do morro (Ver
anexo 11, pg.144). A concentração que apresenta uma densidade maior é aquela que estava
situada próxima a vertente leste, no local de passagem da vala do gasoduto, e onde foram
realizadas as sondagens 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7. Essa área de concentração foi denominada em
nossa pesquisa de área 1, seguindo a seqüência numérica para as demais, e consta de
fragmentos de vasilhas cerâmicas em grande quantidade, e no início do declive da vertente
foram encontrados fragmentos de cachimbos e um tembetá.
Sondagem Decapagens/Dimensões Profundidade
Vestígios
01
03 / 1x5m
30 cm/cada
Frag. Vasilhas, Frag. Cachimbo, Lascas de sílex.
02
03/1x7m
20 cm/cada
Frag Vasilhas.
03 e 4
01/1x3m
10 cm
Frag. Vasilhas, Estilhas de sílex.
05
03/2x1m
25 cm
Não se encontrou vestígios arqueológicos.
06
02/2x1
25 cm
Frag. Vasilhas.
07
02/2x1
25 cm
Frag. Vasilhas.
Tabela 11: Sondagens realizadas no Sítio Ocorrência 34.
Fonte: Relatório Final do GASALP, pg. 58-59, 1998.
112
Foto 13: Fornilho de cachimbo – Ocorrência 34.
Foto 14: Fornilho de cachimbo – Ocorrência 34.
113
Foto 15: Fragmento de Tembetá em amazonita – Ocorrência 34.
Foto 16: Fragmento de Fuso – Sítio Ocorrência 34.
114
A área de concentração 2 foi identificada na zona de cana alta e apresentou uma
densidade de vestígios arqueológicos menor em relação a área 1, talvez pelo motivo de que
a plantação tenha prejudicado o campo de visão dos arqueólogos que realizaram o
salvamento do material arqueológico. Esse material é composto predominantemente de
fragmentos de vasilhas cerâmicas. Na concentração 2 , foi realizada a sondagem 7 descrita
na tabela acima.
A área de concentração 3 foi identificada na parte posterior a área de cana alta
seguindo a estrada vicinal que corta o topo do morro. Essa parcela do sítio apresentava-se
sem a presença da plantação de cana-de-açúcar e diferente das demais concentrações, foi
neste local onde foram registrados os fragmentos cerâmicos de maiores dimensões. Consta
do desenho de distribuição dos vestígios arqueológicos a realização da sondagem 8, mas,
nas informações que constam no relatório final a respeito do salvamento arqueológico
realizado nesse sítio não apresenta dados referente a esta sondagem.
Mesmo com essas 3 áreas de concentração de vestígios cerâmicos não foi possível
identificar nenhum vasilhame cerâmico preservado o que denota o alto nível de
conturbação dos depósitos arqueológicos na ocorrência, bem como nas demais ocorrências
registradas na região.
4.6.1
Análise dos fragmentos cerâmicos
Na metodologia aplicada na análise do material cerâmico da Ocorrência 34,
procuramos seguir a proposta metodológica apresentada pelas arqueólogas Suely Luna e
Ana Nascimento52, onde foram considerados três momentos analíticos:
1. O material arqueológico será analisado de acordo com a sua localização, ou seja, no
interior de cada área de concentração de vestígios identificada no sítio.
2. Estabelecer as comparações dos resultados da análise do material arqueológico
entre as áreas de concentração de vestígios.
3. E, por último, serão estabelecidas as características do material cerâmico que
fornecerão os elementos que constituirão o perfil técnico cerâmico do sítio.
52
LUNA, Suely (1991). O Sítio Sinal Verde – São Lourenço da Mata, PE. Uma aldeia pré-histórica na Zona
da Mata pernambucana. Revista CLIO, Série Arqueológica, vol. 1, n. 7, pg. 89-142, Recife, UFPE.
115
Os procedimentos em laboratório na preparação do material arqueológico segue as
diretrizes estabelecidas pelo Núcleo de Estudos Arqueológicos, e são as seguintes: a)
lavagem do material arqueológico, após se verificar nenhum traço de uso ou pintura; b)
numeração com base na etiqueta de campo; c) Análise dos elementos que compõem cada
unidade; d) identificar os objetos de cada unidade, e e) Segregação das características que
irão delinear o perfil técnico cerâmico do sítio.
Para realizar a segregação das unidades foram utilizados o tipo de aditivo e o
tratamento de superfície externo. Na ausência de qualquer um desses elementos os
fragmentos irão constituir uma classe denominada de residual.53
O salvamento do Sítio Ocorrência 34 levou a coleta de um total de 15.896
fragmentos de cerâmica. Nesse conjunto, 1029 fragmentos foram identificados em
unidades, 1054 na Classe Residual e 13.813 na Classe Direfida.
6%
7%
Unidades
Residual
Diferido
87%
Gráfico 06: Porcentagem das categorias de análise dos fragmentos cerâmicos.
Do total de 1029 fragmentos analisados, em 475 (32%) fragmentos foram
identificados elementos morfológicos e 546 fragmentos (35%) foram classificados como
Classe Diferida, por não apresentarem tamanho suficiente que pudesse identificar a sua
morfologia.
53
Os elementos que caracterizam as unidades cerâmicas estão bem apresentados em Luna (1991).
116
Entre os 475 fragmentos nos quais foram identificados elementos morfológicos a
distribuição dessas características foi a seguinte:
250
246
200
180
150
100
36
50
8
0
BD
BJ
BE
BB
4
4
BBS
BS
Gráfico 07: Quantificação das morfologias dos fragmentos cerâmicos.
38%
2%
1%
8%
2%
50%
1%
BD
BJ
BE
BB
BBS
BS
Gráfico 08: Porcentagem das morfologias do Sítio Ocorrência 34.
ABREVIATURAS: BD = borda; BJ = bojo; BE = base; BB = borda/bojo; BBS = borda/bojo/base; BS =
bojo/base.
117
4.6.1.1 Unidades cerâmicas
Unidade 1
A unidade 1 é composta pelo aditivo areia fina presente na pasta da cerâmica com
as partículas de quartzo variando entre 0,250 a 0,125mm. Essas partículas estão presentes
nos fragmentos cerâmicos de menor dimensão e espessura. O tratamento de superfície
externo dessa unidade é caracterizado pelo alisamento. Com base no tratamento de
superfície interno foram identificados dois grupos, o grupo 1 (alisamento) e o grupo 2
(pintado em vermelho). Sendo a segunda unidade mais representativa do sítio.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
185
49
Residuais
192
51
Total
377
100
Tabela 12: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais.
Gráfico 09: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
192
BS
0
BBS
1
BB
10
1
BE
91
BJ
BB
82
0
50
100
150
200
250
118
Unidade 2
A unidade 2 é composta pelo aditivo areia grossa54 presente na pasta da cerâmica.
As partículas de quartzo apresentam diâmetro superior a 2mm. Um elemento interessante
nessa unidade é que ela só é encontrada nos fragmentos cerâmicos com grandes dimensões,
acima de 20cm, e principalmente nos fragmentos de bojo. O tratamento de superfície
externo desta unidade é caracterizado pelo alisado. O tratamento de superfície interno
levou a identificação de dois grupos, o grupo 1 (alisado) e o grupo 2 (pintado em
vermelho). Essa unidade cerâmica é a mais representativa do sítio arqueológico.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
267
44
Residuais
340
56
Total
984
100
Tabela 13: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 10: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
340
Residual
BS
1
BBS
3
20
BB
7
BE
82
BJ
155
BB
0
100
200
300
400
54
O termo areia grossa foi elaborado devido as partículas de quartzo presentes nos fragmentos cerâmicos
apresentarem dimensões maiores do que 2,0mm. Segundo os dados da pedologia classificados como
cascalhos.
119
Unidade 3
O bolo de argila foi o aditivo utilizado nesta unidade cerâmica, é perceptível a total
ausência de partículas de areia nos 7 fragmentos identificados dentro desta unidade. O
tratamento de superfície externo, bem como o interno foi o alisado.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
6
86
Residuais
1
14
Total
7
100
Tabela 14: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais.
Gráfico 11: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
1
0
0
BBS
5
BE
0
1
0
BB
0
1
2
3
4
5
6
Unidade 4
A unidade 4 é composta pelo aditivo areia + bolo de argila. Não foram identificados
grupos dentro desta unidade, pois o tratamento de superfície externo e interno foi o alisado.
Porém, a presença do aditivo areia é maior em relação ao bolo de argila.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
5
50
Residuais
5
50
Total
10
100
Tabela 15: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais.
120
Gráfico 12: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
5
BS
0
BBS
0
BB
0
BE
0
BJ
3
2
BB
0
1
2
3
4
5
6
Unidade 5
Análise dos fragmentos sem aditivo mostrou que a preparação da pasta foi bem
trabalhada, não deixando a presença de partículas de areia ou bolhas de ar.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
3
30
Residuais
7
70
Total
10
100
Tabela 16: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 13: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
7
BS
0
BBS
0
BB
0
BE
0
3
BJ
0
BB
0
2
4
6
8
121
Unidade 6
Esta unidade cerâmica apresenta como aditivo o mesmo elemento da unidade 2,
areia grossa, porém no tratamento de superfície foi aplicado o engobo branco. A presença
do branco pode ser um ato preparatório para a realização de alguma pintura, pois esse
elemento já foi identificado no sítio. Através do tratamento de superfície interno foi
identificado 2 grupos, o primeiro identificado como alisado e o segundo, a ausência de
identificação de tratamento superficial.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
2
67
Residuais
1
33
Total
3
100
Tabela 17: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 14: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
1
BS
0
BBS
0
BB
0
BE
0
BJ
0
BB
2
0
0,5
1
1,5
2
2,5
122
Unidade 7
A unidade 7 apresenta como aditivo a areia + cacos triturados de cerâmica, sendo
que a presença dos cacos é bastante inferior a quantidade de areia. Apenas dois fragmentos
apresentaram esse aditivo. O tratamento de superfície externo é o alisado e o tratamento de
superfície interno foi identificado como alisado e a ausência de identificação de tratamento
superficial, assim estabelecendo-se dois grupos.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
2
100
Residuais
0
0,0
Total
2
0,0
Tabela 18: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 15: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
0
BS
0
BBS
0
BB
0
BE
0
BJ
0
2
BB
0
0,5
1
1,5
2
2,5
123
Unidade 8
A unidade 8 apresenta como aditivo a areia + carvão, esse elemento como aditivo é
inferior a presença de areia na pasta cerâmica. Em dois fragmentos foi identificado esse
aditivo. O tratamento de superfície externo e interno é o alisado.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
2
100
Residuais
0
0,0
Total
1
100
Tabela 19: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 16: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
0
BS
1
0
BBS
BB
1
BE
0
BJ
0
BB
0
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
124
Unidade 9
O aditivo identificado nesta unidade foi a areia grossa, o mesmo elemento da
unidade 2, porém o tratamento de superfície externo foi o pintado em vermelho, indicativo
de uma nova unidade cerâmica. O tratamento de superfície interno predomina o alisado.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
2
100
Residuais
0
0,0
Total
0
100
Tabela 20: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 17: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
0
1
BS
BBS
0
BB
0
BE
0
BJ
0
BB
2
0
0,5
1
1,5
2
2,5
125
Unidade 10
O aditivo identificado nesta unidade foi a areia fina, o mesmo elemento da unidade
1, porém o tratamento de superfície externo foi o pintado vermelho sobre branco,
indicativo de uma nova unidade cerâmica. O tratamento de superfície interno apresentou a
mesma característica, pintado em vermelho sobre branco.
Fragmentos cerâmicos
Quantidade
%
Analisados
1
100
Residuais
0
0,0
Total
1
100
Tabela 21: Totais dos fragmentos cerâmicos analisados e residuais
Gráfico 18: Quantidade de fragmentos analisados e residual.
Residual
0
BS
0
BBS
0
BB
0
BE
0
BJ
0
BB
1
0
0,2
0,4
0,6
0,8
1
1,2
Percebemos que o aditivo com maior presença nos fragmentos cerâmicos é
composto de areia. A presença das partículas de areia fina não parece intencional, pois os
demais aditivos presentes em alguns fragmentos, bolo de argila, carvão, caco triturado,
estão associados as partículas de areia fina. A exceção é a unidade 5 que possivelmente no
preparo da pasta procurou-se evitar a presença de areia ou bolhas. Quanto às partículas de
areia grossa presente nos fragmentos cerâmicos de grandes dimensões, possivelmente foi
inserido com a intenção de fornecer maior resistência aos vasilhames, mesmo que a
126
presença dessas partículas grandes possa causar problemas de fragmentação dos
vasilhames. Faz-se necessário uma análise das fontes de matéria-prima da região com o
intuito de verificar a origem da argila utilizada na elaboração dos objetos cerâmicos.
Devido ao fato de que a composição da argila da região apresenta nas áreas baixas, as
fluviais, grande concentração de cascalho.
Gráfico 19: Porcentagem dos aditivos no Sítio Ocorrência 34.
60%
1%
AE/F
AE/G
BA
AB
AU
AC
AV
0%
1%
0%
1%
1%
37%
700
600
500
400
300
200
100
0
615
383
AE/F
AE/G
7
10
10
2
2
BA
AB
AU
AC
AV
Gráfico 20: Quantificação dos aditivos no Sítio Ocorrência 34.
A presença de areia é predominante nos fragmentos do sítio, mas sua distribuição
está bem identificada, pois os fragmentos que apresentam na composição da pasta a areia
fina estão localizados na área de concentração 1, localizada na zona do sítio por onde passa
a vala do gasoduto. Os fragmentos que apresentam na sua composição a areia grossa estão
distribuídos na área de concentração 3, local onde foi registrada a maior quantidade de
127
fragmentos de grandes dimensões. A área de concentração 2 apresenta um misto dos dois
grupos.
Não foi possível realizar a reconstituição das prováveis vasilhas do sítio, devido a
precariedade da conservação dos fragmentos com uma intensa fragmentação comprovada
pelo elevado número de materiais inseridos na classe diferida.
Outro problema identificado no sítio arqueológico são os processos de alteração
pós-deposicionais que alteram a morfologia, composição química e coloração dos
fragmentos cerâmicos.
Dessa forma, as análises de coloração, tipo de queima e dureza dos fragmentos
cerâmicos ficou prejudicada pela recorrente prática da queima da área da plantação para
realizar a limpeza do espaço para uma nova semeadura.
128
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As ponderações a que chegamos ao final desta etapa de nosso trabalho, tem por
objetivo responder as dúvidas que surgiram quando da realização do Projeto GASALP.
Naquele momento, algumas hipóteses foram levantadas a respeito dos locais onde estavam
sendo registrados os vestígios arqueológicos na região. Duas hipóteses deram as bases para
o desenvolvimento desta pesquisa. 1. Ocorreu uma escolha intencional sobre os locais
destinados ao estabelecimentos das ocupações e, 2. Essas ocupações podem ser
classificadas como aldeias de grupos agricultores ceramistas.
A resposta a que chegamos é que, sim, houve um padrão que foi seguido para o
estabelecimento dos Assentamentos na Zona da Mata Norte de Alagoas e Sul de
Pernambuco. Esse padrão foi a escolha pelas terras elevadas da região da Formação
Barreiras, os topos dos Tabuleiros Costeiros e suas vertentes. E as populações agricultoras
ceramistas da região Norte de Alagoas e Sul de Pernambuco ocuparam a região
estabelecendo cinco grandes aldeias na região e explorando os morros de menor extensão,
num raio de poucos quilômetros, como locais de acampamento ou para uso exclusivo da
roça.
As áreas escolhidas para o estabelecimento das ocupações caracterizam-se em sua
maioria por locais que oferecem uma extensão superior a 1000m², com uma configuração
plana e quando nas vertentes com uma inclinação não superior a 20m.
Dessa forma, as áreas selecionadas como locais propícios as ocupações
arqueológicas foram registradas nos Tabuleiros Costeiros alagoanos. Isso não quer dizer
que não ocorreram ocupações nos morros na região Sul de Pernambuco, sendo registrados
nessa área uma aldeia com seus locais destinados a roça.
Os grupos agricultores ceramistas dessa região do litoral nordestino deixaram bem
evidenciados o desenvolvimento técnico que possuíam através da presença marcante de
fragmentos cerâmicos e material lítico (lascas e machado). As ferramentas líticas eram
utilizadas nas atividades destinadas a preparação da terra para o plantio, corte de árvores e
aberturas das covas, bem como lascas e estilhas utilizadas como facas, raspadores e
possíveis raladores de mandioca, além de que em conjunto com os vestígios cerâmicos
podem dar um indicativo de atividades diárias desenvolvidas na aldeia.
129
A configuração do relevo e as condições climáticas da região foram elementos
relevantes no desenvolvimento das práticas agrícolas desse grupo ou grupos. Técnicas para
solucionar os problemas de inundação das terras dos vales e várzeas fluviais durante o
inverno possivelmente não eram dominadas. A planta domesticada e utilizada como lastro
principal da dieta alimentar daquela população, a mandioca, não conseguia pleno
desenvolvimento em solos encharcados e ácidos, predominantes nas zonas baixas da região
de nosso estudo.
Com isso, o grupo ou grupos de agricultores ceramistas direcionou seus esforços
em conquistar e explorar as terras secas registradas apenas nos topos e nas vertentes dos
morros da região. A produção de energia necessária à manutenção e reprodução da
comunidade foi uma atividade racionalizada, com isso os topos mais próximos e que não
poderiam ser utilizados no estabelecimento de aldeias, possivelmente foi utilizado para a
implantação da roça de mandioca.
Um indicativo dessa ação pode é fornecido pelos fragmentos cerâmicos. Os locais
que indicamos como prováveis áreas de aldeias indígenas apresentam uma densidade de
fragmentos cerâmicos elevada, não sendo condizente com uma área destinada apenas a
plantação.
Porém, temos a consciência de que nossa pesquisa não pode querer ter pretensões
de uma pesquisa territorial. Não vamos generalizar nossas observações e concluir que na
região existiu um único padrão de assentamento humano pré-histórico. Trabalhamos quase
que em linha reta numa extensão de 209 km e não ultrapassando em muitos casos 200m em
relação às margens do local de passagem da tubulação do gasoduto.
Uma questão primordial a ser solucionada no estudo dos grupos agricultores
ceramistas da região pesquisada está vinculado a dúvida da contemporaneidade das cincos
aldeias identificadas. Existe uma contemporaneidade entre as ocupações, sendo resultado
da ação de um único grupo ou de vários grupos? As ocupações foram permanentes ou
existiram lacunas temporais entre o período de ocupação de uma aldeia ou mesmo das
várias aldeias? Questões como essas só poderão ser solucionadas com a continuação dos
trabalhos na área selecionando grandes células territoriais ou realizando prospecções em
faixas paralelas a que já foi realizada. E principalmente solucionar o problema de datações
para a região.
130
Não devemos esquecer as informações de sítios de sambaquis nas proximidades de
Maceió, juntamente com a conservação dos terraços pleistocênicos e holocênicos no litoral
alagoano. Os sítios litorâneos podem fornecer datações que indiquem o início da ocupação
e exploração da área pelos grupos humanos Com isso esses possíveis sítios do litoral irão
desempenhar duas funções, o de ser um referencial cronológico para a região, haja vista o
grau de degradação dos sítios dos tabuleiros, e de serem caracterizadores de outros padrões
de assentamentos existentes na região.
Em relação aos vestígios predominantes, a cerâmica, a continuação das pesquisas
pode comprovar o desenvolvimento técnico do grupo que ocupou a região. A presença
marcante de areia como aditivo na confecção dos vasilhames cerâmicos denota o grau de
domínio que esses indivíduos detinham sobre esse material. Sendo mal utilizado, a
areia,pode ocasionar o aumento no nível de quebra das vasilhas durante a queima ou
manuseio.
Os problemas verificados nos sítios arqueológicos em relação a alterações pósdeposicionais que levaram a intensa fragmentação dos vasilhames cerâmicos, prejudicando
alguns elementos da análise do perfil técnico cerâmico, apenas podem ser solucionados
com a identificação de locais de ocupação mais preservados na região.
Assim, temos nessa fase do trabalho constatado que, os dados etnográficos e
históricos sobre a presença de populações indígenas na região são corroborados pelos
dados resultantes das pesquisas. A argumentação dos historiadores de que os locais
elevados eram selecionados apenas pelo fato de oferecer melhor campo de visão contra
ataques devido o caráter belicoso dos grupos indígenas necessita ser revisto. Aspectos
econômicos, tecnológicos e ambientais também devem ser avaliados nos estudos referente
as dinâmicas de ocupação e exploração de uma região.
131
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140
ANEXO 1
Mapa de configuração do relevo. Fonte IBGE.
141
ANEXO 2
Imagens de satélite do Estado de Alagoas. Detalha em vermelho, área da Formação
Barreira. Na imagem ampliada parcela da área de registro dos sítios arqueológicos em azul.
Fonte: EMBRAPA.
142
ANEXO 3
Imagens de satélite do Estado de Pernambuco. Detalha em vermelho, área da Formação
barreiras. Na imagem ampliada parcela da área de registro dos sítios arqueológicos. Fonte:
EMBRAPA.
143
Localização do gasoduto Alagoas - Pernambuco, Projeto GASALP.
ANEXO 4
144
ANEXO 5
Mapa com as diferenças climáticas da região da pesquisa. Fonte IBGE.
145
ANEXO 6
Mapa com os diferentes biomas existentes no Brasil. Fonte IBGE.
146
ANEXO 7
Mapa com a localização das aldeias indígenas no século XIX.
147
ANEXO 8
Mapa de distribuição das ocorrências na faixa do gasoduto GASALP.
148
ANEXO 9
Foto 01: Realização de Sondagem na Ocorrência 1.
149
Foto 02: Área de implantação da Ocorrência 11.
150
Foto 03: Área de implantação da Ocorrência 12.
151
Foto 04: Área de implantação da Ocorrência 21.
152
Foto 05: Área de implantação do Sítio Ocorrência 34.
153
Foto 06: Área de implantação do Sítio Ocorrência 40.
154
ANEXO 10
Plantas de Cadastro e Perfil das Ocorrências 1, 11, 12, 21, 34, 40.
155
11
156
12
157
21
158
34
159
40
160
ANEXO 11
Planta de distribuição dos vestígios arqueológicos no Sítio Ocorrência 34.
161